Em entrevista,
dirigente afirma que 'espera não ser' candidato à presidência da CBF,
questiona o movimento Bom Senso FC e fala dos planos para o estádio do
Timão
Por Leandro Canônico e Martín FernandezSão Paulo
Entre tragadas em cigarros e dentadas em biscoitos de morango, Andrés Sanchez,
de 49 anos, falou ao GloboEsporte.com em sua sala na Arena Corinthians.
Ex-presidente do clube e ex-diretor de seleções da CBF, Andrés hoje é o
responsável pelas obras do estádio que vai abrir a Copa do Mundo de
2014.
É
também o líder da oposição na confederação, embora negue ser candidato
na eleição do ano que vem. O mesmo poder que diz não ter no futebol,
Andrés exerce no estádio corintiano. Tanto que afirma e repete que 45%
dos ingressos vão custar R$ 40 - ou ainda menos, para quem for
sócio-torcedor ou tiver meia-entrada.
Na
entrevista a seguir, Andrés admite a possibilidade de o estádio ficar
pronto antes da venda dos naming rights, diz que Tite deve ser
"homenageado eternamente" e jura que não pretende voltar a ser
presidente do Corinthians.
- Não sou masoquista - justifica.
Como está o andamento do estádio?
Faltam
uns quatro, cinco por cento. Acredito que até o final de janeiro esteja
pronto. É claro que ainda restam algumas coisas internas, mas lá pelo
fim de fevereiro, começo de março já poderemos fazer jogo do Corinthians
aqui.
O Corinthians vai usar o estádio antes da Copa do Mundo?
Lógico.
Temos que jogar. Temos uma dívida para pagar, apesar de todo mundo
dizer que o estádio foi dado. Mas, contando juros, temos quase R$ 700
milhões a pagar.
saiba mais
- Andrés
Navarro Sanchez, 49 anos, foi feirante, empresário, presidente do
Corinthians entre 2007 e 2011 e diretor de seleções da CBF entre 2011 e
2012. Atualmente, é o responsável pelasobras da Arena Corinthians
E qual vai ser o jogo de abertura da Arena Corinthians?
Isso
é com o presidente do clube. A minha ideia era jogar Corinthians contra
Corinthians, mas quem define é a diretoria do clube. Por mim seria o
profissional contra o Máster, o sub-20... umas cinco horas de
Corinthians. Mas nossa obrigação é só a entrega do estádio o mais rápido
possível.
Embora fale que a decisão seja da diretoria, você segue sendo consultado?
Não. Só em relação ao estádio.
O projeto do Corinthians só vai ficar pronto mesmo depois da Copa?
É
que tem algumas coisas que precisamos fazer que são exclusivas da Copa.
Mas nós conseguimos deixar um legado para facilitar essas mudanças
depois. Enfrentamos a Fifa, e ela entendeu que era melhor para o
Corinthians fazer assim. A mudança depois da Copa do Mundo será muito
menor do que estava prevista.
Responsável pela Arena Corinthians, Andrés tem
capacete personalizado (Foto: Marcos Ribolli /
Globoesporte.com)
Conseguiram deixar o estádio mais barato por causa disso?
Claro.
Mas não tenho ideia de quanto. Acho que uns R$ 30, 40 milhões. Só um
elevador que eles queriam para as autoridades era R$ 20 milhões. Mas
houve a compreensão da Fifa e do COL, com o Corinthians trabalhando
junto.
Já estamos com um custo de quase R$ 80
milhões a mais do que o previsto. E o Corinthians vai pagar tudo do
estádio. Não sei de onde tiraram que deram isso para o clube
Andrés, sobre os custos da obra
O empréstimo do BNDES não saiu ainda. Vocês trabalham com alguma data?
Não
trabalhamos com data. Todos os documentos estão lá. Não acredito que
saia depois de o estádio estar pronto. Se for assim e não sair até
dezembro, vamos ter de renovar os empréstimos e isso vai aumentar o que
teremos de pagar lá na frente. Já estamos com um custo de quase R$ 80
milhões a mais do que o previsto. E o Corinthians vai pagar tudo do
estádio. Não sei de onde tiraram que deram isso para o clube. Vamos
tirar essa diferença na receita do estádio.
E em quanto tempo pretendem acabar com essa dívida?
