Argentinos,
uruguaios, portugueses, nigeriano, norte-americano... A lista é longa e
torna-se até difícil lembrar de alguns nomes e das histórias
pitorescas. Mas a verdade é que São Januário foi um celeiro de jogadores
estrangeiros desde a profissionalização do futebol no Brasil, em 1934.
Lá se vão 80 anos desde que o goleiro Roque Calocero, o meio-campista
Salvador D´Alessandro e os atacantes Hugo Lamana e Valentin Navamuel
(todos argentinos) foram contratados pelo Vasco. Na próxima temporada, o
clube reafirma uma filosofia esquecida por tanto tempo e que já vinha
sendo revitalizada, mesmo que timidamente. Assim como 2013, serão ao
menos quatro estrangeiros no elenco, algo que não ocorria há 71 anos. E
ainda há espaço para mais gringos.
Foi questão de duas semanas
entre a confirmação de que o peruano Yotún e o equatoriano Tenorio não
renovariam e o acerto com o uruguaio Martín Silva e o paraguaio Eduardo
Aranda. Assim, como o argentino Guiñazu e o colombiano Montoya devem
continuar sob contrato, o espanhol permanece como o segundo idioma do
dia a dia. Note que, curiosamente, os seis citados representam seis
países distintos da América do Sul, como prova de que o mercado é
variado.
Alguns dos jogadores estrangeiros que vestiram
a camisa do Vasco (Foto: Editoria de Arte)
A
diretoria, no entanto, evita dar relevância ao fato e o trata como uma
oportunidade financeira, somada à carência de um time que sofrerá
reformulação por ter caído para a Série B mais uma vez. Este ano já
havia ficado claro que o clube passou a dar ouvidos a indicações e
olheiros, responsáveis por "descobrir" Yotún e Montoya, então com mínimo
destaque internacional.
- Foram oportunidades que apareceram.
O goleiro é de alto nível. Tomara que faça o mesmo percurso de glórias
que o Andrada fez. Todos viram na Libertadores o que ele pode fazer. E
precisávamos agir nessa posição. No Brasil, as boas opções eram caras. O
paraguaio também é um bom jogador, aguerrido e se enquadrou no perfil
salarial. Teremos quatro no grupo de novo, mas não acho que representa
uma mudança - explicou o vice de futebol, Ercolino de Luca.
Pedro Vera e Benitez são apresentados no Vasco em 2009: só figuração (Foto: Globoesporte.com)
'Platinismo' e guinada de Cyro Aranha
A ligação com o exterior surgiu na época em que o futebol carioca
acirrou a rivalidade e resolveu atravessar as fronteiras para investir
em jogadores notoriamente mais qualificados que a maioria dos
brasileiros. O Uruguai era a Celeste Olímpica, bi dos Jogos e campeão
mundial em 1930, enquanto a Argentina batia na trave nas competições e
produzia craques sem parar. Este movimento foi batizado de "platinismo" -
que significa a admiração ao que é argentino. No título de 1939, por
exemplo, foram sete gringos, entre os quais estava Bernardo Gandulla,
que gerou o apelido dos apanhadores de bola por se prontificar a
buscá-la sempre que ela saída de campo.
A intervenção de um
dos presidentes mais admirados do Cruz-Maltino foi determinante para
mexer com o cenário, que nunca mais voltaria a ser o mesmo. Cyro Aranha,
cujo nome e frases emblemáticas estampam muros do estádio até hoje,
estabeleceu que o Vasco daria um jeito de encontrar revelações por perto
e garimpou ídolos como o pernambucano Ademir Menezes.
-
Quando os jogadores que vinham da Argentina já não eram mais de primeira
linha, porque a Europa começou a entrar com força, o Cyro Aranha, vendo
que o Vasco não ganhava desde 1936, formou a base com outra filosofia.
Não vamos importar tanto e vamos abrir os olhos para o Nordeste e para o
Sul. Foi assim que o Ademir, após uma excursão com o Sport, foi
contratado e virou um dos maiores ídolos da história - lembra o vice de
relações especializadas, João Ernesto.
