Bernardo Ribeiro vai jogar o Campeonato Carioca pelo Friburguense (Foto: Vinicius Gastin/Friburguense)
Bernado
Ribeiro é um daqueles casos clichês de brasileiros que foram tentar a
sorte no futebol do exterior muito cedo. Criado nas categorias de base
do Flamengo, o meia, em 2009, decidiu pôr literalmente o pé na estrada
em busca da continuação do sonho de ser jogador profissional. Conseguiu.
Deixou a Gávea e, a partir daí, desandou por clubes da Itália, Albânia,
Austrália e Finlândia. Alguns lugares que, mesmo distantes dos grandes
centros do futebol mundial, lhe proporcionaram histórias inesquecíveis -
como o da parceria com o atacante inglês Emile Heskey, o duelo contra o
italiano Del Piero na Terra do Canguru e a chance de disputar uma
Champions League por um time... albanês.
Hoje aos 26 anos de
idade e após uma passagem quase despercebida pelo Inter de Lages-SC em
2015, Bernardo Ribeiro vai defender o Friburguense no Campeonato Carioca
deste ano. Sem a pretensão de retornar ao futebol do exterior por
enquanto, o meia, agora, é movido por um novo objetivo.
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Quero fazer minha carreira no Brasil. Saí do Brasil muito cedo. Sei que
tenho condições para isso. Chegou a minha hora de crescer dentro do meu
país - disse.
Natural de Nova Friburgo, na
Região Serrana do Rio de Janeiro, Bernardo chegou muito cedo às
categorias inferiores do Flamengo. No Rubro-Negro foram quase 10 anos.
Faturou diversos títulos na base e participou de uma geração que contava
com o zagueiro Wellinton, os meias Erick Flores e Renato Augusto e o
atacante Kayke. Mas, apesar dos canecos pelo time da Gávea, um episódio
corriqueiro é narrado por ele quase como se fosse uma conquista.
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Confira a tabela completa de jogos do Campeonato Carioca 2016
Bernardo guarda recordação da partida contra
o craque italiano Del Piero, na Austrália
(Foto: Reproduçãol/ Facebook)
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Eu estava trocando de roupa no vestiário, quando olhei para porta do
vestiário e apareceu o Ronaldo. Fiquei igual uma criança, cara (risos).
Ele veio para a gente e falou "prazer, Ronaldo". Nem acreditava -
lembrou o meia, que encontrou Ronaldo no Fla quando o ex-atacante se
recuperava de uma lesão na Gávea, em 2008.
Com casamento
marcado para este ano com a noiva australiana, que conheceu quando
atuava pelo Newcastle Jets, o poliglota Bernardo Ribeiro - que arranha
albanês e fala inglês, sueco, italiano e espanhol - orgulha-se da
trajetória até aqui no futebol, como você confere na íntegra da
entrevista abaixo:
Clubes por onde passou:
Flamengo, Catania-ITA, Skënderbeu-ALB, Newcastle Jets-AUS, IFK Mariehamn-FIN e Inter de Lages-SC
Início da carreira-
Jogava aqui em Nova Friburgo em uma escolinha. Me destacava, fazia
gols, era o melhor do time. E, na época, tinha um olheiro do Flamengo
que marcou um jogo nosso contra o Flamengo em Friburgo. Me destaquei
nesse jogo e fui chamado para fazer um teste na Ilha do Governador.
Cheguei e fiz dois gols em 30 minutos e tudo. Aí fui chamado. Foi uma
emoção muito grande para os meus pais eu ter passado para o Flamengo. E
fiquei 10 anos da minha vida lá.
Títulos na Gávea-
Minha geração ganhou tudo. Fomos o único clube que conseguiu índice
para jogar o Mundial de Clubes da categoria na época. Ficamos na frente
do Barcelona, do PSV, ficamos em terceiro nesse torneio na Malásia.
Tinha o Renato Augusto, o Kayke, o Erick Flores, o Wellinton, que acho
que está na Arábia e jogou no Coritiba. Nossa geração ganhou tudo. No
mirim, no infantil, a Copa BH, tudo.
Bernardo Ribeiro guarda foto da participação do Fla no Torneio Internacional da Malásia, em 2007
(Foto: Arquivo Pessoal)
Saída do Flamengo e a chegada na Europa-
Eu tinha contrato na época. Mas eu vi que não teria oportunidade no
Flamengo, que queria me emprestar para alguns times. Mas, por bem, achei
que não seria interessante para mim. Aí eu fiz testes na Alemanha
(Nuremberg), acabei ficando, mas era base, bem amador mesmo. Mas, como
não tinha nada, acabei ficando. Mas foi para o
Catania
que eu saí mesmo do Flamengo, com registro na CBF, tudo mais. Fui fazer
teste no Treviso. A ideia era ficar lá. Mas aí me falaram "pô, você foi
bem", vamos para o Catania, que é de Série A. Eu tenho o passaporte
italiano, aí teve um convite do Catania, que me ofereceu um contrato de
seis meses. Nosso time tinha jogadores importantes, como o Maxi Lopes.
