Na
carreira de Marco van Basten só faltou uma coisa: vencer a Copa do
Mundo. De resto, o holandês ganhou tudo. Até aos 28 anos, foram vários
troféus nacionais com Ajax e Milan,
dois títulos da Liga dos Campeões com os italianos, marcou um golaço
que desafia a lei da gravidade na final da Eurocopa em 1988 -
conquistando o único título internacional com a sua seleção - e faturou
três Bolas de Ouro (quando ainda era apenas o prêmio da revista "France
Football" para o melhor da Europa, sem parceria com a Fifa). O "Cisne de
Utrecht", como era conhecido pela sua elegância em campo, disputou
apenas a Copa do Mundo de 1990 e abandonou o futebol dois anos depois de
forma prematura, com problemas graves no tornozelo. Van Basten ainda
tentou regressar aos gramados para disputar a Copa de 94 com a Laranja
Mecânica, mas não conseguiu por conta das dores no osso da tíbia e do
tornozelo.
Ronaldo foi grandíssimo, mas é difícil falar quem é melhor. Bom, ele
venceu uma Copa e eu tenho ciúmes dele por isso, porque eu nunca venci
uma Copa do Mundo. Nesse aspecto ele foi melhor do que eu. É difícil
comparar, mas eu o vi jogar no início da sua carreira no PSV, no Barça e
penso que com a sua velocidade e classe foi melhor do que eu fui"
Van Basten, ex-jogador da seleção holandesa
Em
entrevista ao GloboEsporte.com em Alkmaar, onde trabalha agora como
auxiliar técnico do AZ, Van Basten, analisou dois craques brasileiros
que fizeram sucesso em seu país pelo PSV: Romário e Ronaldo. Para o
holandês, o Fenômeno foi superar ao Baixinho - e a ele próprio,
considerado por muitos europeus como um dos maiores da história.
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Eu creio que foram grandes jogadores (Romário e Ronaldo), venceram a
Copa do Mundo. Ronaldo foi grandíssimo, mas é difícil falar quem é
melhor. Bom, ele venceu uma Copa e eu tenho ciúmes dele por isso, porque
eu nunca venci uma Copa do Mundo. Nesse aspecto ele foi melhor do que
eu. É difícil comparar, mas eu o vi jogar no início da sua carreira no
PSV, no Barça e penso que com a sua velocidade e classe foi melhor do
que eu fui - confessou o holandês, que reside em Amsterdã com a esposa e
os três filhos.
O ex-jogador completou 50 anos no último dia 31
de outubro e garantiu que está bem de saúde, apesar dos relatos de que
teria tido um infarto e, por isso, deixado o cargo de técnico principal do AZ.
Van Basten demonstrou durante a entrevista humildade e simplicidade.
Palavras mais duras apenas para os médicos que o trataram durante sua
carreira, a quem atribui a culpa pelo abandono prematuro dos gramados.
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Eu acho que tive azar, porque tive um problema no início da minha
carreira, quando tinha 19, 20 anos. Aí, o doutor me disse que não era
nada e que poderia continuar jogando, continuei sempre passando por
problemas e cirurgias até que tive de parar. Nesse momento, o doutor
disse que com uma nova cirurgia limparia minha perna e tornozelo, mas
não deu certo e nunca mais voltei a jogar. Mais do que os zagueiros
adversários, eu tive azar com os médicos que não me curaram bem.
Após deixar o cargo de técnico do AZ, van Basten
atualmente trabalha como auxiliar do clube (
Foto: Claudia Garcia)
Confira a entrevista completa de Marco van Basten:GloboEsporte.com: antes de mais nada, como você está de saúde? Lemos notícias de que você teve um infarto. Marco van Basten:
Não, não tive nenhum infarto. Tive sim um problema de ansiedade, não
conseguia dormir porque o trabalho como treinador estava me dando muito
estresse. Mas fisicamente estou bem. Nunca tive problemas no coração,
essa foi uma invenção de jornalistas e continuaram a falar destas
coisas, mas não é nada disso. Simplesmente, não estava mais me sentindo
confortável no lugar de treinador principal do Alkmaar.
