PHA: Eu entrevisto José Copello, presidente da Companhia de Transportes do Estado da Bahia. Ele é responsável pelo sistema metroviário de Salvador e Lauro de Freitas, inaugurado em 11 de julho de 2014, composto de duas linhas com total de 41km de extensão, 23 estações, 10 terminais de ônibus integrados e o término dessa obra está previsto para 2017. Copello, como é que foi possível construir isso entre 2014 e 2017?
J. Copello: É um desafio muito grande. O Metrô de Salvador tem um histórico bastante negativo de obras iniciadas... Sob gestão do município de Salvador, foram iniciadas obras no ano de 2000, com projeto inicial de 12km - em 2013, só havia 6km de obras construídas e sem condições de operação. Então, em 2013, sob a gestão do governador Jaques Wagner, houve uma atitude bastante corajosa de buscar transferir esse empreendimento, que àquela altura já tinha quase R$ 1 bilhão públicos investidos e sem nenhum benefício para a população. Em 2013, foi feito um acordo entre o estado e a Prefeitura de Salvador, e essas obras paralisadas vieram para o Estado. Então, de imediato, o Estado já tinha feito uma modelagem para uma parceria público-privada e um mês depois de ter recebido do município colocou isso em licitação. Essa parceria público-privada foi definida em leilão na BOVESPA e foi vencedora a empresa CCR, que é uma concessionária - destaco aqui que a gente não contratou, não fez uma modelagem para contratar um obreiro, uma construtora, e sim contratar um serviço, com a concessão de 30 anos. Esse detalhe é muito importante para explicar o resultado que nós estamos tendo hoje.
Estação Pirajá, parte da Linha 1 (Reprodução)
PHA: Qual é a diferença entre contratar por serviço e contratar uma empreiteira?
J. Copello: Basicamente a principal diferença está na questão da matriz de risco. Nós estamos acostumados e vemos tantas obras públicas paralisadas por diversos motivos - e no sistema de obra pública convencional, praticamente todos os riscos são assumidos pelo contratante. Então, o poder público faz um projeto, coloca a licitação e de repente, durante a obra, na hora da fundação, começa a ver que não é bem assim, que ali embaixo passa um rio, que o solo é diferente, que a fundação tem que ser diferente, tudo isso numa obra tradicional. Estou dando um dos exemplos que fazem com que a construtora comece com aqueles famosos pedidos de aditivos de contrato. Enquanto isso, essas obras vão derrapando, vão ficando com custo financeiro tanto para Estado, quanto para o construtor - mas, em última hipótese, é o estado, o poder público, que termina assumindo isso. Então, nessa modelagem existe uma matriz de risco bastante clara, bastante definida, com os riscos todos mapeados. Nesse exemplo que eu coloquei, que é o risco de projeto ou o risco de obras, o risco é 100% assumido pelo privado. Então, não existe possibilidade de acontecer uma parada de obra - ele tem que encontrar a solução, diretamente resolver isso tudo. Como passa ser o custo dele, passa a ter um interesse muito grande de que isso seja muito rápido e ele consiga atingir. Ainda nessa modelagem específica feita aqui, existe um percentual de aporte público... É difícil uma obra de infraestrutura como um Metrô - no mundo inteiro - ser conduzida apenas com resultados que ela dá por tarifa. A Europa é um exemplo claro disso: praticamente todos os grandes metrôs da Europa são subsidiados, têm alguma forma de aporte público, no investimento e também na operação. Então esse aporte público está em torno de 50% do valor total do investimento.
Após conclusão das obras, Metrô de Salvador terá capacidade para atender 500 mil pessoas por dia (Reprodução)
PHA: Que é de quanto?
J. Copello: Em base do contrato da licitação de abril de 2013, em torno de R$ 4 bilhões. Tem um custo da inflação que inclusive é risco dele, do privado.
Estação Detran (Linha 2) foi inaugurada em dezembro de 2016 (Reprodução)
PHA: A inflação é risco deles?
