Ídolo do futsal trabalhou com o pai e,
desde pequeno, exibia habilidade com os pés e fazia embaixadinhas com
bolas, limões, tampinhas e até moedas
Por GLOBOESPORTE.COM
São Paulo
Todo mundo já sabe que ele é o rei das quadras. Alguns já ouviram falar
que ele é inspiração para Neymar e é elogiado por Pelé. Mas o que
poucos conhecem do jogador Falcão
é que ele já foi açougueiro. O craque do futsal aprendeu a moer carne
com o pai, que morreu antes de ver o filho brilhar mundialmente e ser um
dos maiores orgulhos do esporte brasileiro. Atrás do balcão, o jovem já
mostrava habilidade com as mãos e, nas ruas, ele tinha talento com os
pés.
Hoje, o gênio do futebol coleciona dribles e lances memoráveis em 19 anos de carreira. São 71 títulos, o último deles garantido neste sábado,
do Circuito Sul-Americano de Futsal. Além de duas Copas do Mundo pela
seleção brasileira. Mas até chegar ao status de ícone mundial, ele
aprendeu a ter disciplina trabalhando com o pai. Aos 10 anos, quando era
apenas Alessandro Vieira, o Sandrinho, foi recrutado para ajudar no
açougue. As condições da família não eram ruins, mas o senhor João usava
a profissão para educar o filho.
- Meu pai viveu a vida inteira dentro do açougue, ele e a família toda.
E para mim fez parte também, por sete, oito anos, no açougue direto. A
personalidade que eu criei de responsabilidade de horários, de realmente
trabalhar desde novo, na minha vida profissional contou bastante. Minha
função era moer carne porque saía muito e domingo de manhã era muita
gente – lembra o jogador.
Falcão com o pai e os irmãos ainda pequeno (Foto: Arquivo pessoal)
Se no açougue ele fazia direitinho o trabalho de moedor, nas ruas do
Parque Edu Chaves, na Zona Norte de São Paulo, ele mostrava outra tipo
de habilidade.
- Qualquer coisa ele pegava e fazia umas embaixadas. Era tampinha de
garrafa, limão, moeda... o que ele pegava na rua servia – conta
Ronaldo, amigo de infância.
A agilidade, as brincadeiras, a facilidade com a bola e o até o apelido
são heranças do pai, que tinha semelhança com o ex-jogador Falcão, que
atuou no Inter. Aos poucos, Falcãozinho passou a ser o craque da rua e
com 12 anos já jogava no time dos colegas cinco anos mais velhos. Na
época, ele já dava trabalho para os adversários e para os companheiros
de time também.
- É coisa de bairro, o pessoal aqui é muito caxias, tem que ganhar
sempre. Quem joga em casa tem que ganhar. E a gente enfrentava todas as
ruas. E tinha lugar que a gente ia, que fazia dois, três de diferença, e
eu começava a dar chapéu, caneta. Eles (os companheiros de time)
falavam para eu parar, porque podia sair confusão – diz Falcão.
Mas ele não se intimidava e deixava os colegas preocupados com as
consequências dos dribles. Como ninguém segurava o menino precoce, o
jeito foi criar uma estratégia para não arrumar problema.
- Quando ele começava com graça, que o negócio apertava, a gente
falava: ‘Já dá uma bica na bola pra lá, em direção à nossa rua, e já sai
todo mundo correndo e não volta mais’. E essa era a tática – ri o amigo
Jô.
Seu João, pai de Falcão, usou o trabalho no açougue para educar o filho e ajudar a família (Foto: Arquivo pessoal)
Vendo que tinha futuro no futebol, Falcão se inscreveu na Federação
Paulista de Futsal e começou sua carreira na Associação Atlética
Guapira. O primeiro gol dele, contra o Corinthians, foi tão bonito que
chamou a atenção do clube. Aos 15 anos, ele fazia o primeiro dos dez
dias de testes no Timão. Mas só precisou de um dia para mostrar seu
potencial.
