Em paz pouco mais de uma semana após sua demissão do Flu, treinador revela decepção com o fato, com Felipe, relembra erros e defende a zaga
No último dia 28 de julho, Abel Braga entrava na sala de imprensa da
Arena do Grêmio com o semblante visivelmente abatido após a derrota do
Fluminense para os donos da casa, a quinta consecutiva no Brasileiro. No
dia seguinte acabou demitido após quase dois anos e meio no comando do
clube. Pouco mais de uma semana depois, Abel entra no Uniko, restaurante
no Centro do qual se tornou sócio, com sorriso no rosto, algo raro nas
Laranjeiras em 2013, e mais relaxado. O pouco tempo foi o suficiente
para devolver a paz tão ausente neste ano em sua vida.
Mesmo com este cenário, engana-se quem pensa que era o que ele queria. A mágoa pela demissão ainda está presente. Apesar do momento ruim vivido pelo Flu, sua convicção em uma volta por cima era grande. E nas palavras nota-se que ele esperava uma consideração e uma confiança maior por parte da diretoria, principalmente após o 2012 arrasador que culminou com a conquista do Carioca e do tetracampeonato brasileiro. A demissão, na sua visão, poderia ter acontecido após a eliminação na Libertadores para o Olimpia. Mas se sobreviveu àquele trauma, não seriam cinco derrotas que causariam isso.
- Não foi o que eu queria e nem o que eu esperava. Jamais largaria o
meu grupo. Mas foi a decisão que eles tomaram. Nunca imaginei que cinco
resultados ruins seriam o suficiente após tudo que passamos - desabafou
Abel, que embarca no próximo domingo com a esposa para uma viagem pela
Europa que passará por Itália, Portugal e França, tudo parte do processo
de ficar até dezembro sem trabalhar.
- Vou descansar. Não adianta. O telefone já tocou, mas não vou assumir nada mais neste ano. Vou para a Itália, em seguida para Portugal e termino passando alguns dias em Paris.
Entre um gole e outro de vinho, algo que costuma fazer diariamente em casa com amigos ou em restaurantes pela cidade, e recomendando os pratos do cardápio que ajudou a aprovar durante o processo de abertura da casa, Abel falou por mais de uma hora com o GLOBOESPORTE.COM. Revelou que sentia desde a pré-temporada que o ano não seria vitorioso como o passado, defendeu novamente seu ponto de vista em relação à zaga do Fluminense, alvo constante de críticas, mostrou certa mágoa com Felipe e garantiu que nunca se importou com os boatos de que Celso Barros, presidente da Unimed, já tinha tido contatos com Vanderlei Luxemburgo, que o substituiu, antes mesmo de sua demissão.
Confira a íntegra da conversa abaixo.
GLOBOESPORTE.COM: Passado pouco mais de uma semana da sua demissão, a ficha já caiu? Afinal de contas, em sua despedida você deixou claro que por você o trabalho teria uma continuidade.
Abel Braga: Não era o que queria. Jamais largaria meu grupo, ainda mais em uma situação daquelas. Fora que tinha absoluta certeza de que a má fase seria passageira. Aliás, uma fase como essa é absolutamente normal. A maioria entende pouco disso (futebol). Depois da arrancada de 2011, com aquele segundo semestre maravilhoso, de todo o ano de 2012 impecável, é absolutamente normal vir a cair. Mas as pessoas acham que não, que tem de continuar ganhando tudo. Neste ano o Flu teve uma coisa boa que foi manter o grupo. Vieram praticamente três jogadores, além dos meninos da base. O Monzón não deu certo. O Rhayner ainda será muito útil, pode ter certeza. Mas ao mesmo tempo o meu subconsciente previa que seria difícil. E isso ficou mais claro porque começamos de maneira muito ruim. Logo no primeiro dia de pré-temporada ficamos sem o Thiago Neves. Depois na mesma semana perdemos o Fred, o Deco e o Gum. São quatro titulares de uma vez. Por isso sabíamos que teríamos problemas na frente. No momento mais importante do ano, que é a pré-temporada, acontece esse tipo de coisa. É o tempo que a gente tem para acertar os detalhes, apesar de ser um tempo ridículo.
E como têm sido os seus dias de descanso?
A melhor coisa que pode acontecer quando se deixa o trabalho é o relaxamento. É desumano ser treinador no Brasil. É claro que você não desliga dos jogos, mas não vê mais com olho de treinador e sim de torcedor. Torço por alguns clubes pelos quais tenho carinho e é óbvio que o Fluminense é um deles. Além do carinho, o meu filho está lá. Mas o melhor é que ganhando, perdendo ou empatando não há mais aquele incômodo. Você consegue relaxar assistindo a um jogo. E se não conseguir assistir, tudo bem também.
A saída aconteceu após o time perder cinco partidas consecutivas no Campeonato Brasileiro. Naquele momento era algo que você esperava?
Não esperava sair pelo que fizemos de 2011 até agora. Não esperava. Depois de o clube voltar à normalidade poderia até sair. Mas ser tirado em função de cinco resultados? Queira ou não 50% do grupo veio da base. Teve o tetracampeonato brasileiro, o Carioca que não era conquistado desde minha última passagem em 2005... Tudo isso pesa. Mas tiveram duas coisas que no fundo marcaram positivamente essa passagem. O primeiro foi o fato inédito de um clube me esperar por três meses. Isso mostra o quanto tinham convicção do meu trabalho, da resposta que eu daria... E isso tudo com o ambiente ruim. Com eles tomando porrada. Agora que passou posso falar, mas fui contactado pelo Santos semanas antes do Fluminense. Adorei as pessoas, o presidente conversou comigo, mas deixei claro que não poderia ir naquele momento. Disse que se quiserem me esperar, quem sabe, mas veio uma derrota e me ligaram dizendo que não daria. Falei o mesmo que disse para o Celso e para o Peter em 2011 no meio daquela pressão. Se quiserem esperar estou dentro. Se ficar insuportável arruma outro. E me esperaram.
Por tudo isso a saída foi mais dolorosa? Você chegou a recusar propostas vantajosas financeiramente dos Emirados Árabes durante a temporada.
Quando eu tive a proposta dos Emirados foi durante a Libertadores. Respondi que não poderia dar uma posição porque estava disputando uma competição importante e a ideia de todos era ir longe. Isso aconteceu ainda na primeira fase. Nos classificamos, passamos pelo Emelec, o time vinha bem... Aí veio o Olimpia e ficamos fora. Até achava ali que poderia acontecer alguma coisa, surgir uma dispensa... Agora no Brasileiro não esperava por isso. Até pela maneira que vinha jogando. As derrotas foram provocadas por falhas pontuais nítidas para todos. Ali não esperava. Poderia ser. Até pensei, porque a frustração não foi só minha e sim de todos.
Boatos circularam dizendo que Celso Barros, presidente da Unimed, já tinha feito contatos com Vanderlei Luxemburgo no meio do ano. Você obteve essas informações? Como era sua relação com ele?
É uma situação natural ouvir esses boatos. Se vão te despedir, é necessário buscar um plano B. O que eu digo do Celso... Aqui não quero falar do lado do esporte, do torcedor... Porque em 2005 saí brigado com ele. Não tinha nenhum vínculo com a Unimed então achava que não tinha direito de escutar o que poderia acontecer. Mas agora era diferente. E acho que me dignifiquei muito. Então o que eu digo nessa convivência é que se trata de um cara boníssimo. Em dois anos e meio eu nunca o vi dizer um não. E não é para o Abel, Fred, Deco... É para todo mundo. Se tiver dentro do seu alcance ele vai te ajudar. Foi assim com o Roberto Moreno, meu observador. Com seu conhecimento ele ajudou na época do problema que ele teve no fígado. Se por ventura ele tiver alguma falha você nem considera porque nos problemas mais sérios da vida ele está sempre disposto a colaborar.
Você falou no início na espera do Fluminense por você como sendo uma das coisas que o impressionaram durante esta passagem. Qual foi a segunda?
Eu nunca vi treinador sair ganhando troféu. Como em uma despedida você ganha um troféu? Não sei te explicar o que senti na hora. Fui fazer um comunicado para vocês. Ali encerrava um ciclo e como sempre foi saio por uma porta maior do que a que entro. Um dos motivos para isso é que eu só me preocupo com o campo. Acho que esta é minha grande vantagem. Meu caráter, minha honestidade, minha lealdade... Não me meto no que está fora da minha parte. Se perguntarem minha opinião eu dou. Mas nunca cheguei e me meti em nada. Meu trabalho é com a minha comissão. E nisso o Fluminense está bem servido também. Tem um departamento médico que é brincadeira. O que esses caras aguentam de lesão... E não é coisa boba não. O trabalho é intenso em concentração, em viagem... Aliás, a estrutura de trabalho está muito boa.
Você acha? Essa é geralmente uma crítica que se faz ao clube...
As condições em Laranjeiras são muito boas. O vestiário está impecável. Eu colocava um DVD na minha sala e as imagens passavam nas quatro televisões. Agora o clube voltou a ter uma casa com o Maracanã, o CT está para sair... Mas ainda assim não é o ideal. Teve uma passagem que não me esqueço mais. Treinamos duas ou três vezes uma jogada de escanteio. Até mascaramos um pouco para não ficar na cara. No dia do jogo, o Deco foi pegar a bola e o posicionamento dos caras nos impediu de fazer a jogada. Ele olhou para mim e gritou: "Abel, os caras já sabem". A gente riu. Isso acontece porque ali do outro lado das Laranjeiras entra quem quer. Mas mesmo com essa situação os treinos ali não podem acabar nunca. Nem mesmo com o centro de treinamento.
Por quê?
A pulsação. O contato entre torcida e jogador. É tudo muito interessante, muito saudável... O torcedor precisa disso assim como os jogadores também. É preciso sentir a pulsação.
Após um ano praticamente irretocável em 2012, não julgou que seria benéfico para o clube realizar uma mudança em parte do elenco? Afinal de contas o Fluminense conta com muitos jogadores que estão há alguns anos no clube.
Já tinha dito para vocês e continuo com a mesma opinião. A mudança teria de acontecer no fim deste ano. Aí você precisa procurar manter uma espinha e criar novamente o grupo. O goleiro você mantém. O primeiro volante se sair, traz um outro f.. O meia vai? Traz outro f.. E por aí vai. A espinha forte precisa ser mantida. O resto é normal. Era isso ou mudar o treinador, mas isto eles já fizeram. Agora no fim do ano vai se analisar a necessidade de novas peças. Mas como disse no início, a queda é algo normal. O Internacional, o Santos, o São Paulo... Eles passaram por isso. O Santos ganhou estofo de time grande, conquistou títulos e agora passa por outra renovação. É assim. Faz parte do processo.
