Com clubes em crise financeira, 'calcio' perde craques e conta com poucos brasileiros de destaque. Atual bicampeão, Juventus parte como favorito
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Houve um tempo em que um império localizado na Península Itálica era o
centro do mundo, até ruir por causa de sua própria desorganização e a
ofensiva de guerreiros vindos do norte. Como a história costuma se
repetir, como prega o ditado popular, a queda agora se dá no esporte
mais popular do mundo: foi-se o tempo em que o Campeonato Italiano, cuja
temporada 2013/2014 começa neste sábado, era o mais importante da
Europa. Envolto em problemas econômicos e estruturais, o "calcio" inicia
sua edição menos badalada nos últimos anos, ofuscado principalmente
pela liga alemã, justamente dos descendentes daqueles povos que um dia
puseram fim ao Império Romano.Exemplo de organização na Europa, a Bundesliga desbancou o Campeonato Italiano do terceiro lugar do ranking da Uefa há duas temporadas, fazendo com que o calcio perdesse um representante na Liga dos Campeões. Fora de campo, a distância entre os dois torneios é grande: do lado germânico, estádios modernos, times competitivos e fãs assíduos. Pelos herdeiros dos romanos, escândalos de manipulação de resultados, violência entre torcidas e êxodo de craques.
- São duas culturas diferentes. Cultura como cultura e cultura futebolística. Pensamentos diferentes. Cada um com sua maneira de fazer futebol. São duas ligas muito importantes a nível mundial. A liga italiana não tem o que aprender. Tem momentos que vão pender para um lado ou para o outro. O ambiente (na Itália) está um pouco contaminado. Mas é um campeonato de muita tradição. É muito forte, muito disputado. Apesar de não ter tanto brilho que nem antes, tem a tradição, a camisa que pesa - defendeu o meia Hernanes, do Lazio.
Crise financeira = debandada de brasileiros
O Profeta, aliás, representa um dos indicadores de que o futebol na Itália perdeu um pouco de seu prestígio: o baixo número de brasileiros de destaque atuando no país. Além de Hernanes, apenas Robinho, do Milan, e Maicon, do Roma, se enquadram na categoria. A última perda foi a do zagueiro Marquinhos, que deixou os giallorossi da capital rumo ao Paris Saint-Germain por € 35 milhões (cerca de R$ 105 milhões). No ano anterior, Thiago Silva deixou o Milan e também fechou com os franceses.
- Acho que isso se deve um pouco à crise econômica. É apenas uma fase não ter muito jogador brasileiro aqui com destaque. Na verdade, tem bastante brasileiro por aqui, embora a maioria não tenha muito destaque no Brasil - comentou Hernanes.
Hernanes é um dos poucos brasileiros de renome restantes na Serie A (Foto: Getty Images)
- O futebol italiano perdeu terreno por conta da crise econômica que o país está atravessando, Isso provocou investimentos menores de patrocinadores. Além disso, há o problema dos estádios, que não são acolhedores. Uma solução para o calcio pode ser o surgimento de estádios próprios dos clubes, algo que deu bons resultados na Inglaterra. Precisamos focar em estádios confortáveis se queremos aumentar a atratividade da liga e as receitas dos jogos. Assim, o nível da Serie A pode voltar a ser igual ao do passado – analisou Cristiano Giaretta, diretor esportivo do Udinese, um dos clubes tidos como modelo no país, pela gestão responsável dos recursos.
A falta de dinheiro, portanto, se reflete diretamente na ausência de brasileiros. Geralmente valorizados, eles foram para outros mercados, que embora não tenham a mesma tradição da Itália, têm orçamentos mais generosos.
- Os times italianos não podem oferecer salários muito grandes. E, sobretudo, há a concorrência das outras ligas. Em outros anos seria impossível que um jogador como Hulk fosse para o Campeonato Russo. Salários baixos e concorrência maior têm como resultado menos jogadores de destaque na Itália – ponderou o jornalista Jacopo Gerna, do diário “La Gazzetta dello Sport”.
Rubinho está no Juventus após passar por diversos times italianos (Foto: Reprodução / Juventus.com)
- Não sei se há decadência aqui. Lógico que a Itália não tem o poderio financeiro da Alemanha e da Inglaterra, mas o Campeonato Italiano sempre vai ser um torneio de referência. Infelizmente, dentro da Itália não tem um clube com um árabe louco investindo, pagando € 100 milhões num jogador que tem seis meses como profissional. Creio que os clubes são mais conscientes com as contas – opinou o jogador.
Em terra de cego...
Num cenário complicado, leva vantagem quem tem o mínimo de organização. É o caso do Juventus, atual bicampeão italiano. A Velha Senhora é o único clube com estádio próprio, o que lhe permite um orçamento acima dos demais. Suficiente para atrair jogadores como Tevez e Llorente, que, ao lado de Buffon, Pirlo, Vidal e o técnico Antonio Conte, formam a base para a busca pelo terceiro scudetto consecutivo. Mas, acima de tudo, o ponto forte dos bianconeri está na estrutura oferecida aos atletas.
- No Juventus, a gente tem uma estrutura excepcional. Nos outros clubes em que passei, não havia a mesma coisa. A prioridade do Juventus é me dar todas as condições necessárias para jogar e se dar bem - disse Rubinho.