Foi uma experiência excelente
Pensar em voltar ao Flamengo?-
Eu tenho um carinho muito grande pelo Flamengo. Me profissionalizei
ali. Tenho uma relação muito boa com os jogadores do Flamengo, como o
Kayke, um irmão que eu tenho, o Luiz Antônio, todo mundo. Se pintar essa
oportunidade ficaria muito feliz. Saí, fiz minha estrada, fiz outras
coisas. Fui para a Europa muito cedo, mas o Flamengo eu tenho um grande
carinho. Foi o clube que me deu a oportunidade de ser profissional.
Bernardo
guarda foto de quando treinou com Ronaldo, em 2008, quando
o ex-atacante se tratava de uma lesão na Gávea (Foto: Divulgação)
Encontro com o Fenômeno-
O Ronaldo sempre foi o meu ídolo. Quando eu tinha entre 9 e 10 anos, eu
sempre comprava as chuteiras que ele usava. Eu estava em Friburgo e
ligaram e falaram "você vai treinar no profissional hoje". Aí já pensei
"pô, treino físico de novo, não" (risos). Cheguei na Gávea e vi uma
movimentação que não era normal, nem em contratação ficava daquele
jeito, coisa de louco. Aí pensei "tem alguma coisa hoje aí". Tinha
gente de todo o mundo, japonês. Eu estava trocando de roupa no
vestiário, quando eu estava olhando para porta do vestiário e aparece o
Ronaldo. Fiquei igual uma criança. Ele veio para a gente e falou
"prazer, Ronaldo". Nem acreditava. Cara, fomos treinar junto com ele. Eu
aqueci junto com ele. Foi minha dupla no aquecimento, treinamos juntos.
Dei um passe para ele fazer um gol no treino. Aí quando acabou, tirei
uma foto dentro do campo mesmo, com a roupa do Flamengo. Essa foto está
no meu quarto, como um troféu, né (risos).
Passagem pelo Skënderbeu, da Albânia-
Saí da Itália e fui para Albânia. A Albânia hoje em dia está
classificada para a Eurocopa, o clube que eu joguei estava na fase de
grupos da Liga Europa. Está crescendo, tem um trabalho legal. Foi
através de uma parceiro, que é albanês, que queria formar, vamos dizer,
um time imbatível. O clube não ganhava o campeonato nacional tinha 82
anos. Um clube de muita torcida. Metade da comissão técnica do Catania
foi para lá. Foi excepcional. Lá a torcida comparece, o estádio tinha
capacidade para 15 mil pessoas. Ganhamos o campeonato e só perdemos dois
jogos. Fui eleito o melhor meia do campeonato. Até hoje as pessoas de
lá me mandam mensagem, me procuram, virei ídolo mesmo. Muito legal para
mim. Uma coisa muito emocionante. Eu não podia andar nem na rua, no
shopping. Meus pais quando foram para lá ficaram assustados. Eu não
podia fazer nada, nem tomar um café. Mas foi muito legal. Fiquei um ano e
meio. Ganhei dois campeonatos albanês e uma Copa da Albânia.
Participação na Liga dos Campeões, temporada 2011/2012-
Na Albânia, eu também joguei a Liga dos Campeões. Não cheguei a jogar a
fase de grupos, mas jogamos a última fase dos playoffs, uma antes de
entrar nos grupos. Perdemos para o Apoel, do Chipre. Esse Apoel,
inclusive, estava bem, foi eliminado naquela Liga apenas pelo Real Madri
no mata-mata (quartas de final). É espetacular poder jogar a Champios.
Atacante da Inglaterra nas Copas de 2002 e 2010, Heskey jogou com Bernardo no Newcastle Jets (Foto: Reuters)
Parceria com Heskey e o encontro com Del Piero, na temporada 2012/2013-
Como fui bem na Albânia, surgiram propostas. E surgiu essa da
Austrália, para jogar no Newcastle Nets, que estava montando um time
forte. Cheguei junto com o Emile Heskey, que jogou no Liverpool, na
seleção da Inglaterra. Eu peguei a 10 e ele a 9. O Cássio
(lateral-esquerdo), que já jogou no Fla, disse "é muito bom aqui, cara".
Isso foi na época que o Del Piero saiu da Juventus e foi para o Sidney.
A repercussão foi muito grande na Austrália com ele e com o Heskey. No
primeiro jogo do Del Piero, nós que jogamos contra eles. Tinha umas 85
mil pessoas no Estádio. A gente ganhou. Tenho até uma foto que estou
driblando o Del Piero (risos). Poxa, vendo essa foto me faz lembrar que
eu cheguei em um nível bom. 85 mil pessoas no estádio, jogando contra o
Del Piero, que já ganhou Copa do Mundo, formando dupla de ataque com o
Heskey, que também já jogou Copa, foi demais.
Aventura "fria" na Finlândia, em 2013 e 2014-
Na Finlândia se pode pensar que é fácil jogar, mas não é. As
dificuldades lá são muito grande. Já joguei lá com 27 graus negativos,
menos 20. É muito difícil jogar no frio. Lá eles marcam muito, chegam
junto, e o juiz deixa rolar. E eu jogo bem para frente, com aquele
estilo brasileiro. Eles não aceitam muito isso, não. Acham que está
querendo menosprezar. Nosso time era um time bom, conseguimos chegar
entre os quatro primeiros do campeonato. Eu fui escolhido como um dos
melhores meias. Consegui chegar a um número que ninguém nunca tinha
conseguido de assistências no campeonato. Foram 16 em 25 jogos. Aí
surgiu a oportunidade de eu ir para alguns clubes maiores da Finlândia,
ir para a Suécia, para a Dinamarca, Noruega. Mas decidi voltar para o
Brasil, para fazer minha carreira profissional dentro do Brasil.
Bernardo jogou na Finlândia antes de retornar ao Brasil (Foto: Reprodução/ Facebook)
Acerto com o Inter de Lages e o retorno ao "lar"-
Fui para lá (Inter de Lages), mas não joguei. Tive problema na
documentação e acabou que não consegui jogar. Aí fiz um acordo com o
presidente para vir para o Friburguense, que seria melhor para mim.
Perto de casa, um clube que fica cinco minutos da minha casa. Conheço
todos ali, o Siqueirinha, uma pessoa que eu gosto, confio, que conversou
comigo. Não pensei duas vezes. Agradeço a ele pelo convite. Espero
fazer um trabalho legal. Assinei com um clube que literalmente é dentro
da minha casa. Sai daqui com 12 anos e só estou voltando agora, para ter
essa tranquilidade. E para jogar o Carioca que, junto com o Paulista, é
o campeonato mais visto, mais charmoso.
Volta ao futebol do exterior?-
Agora mesmo, que nessa abertura do mercado de janeiro, eu recebi uns
dois, três telefonemas de pessoas que eu conheço por lá. Mas não quero
isso. Quero fazer minha carreira no Brasil. Saí do Brasil muito cedo.
Sei que tenho condições para isso. Chegou a hora de crescer dentro do
meu país. Tem clubes excelentes, um campeonato forte, que todo mundo
comenta lá fora. Dizem que estamos enfrentando uma crise no futebol do
Brasil. Mas, para mim, não existe isso. Lá todo mundo fala. Falei que
voltei para cá, e as pessoas me deram os parabéns. Tenho condições de
crescer muito. Isso que eu quero. Espero fazer um excelente Carioca pelo
Friburguense para alcançar muitas coisas.
Bernardo jogou na Austrália por uma temporada (Foto: Arquivo Pessoal)
Poliglota?-
Eu falo cinco línguas. No Albanês, eu engano (risos). Mas falo fluente
inglês, porque causa da minha noiva. Falo espanhol perfeitamente, porque
tive alguns treinadores espanhóis. Falo muito bem italiano e um pouco
de sueco também, porque, na Finlândia, na região que eu morava, a
maioria das pessoas falavam sueco.
Sonho realizado-
Tenho que destacar duas coisas bem pontuais na minha vida pelo futebol.
Saí do Brasil muito cedo com o sonho de ser jogador. Consegui todas as
minhas coisas, tudo o que eu tenho e ganhei títulos em países que não
eram da minha língua. Isso é fruto de muito trabalho e muito mais pelo
apoio dos meus pais, dos meus irmãos e da minha família. Graças a Deus,
eu conquistei coisas boas lá fora. Na Austrália, por exemplo, eu conheci
a minha a noiva. Ela veio morar aqui comigo, ela é apaixonada pelo
Brasil. Nós vamos no casar esse ano no Brasil. Tive uma experiência
muito legal por esse mundo.
FONTE:
http://globoesporte.globo.com/rj/serra-lagos-norte/noticia/2016/01/del-piero-heskey-ronaldo-bernardo-volta-ao-brasil-repleto-de-lembrancas.html