Houve duas frases que marcaram negativamente a sua passagem pelo clube. Até hoje muitos torcedores reclamam de quando você falou que "Era melhor empatar em 0 a 0 dentro de casa pela Libertadores do que vencer por 2 a 1". Foi o resultado que acabou acontecendo em São Januário. No fim, o Flu terminou eliminado pelo Olimpia. Se arrepende de ter dito?
O que quis dizer é que você consegue ter um aproveitamento melhor ofensivo fora de casa do que em casa. Aqui contra o Olimpia foi ataque contra defesa, mas não marcamos porque as chances foram raras. Mais ou menos o que aconteceu contra o mesmo Olimpia no Mineirão diante do Atlético-MG. E lá fizemos 1 a 0 e ficamos mais perto do segundo do que de sofrer o primeiro. É claro que o melhor é ganhar, mas na Libertadores sofrer gol em casa é um grande problema. Estou falando porque vivenciei isso no Internacional. Na semifinal contra o Libertad em 2006 sabíamos das dificuldades. Mas nós fizemos o diabo para não sofrer gol em casa. O primeiro foi 0 a 0, só que lá. Aí em casa, sem o desespero, e isso o time brasileiro sabe fazer melhor, que é ter uma estrutura ofensiva melhor sem dar o contra-ataque, ganhamos em casa por 2 a 0. Mas exemplo claro veio antes contra a LDU. Perdemos lá por 2 a 1. Aqui era o jogo que a gente tinha de ir para cima. E os caras com um timaço defenderam muito, mas a vitória veio. Falei em função do que conheço e do que já vivi. E por isso ficou um mal entendido.
A outra frase marcante foi: "Temos zagueiros para os próximos seis anos". O setor é o que mais sofre com críticas da torcida. Mesmo diante das falhas que aconteceram nos seus últimos jogos você mantém esta opinião?
Em 2010 essa defesa foi campeã sendo a menos vazada. Em 2011 fizeram um segundo turno impecável após a minha chegada. O Elivélton com fratura na canela se entregava de maneira impressionante. Em 2012 a zaga novamente foi campeã brasileira sendo a menos vazada. Por que tirar o valor deles? Não vou nem falar do Gum e do Euzébio que já são mais rodados. O Digão é um grande jogador. Você vê que é acima do normal, mesmo com uma falha ou outra que tenha acontecido. O Anderson para mim é um dos melhores zagueiros com quem já trabalhei. Você olha e não diz qual a perna dele. E é um cara fantástico ofensivamente também. Mas foram três lesões na mesma perna, uma pena. Então vamos parar com isso. Como foram as falhas? Tomamos um gol olímpico de uma bola leve. Não aquele chute forte, estilo Ronaldinho Gaúcho. E já contra o Vasco o Cavalieri já estava voltando a ser o de sempre com grandes defesas. O Digão teve uma falha pontual. Antes ele foi lá e marcou duas vezes contra o Criciúma. Contra o Vasco a falha foi do Edinho e não da zaga. E ele tem muita personalidade. No dia seguinte já superou. É injusto colocar na conta da zaga por causa de algumas falhas pontuais em um momento que as coisas não vão bem. O Fred perdeu o pênalti contra o Cruzeiro, mas o Fluminense venceu. Mas o Digão falhou contra o Inter e o time perdeu. Aí f... O goleiro falhou e perdeu? F... E os jogadores que chegam pelo patrocinador são todos do meio para a frente. É Thiago Neves, Conca, Fred, Deco... Isso ajuda a colocar uma carga maior na defesa. Ninguém vai me provar que esses caras mais jovens, Digão, Elivélton, Wellington Carvalho, não vão estourar. Não tenho dúvida disso. Fui zagueiro, p... Sei do que falo. Amanhã, se estou indo para um clube, eu venho buscá-los. Não tenha dúvida disso.
O Felipe foi uma decepção para você nesta temporada?
Não foi uma decepção, até porque quando foi contratado teve minha aprovação. Se não fosse aprovado não viria. Mas antes de fechar eu liguei para ele e avisei que o time estava fechado, que teria de buscar espaço, mas que não iria deixá-lo voltar para o Catar para encerrar a carreira longe do seu país. Mas confesso que sua última entrevista me decepcionou. Não gostei da maneira como ele falou. Eu acreditava nele como também nos demais. Assim, não me magoou, mas achei desproposital.
Mas e o desempenho dele? As chances foram poucas e agora com o Luxemburgo ele entrou nos dois jogos.
É a ordem natural das coisas. Como disse, o esquema estava definido. Mas passei a jogar com Deco e Wagner e de repente era o momento dele. Como foi na verdade. O Deco saiu e ele entrou. Isso iria acontecer também. Mas foi tudo muito estranho. Contra o Grêmio ele não viajou em função de uma dor na perna. Dias depois estava bom e jogou contra o Cruzeiro? Agora falou em acreditar? Futebol é assim. As coisas passam muito rapidamente pela cabeça das pessoas. Não deixo de gostar dele, ainda mais porque sei do seu carinho pelo Fábio. Isso é legal.
Falando no Fábio, acredita que agora ele terá condições de evoluir ainda mais sem o pai no comando técnico?
Sim. Com certeza. A nossa relação estava até ruim. A saída vai ser melhor para mim e para ele. O Fábio deu um salto porque conquistou a agressividade que faltava a ele. O volante precisa ter agressividade. Não é só dar porrada e nem só a técnica que ele tem. Seu passe é diferenciado para a posição. Mas o convívio com o Edinho, Diguinho, Valencia trouxe isso. Só que ao mesmo tempo acredito que uma saída do futebol brasileiro seria ainda mais benéfica. Ele tem passaporte português em casa. O Fluminense facilita nestes casos: empresta com passe fixado. Acho que para amadurecimento seria muito bom.
