Ídolo do basquete
brasileiro recorda regime forçado, bloco de carnaval no hospital e
apoio da esposa e de fãs durante um mês de internação: 'Mais uma batalha
vencida'
Por Marcos GuerraSantana de Parnaíba, SP
A casa de tijolos vermelhos está tranquila, silenciosa. Nem
a bandeira do Brasil à porta balança com o vento. Até que Oscar Schmidt
aparece
e dá energia ao seu lar em Santana de Parnaíba, localizado na região
metropolitana da capital paulista. Com passos firmes e um sorriso
largo do alto dos seus 2,05m, o ídolo do basquete nacional logo trata de
deixar
à vontade todos ao seu redor. O jeito brincalhão, carismático e por
vezes
desbocado não lhe falta nem mesmo para recordar dias difíceis de luta em
hospitais.
O mês de internações nos Estados Unidos e em São Paulo é mais uma
batalha vencida
pelo ex-jogador, que combate um tumor no cérebro desde 2011.
O coração é
que pede
cuidados especiais desta vez, mas Oscar ri aliviado: está curado de uma
arritmia cardíaca.
- Foi o maior susto
da minha vida, porque o coração é que te coloca em pé, é a alma do corpo. Eu
fiquei muito tempo no hospital. Foram três semanas aqui, em São Paulo, e mais
uma nos Estados Unidos antes. Quase um mês. Ninguém merece ficar internado
tanto tempo. É um saco. Mas eu estava em boas mãos, nas mãos dos melhores
médicos do Brasil. Agora estou bom, estou curado da arritmia. Foi mais uma
grande batalha vencida - disse Oscar.
Oscar Schmidt temeu por sua vida, mas está
curado da arritmia cardíaca
(Foto: Marcos Guerra)
Por causa da
arritmia, o ex-jogador passou uma semana internado em um hospital de Orlando,
na Flórida, onde passava férias com a família. Ele retornou ao Brasil, e o
problema cardíaco voltou.
Aos 56 anos, ele foi internado no hospital
Sírio-Libanês para tratar a doença, provocada por um vírus. Oscar chegou a temer
por sua vida, mas superou o desafio. Ele fez das restrições alimentares um
regime para perder 14kg, fez dos corredores do hospital uma passarela de carnaval.
Nesta terça-feira, uma semana depois de ter alta, ele recebeu a reportagem do
GloboEsporte.com e disse estar com o coração pronto para torcer pelo Brasil na
Copa do Mundo de basquete e na de futebol.
Oscar Schmidt voltou à sua casa na noite da última segunda-feira (Foto: Marcos Guerra)
GloboEsporte.com: O
que estava fazendo na hora que começou a sentir a arritmia? Pode descrever como
era?
Oscar Schmidt: eu
não sentia o coração batendo. Cheguei ao hospital, nos Estados Unidos com o
coração a 180 batimentos por minuto. Eu vomitava muito. Falei: “Estou morrendo
aqui. Stephanie (a filha), me leva ao hospital”. Ela me levou ao mais próximo e
fui atendido de emergência. Eles me internaram. Foi uma coisa surpreendente e
inesperada. Eu estava fazendo tratamento só da cabeça, e de repente estava
internado pelo coração. Ainda bem que apareceu, porque curou. Espero que não
volte mais.
Quem estava com
você no dia?
Minha família toda
estava comigo. Coitada da minha mulher (Cristina). Ela que passou o nervoso
todo. Ficou muito mais nervosa que eu. Se eu fosse embora, eu nem ia ver mesmo
(risos). Ela que aguentou a pancada.
Foi uma coisa surpreendente e
inesperada. Eu estava fazendo tratamento só da cabeça, e de repente estava
internado pelo coração
Oscar Schmidt
Em algum momento
você temeu por sua vida?
Eu temi pela minha
vida, mas com o coração aberto, porque minha vida foi linda. Quem não gostaria
de ter minha vida? Disputando esporte, defendendo o Brasil. É uma coisa maravilhosa.
Temi, mas temi tranquilo.
Quando você voltou ao Brasil, já foi direto ao hospital de
novo?