J. Copello: É risco deles, é risco do privado. O aporte público que está estabelecido, por exemplo, em dinheiro da União - R$ 1,3 bilhão -, e do Estado - mais R$ 1 bilhão. Refazendo esses R$ 2,3 bilhões dos R$ 4 [bilhões], é necessário usar preços de 2013. Esse aporte ele vai recebendo à medida que ele vai entregando trechos em operação. Não há aquela tradicional medição por mês. Eu faço uma fiscalização, o poder público faz uma fiscalização contínua, permanente ao longo da obra e ao final daquele trecho, daquele pedaço de via, de estação, [para verificar] se o conjunto tem condições de operar.
Estação Bom Juá (Linha 1) em seus primeiros dias de operação (Reprodução)
PHA: Eu tenho o prazer de ir sempre a Salvador. E, quando saio do aeroporto e me dirijo à minha casa, eu vou sendo acompanhando pela evolução da obra do Metrô, o Metrô vem andando na minha direção, e daqui a pouco ele vai chegar ao aeroporto, não é isso?
J. Copello: Sem dúvida nenhuma, Paulo. Eu gostaria de lhe convidar para o final do ano, quuando você venha a Salvador, estarei no aeroporto lhe esperando para a gente ir de metrô.
Trabalhadores nas obras da Estação Aeroporto, que integrará a Linha 2 (Reprodução)
PHA: Maravilha! Uma das coisas que sempre me intrigou é: como é que na Bahia, que é a sede da Odebrecht, que é uma das maiores empresas de engenharia do mundo, a Odebrecht não participou dessa licitação?
J. Copello: Pois é! A licitação foi feita nessa modelagem PPP, foi conduzida com um processo anterior de manifestação de interesse com audiências públicas, consultas públicas e a Odebrecht, assim como outras construtoras, acompanhou todo esse processo, era uma das empresas que estavam estudando muito o processo e chegou no final da licitação. No dia de apresentar as propostas na BOVESPA, ela não entrou na sessão e terminou que a vencedora foi a empresa CCR.
Estação Tamburugy (Linha 2) será entregue em 2017 (Reprodução)
PHA: E a OAS, que também é baiana, não concorreu?
J. Copello: A OAS nesse processo estava junto com a Odebrecht. Formaram um consórcio que tinha Odebrecht, OAS - a OAS através da Invepar, que era a empresa de infraestrutura e de concessões, sem fundos de pensão. Então, não era a OAS diretamente, mas era a Invepar, com a Odebrecht Transporte, que também é uma empresa de concessões da Odebrecht.
PHA: E a CCR é uma empresa paulista?
J. Copello: É uma empresa nacional que tem sede em São Paulo, mas tem capital também entre construtoras, e uma parte dela, 49% pelo menos, é o que eles divulgam, está no Novo Mercado de ações.
CCR tem direito à concessão por 30 anos (Reprodução)
PHA: Todos os trabalhadores da obra são baianos ?
J. Copello: Todos não, mas temos poucos estrangeiros, - na área de sistemas tem alguns de origem alemã e na parte de trem também tem alguns de origem coreana, mas com fábricas aqui no Brasil. Mas são pouquíssimos, estatisticamente é quase zero de estrangeiro.
PHA: Então é uma mão de obra que gosta de acarajé, eu imagino.
J. Copello: É, e tem alguns aqui também de todo o Brasil, mas o grande percentual, a grande massa de obras (chegamos no pico de ter 8 mil trabalhadores diretos nas obras, sem falar dos indiretos), quase todos são baianos.
Vídeo da Secretaria de Desenvolvimento Urbana oferece um "passeio" pela Linha 2
(VEJA ESTE VÍDEO CLICANDO NO LINK DA FONTE ACIMA)
PHA: E são quantos trabalhadores na obra, hoje ?
J. Copello: Agora nós estamos com cerca de 6 mil trabalhadores na obra, porque já esta entregando, já estamos aí a ponto de entregar.
Paulo, só para concluir um pequeno raciocínio naquela hora que falei dos aportes: eles só recebem quando entregam um trecho pronto para operar. E eles recebem isso sem correção, com valor de fato de 2013. Então, esse risco da inflação é totalmente deles e faz com que eles sejam muito rápidos, porque a cada dia que passa o custo financeiro é deles. E também deixam de arrecadar porque eles não abriram a porta do vagao, então eles não têm o passageiro, não têm a tarifa.
PHA: A concessão é por 30 anos?
J. Copello: Concessão por 30 anos, incluindo o período de obras, que deve fechar na faixa de três anos e meio a quatro anos. Quase todo o período é de operação, é de receita.
Obras para instalar estruturas da Estação Aeroporto já foram iniciadas (Crédito: Correio 24 Horas)
PHA: Vocês estão transportando 400 mil passageiros/dia.
J. Copello: Ainda não. O projeto, quando chegar no aeroporto, ele passa para mais 400 mil passageiros/dia. Hoje, o trecho que já está em operação está operando com aproximadamente 65 mil passageiros/dia. E quando entregar o aeroporto e depois de alguns meses de maturação vai chegar a quase 500 mil passageiros por dia.
PHA: Quanto custa uma passagem de integração metrô e ônibus?
J. Copello: R$ 3,60, podendo usar somente o Metrô ou usar o Metrô com até duas integrações de ônibus. Digamos que ele sai da residência dele e não tem Metrô, então ele vai de ônibus até chegar ao Metrô, pega o trecho de Metrô e se na outra ponta tiver necessidade de mais algum ônibus, está incluído nessa tarifa.
Campanha do Governo da Bahia destaca estação na Avenida Paralela (Reprodução)
PHA: A Companhia de Transportes do Estado da Bahia vai parar na linha 1 e na linha 2?
J. Copello: A Companhia é do Estado, ela faz o gerenciamento, é o "P" público da parceria, então cabe a ela também fazer o planejamento de expansões. Assim como toda administração direta do Estado, nós estamos vinculados à Secretaria de Desenvolvimento Urbano, então já temos algumas expansões em papel, em planejamento, mas nesse momento o foco é:
- concluir o aeroporto, que é a linha 2, até o final desse ano;
- fazer mais 5km no período de 2 anos, até chegar na região de Águas Claras, saindo de Pirajá;
- e, voltando para a linha 1, aquele sentido da BR 324, indo para Feira de Santana.
São mais 5km que pretendemos fazer e entregar daqui a 2 anos, e nesse em particular, na região de Águas Claras, tem desenvolvimento econômico de uma área que é um bairro grande que está junto a Cajazeiras, uma região populosa de Salvador...
PHA: Onde mora a minha sogra ...
J. Copello - ..., onde será implantada uma nova estação rodoviária, integrada com o Metrô, para os ônibus que vêm aqui - intermunicipais ou de outro estado. Então, ele vai chegar por ali, vai ter a estação de Metrô acoplada e vai chegar ao centro de Salvador pelo Metrô.
Estação Rodoviária: são 7700 m² (Crédito: CCR)
PHA: Quero dizer que quando for à Bahia para comemorar o Natal com a minha sogra, eu vou querer sair do aeroporto com você.
J. Copello: Me avise, que eu vou lhe receber lá no aeroporto com todo o prazer. E queria acrescentar que o programa de mobilidade do Governo do Estado, Paulo, tem um investimento total de R$ 9 bilhões. Além do Metrô, tem uma linha de VLT que vai substituir o trem subúrbio. Nesse momento, estamos encaixando a modelagem para iniciar as obras no segundo semestre de 2017, com mais 18km de um VLT que é quase um Metrô aqui em Salvador e atendendo a região do subúrbio. O Governador Rui Costa é um obstinado em cima desse programa de mobilidade.
Projeto do VLT do Subúrbio - Estação Calçada (Reprodução)
PHA: E vai ser também sob o regime de PPP?
J. Copello: Também PPP, e eu diria pra você que o grande objetivo é o que está na cabeça do Governo, nas gestões tanto do Governador Wagner, quanto do Governador Rui: fazer com que a massa trabalhadora seja privilegiada. Salvador tem a terceira pior mobilidade do país. Com o engarrafamento, o trabalhador leva em média 75 minutos para sair de sua casa para o trabalho. O objetivo é sempre em cima do transporte público, do transporte coletivo.