Muito se falou no fato de o Fluminense ter contratado apenas um jogador, o atacante Marcelinho, neste meio de ano. Após a eliminação na Libertadores não discutiu reforços com a diretoria?
Nós pensamos muito. O A decisão do Monzón, por exemplo, nos surpreendeu muito. É justo o jogador querer ter chances, mas o Carlinhos não deu brecha para ninguém este ano. Nem lesionado ou suspenso ele fica. Aí subiu o Ronan, jogador que sempre esteve nos meus planos. Na direita a mesma coisa com o Julião. O Samuel estava para ser negociado e pegamos o Marcelinho, que joga para caramba. Nos Emirados ele dava cabo da minha defesa sozinho. Faz a mesma função que o Rafael Marques no Botafogo. Muitos fazem críticas. O Fluminense perdeu grandes jogadores como o Thiago Neves e o Wellington Nem. Mas este ano o próprio Thiago não jogou o que se esperava. Já o Nem a gente pensava e preparava o Marcos Junior. Mas aí ele vai e se machuca. Volta e se machuca de novo. Aí complica. Como finalizador é muito superior ao Nem. A gente estava coberto para tudo. Mas não vai imaginar as coisas que acontecem. E nisso posso até me colocar como co-responsável.
O Luxemburgo disse que iria pegar seu telefone com o Fábio para que vocês pudessem conversar. Houve este contato? Como foi?
Nós conversamos coisas pontuais. Achei legal da parte dele. Coloquei o que penso e o que acho. Temos filosofias diferentes, mas disse que ele pegou um time pronto e com um ambiente f... As coisas mudam naturalmente. Eram cinco jogos sem vencer e agora são dois sem perder. Normal. Mas falei de algumas coisinhas. O grupo é excelente, mas com jogadores de personalidade. É preciso saber administrar. Tem cara ali que não pode gritar. Se gritar f... Ele vai piorar. Vai ficar triste e ter uma queda. Isso com o tempo ele vai descobrir. Tinha alguns que eu observava que não acordavam bem, por exemplo. Com a cara amarrada já no café. Aí eu ia no amigo para saber como tinha sido a noite e tal. E começava a brincar, sacanear... E o clima mudava. Mas isso é só com o tempo mesmo.
Acredita na possibilidade de um dia iniciar uma terceira passagem pelo Fluminense ou seu ciclo de fato se encerrou?
Não dá para prever, mas acho quase impossível até pelo tempo que me dou de carreira. Outro fato que me deixou magoado nesta saída era que faltavam poucos jogos para eu me tornar o segundo que mais treinou o clube em sua história (Abel comandou o Flu em 217 jogos, perdendo apenas para Ondino Viera, com 300, e Zezé Moreira, com 474). Ser terceiro já é motivo de orgulho muito grande e eu achei que iria quebrar este ano. Quando ganhei aquela camisa pelos 157 jogos no Campeonato Brasileiro fiquei muito orgulhoso. Tenho um carinho muito grande e vou até fazer um quadro.
No meio do ano você recusou as investidas que vieram de clubes dos Emirados Árabes. Mas as diretorias de lá ainda pensam em você como os próprios telefonemas mostram isso. Voltar para lá agora é uma possibilidade?
Não sei. A única certeza é que esse ano eu não trabalho mais. Se for Emirados lá em outubro a gente pode começar a conversar, mas antes disso esquece. O telefone já tocou, mas não tem conversa. O Muricy está parado. Você acha que o telefone dele não tocou? Mas eu tenho de pegar algo que eu sinta condições de ser campeão. Não tenho mais idade para apagar fogueira. Sei formar um time e um bom ambiente. Mas mágica não faço. Esse tem sido o mal de alguns colegas que mudam muito. Treinar dois ou três clubes no mesmo ano é muito ruim. Se não deu certo antes por que vai dar com você? Vê se alguém vai tirar o Oswaldo do Botafogo? Está dando certo. Se for entrar para ficar igual então f... Por isso eu falo para ter calma e não arriscar.
E no Brasil? Boatos dão conta de que o Dunga pode não continuar no Inter ano que vem. Voltar a Porto Alegre é algo que te agrada?
Eu acho que ele deve ficar. O trabalho está sendo fantástico. O Dunga está quebrando paradigmas. Foi bem na Seleção e agora no Inter. Agora todas as vezes que o Inter ficar sem treinador o meu nome será cogitado. É algo normal pela relação que eu tive. Mas o pouco que vi até nessa última vez em Porto Alegre é que o grupo está muito fechado com ele. Ele é verdadeiro como eu, não guarda besteirinha... Não tem nada disso de ranzinza.
Até quando se vê na beira do campo?
Estou com 60 anos. Se explodir mesmo mais uns quatro. Tem de ser no limite. Como não fui agora para os Emirados pegaria uns dois anos de contrato. De repente, mais uns dois aqui. Vamos ver.
E após parar? Agora você entrou como sócio no Restaurante Uniko. Trabalhar com gastronomia direto é algo que passa pela sua cabeça?