Campeão da Supercopa, Juventus busca o tri da Serie A (Foto: Reuters)
- O Juventus é o claro favorito para o título italiano, embora eu ache que este ano será mais difícil do que da última vez. Mas acho que o time continua incompleto para a Champions. Ainda há três ou quatro times muito superiores na Europa. Na minha opinião, o Juve ainda precisa de um grande centroavante, que não será Llorente. Tevez é um ótimo atacante, mas não é um artilheiro – analisou o jornalista Jacopo Gerna.
'Acabou o dinheiro': Berlusconi tenta implantar uma política mais austera no Milan (Foto: AP)
Curiosamente, no Milan o problema é diferente. Artilheiros não faltam – como provam Balotelli e El Shaarawy -, mas a situação financeira não é das melhores. No início da temporada passada, o clube teve de vender Thiago Silva e Ibrahimovic para fazer caixa. Na época, o presidente dos rossoneri, Silvio Berlusconi, avisou que não gastaria mais grandes somas em jogadores e procuraria formar uma equipe jovem.
A nova política, porém, teve impacto nos gramados. O Milan foi muito mal na primeira metade da temporada e só se recuperou a partir de janeiro, com a chegada de Balotelli – quebrando a promessa de austeridade de Berlusconi -, assegurando uma vaga na Liga dos Campeões. Ainda assim, o time está longe das potências europeias. Pouco para quem chegou ao topo do continente em 2003 e 2007.
- O problema do Milan é financeiro. Há poucos anos, antes das saídas de Kaká e Shevchenko, Berlusconi gastava dinheiro do próprio bolso para cobrir o prejuízo do clube. Em um certo ponto, decidiu não fazer mais isso, e o Milan perdeu competitividade. A crise econômica na Itália afetou sua influência política. Seus filhos preferem que o Milan seja autossustentável – explicou Gerna.
Para a próxima temporada, os rossoneri pouco investiram. As apostas foram em jovens, como o meia Saponara, comparado a Kaká, e o volante Poli, já com passagens por Inter de Milão e Sampdoria. As esperanças seguem depositadas em Balotelli e El Shaarawy. Brasileiros? Apenas Robinho, ainda lutando para recuperar a forma física após quase ir para o Santos, e o goleiro reserva Gabriel, ex-Cruzeiro.
Balotelli é a esperança do Milan na temporada (Foto: Agência Reuters)
Do lado azul e preto de Milão, a situação também não é das melhores. Na última temporada, o Inter de Milão terminou em sétimo lugar, sem conseguir a classificação para as competições europeias. Para este ano, os nerazzurri investiram na contratação do técnico Walter Mazzarri, ex-Napoli. O treinador é a grande esperança para que o time volte a ser protagonista.
- No ano passado, a gente começou bem o campeonato, chegamos até a zona da Liga dos Campeões, mas depois tivemos muitos problemas com lesões e acabamos perdendo peças importantes. Creio que fizemos um bom mercado, e a chegada do Mazzarri só acrescenta, pois ele é um treinador experiente, que conhece muito o futebol italiano. Acredito que podemos fazer um grande campeonato – disse o zagueiro Juan, que permanece como titular com o novo técnico.
Juan é uma das apostas do Inter de Milão (Foto: Agência Reuters)
Com os rivais de Milão em baixa, quem surge como principal concorrente do Juventus ao título é o Napoli. Mesmo tendo perdido o artilheiro Cavani, vendido para o PSG, o clube do sul da Itália investiu bem. Sob a batuta do técnico Rafa Benítez, vieram os espanhóis Albiol (zagueiro), Callejón (meia) e Reina (goleiro). Mas a principal estrela é o atacante Higuaín, ex-Real Madrid, nova esperança de gols dos azzurri.
Higuain em sua chegada ao Napoli: recepção de ídolo do substituto de Cavani (Foto: Getty Images)
Quem também sonha incomodar os grandes é a Fiorentina. Depois de perder a vaga na Liga dos Campeões para o Milan na última rodada da temporada passada, a Viola voltou a se reforçar bem - trouxe o centroavante Mario Gómez, ex-Bayern de Munique - e, mesmo sem o ídolo Jovetic, é vista como possível surpresa.
Por fim, há o Lazio de Hernanes, embora o próprio meia evite fazer projeções mais ambiciosas. Para ele, a tradição ainda faz a diferença na Serie A. Afinal de contas, história é o que não falta na Itália, e deve ser sempre levada em conta.
- Cito os três grandes (Juventus, Milan e Inter) como favoritos, que têm condições de poder ganhar títulos. A camisa e a tradição contam muito. Antes de começar, prefiro arriscar esses três entre os favoritos. Depois, quando a bolar rolar, outros são os favoritos. Nós (Lazio) temos feito bons campeonatos. Tenho aprendido que é melhor entrar sem fazer planejamento. Temos que pensar em melhorar, porque temos qualidade. Sem pensar em Champions, título ou coisa do tipo - finalizou o brasileiro.
FONTE:
http://globoesporte.globo.com/futebol/futebol-internacional/futebol-italiano/noticia/2013/08/imperio-em-ruinas-campeonato-italiano-inicia-edicao-pouco-badalada.html
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