domingo, 25 de janeiro de 2015

Mundo afora: "terceiro grande" do Uruguai, Rampla tem estádio pitoresco

Campo do time de Montevidéu fica na beira do Rio da Prata e é de estrutura simples. Clube é centenário, possui histórica rica, mas vive período de altos e baixos


Por
Montevidéu, Uruguai



Quando se chega de avião a Montevidéu, um olhar atento ainda das nuvens por quem é apaixonado por futebol revela uma característica da capital uruguaia: ela é repleta de estádios de futebol. Desde o imponente e tradicional Centenário até os mais simples, um deles se destaca na paisagem, colado com o Rio da Prata, na região portuária da cidade: o Estádio Olímpico, do modesto Rampla Juniors, um dos times mais antigos do país.

- É o estádio mais largo do mundo, por causa da distância entre as tribunas – brincou o presidente do clube, Lucas Blasina, em alusão ao fato de, na verdade, só haver tribuna de um lado do campo; do outro, está um muro e, em seguida, surgem as águas do Rio da Prata.

Esta é a casa do clube considerado o terceiro grande do Uruguai. A alcunha deve-se mais à rica história do Rampla Juniors, que completou 100 anos em 2014, do que propriamente aos resultados esportivos recentes. Os Picapiedras, como são conhecidos, ganharam a liga nacional apenas uma vez, em 1927, ainda na era do futebol amador, e jamais disputaram a Libertadores ou a Copa Sul-Americana – em sua sala de troféus, há outros torneios de menor expressão no país, entre eles a comemorativa Copa Maracanã, disputada sugestivamente em 1950.


mosaico rampla uruguai (Foto: Editoria de Arte)
Campo do Rampla fica à beira do Rio da Prata, 
onde casco de navio tem homenagem ao clube 
(Fotos: Felipe Schmidt)


O Rampla está no humilde bairro Villa del Cerro, uma área residencial, perto da parte mais badalada de Montevidéu. Ali mora o atual presidente uruguaio, Pepe Mujica, que torce para o Cerro, grande rival dos Picapiedras. As duas equipes, aliás, disputam um dos clássicos mais famosos do país, considerado por muitos o segundo mais importante, perdendo apenas para o dérbi entre Peñarol e Nacional.

- É como o clássico entre Peñarol e Nacional, mas em menor escala. São dois times do mesmo bairro, o ambiente é mais familiar. Historicamente, o Rampla é conhecido por jogar um futebol mais técnico, enquanto o Cerro é mais aguerrido – explicou Edson Pérez, torcedor do Rampla.


VÍTIMA DO FUTEBOL MODERNO

A sede social do Rampla é antiga, e o estádio é dos mais simples. Quando a reportagem do GloboEsporte.com chegou ao campo, com entrada escancarada, havia dois técnicos da base, poucos torcedores e alguns cachorros, preguiçosamente deitados no caminho rumo ao gramado. Um ambiente intimista e pouco comum na elite do futebol.

Estádio Olímpico de Montevidéu Rampla Juniors (Foto: Fernando Schmidt)
Fachada do Estádio Olímpico do Rampla, com 
o gramado e o Rio da Prata ao fundo - e o cão 
ao lado (Foto: Felipe Schmidt)


Talvez esta característica do Rampla explique por que o clube não conseguiu se manter entre os grandes, como Peñarol e Nacional. Para Lucas Blasina, no comando do clube desde 2007, as mudanças pelas quais o futebol passou nos últimos anos atingiram em cheio os Picapiedras.

- Até a década de 1960 fomos grandes, mas depois aconteceu uma mudança importante na estrutura socioeconômica nesta localidade. Aqui em Cerro havia muitos frigoríficos, que desapareceram. Isso fez com que o Rampla mudasse sua condição, de ser grande com tradição de excelência para ter muitos altos e baixos. Sentiu o golpe. Foi consequência da mudança no futebol e na estrutura local. Em 1966, por exemplo, Luis Ubiña, que disputou a Copa do Mundo, jogava no Rampla e trabalhava oito horas numa fundição. Bem diferente do futebol de hoje. O Rampla trazia jogadores do interior e dava trabalho a eles nos frigoríficos. Se não tem mais frigorífico, não pode mais fazer isso. O futebol mudou também – explicou Blasina.

No ano em que completou 100 anos, o Rampla teve uma alegria: retornou à elite do futebol uruguaio. Mas ainda está longe de uma situação estável – terminou o Torneio Apertura em 14º lugar, entre 16 times, e convive com a ameaça do rebaixamento. Para Edson Pérez, apaixonado pelo clube, esta é a tônica da equipe. Questionado sobre as alegrias que tem com os Picapiedras, ele demorou para responder, mostrou um semblante de resignação e filosofou:

- É preciso avaliar o que é alegria (risos). Com o Rampla, até as vitórias são sofridas. Podemos estar vencendo por 1 a 0 até os 45 minutos do segundo tempo, mas a água está sempre no pescoço. Esperamos fazer um bom Torneio Clausura para ficarmos mais aliviados.


SITUAÇÃO ECONÔMICA "AMEAÇA" VISTA DO ESTÁDIO

Fora de campo, o lema também é sobrevivência. Segundo o presidente Blasina, o Rampla tem um dos orçamentos mais baixos da primeira divisão. É preciso trabalhar com esforço para atender às demandas diárias. Valorizar as divisões de base é um dos objetivos da diretoria.
- Precisamos trabalhar de forma diferente, trabalhar na base. O Rampla está sofrendo este processo de mudança. O clube trabalha sozinho, com muitas dificuldades, tem um orçamento muito curto, e isso dificulta todo o investimento na base. Além disso, não tem tradição de trabalhar neste sentido. Estamos tentando fazer essa mudança, mas é algo difícil de fazer.

Estádio Olímpico de Montevidéu Rampla Juniors (Foto: Fernando Schmidt)
Presidente do Rampla Juniors, Luca Blasina 
cogita construir tribuna do lado do rio 
(Foto: Felipe Schmidt)


As necessidades econômicas fazem com que até um dos maiores orgulhos do clube possa ser alterado. O Estádio Olímpico é um dos mais inusitados do mundo, com sua vista para o Rio da Prata. Apesar do nome imponente, tem capacidade para seis mil pessoas – foi batizado desta forma porque o dono do terreno é grego e quis homenagear o país natal. Para aumentar a estrutura, Blasinas não descarta erguer outra tribuna e atrapalhar um pouco o visual.

- O estádio é um orgulho para nós, tem muito valor histórico e uma vista maravilhosa. Mas já está em consideração uma tribuna. Vamos tentar fazer uma tribuna bem baixa, para colocar umas 1500 pessoas, justamente para manter a vista. Mas este projeto não é prioridade.
Assim, entre o orgulho de seu passado e os desafios do futuro, o Rampla Juniors tenta se manter no futebol moderno: num estádio em que as bolas caem na água, com torcedores apaixonados e exigentes.

- As pessoas pensam que ainda somos o terceiro grande e exigem muito, mas a realidade é que não somos mais, porque os resultados esportivos mostram isso. Para voltarmos a ser, temos que começar a nos moldar à realidade do futebol uruguaio, ter um bom trabalho de base, o que implica investir, e os recursos são limitados. Estamos melhores que há 10 anos, mas é um processo lento de desenvolvimento – completou Blasina.


FONTE:

Nenhum comentário: