Salários
atrasados, influência política e saída de diversos titulares desde a
eliminação da Libertadores, em 2012, demarcam caminho para a tragédia
anunciada em campo
Por GloboEsporte.comRio de Janeiro
O
segundo rebaixamento do Vasco em apenas cinco anos pode ser explicado
através do acúmulo de problemas na segunda administração do presidente
Roberto Dinamite. Crise financeira sem fim, falta de credibilidade no
mercado e uma série de escolhas equivocadas - no âmbito administrativo e
técnico - levaram o clube a perder jogadores de qualidade que formaram o
time campeão da Copa do Brasil e vice do Brasileiro de 2011 em
pouquíssimo tempo.
A análise fria desta nova
tragédia esportiva em São Januário leva, em sua origem, para o meio do
ano de 2012. Quando o goleiro Cássio, do Corinthians, espalmou o chute
de Diego Souza e, minutos depois, Paulinho eliminou o Vasco nas quartas
de final da Libertadores, o trem-bala da Colina começou a desmoronar
pouco a pouco. Um ano e meio depois, a goleada para o Atlético-PR atira o
clube para a Série B e entristece milhões de torcedores.
O
GloboEsporte.com lista abaixo os principais fatores que levaram o clube
à nova queda para a Segundona. Sem rumo e com futuro ameaçado, a nau
cruz-maltina vai para uma nova viagem pelo interior do Brasil e busca
outro lema para reviver os dias de glória.
Roberto Dinamite e Cristiano Koehler não conseguiram
contornar os problemas a tempo (Foto: Fred Huber)
O
bloqueio das receitas por conta das dívidas com a Fazenda Nacional
começou em agosto de 2012. Os reflexos foram sentidos imediatamente, mas
tiveram efeito devastador ao longo desta temporada. Salários atrasados
viraram regra em São Januário, deixando funcionários, jogadores e
comissão técnica insatisfeitos - Paulo Autuori pediu demissão alegando
que a diretoria não cumpriu a promessa de regularizar a situação. O
fator extracampo foi assunto em entrevistas e reuniões de vestiário,
tomando o lugar do foco absoluto para os jogos. Isso sem contar na falta
de credibilidade no mercado para contratar bons reforços. No último mês
de outubro, finalmente o acordo com o órgão do Governo foi assinado e
livrou o clube da asfixia financeira. Tarde demais.
Renê Simões viu as contratações fracassarem e, sem
ambiente, acabou demitido (Foto: Ivo Gonzalez /
Agencia O Globo)
Foram
nada menos do que 23 caras novas chegando sem parar entre janeiro e
outubro - quando Francismar, do Boa Esporte, assinou contrato. Poucos se
firmaram, alguns foram embora antes do fim do campeonato, e o saldo
negativo caiu, principalmente, na conta do ex-diretor René Simões, que
foi anunciado no fim de 2012 para gerir o futebol do Vasco. Em meio à
grave crise financeira, ele reforçou a equipe na base de troca-troca e
com nomes quase sem expressão. O objetivo era reduzir despesas. Entre as
escolhas mais contestadas estão o goleiro Michel Alves e o atacante
Robinho, que veio como um agrado ao zagueiro Dedé, vendido semanas
depois. Contestado e sem harmonia no dia a dia, René foi demitido, e
Ricardo Gomes, que já trabalhava em conjunto, assumiu sua função. Os
insucessos não pararam. Investimentos como Rafael Vaz e Montoya não
vingaram, e André até fez gols, mas esteve às voltas com polêmicas por
excesso na noite carioca. Terminaram como titulares: Fagner, Cris,
Guiñazu, Pedro Ken e Edmílson.
Gaúcho, Autuori, Dorival e Adilson foram os técnicos
do ano da 2ª queda (Foto: Montagem sobre foto da
Agência Estado)
O
diretor de futebol Ricardo Gomes foi quem fez a análise: com quatro
treinadores no comando do clube na temporada, ficou difícil para o time
ter um rumo em 2013. O Vasco iniciou a temporada com uma tentativa
caseira, Gaúcho, demitido ainda no Carioca. Depois, como esperança de
fortalecimento, o badalado Paulo Autuori foi contratado. A campanha já
não era boa, e o treinador saiu após a quebra da promessa de colocar
salários em dia no meio do ano.
Comandante da
campanha de retorno ao Vasco para a Primeira Divisão, em 2009, Dorival
Júnior foi contratado. Ele orientou o time, em sua segunda passagem, por
três meses e meio. O
técnico deixou o clube na 18ª posição da tabela do Campeonato
Brasileiro, na
zona de rebaixamento, quando faltavam sete rodadas para o fim da
competição. As
constantes mexidas que fazia nos titulares incomodavam torcedores e
dirigentes. O sistema defensivo jamais se acertou. O maior exemplo foi a
rotação de Pedro Ken, que atuou nas quatro posições do meio de campo.
Adilson
Batista foi a bola da vez já em novembro, em busca da salvação. Seu
aproveitamento foi razoável, com três vitórias nas seis primeiras
rodadas. Em nova filosofia, ele optou por esquemas táticos cautelosos,
utilizando três zagueiros e três volantes. A equipe mostrou mais
consistência e se apoiou ofensivamente na fase de Marlone e Edmílson. O
desfecho com a goleada sofrida para o Atlético-PR, no entanto, freou a
arrancada e impediu que o Vasco atingisse seu objetivo.
Em
2013, o Vasco viveu um intenso rodízio no gol, que só trouxe
insegurança e ansiedade para os arqueiros cruz-maltinos Michel Alves,
Diogo Silva e Alessandro, de estilos e origens distintas. O último
começou - e terminou - o ano como titular, mas perdeu a vaga para Michel
Alves depois de 15 jogos. No Brasileiro, a princípio houve a
manutenção. Seis rodadas depois, porém, ele já dava lugar a Diogo Silva,
beneficiado com a chegada de Dorival Júnior. Foram 15 rodadas como
titular, até que uma trapalhada contra o São Paulo, seguida de queixa a
respeito do comportamento da torcida, forçou nova mudança. Mas Michel
Alves ficou apenas dois jogos no posto novamente, e Diogo Silva voltou.
Só que outras duas falhas contra o Botafogo fizeram o técnico retornar
com Alessandro, que permaneceu no gol até o fim da competição nacional.
Foram
pelo menos dez pontos perdidos no Brasileirão por causa das falhas de
goleiros. Diogo Silva ocupou a meta vascaína em 22 ocasiões, tendo
sofrido 22 gols. Já Michel Alves foi titular em oito jogos e foi vazado
17 vezes. Alessandro, por sua vez, buscou a bola no fundo da rede em 12
oportunidades em oito partidas. No total, o Vasco sofreu 61 gols no
Brasileirão, tendo a terceira pior defesa da competição, atrás apenas do
lanterna Náutico (79) e do Criciúma (63).
Fernando
Prass,
Fagner, Renato Silva, Rodolfo e Thiago Feltri (Felipe); Nilton, Rômulo,
Juninho
Pernambucano e Diego Souza; Eder Luis (Carlos Alberto) e Alecsandro.
Essa foi a base do Vasco da campanha da Libertadores de 2012, que acabou
em eliminação pelo
Corinthians nas quartas de final, em gol de cabeça de Paulinho aos 42 do
segundo tempo. Mais de uma dezena de jogadores deixou o clube a partir
daquela derrota até o fim do
ano e iniciou a derrocada.
Sem receitas devido ao
bloqueio financeiro, a diretoria não conseguiu reposição à altura. Ao
longo desta temporada, o cenário se repetiu - mesmo que em escala menor.
A dupla de zaga, Dedé e Douglas, foi vendida; Eder Luis, quando
melhorava seu rendimento, foi emprestado; Alisson foi liberado de volta
ao Cruzeiro em posição carente no elenco. O próprio Marlone,
oficialmente ainda sob contrato, já foi negociado com um grupo de
investidores enquanto a bola rolava. Além disso, os lucros foram
relativamente baixos, já que as multas não eram altas e o clube não
tinha poder de barganha. A perda técnica com a saída de Dedé jamais foi
reparada.
FALTA DE COMANDO NO FUTEBOL
Após sair, José Hamilton Mandarino não teve substituto
na vice-presidência por mais de um ano (Foto:
Globoesporte.com)
O
ex-vice-presidente de futebol José Hamilton Mandarino deixou o cargo em
setembro de 2012. Não houve substituto imediato na pasta. Oficialmente,
o presidente Roberto Dinamite acumulou o cargo, como aconteceu também
em 2008, no ano do primeiro rebaixamento. Deputado estadual e presidente
do clube, com compromissos institucionais, Dinamite nem sempre podia
viajar com a equipe ou dar o suporte necessário para o departamento.
No
fim de setembro, após o clube entrar na zona de rebaixamento e a
pressão aumentar em São Januário, conselheiros sugeriram o
vice-presidente geral Antônio Peralta e Ercolino de Luca como segunda
opção. Peralta declinou do convite, e Ercolino, cotado anteriormente,
acabou aceitando. O diretor de futebol Ricardo Gomes, inexperiente no
cargo, tentava de todo modo acalmar o vestiário, contornar os casos de
indisciplina e a crise financeira, mas a falta de maior sustentação e
até erros de logística eram críticas constantes em especial de Dorival
Júnior.
Isolado politicamente e alvo da
torcida pela péssima campanha no Brasileiro e pelo desmonte do time campeão
da Copa do Brasil, o presidente Roberto Dinamite viu ressurgir no
cenário político de São Januário o ex-presidente e desafeto Eurico
Miranda. Atual presidente do Conselho de Beneméritos, o cartola mobilizou
seus seguidores para uma polêmica campanha de associação em massa
visando as eleições de 2014, ainda sem data. A estratégia, que
inclui pagamento a muitos sócios que depois tentaram e não conseguiram
cancelar o cadastro no quadro associativo do clube, passa por pagamento
de matrícula e mensalidades.
Outro candidato,
Roberto Monteiro, vice-presidente do Conselho Deliberativo, usou da
mesma estratégia e conseguiu apoio de nomes importantes do clube, como
do ex-vice de futebol Mandarino. Em jogos dentro de São Januário, houve
princípio de briga e confusão com seguranças de Eurico e torcedores, que
antes hostilizavam Roberto Dinamite. O clima na Colina ferve meses
antes da eleição.
FONTE:
http://globoesporte.globo.com/futebol/times/vasco/noticia/2013/12/ma-gestao-problemas-internos-crise-financeira-os-motivos-para-queda.html