Andrada lidera o Vasco multicampeão no início
dos anos 70. Dinamite é o penúltimo agachado
(Foto: Agência Estado)
De lá para cá, na contramão de rivais como Flamengo e, principalmente,
os gaúchos Grêmio e Inter, o Vasco foi um dos brasileiros que menos se
aventuraram com estrangeiros. E, quando o fez, viveu mais baixos do que
altos. Foram os casos de Erreia, goleiro que brilhou no Boca Juniors e
no Estudiantes e praticamente não atuou em 1971; dos portugueses Perez,
Lito e Dominguez, reservas que não deixaram saudade na torcida; de Cobi
Jones, Avalos e Maximo Tenório, que passaram incógnitos nos anos 90. A
década de 80 é uma exceção, quando Daniel González, vice brasileiro em
1984, e Quiñonez, campeão nacional em 1989, foram os xerifes da zaga.
Além deles, brilharam em diferentes épocas o zagueiro Rafagnelli, o goleiro Andrada e os
meias Petkovic e Conca.
Recentemente, a relação coleciona mais
fiascos, como o sérvio Tadic, amigo de Petkovic, os chilenos Frank
Lobos e Salinas, em 2006, Villanueva, Pinilla e Abubakar, juntos em
2008, os paraguaios Benítez e Vera na Série B de 2009 e os argentinos
Palermo, Chaparro e Abelairas. Entre os treinadores, foram oito nomes.
Os mais famosos e de destaque são o uruguaio Ramón Platero (bicampeão
carioca em 1923 e 1924), o inglês Henry Walfare e o argentino Filpo
Nuñez.
Recordistas de gringos em 2013:
Inter: 5 (Bolatti, Dátolo, Scocco, Forlán e D'Alessandro)
Coritiba: 4 (Ibérbia, Bottinelli, Geraldo e Escudero)
Santos: 4 (Mena, Patito Rodríguez, Miralles e Montillo)
Regra possibilita mais gringos
Em
novembro, a CBF estabeleceu uma mudança na regra sobre escalação de
estrangeiros, que pulou de três para cinco. Clubes como o Inter se
beneficiam, já que em 2013 a direção liberou Dátolo e pouco usou Bolatti
no segundo semestre porque Forlán, Scocco e D´Alessandro eram
preferidos. O empresário Régis Marques, que participa de negociações no
mercado sul-americano, já ofereceu Maxi Biancucchi, ex-Flamengo e
Vitória, após colocar Martín Silva e Aranda.
O Vasco também
não descarta manter-se atento ao exterior para compor o esfacelado grupo
do rebaixamento, que deve perder entre 11 e 14 jogadores. Bons valores
nos mercados emergentes, como Colômbia, Equador e Paraguai, seguem em
avaliação pela diretoria, que se aproveita do maior poder aquisitivo e
da vitrine para a Europa que é o futebol brasileiro.
Confira a lista de estrangeiros que jogaram no Vasco desde 1960:
2014 - Martín Silva, Guiñazu, Aranda e Montoya
2013 - Yotún, Guiñazu, Montoya e Tenorio
2012 - Chaparro, Abelairas e Tenorio
2011 - Chaparro e Irrazábal
2010 - Matías Palermo e Irrazábal (não juntos)
2009 - Benítez e Pedro Vera
2008 - Villanueva, Pinilla e Abubakar (não juntos)
2007 - Dudar, Conca e Martín García
2006 - Dudar, Lobos e Salinas (os dois últimos não jogaram)
2005 - Dominguez e Vergara
2004 - Tadic e Petkovic
2003 - Petkovic
2002 - Petkovic
Década de 90: Cobi Jones (EUA) e Maximo Tenorio (COL), Ávalos (PAR). O último não jogou.
Década de 80: Daniel González (URU) e Quiñonez (EQU).
Década de 70: Andrada (ARG), Peres (POR), Lito (POR)
e Washington Oliveira (URU)
Década de 60: Danilo Meneses (URU), Nestor Errea (ARG)
* Colaborou Eduardo Santos
Pinilla causou boa impressão nos poucos jogos
que fez, mas o rebaixamento o tirou do clube
(Foto: VIPCOMM)
FONTE:
http://globoesporte.globo.com/futebol/times/vasco/noticia/2013/12/do-brilho-ao-fiasco-vasco-faz-80-anos-de-historia-com-gringos-e-reve-tradicao.html