- Fui convidado a passar dez dias fazendo testes. E eu lembro que esses
dez dias se transformaram em um. No primeiro treino, eu já fiz vários
gols, fiz seis gols, fiz um golaço, aliás. E logo depois do treino, a
ficha já estava na mão. Um mês depois, eu era o camisa dez e capitão.
Então foi tudo muito rápido – lembra Falcão.
Aos 17 anos, ele já era titular do time principal do Corinthians. Foi
campeão paulista em 95 e, três anos depois, conquistava a primeira Liga
Futsal pelo Atlético-MG. Em 2000, foi campeão mundial de clubes pelo
Banespa. O menino que era craque da rua virava craque nacional. Mas, em
2004, ele teve uma das maiores perdas de sua vida.
Além do apelido, Falcão herdou do pai a habilidadeno futebol (Foto: Arquivo pessoal)
- Foi uma fase muito difícil para ele e para todos nós porque tinha
acabado de nascer o primeiro filhinho dele, o Enzo, e num momento de
tanta felicidade, nós soubemos que o pai estava doente. Foi um
sofrimento muito grande. – conta dona Reinalma, mão de Falcão.
Aos 48 anos, o seu João morreu vítima de câncer. Diante do caixão,
Falcão fez uma promessa ao pai: que seria o melhor jogador de futsal do
mundo!
- No enterro dele, eu falei pra ele que o sonho dele ia ser realizado. E acabou acontecendo – fala emocionado.
E aconteceu no mesmo ano. No fim de 2004, ele foi eleito pela Fifa,
pela primeira vez, o melhor jogador do mundo. Superada a morte do pai,
ele teve uma passagem sem oportunidades pelo gramado. Em 2005, ele
fechou com o São Paulo e virou jogador de campo. Mas o maior nome do
futsal não teve sucesso. O retorno às quadras foi triunfal, com seis
títulos da Liga Futsal. Pela seleção, uma das mais atuações mais
marcantes foi no Pan de 2007.
- Foi a realização de um sonho. Jogar o Pan dentro do país. Acho que
fiz gols memoráveis da minha carreira. Na final contra a Argentina, que
eu chapelei o goleiro, fiz o gol de cabeça e o argentino voltou e
derrubou a trave. Então, foi um contexto geral perfeito.
Depois de contusões e momentos difíceis na Copa do Mundo de 2012, ele
se consagrou herói do heptacampeonato brasileiro e fechou mais um ciclo
com medalha de ouro.
Com seu talento e seus dribles, Falcão inspira talentos como Neymar (Foto: Luciano Bergamaschi / CBFS)
Fãs famosos
O talento, o dom com a bola e o amadurecimento em quadra lhe renderam elogios do rei do campo.
- Uma vez nós tivemos no Santos juntos para uma entrevista. Aí, eu
falei isso para ele. Sem dúvida nenhuma, é um exemplo como jogador, com
uma habilidade tremenda! – reafirma Pelé.
O maior ídolo do futebol brasileiro da atualidade também faz questão de falar sobre o craque.
- Hoje, pra mim, é um ícone do futebol mundial, independentemente se é o
futsal. É um cara em quem eu me espelho e me inspiro muito pelas
jogadas e pela pessoa que é. E eu já copiei muito as coisas que ele faz
no futsal e levei para o campo também – revela Neymar.
Mas até quando Falcão continuará inspirando jogadores e trazendo medalhas para o Brasil?
- Infelizmente, o atleta tem prazo de validade e eu quero prolongar o
meu ao máximo. Mas eu tenho um planejamento de vida, com minha família,
meus filhos, de dar uma viajada, de sair dessa rotina maçante. Mas eu
penso em mais uns três anos.
Pelos planos do craque, que já fez quase dois mil gols, os brasileiros
ainda poderão se surpreender e se emocionar com jogadas inesquecíveis
até 2016.
FONTE:
http://globoesporte.globo.com/programas/esporte-espetacular/noticia/2013/03/inspiracao-para-neymar-o-rei-das-quadras-falcao-ja-foi-acougueiro.html