Temos
dez anos para pagar os empréstimos, mas vamos fazer de tudo para pagar
antes. Até para mostrar que clube de futebol não é caloteiro.
E quanto vocês estimam que será a receita anual do estádio?
Uns R$ 200 milhões.
E qual será o preço dos ingressos?
45%
do estádio será a preço popular, de R$ 40 para baixo (atrás dos gols). O
restante vai ser o que quiserem pagar, o que o mercado aceitar. E não
vamos aumentar esse valor, porque aí vão falar que estamos elitizando,
etc. Não se pode fazer nada nesse país. IPTU pode aumentar, mas
ingresso, não.
Arena Corinthians terá locais com preços populares atrás
dos gols (Foto: Marcos Ribolli / Globoesporte.com)
A procura que o Corinthians já registra por camarotes ajudou a conseguirem essa conta de R$ 40 nos setores populares?
Não.
Esse é o modelo que existe no mundo todo. A outra área, onde as pessoas
pagam mais caro porque tem mais benefícios e serviços, financia a área
popular.
Quando vai começar o leilão pelos camarotes?
Queremos
começar a vender em dezembro. Já temos pessoas e empresas cadastradas,
mas tudo será definido em um leilão eletrônico. Temos um lance mínimo,
que é suficiente para o Corinthians sobreviver. Mas o que pagarem acima
disso no leilão é lucro nosso.
Você já tem o valor dos camarotes?
Tenho, mas não vou falar.
A outra área, onde as pessoas
pagam mais caro porque tem mais benefícios e serviços, financia a área
popular (atrás dos gols)
Andrés, sobre o preço dos ingressos
Como está a discussão sobre bebida alcoólica nos estádios?
Entendo
que isso seja a coisa mais ridícula. Como que não deixam vender no
estádio e podem vender na porta, sem controle nenhum? Hoje as arenas
novas têm espaço exclusivo para comer e beber. Se na Copa do Mundo vai
poder vender, por que não vão liberar pra gente? Os gringos são
melhores do que nós, brasileiros? Não tem cabimento liberar para a Copa, e pra gente não.
Na
última segunda-feira, Corinthians, Palmeiras, Santos e São Paulo
assinaram um Termo de Compromisso para Ajustamento de Conduta do
torcedor. Agora, as organizadas terão de ficar isoladas, sem livre
acesso. Você concorda com isso?
(em
tom irônico) Nesse país não tem discriminação. É tudo liberado. É um
país democrático. Infelizmente fazem coisas que discriminam. Todos são
seres humanos iguais. O que tem de fazer é: cometeu atos ilegais, punam.
Andrés come bolacha de morango durante a entrevista (Foto: Marcos Ribolli / Globoesporte.com)
Como que está a negociação pelos naming rights do estádio?
Está
como estava três meses atrás. Estamos conversando com três, quatro
empresas, mas ainda não tem nada bem adiantado. Estamos tratando disso
há tempos, mas não é uma coisa simples. Todos têm receios. Houve
passeatas contra o futebol (durante a Copa das Confederações) e quem
está investindo no futebol tem medo. Ouvi isso de várias empresas,
dentro e fora do Brasil. E aí as pessoas chamam o estádio de Itaquerão,
Fielzão, Andrezão, o raio que os parta, e complica ainda mais. Enquanto
não tiver a empresa, tem de chamar de Arena Corinthians.
O Corinthians tem receio de que o estádio fique pronto antes da assinatura de um contrato de naming rights?
Não
temos receio, mas tem essa possibilidade. E ficaria mais difícil para
nós financeiramente. E aí vocês (jornalistas) ficam especulando toda vez
que saio de São Paulo. Olha lá, o Andrés foi negociar naming rigths.
Vamos vivendo assim.
E por que você não fala o nome das empresas para acabar com especulações?
Lógico
que não. Esses caras querem sigilo. Toda vez que se fala o nome de uma
empresa aqui complica mais ainda, pô! São negócios grandes (o Timão
quer, no mínimo, R$ 400 milhões por 15, 20 anos), quanto menos se falar,
melhor.
O
estádio do Corinthians será para 50 mil pessoas. Pode ser que demorem
pra tirar as estruturas móveis. Algo como um mês, dois meses, cinco
meses. Mas vão tirar. Se nesse período precisarmos usar, a gente paga,
aluga e usa
Andrés, sobre a capacidade da Arena
O clube já aceita receber menos do que estipulado como meta?