Fisicamente você está bem, mas é verdade que não consegue sequer correr? Sim,
isso é verdade. Eu não posso correr, porque não tenho mobilidade no
tornozelo. Mas estou tentando fazer sempre outros esportes, como golfe,
ciclismo ou natação. Agora descobri que posso jogar squash, porque apoio
mais a parte da frente do pé e estou feliz. É importante me manter
ativo.
Foram os zagueiros que acabaram com sua carreira aos 28 anos?
Mais do que os zagueiros, foram os médicos que não me curaram bem"
Van Basten
Não,
eu acho que tive azar, porque tive um problema no início da minha
carreira quando tinha 19, 20 anos. Aí, o doutor me disse que não era
nada e que poderia continuar jogando. Continuei sempre passando por
problemas e cirurgias até que tive de parar. Nesse momento, o doutor
disse que com uma nova cirurgia limparia minha perna e tornozelo, mas
não deu certo e nunca mais voltei a jogar. Mais do que os zagueiros,
foram os médicos que não me curaram bem.
Apesar de ter terminado tão cedo, você ainda é recordado como um dos melhores centroavantes de sempre. Como é que se sente?Joguei
na Itália contra Maradona, ouvi falar muito de Pelé, esses foram
grandes jogadores, como agora a gente tem Messi e Neymar. Eu também tive
um período no Milan em que joguei com grandes jogadores como Franco
Baresi, Maldini, Tassoti, Gullit, Rijkaard, dominamos um pouco o mundo,
foram belos anos. Impressionamos todo o mundo e, por isso, ainda falam
da gente. Mas é sempre uma coisa de equipe, porque sozinho você não pode
fazer tanta coisa, então eu posso dizer que tive sorte por ter tantos
companheiros craques, que me deram a possibilidade de vencer títulos
como centroavante. Como hoje existem ainda tantos jogadores craques no
ataque: Cristiano Ronaldo, Messi, Neymar... É bonito vê-los jogar, e por
isso é um grande prazer que ainda falem de mim e daquele Milan.
Que recordações guarda dos seus tempos no Ajax e depois no Milan? O
Ajax era um time menor como clube, estava crescendo. No Milan, vencemos
títulos muito importantes. Foi um momento incrível, dominamos o mundo.
Van Basten em ação pela Holanda (Foto: Getty Images)
Hoje se você jogasse neste Milan o que é que poderia fazer para salvar esta equipe? É
sempre difícil, porque o futebol se desenvolve, se torna mais rápido. O
futebol ficou realmente mais difícil. E a única forma de superar estas
defesa robustas, organizadas e muito disciplinadas, é ser ainda melhores
tecnicamente. Os jogadores atualmente são bons com a bola nos pés,
muito técnicos.
E como se sente ao ver os seus dois antigos times Ajax e Milan mal atualmente, longe do topo da Europa?O
dinheiro agora está na Inglaterra e Espanha. O campeonato holandês não
consegue mais fazer concorrência nem manter os seus melhores jogadores,
eles vão logo embora. No meu tempo, o campeonato italiano era o melhor.
Agora é o inglês e o espanhol, talvez em cinco anos o mais atraente será
o Alemão, isso é bom para o futebol, senão seria aborrecido. Mas eu
acredito que a Itália recuperará seu prestígio, porque é um país onde
sempre aparecem novos jogadores, bons, muitos deles, e todo o mundo vive
muito o futebol ali. Com esse espírito eles podem rivalizar com o
dinheiro.
Quem foi o seu grande rival em campo? O
Maradona que jogava no Napoli, que era um grande jogador. Sempre foi um
prazer para mim jogar contra ele e ver o que é que eu conseguia fazer,
mas tinha também Careca e os jogadores do Internazionale: Lothar
Matthaus, Klinsmann, Brehme, que eram muito bons. Em todos os períodos
havia jogadores de grande importância.
Que recordações guarda dessas batalhas em campo contra o Napoli de Maradona?Eram
jogos incríveis. Eles tinha Maradona, Giordano e Careca. A gente tinha o
trio holandês. Essas partidas passavam em todo o mundo, em Nova York
sei que paravam para assistir. Era um pouco como agora o Real Madrid e o
Barcelona.
Qual foi o gol mais bonito da sua carreira? O
gol mais bonito da minha carreira foi uma bicicleta contra Den Bosch no
campeonato holandês. O gol da final da Eurocopa em 1988 foi particular,
especial, mas é preciso um pouco de sorte. A acrobacia com o Ajax é
mais bonita. E depois o gol sobre o Real Madrid, aquele que fiz de
cabeça. Foi importante porque foi contra o Real Madrid, na Champions, no
Bernabéu.
Você era famoso por ser um atacante muito
elegante, com técnica e visão de jogo. Qual é o jogador do futebol
moderno que mais se parece com você?
Romário era capaz de jogar lindamente, entendia o jogo e fazia os gols"
Van Basten
Temos
tantos centroavantes elegantes. Olha, o Romário, ele era capaz de jogar
lindamente, entendia o jogo e fazia os gols. Agora tem o Cristiano
Ronaldo, o Ibrahimovic, o Lewandovski, por exemplo, são jogadores que
fazem ambas as coisas: jogam bem e sabem fazer gols.
Ibra
sempre disse que você tinha sido a grande inspiração dele, que tinha
assistido aos seus vídeos para tentar fazer igual. Ele é parecido com
Van Basten? Eu penso que ele também, hoje é um grande
jogador, faz a diferença, só que ele precisou de mais tempo para chegar a
um nível de grande vencedor. Mas agora ele faz isso bem há vários anos,
com o Milan, o Internazionale, o Barcelona. É um grande craque. Só que
Ibra não teve a sorte de ter ganho a Champions nem de ter ganho um
titulo com a Suécia, mas para isto é preciso um pouco de sorte. Nos
últimos seis, sete anos eles está jogando como um campeão, fazendo a
diferença e isso conta muito.
Onde é que você teria chegado se sua carreira não tivesse terminado prematuramente? Eu
infelizmente parei de jogar futebol aos 28 anos, eu estou contente por
ter vivido esses 10 anos de grande nível, muito bonitos, e só devo estar
agradecido por ter vivido momentos maravilhosos com o Ajax e o Milan,
onde venci campeonatos, duas Champions e tantos prêmios individuais. Mas
não sei o que teria sido se eu tivesse jogado até aos 35 anos, sei lá,
não faz sentido falar das coisas, nunca saberei.
Van Basten em ação pelo Ajax (Foto: Getty Images)
Você acha que teria superado grandes atacantes como Romário ou Ronaldo se tivesse jogado até mais tarde?
Eu
creio que foram grandes jogadores, venceram a Copa do Mundo. Ronaldo
foi grandíssimo, mas é difícil falar quem é melhor. Bom, ele venceu uma
Copa e eu tenho ciúmes dele por isso, porque eu nunca venci uma Copa do
Mundo. Nesse aspecto ele foi melhor do que eu. É difícil comparar, mas
eu o vi jogar no início no PSV, no Barça e penso que com a sua
velocidade e classe foi melhor do que eu fui. O Brasil é um exemplo,
para todos os atacantes, de jogadores que sabem jogar e fazer gols.
E o Neymar, você o vê melhor no futebol europeu este ano? Onde ele pode chegar?
Eu
acho que é um grande jogador, inicialmente eu estava muito curioso e
queria muito o ver jogar, porque se falava muito, mas ele me convenceu
na Copa do Mundo, que jogou muito bem. Infelizmente teve de sair com o
problema nas costas, mas se deu para ver que tem grandes momentos e é um
grande jogador.
Ele pode conectar bem com Luis Suarez nesse famoso trio do Barça ainda com Messi?