Fiquei amigo do Dionísio Chaves e do Nicola Giorgio em um dos restaurantes deles no Leblon. Aí surgiu a oportunidade neste ponto fantástico aqui no Centro da cidade. Era um negócio impressionante e eu apostei após muita conversa com a minha mulher. O processo não foi fácil. Éramos oito sócios, mas alguns saíram. Aí entrou o Fabrizio Giuliodori conosco e as coisas estão indo muito bem. Foi um negócio único, e de tanto falarem isso, batizamos como Uniko. Vamos ver. É o meu segundo restaurante, já que mantenho uma sociedade que vem dando certo em Portugal. Mexe com uma paixão minha. O futuro a gente não sabe, mas parado é certo que não vou ficar.
Mesmo com este cenário, engana-se quem pensa que era o que ele queria. A mágoa pela demissão ainda está presente. Apesar do momento ruim vivido pelo Flu, sua convicção em uma volta por cima era grande. E nas palavras nota-se que ele esperava uma consideração e uma confiança maior por parte da diretoria, principalmente após o 2012 arrasador que culminou com a conquista do Carioca e do tetracampeonato brasileiro. A demissão, na sua visão, poderia ter acontecido após a eliminação na Libertadores para o Olimpia. Mas se sobreviveu àquele trauma, não seriam cinco derrotas que causariam isso.
Abel Braga aprecia uma taça de vinho na mesa do restaurante do qual se tornou sócio (Foto: Rafael Cavalieri)
- Vou descansar. Não adianta. O telefone já tocou, mas não vou assumir nada mais neste ano. Vou para a Itália, em seguida para Portugal e termino passando alguns dias em Paris.
Entre um gole e outro de vinho, algo que costuma fazer diariamente em casa com amigos ou em restaurantes pela cidade, e recomendando os pratos do cardápio que ajudou a aprovar durante o processo de abertura da casa, Abel falou por mais de uma hora com o GLOBOESPORTE.COM. Revelou que sentia desde a pré-temporada que o ano não seria vitorioso como o passado, defendeu novamente seu ponto de vista em relação à zaga do Fluminense, alvo constante de críticas, mostrou certa mágoa com Felipe e garantiu que nunca se importou com os boatos de que Celso Barros, presidente da Unimed, já tinha tido contatos com Vanderlei Luxemburgo, que o substituiu, antes mesmo de sua demissão.
Confira a íntegra da conversa abaixo.
GLOBOESPORTE.COM: Passado pouco mais de uma semana da sua demissão, a ficha já caiu? Afinal de contas, em sua despedida você deixou claro que por você o trabalho teria uma continuidade.
Abel Braga: Não era o que queria. Jamais largaria meu grupo, ainda mais em uma situação daquelas. Fora que tinha absoluta certeza de que a má fase seria passageira. Aliás, uma fase como essa é absolutamente normal. A maioria entende pouco disso (futebol). Depois da arrancada de 2011, com aquele segundo semestre maravilhoso, de todo o ano de 2012 impecável, é absolutamente normal vir a cair. Mas as pessoas acham que não, que tem de continuar ganhando tudo. Neste ano o Flu teve uma coisa boa que foi manter o grupo. Vieram praticamente três jogadores, além dos meninos da base. O Monzón não deu certo. O Rhayner ainda será muito útil, pode ter certeza. Mas ao mesmo tempo o meu subconsciente previa que seria difícil. E isso ficou mais claro porque começamos de maneira muito ruim. Logo no primeiro dia de pré-temporada ficamos sem o Thiago Neves. Depois na mesma semana perdemos o Fred, o Deco e o Gum. São quatro titulares de uma vez. Por isso sabíamos que teríamos problemas na frente. No momento mais importante do ano, que é a pré-temporada, acontece esse tipo de coisa. É o tempo que a gente tem para acertar os detalhes, apesar de ser um tempo ridículo.
E como têm sido os seus dias de descanso?
A melhor coisa que pode acontecer quando se deixa o trabalho é o relaxamento. É desumano ser treinador no Brasil. É claro que você não desliga dos jogos, mas não vê mais com olho de treinador e sim de torcedor. Torço por alguns clubes pelos quais tenho carinho e é óbvio que o Fluminense é um deles. Além do carinho, o meu filho está lá. Mas o melhor é que ganhando, perdendo ou empatando não há mais aquele incômodo. Você consegue relaxar assistindo a um jogo. E se não conseguir assistir, tudo bem também.
A saída aconteceu após o time perder cinco partidas consecutivas no Campeonato Brasileiro. Naquele momento era algo que você esperava?
Não esperava sair pelo que fizemos de 2011 até agora. Não esperava. Depois de o clube voltar à normalidade poderia até sair. Mas ser tirado em função de cinco resultados? Queira ou não 50% do grupo veio da base. Teve o tetracampeonato brasileiro, o Carioca que não era conquistado desde minha última passagem em 2005... Tudo isso pesa. Mas tiveram duas coisas que no fundo marcaram positivamente essa passagem. O primeiro foi o fato inédito de um clube me esperar por três meses. Isso mostra o quanto tinham convicção do meu trabalho, da resposta que eu daria... E isso tudo com o ambiente ruim. Com eles tomando porrada. Agora que passou posso falar, mas fui contactado pelo Santos semanas antes do Fluminense. Adorei as pessoas, o presidente conversou comigo, mas deixei claro que não poderia ir naquele momento. Disse que se quiserem me esperar, quem sabe, mas veio uma derrota e me ligaram dizendo que não daria. Falei o mesmo que disse para o Celso e para o Peter em 2011 no meio daquela pressão. Se quiserem esperar estou dentro. Se ficar insuportável arruma outro. E me esperaram.
Por tudo isso a saída foi mais dolorosa? Você chegou a recusar propostas vantajosas financeiramente dos Emirados Árabes durante a temporada.
