Pilotos,
técnicos, dirigentes, profissionais da Fórmula 1, de modo geral, vão
trabalhar já a partir de quinta-feira em um autódromo diferente, em São
Paulo, onde domingo será disputada a 44ª edição do GP do Brasil.
Interlagos passa por importante reforma. Nesta segunda-feira ainda havia
muitos funcionários envolvidos na conclusão da primeira parte do
projeto previsto para ficar pronto em 2016. As obras visam a obter dois
resultados, em especial: oferecer maior espaço para as equipes e ampliar
o paddock, área atrás dos boxes, onde quase tudo acontece na F-1. As
instalações existentes até a edição do GP do Brasil do ano passado
colocavam Interlagos como o mais deficitário nesse aspecto, dentre todos
os circuitos do calendário.
Apesar
da reforma, a área do paddock, espaço
compreendido entre os boxes, à
direita, e a
nova edificação das equipes, à esquerda,
continua reduzida
(Foto: Livio Oricchio)
+ Pelo ídolo, Hamilton busca vitória inédita no Brasil: "Tributo a Senna"
+ Crítico de Interlagos, chefão da F-1 celebra reformas para o GP deste ano
Mas
quem visita o autódromo hoje tem a impressão de que os objetivos foram
atingidos apenas parcialmente. Por exemplo: o espaço entre a área
posterior dos boxes e a nova edificação que recebe as equipes, a que
define o paddock, cresceu somente de 8 metros de largura para 10.
Manteve-se na extensão.
E mesmo as áreas das equipes não
ganhou a dimensão esperada, ainda que o avanço nos dois pontos críticos
de Interlagos tenha sido relevante. Melhor: quando tudo estiver pronto,
para a edição do GP do Brasil do ano que vem, o autódromo oferecerá algo
inédito e de extraordinária serventia, o paddock coberto, com luz e
ventilação naturais.
Ainda quanto ao paddock, mesmo com o
aumento da área, o do circuito de São Paulo seguirá sendo o mais
estreito da F-1, menor até mesmo que nos circuitos de rua. Há razões
para isso. A principal é o imenso desnível do terreno. O engenheiro
responsável por orientar a definição do projeto, Luis Ernesto Morales,
explica: “Para deslocar a construção (da edificação das equipes) mais
para o vale estaríamos falando de outra obra, o investimento teria de
ser muito maior”. Seria preciso criar uma imensa laje para compensar a
vale.
Circuito de Interlagos mais uma vez é o palco do
GP do Brasil de Fórmula 1 (Foto: Divulgação)
Paddock
estreito pode criar dificuldades para quem trabalha na F-1, mas há quem
goste. Na edição de 2014, o GloboEsporte.com ouviu Niki Lauda,
ex-piloto e hoje diretor da Mercedes, sobre o que seria feito em
Interlagos, notadamente a ampliação do paddock. Ele disse: “Para quê? Na
China o paddock é imenso. Você nunca cruza com ninguém lá. Não existe o
clima de corrida que temos aqui. Gosto desse espírito de Interlagos”.
Para
não repetir o que sempre acontecia no autódromo, as imensas caixas das
equipes não vão mais permanecer no paddock, ocupando espaço vital diante
das já severas limitações para deslocamento. “Temos um lugar próprio
para essas caixas”, disse Morales. Solução simples, mas de larga
repercussão nas necessidades operacionais de todos.
A
edificação nova de Interlagos criou novos
espaços para as equipes e
sobre ela a
construção que servirá de área de
serviço para o paddock
club
(Foto: Livio Oricchio)
E quanto à área das
equipes, o engenheiro responsável diz que Interlagos disponibiliza,
agora, uma área livre para a Formula One Management (FOM). “As
divisórias são móveis. Podemos ampliar ou reduzir os espaços para as
equipes de acordo com o que nos pedirem.” A FOM nesses casos dá
preferência, como não poderia deixar de ser, às escuderias que têm maior
número de integrantes nos eventos, Ferrari, RBR, Mercedes, McLaren,
ainda que por conta da contenção de custos haja um limite de 57
profissionais.
Na segunda fase do projeto, esse espaço para as
equipes vai crescer em extensão, acompanhando os últimos boxes. Isso
permitirá ampliar a atual área. Em conversa com integrantes dos times,
que nesta segunda-feira trabalhavam na montagem de seus espaços, o
GloboEsporte.com ouviu: “Está muito melhor do que era, mas se fizeram
tudo novo por que não nos deram maior espaço?”
Na área da
Williams, por exemplo, Felipe Massa e Valtteri Bottas terão espaço,
individualizados, extremamente exíguo, algo como 1,5 por 3 metros.
As
equipes estabelecem por conta própria como ocupar suas áreas. Em geral
há uma divisão para os pilotos, uma para as reuniões dos engenheiros com
os pilotos, outra para o grupo de marketing, uma quarta destinada aos
profissionais de comunicação enquanto a maior delas serve para a
instalação das mesas para as refeições.
Esta última permitirá,
agora, que as entrevistas com os pilotos e os diretores dos times sejam
realizadas lá. Como antes não havia, os encontros dos jornalistas com
os personagens do show eram muito tumultuados.
O ponto mais
criticado de Interlagos, por vezes motivo de chacota, parece atender,
agora, às necessidades de seus profissionais: a cozinha. Cada escuderia
tem seus próprios cozinheiros. Era comum integrantes do catering
brincarem com alguns jornalistas, chamar a atenção para o fato de ter de
deixar panelas no chão, por falta de bancada ou uma pia longa.