Eu fui ao hospital
para fazer minha consulta de sempre com meu oncologista (no dia 17 de
fevereiro). Cheguei lá com um cansaço terrível. Nunca tinha sentido isso na
vida. Quando o doutor (Olavo Feher) me examinou, ele disse: “Rapaz, você vai
ser internado, porque seu coração está aos pedaços”. Eu fiquei três semanas lá,
e digo isto porque tenho de ser crítico: nos Estados Unidos, não tomei um
diurético. Ninguém falou de vírus no coração, e eu tinha um vírus no coração.
Fizeram um procedimento de choque e três dias depois estava com arritmia de
novo. Medicina boa é aqui no Brasil. Graças ao Dr. Roberto Kalil Filho e ao meu
oncologista, eu curei isso. Eu passei por um procedimento chamado ablação (em
que o médico passa um cateter através dos vasos sanguíneos até o coração para
eliminar sinais elétricos anormais no tecido cardíaco). Eu fiquei seis horas na
cama, desacordado. É bem invasivo, mas funcionou.
Como foram seus
primeiros dias no hospital? Qual era a rotina?
Eu não tinha de
fazer nada. Só me esburacaram no braço. Eu ficava lá deitado, esperando
resolver. Eu fiquei na suíte do Lula (risos). A suíte presidencial.
Recém-inaugurada. O Lula nem foi lá ainda (risos). Era enorme o quarto. Era uma
coisa linda, mas também não dá para ficar lá direto. Eles me liberaram depois
de muito tempo. Eu poderia ter voltado para casa antes disso. Eu fui paparicado
para caramba pelo povo de lá.
Oscar Schmidt tem quatro cachorros e os leva
para passear no condomínio onde mora
(Foto: Marcos Guerra)
Como eram as
visitas? Os filhos e os parentes estavam sempre por perto?
A presença da minha
esposa 24 horas por dia comigo foi a coisa mais tocante. Ela foi meu porto seguro.
Eu acordava e ela estava olhando para mim. Essa era a melhor parte. Eu dava
mais força a ela do que ela para mim (risos). Ela sofreu para caramba. O cara
teve tumor na cabeça e agora está com problema no coração. Coitadinha. Meus
filhos estavam sempre comigo também. Só dormiam em casa. Às vezes, a Stephanie
dormia lá. O Felipe não, mas foi lá todo dia.
Eu emagreci 14kg. Estava
uma baleia antes. Aí eu entrei no peso aceitável. Foi bom até (risos). Saí de lá inteiro, porque estava
gordo. Queria fazer um regime mesmo
Oscar Schmidt
Você tinha alguma
válvula de escape? Um hobby que você manteve e que te ajudou a encarar melhor
os dias no hospital?
Eu via muita TV.
Estava sempre junto da minha mulher, e saíamos para passear pelos corredores.
No carnaval, nos fantasiamos (risos). Foi legal para caramba. Colocamos só
máscaras e saímos desfilando pelo corredor. Era o bloco do Sírio-Libanês
(risos). Eu sempre cruzava com pacientes e acompanhantes pelos corredores.
Tinha muita convivência. Todos eles estavam felizes em me ver.
Você em algum
momento teve alguma restrição para falar, se movimentar ou comer?
Só tive restrição a
alguns alimentos no começo. Você já come mal no hospital, se não pode comer o
que quer, é pior ainda. Aos poucos foi acabando a restrição. Da metade para o
fim da internação, eles já preparavam o que eu pedia. Eu emagreci 14kg. Estava
uma baleia antes. Aí eu entrei no peso aceitável. Foi bom até (risos). Eu
emagreci porque me forçaram a emagrecer. Saí de lá inteiro, porque estava muito
gordo. Queria fazer um regime mesmo (risos). Eu gosto muito de macarrão. É bom
demais e não podia. Depois que eu fiz a ablação melhorou muito minha vida. A
ablação me curou.
Oscar Schmidt caminha para exercitar o coração (Foto: Marcos Guerra)
De que você mais sentia
falta durante a internação?
Eu sentia mais
falta de trabalhar. Adoro o que faço, adoro dar palestras motivacionais. Quando
vê alguém cancelar palestra achando que você está morrendo é irritante. Perdi
sete palestras. Cinco eu tive de cancelar, e duas foram canceladas. Os caras
pensavam que eu estava morrendo, entubado. Mas tudo vai voltar melhor que
antes. Eu vou começar nesta quarta-feira a dar palestra. Eu vou começar na
quarta-feira. Já tenho outra na quinta-feira e outra na sexta.
Como você imagina
que será a reação das pessoas nessas suas primeiras palestras depois da
internação?
O povo vai fica
feliz para caramba quando me vir (risos). Sem dúvida. O Brasil gosta muito de
mim, e eu gosto muito do Brasil. É uma emoção que levo comigo até morrer. Por
isso não troco o Brasil por lugar nenhum. Eu meu lugar. Ficarei aqui. Meu
futuro é nesta casa.
Muitos fãs mandaram
mensagens de carinho a apoio. Você as recebeu? Seus amigos do basquete também
te mandaram mensagens? Talvez o Kobe Bryant, que é seu amigo?
Acho que o Kobe
nem soube que eu estava doente. Se soubesse, ele teria me mandando uma
mensagem, com certeza. É um menino de ouro. O pessoal da minha geração de
basquete ficou muito comovido e me mandou mensagens. O povo torcendo por você é
uma força grande. Não conto quantas mensagens eu recebi. Foram milhares. É uma
força para superar tudo o que vier.
O coração está bom
para torcer pelo Brasil na Copa do Mundo de basquete e de futebol. Vamos torcer
muito
Oscar Schmidt
Como foi quando o
médico disse que você poderia ir para casa? A família fez festa?
Foi um p*** alívio!
Eu fui vê-lo na segunda, ele me disse: “Não achava que ia te ver tão bem”.
Ficou muito feliz. Todo mundo fez festa no hospital, mas em casa não teve nada
especial. Continuamos nossa rotina.
Como está seu
tratamento da arritmia agora? Você está com alguma restrição na sua rotina?
Não tenho
restrições. Eu só tomo alguns remédios. Devo andar muito e faço isso com meus
cachorros. Já matei os quatro de cansaço (risos). Fiquei com os pés doendo. É o
que preciso fazer: exercícios para fortalecer o coração. Na última vez, eu
andei duas horas.
Você pode até jogar
basquete? Está liberado para isso?
Eu não jogo mais
basquete, só futebol. Basquete eu nunca brinquei. Eu me irrito muito jogando
basquete. No futebol está previsto eu ser ruim (risos). Mas o coração está bom
para torcer pelo Brasil na Copa do Mundo de basquete e de futebol. Vamos torcer
muito.
Como está o
tratamento do tumor maligno?
Não dá para
controlar esse negócio. Vai tomando remédio até a hora que pintar de novo. Aí
eu abro a cabeça de novo. Eu já fiz radioterapia lá atrás, e faço quimioterapia
todo mês.
Uma frase marcante
sua após a cirurgia do ano passado foi: “Se eu tiver de abrir a cabeça 20 vezes
eu vou abrir”. Essa força de quem está disposto a lutar muito permanece
inabalada?
Sem dúvida. Se
tiver que abrir o coração também eu vou abrir. Tudo que precisar consertar
cirurgicamente, eu faço.
Como é a vida de
Oscar Schmidt de hoje em comparação com a do Oscar jogador?
Minha vida é até melhor agora, porque eu falo da
minha vida e não canso. É uma forma até engraçada e emocionante de contar. Isso
é surpreendente, porque você faz basquete em uma intensidade incrível e de
repente não faz mais. É um baque na vida de qualquer pessoa. Eu tinha muito
medo de parar de jogar. Investi em palestras e deu certo. No ano passado eu
ganhei o prêmio de melhor palestrante do Brasil. Quero manter, ganhar muitas
vezes. Nunca pensei que fosse fazer isso. Agradar um público grande sozinho no
palco é difícil. Deu certo. É mais fácil no palco que na quadra.
FONTE:
http://globoesporte.globo.com/basquete/noticia/2014/03/apos-maior-susto-da-vida-oscar-abre-o-coracao-estou-curado-da-arritmia.html