Creio
que se um time tem um ataque com esses três, o treinador tem só de
defender, porque de resto eles vão sempre fazer gol. Mas é muito fácil
falar, geralmente devia ser sempre assim, porque estes três podem fazer a
diferença sempre e em qualquer campo.
Você foi treinador de Suárez no Ajax, acha que ele será capaz de voltar a morder um adversário?
Creio
que ele já terá entendido que não fez bem e não vai voltar a repetir.
Mas acho que são piores as entradas duras para quebrar uma perna de um
jogador do que morder. Sem dúvida que isso não deveria acontecer, mas o
dano que ele faz ao jogador é muito menor. Acho que ele tem de se
comportar como um profissional, um esportivo.
Como treinador, você não alcançou a mesma glória do que como jogador. Por quê?
É
diferente. Como jogador, você tem muito mais influência, pode fazer
muito mais pelo time. Como treinador, se trata mais de conversar,
motivar, falar com os jogadores, ter muita paciência, explicar tudo. Deu
para ver que nesse aspecto eu não sou tão bom. É outra disciplina, e eu
não me sinto tão forte como treinador, como me sentia como jogador.
Nunca consegui fazê-lo tão bem, mas fiz o que pude fazer, não pude ser
melhor. Agora como auxiliar técnico, eu me sinto muito mais cômodo
porque não devo pensar em tudo, decidir tudo. Agora faço só as minhas
coisas, falo mais à vontade com os jogadores, me sinto melhor assim e
sinto que consigo ter mais influência deste jeito.
Como auxiliar técnico ou treinador você pensa em regressar ao Milan um dia? Não
faz parte dos meus planos. Já vivi na Itália, passei belos anos ali no
Milan, mas agora tenho duas meninas e um garoto para cuidar. Vivemos em
Amsterdã e somos felizes aqui. Não tenho mais vontade em emigrar para
outro país. Não posso falar nunca, porque nunca se sabe o futuro, mas
não penso nisso.
Que impressão ficou da Copa do Mundo, da sua Holanda e do Brasil? Esperava
tanto do Brasil, mas estavam indo muito até à semifinal. Aí, a derrota
foi muito dura contra a Alemanha e depois contra a Holanda. Foi uma pena
que Neymar não pôde jogar essa partida.
Van Basten em ação pelo Milan (Foto: Getty Images)
Acha que teria feito muita diferença? Sim,
acredito que conta muito. Foi uma pena, porque Copa do Mundo é uma
coisa do Brasil e principalmente sendo disputada no Brasil, o país
deveria ter ganho esta Copa. Não aconteceu, acho que a Alemanha venceu
de forma merecida.
Mas na final, os dois centroavantes da
Argentina (Higuain e Palacio) falharam em duas chances de forma
inacreditável. Um jogador como você teria falhado daquele jeito? Acontece.
Em 2010, Robben teve a Copa do Mundo em seus pés e falhou diante de
Casillas. São ocasiões que fazem a diferença numa carreira. Conta um
pouco a sorte e a classe de saber manter a calma, controlar as emoções e
fazer a diferença com um gol numa final. Nem todos têm isso.
Robben é um desses que não tem? Não,
Robben é um dos craques que pode fazer a diferença. Só que não
conseguiu fazer ao mais alto nível que é uma Copa do Mundo, mas foi
muito importante para a Holanda nessa Copa e agora no Brasil também.
Em sua opinião, quem deveria levar a Bola de Ouro este ano? Acho
que seria lógico dar a um jogador da Alemanha, vencedora da Copa do
Mundo. Na minha opinião, o melhor da Alemanha foi Toni Kroos. Não é só
um jogador que faz gols que conta, deve ser alguém que faz o time vencer
com as suas qualidades, que faz a diferença, e ele foi esse jogador.
Você prefere Cristiano Ronaldo ou Messi? Eu
gosto mais de Messi, porque é mais natural, tem mais talento, mas
Ronaldo é impressionante, porque faz tantos gols. Em cada partida ele
está presente, faz a diferença, faz gols. É realmente impressionante.
FONTE:
http://glo.bo/1xCu6sD