Quando eu tive a proposta dos Emirados foi durante a Libertadores. Respondi que não poderia dar uma posição porque estava disputando uma competição importante e a ideia de todos era ir longe. Isso aconteceu ainda na primeira fase. Nos classificamos, passamos pelo Emelec, o time vinha bem... Aí veio o Olimpia e ficamos fora. Até achava ali que poderia acontecer alguma coisa, surgir uma dispensa... Agora no Brasileiro não esperava por isso. Até pela maneira que vinha jogando. As derrotas foram provocadas por falhas pontuais nítidas para todos. Ali não esperava. Poderia ser. Até pensei, porque a frustração não foi só minha e sim de todos.
Boatos circularam dizendo que Celso Barros, presidente da Unimed, já tinha feito contatos com Vanderlei Luxemburgo no meio do ano. Você obteve essas informações? Como era sua relação com ele?
É uma situação natural ouvir esses boatos. Se vão te despedir, é necessário buscar um plano B. O que eu digo do Celso... Aqui não quero falar do lado do esporte, do torcedor... Porque em 2005 saí brigado com ele. Não tinha nenhum vínculo com a Unimed então achava que não tinha direito de escutar o que poderia acontecer. Mas agora era diferente. E acho que me dignifiquei muito. Então o que eu digo nessa convivência é que se trata de um cara boníssimo. Em dois anos e meio eu nunca o vi dizer um não. E não é para o Abel, Fred, Deco... É para todo mundo. Se tiver dentro do seu alcance ele vai te ajudar. Foi assim com o Roberto Moreno, meu observador. Com seu conhecimento ele ajudou na época do problema que ele teve no fígado. Se por ventura ele tiver alguma falha você nem considera porque nos problemas mais sérios da vida ele está sempre disposto a colaborar.
Você falou no início na espera do Fluminense por você como sendo uma das coisas que o impressionaram durante esta passagem. Qual foi a segunda?
Eu nunca vi treinador sair ganhando troféu. Como em uma despedida você ganha um troféu? Não sei te explicar o que senti na hora. Fui fazer um comunicado para vocês. Ali encerrava um ciclo e como sempre foi saio por uma porta maior do que a que entro. Um dos motivos para isso é que eu só me preocupo com o campo. Acho que esta é minha grande vantagem. Meu caráter, minha honestidade, minha lealdade... Não me meto no que está fora da minha parte. Se perguntarem minha opinião eu dou. Mas nunca cheguei e me meti em nada. Meu trabalho é com a minha comissão. E nisso o Fluminense está bem servido também. Tem um departamento médico que é brincadeira. O que esses caras aguentam de lesão... E não é coisa boba não. O trabalho é intenso em concentração, em viagem... Aliás, a estrutura de trabalho está muito boa.
Na despedida, Abel ganhou a réplica da taça de tetracampeão brasileiro da diretoria (Foto: Rafael Cavalieri)
As condições em Laranjeiras são muito boas. O vestiário está impecável. Eu colocava um DVD na minha sala e as imagens passavam nas quatro televisões. Agora o clube voltou a ter uma casa com o Maracanã, o CT está para sair... Mas ainda assim não é o ideal. Teve uma passagem que não me esqueço mais. Treinamos duas ou três vezes uma jogada de escanteio. Até mascaramos um pouco para não ficar na cara. No dia do jogo, o Deco foi pegar a bola e o posicionamento dos caras nos impediu de fazer a jogada. Ele olhou para mim e gritou: "Abel, os caras já sabem". A gente riu. Isso acontece porque ali do outro lado das Laranjeiras entra quem quer. Mas mesmo com essa situação os treinos ali não podem acabar nunca. Nem mesmo com o centro de treinamento.
Por quê?
A pulsação. O contato entre torcida e jogador. É tudo muito interessante, muito saudável... O torcedor precisa disso assim como os jogadores também. É preciso sentir a pulsação.
Após um ano praticamente irretocável em 2012, não julgou que seria benéfico para o clube realizar uma mudança em parte do elenco? Afinal de contas o Fluminense conta com muitos jogadores que estão há alguns anos no clube.
Já tinha dito para vocês e continuo com a mesma opinião. A mudança teria de acontecer no fim deste ano. Aí você precisa procurar manter uma espinha e criar novamente o grupo. O goleiro você mantém. O primeiro volante se sair, traz um outro f.. O meia vai? Traz outro f.. E por aí vai. A espinha forte precisa ser mantida. O resto é normal. Era isso ou mudar o treinador, mas isto eles já fizeram. Agora no fim do ano vai se analisar a necessidade de novas peças. Mas como disse no início, a queda é algo normal. O Internacional, o Santos, o São Paulo... Eles passaram por isso. O Santos ganhou estofo de time grande, conquistou títulos e agora passa por outra renovação. É assim. Faz parte do processo.
Houve duas frases que marcaram negativamente a sua passagem pelo clube. Até hoje muitos torcedores reclamam de quando você falou que "Era melhor empatar em 0 a 0 dentro de casa pela Libertadores do que vencer por 2 a 1". Foi o resultado que acabou acontecendo em São Januário. No fim, o Flu terminou eliminado pelo Olimpia. Se arrepende de ter dito?
O que quis dizer é que você consegue ter um aproveitamento melhor ofensivo fora de casa do que em casa. Aqui contra o Olimpia foi ataque contra defesa, mas não marcamos porque as chances foram raras. Mais ou menos o que aconteceu contra o mesmo Olimpia no Mineirão diante do Atlético-MG. E lá fizemos 1 a 0 e ficamos mais perto do segundo do que de sofrer o primeiro. É claro que o melhor é ganhar, mas na Libertadores sofrer gol em casa é um grande problema. Estou falando porque vivenciei isso no Internacional. Na semifinal contra o Libertad em 2006 sabíamos das dificuldades. Mas nós fizemos o diabo para não sofrer gol em casa. O primeiro foi 0 a 0, só que lá. Aí em casa, sem o desespero, e isso o time brasileiro sabe fazer melhor, que é ter uma estrutura ofensiva melhor sem dar o contra-ataque, ganhamos em casa por 2 a 0. Mas exemplo claro veio antes contra a LDU. Perdemos lá por 2 a 1. Aqui era o jogo que a gente tinha de ir para cima. E os caras com um timaço defenderam muito, mas a vitória veio. Falei em função do que conheço e do que já vivi. E por isso ficou um mal entendido.
A outra frase marcante foi: "Temos zagueiros para os próximos seis anos". O setor é o que mais sofre com críticas da torcida. Mesmo diante das falhas que aconteceram nos seus últimos jogos você mantém esta opinião?
Em 2010 essa defesa foi campeã sendo a menos vazada. Em 2011 fizeram um segundo turno impecável após a minha chegada. O Elivélton com fratura na canela se entregava de maneira impressionante. Em 2012 a zaga novamente foi campeã brasileira sendo a menos vazada. Por que tirar o valor deles? Não vou nem falar do Gum e do Euzébio que já são mais rodados. O Digão é um grande jogador. Você vê que é acima do normal, mesmo com uma falha ou outra que tenha acontecido. O Anderson para mim é um dos melhores zagueiros com quem já trabalhei. Você olha e não diz qual a perna dele. E é um cara fantástico ofensivamente também. Mas foram três lesões na mesma perna, uma pena. Então vamos parar com isso. Como foram as falhas? Tomamos um gol olímpico de uma bola leve. Não aquele chute forte, estilo Ronaldinho Gaúcho. E já contra o Vasco o Cavalieri já estava voltando a ser o de sempre com grandes defesas. O Digão teve uma falha pontual. Antes ele foi lá e marcou duas vezes contra o Criciúma. Contra o Vasco a falha foi do Edinho e não da zaga. E ele tem muita personalidade. No dia seguinte já superou. É injusto colocar na conta da zaga por causa de algumas falhas pontuais em um momento que as coisas não vão bem. O Fred perdeu o pênalti contra o Cruzeiro, mas o Fluminense venceu. Mas o Digão falhou contra o Inter e o time perdeu. Aí f... O goleiro falhou e perdeu? F... E os jogadores que chegam pelo patrocinador são todos do meio para a frente. É Thiago Neves, Conca, Fred, Deco... Isso ajuda a colocar uma carga maior na defesa. Ninguém vai me provar que esses caras mais jovens, Digão, Elivélton, Wellington Carvalho, não vão estourar. Não tenho dúvida disso. Fui zagueiro, p... Sei do que falo. Amanhã, se estou indo para um clube, eu venho buscá-los. Não tenha dúvida disso.
O Felipe foi uma decepção para você nesta temporada?
Não foi uma decepção, até porque quando foi contratado teve minha aprovação. Se não fosse aprovado não viria. Mas antes de fechar eu liguei para ele e avisei que o time estava fechado, que teria de buscar espaço, mas que não iria deixá-lo voltar para o Catar para encerrar a carreira longe do seu país. Mas confesso que sua última entrevista me decepcionou. Não gostei da maneira como ele falou. Eu acreditava nele como também nos demais. Assim, não me magoou, mas achei desproposital.
Mas e o desempenho dele? As chances foram poucas e agora com o Luxemburgo ele entrou nos dois jogos.
É a ordem natural das coisas. Como disse, o esquema estava definido. Mas passei a jogar com Deco e Wagner e de repente era o momento dele. Como foi na verdade. O Deco saiu e ele entrou. Isso iria acontecer também. Mas foi tudo muito estranho. Contra o Grêmio ele não viajou em função de uma dor na perna. Dias depois estava bom e jogou contra o Cruzeiro? Agora falou em acreditar? Futebol é assim. As coisas passam muito rapidamente pela cabeça das pessoas. Não deixo de gostar dele, ainda mais porque sei do seu carinho pelo Fábio. Isso é legal.
Falando no Fábio, acredita que agora ele terá condições de evoluir ainda mais sem o pai no comando técnico?
Sim. Com certeza. A nossa relação estava até ruim. A saída vai ser melhor para mim e para ele. O Fábio deu um salto porque conquistou a agressividade que faltava a ele. O volante precisa ter agressividade. Não é só dar porrada e nem só a técnica que ele tem. Seu passe é diferenciado para a posição. Mas o convívio com o Edinho, Diguinho, Valencia trouxe isso. Só que ao mesmo tempo acredito que uma saída do futebol brasileiro seria ainda mais benéfica. Ele tem passaporte português em casa. O Fluminense facilita nestes casos: empresta com passe fixado. Acho que para amadurecimento seria muito bom.
Muito se falou no fato de o Fluminense ter contratado apenas um jogador, o atacante Marcelinho, neste meio de ano. Após a eliminação na Libertadores não discutiu reforços com a diretoria?
Nós pensamos muito. O A decisão do Monzón, por exemplo, nos surpreendeu muito. É justo o jogador querer ter chances, mas o Carlinhos não deu brecha para ninguém este ano. Nem lesionado ou suspenso ele fica. Aí subiu o Ronan, jogador que sempre esteve nos meus planos. Na direita a mesma coisa com o Julião. O Samuel estava para ser negociado e pegamos o Marcelinho, que joga para caramba. Nos Emirados ele dava cabo da minha defesa sozinho. Faz a mesma função que o Rafael Marques no Botafogo. Muitos fazem críticas. O Fluminense perdeu grandes jogadores como o Thiago Neves e o Wellington Nem. Mas este ano o próprio Thiago não jogou o que se esperava. Já o Nem a gente pensava e preparava o Marcos Junior. Mas aí ele vai e se machuca. Volta e se machuca de novo. Aí complica. Como finalizador é muito superior ao Nem. A gente estava coberto para tudo. Mas não vai imaginar as coisas que acontecem. E nisso posso até me colocar como co-responsável.
O Luxemburgo disse que iria pegar seu telefone com o Fábio para que vocês pudessem conversar. Houve este contato? Como foi?
Nós conversamos coisas pontuais. Achei legal da parte dele. Coloquei o que penso e o que acho. Temos filosofias diferentes, mas disse que ele pegou um time pronto e com um ambiente f... As coisas mudam naturalmente. Eram cinco jogos sem vencer e agora são dois sem perder. Normal. Mas falei de algumas coisinhas. O grupo é excelente, mas com jogadores de personalidade. É preciso saber administrar. Tem cara ali que não pode gritar. Se gritar f... Ele vai piorar. Vai ficar triste e ter uma queda. Isso com o tempo ele vai descobrir. Tinha alguns que eu observava que não acordavam bem, por exemplo. Com a cara amarrada já no café. Aí eu ia no amigo para saber como tinha sido a noite e tal. E começava a brincar, sacanear... E o clima mudava. Mas isso é só com o tempo mesmo.
Abel ganhou camisa após 157 jogos pelo Flu no
Brasileiro (Foto: Nelson Perez/Fluminense F.C.)
Brasileiro (Foto: Nelson Perez/Fluminense F.C.)
Não dá para prever, mas acho quase impossível até pelo tempo que me dou de carreira. Outro fato que me deixou magoado nesta saída era que faltavam poucos jogos para eu me tornar o segundo que mais treinou o clube em sua história (Abel comandou o Flu em 217 jogos, perdendo apenas para Ondino Viera, com 300, e Zezé Moreira, com 474). Ser terceiro já é motivo de orgulho muito grande e eu achei que iria quebrar este ano. Quando ganhei aquela camisa pelos 157 jogos no Campeonato Brasileiro fiquei muito orgulhoso. Tenho um carinho muito grande e vou até fazer um quadro.
No meio do ano você recusou as investidas que vieram de clubes dos Emirados Árabes. Mas as diretorias de lá ainda pensam em você como os próprios telefonemas mostram isso. Voltar para lá agora é uma possibilidade?
Não sei. A única certeza é que esse ano eu não trabalho mais. Se for Emirados lá em outubro a gente pode começar a conversar, mas antes disso esquece. O telefone já tocou, mas não tem conversa. O Muricy está parado. Você acha que o telefone dele não tocou? Mas eu tenho de pegar algo que eu sinta condições de ser campeão. Não tenho mais idade para apagar fogueira. Sei formar um time e um bom ambiente. Mas mágica não faço. Esse tem sido o mal de alguns colegas que mudam muito. Treinar dois ou três clubes no mesmo ano é muito ruim. Se não deu certo antes por que vai dar com você? Vê se alguém vai tirar o Oswaldo do Botafogo? Está dando certo. Se for entrar para ficar igual então f... Por isso eu falo para ter calma e não arriscar.
E no Brasil? Boatos dão conta de que o Dunga pode não continuar no Inter ano que vem. Voltar a Porto Alegre é algo que te agrada?
Eu acho que ele deve ficar. O trabalho está sendo fantástico. O Dunga está quebrando paradigmas. Foi bem na Seleção e agora no Inter. Agora todas as vezes que o Inter ficar sem treinador o meu nome será cogitado. É algo normal pela relação que eu tive. Mas o pouco que vi até nessa última vez em Porto Alegre é que o grupo está muito fechado com ele. Ele é verdadeiro como eu, não guarda besteirinha... Não tem nada disso de ranzinza.
Até quando se vê na beira do campo?
Estou com 60 anos. Se explodir mesmo mais uns quatro. Tem de ser no limite. Como não fui agora para os Emirados pegaria uns dois anos de contrato. De repente, mais uns dois aqui. Vamos ver.
E após parar? Agora você entrou como sócio no Restaurante Uniko. Trabalhar com gastronomia direto é algo que passa pela sua cabeça?
Fiquei amigo do Dionísio Chaves e do Nicola Giorgio em um dos restaurantes deles no Leblon. Aí surgiu a oportunidade neste ponto fantástico aqui no Centro da cidade. Era um negócio impressionante e eu apostei após muita conversa com a minha mulher. O processo não foi fácil. Éramos oito sócios, mas alguns saíram. Aí entrou o Fabrizio Giuliodori conosco e as coisas estão indo muito bem. Foi um negócio único, e de tanto falarem isso, batizamos como Uniko. Vamos ver. É o meu segundo restaurante, já que mantenho uma sociedade que vem dando certo em Portugal. Mexe com uma paixão minha. O futuro a gente não sabe, mas parado é certo que não vou ficar.
Abel Braga ao lado de dois dos sócios do Uniko, seu restaurante no Centro da cidade (Foto: Rafael Cavalieri)
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