A maior reivindicação das equipes foi atendida:
uma área para a instalação da cozinha
(Foto: Livio Oricchio)
A
maior disponibilidade de espaço atenuou bastante o problema, assim como
a instalação de dois exaustores e do ar condicionado para cada time
agradou bastante, ainda que persista a ausência de bancadas, sinalizada
por profissionais à reportagem do GloboEsporte.com.
Quem
caminha pelo paddock observa o guarda corpo de vidro do andar de cima da
edificação das equipes ainda por ser concluído, como tantas outras
coisas na obra. Sobre a laje da edificação já existe outra construção,
mas ainda na fase de bloco de concreto, sem acabamento, janelas, portas.
Ela servirá como área de serviço para o paddock club, localizado sobre
os boxes.
Para 2016, os boxes vão ser novos. Ocuparão a mesma área dos atuais, mas serão mais altos.
Paddock
club são espaços destinados a empresas, essencialmente. Seus ingressos
são os mais caros do evento, pela localização, sobre os boxes, e por
disporem de serviço de alimentação, dentre outros. Seis pontes, sobre o
paddock, ligarão essa área de serviço, com cozinhas e banheiros, ao
paddock club, que ocupará a área superior dos novos boxes em 2016.
A
impressionante extensão dessa construção sobre a laje das áreas das
equipes, com cerca de 80 metros por 12 de largura, destinada ao paddock
club, visa a atender, também, outros usos do autódromo. “Foi concebida
de acordo com a filosofia da reforma, ou seja, Interlagos poder ser
usado para outros eventos. Conciliamos os dois lados, o das necessidades
da F-1 com a vida do autódromo no ano todo”, explicou Morales.
As equipes dispõem de espaço funcional em
Interlagos, ainda que não seja como gostariam
(Foto: Livio Oricchio)
Opinião
O
que primeiro chama a atenção de quem já caminhou pelos paddocks de
todos os circuitos da F-1 é, de fato, a dimensão reduzida do existente
em Interlagos, mesmo agora, depois da reforma. Não era possível se
deslocar sem pedir licença e continuará sendo assim. O argumento da
topografia desfavorável do sítio procede. De fato, para estender uma
longa laje, como fizeram os responsáveis pelo autódromo da Hungria, por
conta de talude ainda mais pronunciado, exigiria um orçamento bem
elevado.
O paddock estreito, ainda que desaconselhável, não
inviabiliza o sucesso do evento. E a questão é até controversa, diante
da visão de personagens como Lauda. O que é incompreensível na reforma
de Interlagos, por exemplo, é o uso destinado à construção sobre a área
das equipes.
Estamos falando de algo como 80 metros de
extensão por 12. Tudo isso para apenas servir de cozinha e banheiro para
o paddock club? O engenheiro responsável diz que é possível utilizar
apenas parte dessa construção, de acordo com a necessidade do evento,
não apenas a F-1.
Seria muito mais interessante para o
autódromo, e para a F-1, se houvesse uma escada interna nas áreas das
equipes para acessar a área nesse espaço superior. As equipes poderiam
realizar ali as reuniões entre pilotos e engenheiros, ou mesmo apenas
técnicas, como faz parte da sua rotina nos fins de semana de competição.
As
escuderias teriam uma área mais reservada, separada da de serviço, e
não tudo junto, como hoje. Mais importante: qual a necessidade de uma
área gigantesca de 80 metros por 12 para o paddock club? É perfeitamente
possível manter uma área dessa construção destinada ao paddock club e
parte dela ser ocupada pelas equipes nesse modelo de ocupação, uma parte
no térreo e outra no primeiro andar. Solução adotada em outros
autódromos, como Suzuka, por exemplo.
Outro aspecto difícil de
ser compreendido é a primeira fase ainda não estar pronta. “As obras
começaram em março”, afirma Morales. Funcionários ainda colocavam
cimento no solo em algumas partes do autódromo, entregavam os banheiros
sem pintura no teto, com o gesso aparente, ainda passavam silicone entre
as lâminas de vidro que formam a parede frontal das áreas das equipes,
sem nenhuma preocupação com o acabamento.
Quando o teto do
paddock estiver coberto não mais será necessário esse silicone para
fechar os vãos das lâminas, verdade, mas e hoje, por que não haver
nenhuma preocupação com acabamento. O resultado é chocante. “Parece a
obra da Índia”, afirmou um integrante da Ferrari.
O piso do
paddock, no fim da fase 2 do projeto, vai estar nivelado com o da área
das equipes e dos novos boxes. Hoje, há um desnível importante. Na
hipótese provável de chuva forte em Interlagos nos próximos dias, a
chance de a água invadir a área das equipes é real.
Infelizmente
poucas obras no Brasil observam a importância do acabamento, muitos
veem como questão supérflua, mas que no fundo não deixam de ser
reveladoras da cultura de um povo. No caso, a precisão não é algo
cultuado.
A F-1 desembarca em São Paulo proveniente do México.
Lá também o autódromo foi reconstruído e em uma extensão muito maior
que em Interlagos. E quando o evento chegou no Autódromo Hermanos
Rosdriguez, tudo estava pronto, acabado, ao menos os espaços destinados
aos profissionais da F1. E funcionando muito bem. Não é o caso de São
Paulo. Não foi por falta de tempo. Mas diante do histórico das obras
públicas no país, nem um pouco surpreendente.
FONTE: