De Fernando, último a deixar o Tricolor,
a Lucas e Rafael Carioca, clube tem histórico positivo na formação e
venda nesta posição nos últimos anos
Por Jessica Mello
Porto Alegre
Fernando é exemplo mais recente da tradição
de volantes (Foto: Lucas Uebel/Grêmio FBPA)
Élton, China, Bonamigo, Dinho, Luís Carlos Goiano. Todos jogadores
históricos do Grêmio e com uma característica em comum: atuavam como
volantes. Muitos deles não foram formados no clube gaúcho, é verdade,
mas integram uma estatística de grandes nomes que davam retaguarda aos
zagueiros tricolores. Nos últimos anos, o clube não só seguiu com bons
jogadores na posição, mas também se especializou em revelar jovens
camisas 5 e 8. Das últimas 13 grandes vendas de jogadores formados na
base, seis foram de meio-campistas de marcação. Os valores totais
envolvidos na negociações somam quase R$ 100 milhões. Nos cofres do
Grêmio, caíram R$ 57,4 milhões.
Último jogador negociado, Fernando foi vendido por R$ 36 milhões ao
Shakhtar Donetsk. O Grêmio, detentor de 40% dos direitos do jogador,
lucrou R$ 14 milhões.
A boa venda de Fernando após passagem pelo grupo principal do Grêmio,
rendendo-lhe, inclusive, convocações e atuações pela Seleção, apenas
segue um ciclo iniciado já há anos. Antes, Lucas, Rafael Carioca e
Adilson foram alguns dos volantes vendidos para clubes europeus. Pode-se
somar aí até o caso de Anderson, meia de formação em Porto Alegre que
passou a atuar mais recuado a partir das necessidades do futebol inglês.
Volante |
Clube |
Ano da venda |
Valor recebido pelo Grêmio |
Fernando |
Shakhtar Donetsk |
2013 |
R$ 14,4 milhões |
Adilson |
Terek Grozny |
2011 |
R$ 2,9 milhões |
Rafael Carioca |
Spartak Moscou |
2009 |
R$ 15,48 milhões |
Tiago Dutra e Bruno Renan |
Villarreal |
2009 |
R$ 4,9 milhões |
Lucas |
Liverpool |
2007 |
R$ 19,6 milhões |
| * Valores com a cotação da época |
A trajetória de Anderson pelo meio-campo, aliás, é até comparada com a
de Emerson, campeão da América com a camisa tricolor e que,
recentemente, foi auxiliar técnico da equipe principal. O volante também
teve suas origens como meio-campista. E, ao comentar do sucesso do
prata da casa no Manchester United, foi só elogios.
- Comecei no Grêmio como meia. Fui atuar mais recuado com a Seleção, em
1999, com o Vanderlei (Luxemburgo). Com o Anderson, que está muito bem
na Europa, aconteceu quase a mesma coisa. No futebol inglês, que é um
campeonato muito difícil, passou a jogar mais atrás. Era uma das grandes
promessas do Grêmio e saiu do time muito bem, muito novo. Se firmou bem
na Europa. Jogar lá fora não é fácil - analisa.
Outro ponto curioso de todas as últimas grandes vendas do Grêmio de
jogadores formados na sua base é de que nenhum atua do meio para frente,
apenas para trás. O último grande goleador a sair dos campinhos de
Porto Alegre para os do mundo foi Ronaldinho Gaúcho, em 2001. O fato é
visto com completa naturalidade por Emerson, por considerar a formação
de atletas de defesa uma das características do time gaúcho.
- O Grêmio sempre foi um clube formador de jogadores de defesa. A
exceção, nos últimos anos, foi o Ronaldinho, que é de um nível top. É a
cultura do clube, o modo como se joga, sempre teve bons defensores -
afirma.
Grêmio, uma fábrica de volantes
Formado no Grêmio como meia, Anderson virou
volante na Inglaterra (Foto: Agência Getty Images)
O sucesso de jogadores da posição dentro do Estádio Olímpico é uma das
razões, aliás, pelas quais as categorias de base seguem relevando
atletas de meio-campo. Inspirados naqueles que conquistam boas atuações e
conseguem garantir o seu sucesso profissional, os garotos que chegam ao
clube para se inscrever nas escolinhas apontam suas preferências para
as posições que dão mais resultados. No caso do Grêmio, a de volante.
Segundo o coordenador geral das categorias de base do clube, Junior
Chávare, chega a ser "assustador" o número de meninos que querem ser
volantes:
- É até assustador. De cada dez atletas que nós avaliamos, quatro são
volantes. O Grêmio sempre teve essa característica de ter bons jogadores
de meio-campo. E o volante tem um espírito guerreiro, de intensidade de
jogo, que são características do Grêmio. Normalmente o jogador da base
se inspira nos que tiveram sucesso. Eles querem ser da mesma posição do
ídolo. Isso acaba contribuindo para se ter mais atletas nessa posição.
É até assustador. De cada dez atletas que nós avaliamos, quatro são
volantes. O Grêmio sempre teve essa característica de ter bons jogadores
de meio-campo."
Junior Chávare, coordenador geraldas categorias de base do Grêmio
Dentre as equipes sub-20, 19 e 17, hoje existem oito volantes que já
estão sendo observados e que inspiram confiança em seus comandantes.
Três deles iniciaram seu processo de transição para o grupo principal.
Processo esse que é feito com muita calma para evitar "queimar" qualquer
tipo de etapa, vindo a prejudicar o atleta de alguma forma no futuro. A
lapidação das características e qualidades do jovem é feita antes de
encarar uma atividade com a equipe profissional. Da base, o jogador deve
sair "semi-pronto", de acordo com Chávare.
Neste ano, aliás, o Grêmio passou a desenvolver um projeto chamado de
"Lapidar", visando ao desenvolvimento de fundamentos em todas as
posições, tendo uniformidade em todos os setores do campo. A ideia é de
que o Tricolor passe a revelar atletas além do meio-campo. Assim,
profissionais realizam exercícios específicos para cada categoria e em
cada posição, deixando a parte técnica completa e apenas os aspectos
emocionais e comportamentais para serem aperfeiçoados ao integrar o
grupo principal.
Matheus Biteco, aposta para o futuro
Matheus Biteco tem moral no grupo de Luxa
(Foto: Lucas Uebel/Grêmio FBPA)
Foi o que aconteceu neste ano, por exemplo, com Matheus Biteco. Aos 18
anos, passou a treinar sob o comando de Vanderlei Luxemburgo e já conta
com seis jogos profissionais em seu currículo. Teve chance de vestir a
camisa canarinho, pela seleção sub-20, e recebeu até assédio de clubes
europeus. É um dos jogadores, na visão compartilhada de Chávare e de
Emerson, que mais pode render ao clube nos próximos anos nesta posição.
- Da nova geração, vejo que o Matheus Biteco ainda vai evoluir muito. O
potencial e o profissionalismo dele é muito grande. Não é a toa que já
chegou na Seleção Sub-20. Se continuar nesse caminho, ainda vai render
muitos frutos - aposta Emerson.
Quem sabe Matheus não siga os mesmos passos do seu irmão, Guilherme,
que também veio da base e já carimbou seu passaporte para a Europa -
teve 70% dos seus direitos vendidos para o Hoffeinheim, da Alemanha, no
ano passado, mas segue atuando no Rio Grande do Sul até o fim do ano que
vem.