Estamos negociando. Melhor um pássaro na mão do que dois voando.
Vocês têm receio de que os gastos com o estádio influenciem no futebol?
A
receita do Corinthians vai continuar no Corinthians. A receita do
estádio vai continuar no estádio para pagar o empréstimo. E uma
porcentagem que vier dos jogos de futebol será dividida ao final do mês.
O estádio não vai dar prejuízo, porque o torcedor vai sempre aos jogos.
O
Corinthians vai manter os 20 mil lugares temporários depois da Copa (de
obrigação do governo estadual) e ficar com 68 mil assentos?
O
estádio do Corinthians será para 50 mil pessoas. Pode ser que demorem
pra tirar as estruturas móveis. Algo como um mês, dois meses, cinco
meses. Mas vão tirar. Se nesse período precisarmos usar, a gente paga,
aluga e usa. Mas isso tudo é uma negociação. Vamos esperar.
Não vale a pena ficar com 70 mil?
Fizemos as contas e vimos que não. Depois da Copa vai
continuar lá, mas um mês, dois meses, cinco meses depois, deve tirar.
Administrar estádio está sendo mais fácil ou mais difícil do
que você pensava?
Primeiro que a gente não conhece, o Corinthians nunca foi
expert em obras. A parceria com a Odebrecht ajudou bastante. O grande desafio
para nós aqui no estádio vai ser administrar depois de pronto. Conseguir trazer
o público várias horas antes para o estádio, manter o cara aqui depois do jogo,
fazer eventos em dia que não tem jogo, esse vai ser o desafio.
O que acha do Bom Senso FC?
Jogador é uma peça importantíssima no futebol, acho que eles
têm de ser ouvidos, têm de participar, têm de ser mais unidos também. Mas
isso tem de ser por meio dos sindicatos. Eles têm uma entidade representativa,
têm que ser por ali.
O movimento é contra o sindicato.
Eu acho que isso é errado.
O que achou dos protestos?
Eu sou do mundo sindicalista, acho que todas as reclamações
para melhorar as coisas são válidas. Mas tem que estar a classe representativa,
o sindicato, junto.
O que achou de a CBF ter orientado os árbitros a dar cartão amarelo para os
jogadores?
Sobre isso eu não falo, não estou envolvido. Tem que
perguntar para a CBF.
Andrés diz que não quer ser candidato à presidência
da CBF (Foto: Marcos Ribolli / Globoesporte.com)
Como estão as articulações para a criação de uma chapa de
oposição?
Já tem oposição. Estamos discutindo quem será o candidato.
Não é fácil. A oposição sempre tem mais dificuldade.
Como está usando sua experiência de ter sido oposição no
Corinthians?
Por isso que se der errado eu não vou me frustrar. Porque eu
sei como é difícil. Temos que tentar melhorar, todo mundo pensando positivo.
Mas quem está na situação tem vantagem.
Até quando sai a chapa?
Até janeiro.
Existe chance de não ter chapa?
Acho muito difícil não ter. É mais provável ter do que não
ter. Mas tudo é possível.
O Bom Senso influencia na eleição?
É indiferente. Eles não votam. São coisas separadas,
diferentes.
Como você trataria o Bom Senso se fosse presidente da CBF?
Não sei. Eu não sou presidente da CBF. E espero não ser
também. Não vou responder suposição. Não sei. Tem de perguntar para quem está
lá e para quem for o próximo candidato.
Você não pode aparecer daqui a pouco como candidato?
Não sei. Espero que não.
Você não pode mudar de ideia?
Se o pessoal pedir, pode acontecer. Espero que não. A
oposição está aí, vocês sabem quem é, vamos esperar.
Andrés Sanchez concedeu entrevista em seu escritório
na Arena Corinthians (Fotos: Marcos Ribolli)
O que achou de o São Paulo não querer jogar a final da
Sul-Americana no Moisés Lucarelli?
O regulamento tem de ser cumprido. Mas isso tem de ver lá
no começo. Não admito que o time jogue o campeonato todo num estádio e
depois não pode jogar mais lá. Tem regras que são ridículas. Tem que discutir
lá no começo. Quando começa o campeonato, o clube tem que brigar. “Meu estádio
tem capacidade para 10 mil e vou jogar lá até o final”. Se não disse, e o
regulamento diz que é 20 mil, então é 20 mil.
Tem de ser punido tecnicamente.
Depois que souber de tudo que tem de pagar e não pagar, tem que perder ponto e
cair de divisão
Andrés, sobre clubes devedores
O que acha de os clubes terem 20 anos para pagarem suas dívidas?
Alguma coisa desse tipo pode ser. Mas tem de ser punido tecnicamente.
Depois que souber de tudo que tem de pagar e não pagar, tem que perder ponto e
cair de divisão.
Não vê risco de bagunçar o campeonato, torcedor entrar na justiça?
Está no regulamento. O presidente do clube que perdeu três pontos
que se explique com a torcida. Não adianta tomar bem de presidente, prender o
presidente. Tem que perder ponto. E tem que definir o que se vai pagar. E ficar
definido.
Isso vai pegar?
Vai. Tem que ter perda técnica. Se não, daqui a dez anos, está
o mesmo problema.
Isso vai gerar queda nos salários?
Os salários têm que cair. E eu estou falando pelo Corinthians,
que está pagando salários acima da realidade brasileira. Nós perdemos um pouco
a mão e estamos cientes de que temos que voltar a patamares menores. Treinador,
então, nem se fala. Tem que baixar.
Você acredita mesmo que os salários vão cair?
Sim. Tem time que vai ser campeão brasileiro com folha de
pagamento 30% menor que o de outros times grandes.
Gostou da saída do Tite?
Não tenho que gostar ou deixar de gostar. Eu não sou da
diretoria. Tite é um grande técnico, uma grande pessoa, temos que agradecer a
ele. São momentos, tem começos, meios e
fins. Eu não estou no dia a dia, não sei como foi.
Ele é o maior treinador da história do Corinthians?
Se não o maior, um dos melhores.
Andrés e Tite, na comemoração do título brasileiro de 2011 (Foto: Marcos Ribolli/Globoesporte.com)
No nível de quem?
Osvaldo Brandão, Nelsinho que ganhou o primeiro brasileiro. O
Tite ganhou todos os títulos possíveis, tem que ser reverenciado eternamente. Mas
também ganhou dinheiro para fazer isso, não foi de graça não. Não é que ele só
deu, foi recíproco.
Se você fosse presidente da CBF, Tite seria o técnico da
Seleção?
Eu não sou presidente da CBF, já te falei isso aí. Ele está
entre os maiores do Brasil. Ou você acha que o Tite sabe mais que o Muricy? E o
Muricy mais que o Mano? E o Mano mais que o Felipão? E o Felipão sabe mais que
o Vanderlei? E o Vanderlei mais que o Autuori? A diferença é no jeito de falar,
de se expressar, de trabalhar o dia a dia. Mas tecnicamente e taticamente tem
10, 12 treinadores que estão nivelados.
Mano é o técnico ideal para o Corinthians agora?
É um dos grandes nomes que estão no mercado.
Mano Menezes e Andrés, nos tempos de Seleção (Foto: Leandro Canônico / Globoesporte.com)
Por que você não assume se sabe que é um provável candidato?
Porque eu ainda não sou candidato. Quando for, vou falar.
Hoje tem um grupo, e tenho que esperar a definição do grupo.
O fato de ter participado dessa gestão Marin/Marco Polo te
ajuda?
Eu era diretor de futebol, nunca estava lá dentro, só
viajava. Nunca participei das decisões.
Você é a favor de estaduais menores?
Estadual é algo tradicional no país. Time pequeno e médio
têm de jogar.
O Corinthians gastou demais neste ano?
Todas as contas que foram postas no conselho foram
aprovadas, e eu sou conselheiro. Eu poderia ter votado contra, ou vetado. Mas eu
aprovei. Se estivesse ganhando, ninguém faria essa pergunta esdrúxula.
Voltaria a ser presidente do Corinthians?
Não. Não sou masoquista.
Onde você se vê em cinco anos?
Cinco anos? Não sei se vou estar vivo. Não sei.
FONTE:
http://globoesporte.globo.com/futebol/times/corinthians/noticia/2013/11/andres-quer-ver-torcedor-de-area-rica-financiando-o-da-popular-na-arena.html