Reportagem do GLOBOESPORTE.COM esteve na prisão em Oruro para visitar os 12 corintianos detidos há 45 dias na Bolívia
É dia de visita na Penitenciária San Pedro, em Oruro, na Bolívia. Lá
dentro, os 12 corintianos presos como suspeitos da morte do menino
Kevin, atingido por um sinalizador no dia 20 de fevereiro, no empate
entre San José e Corinthians, completam 45 dias de cárcere. Desanimados,
ainda sonham com a liberação.
Do lado de fora, duas filas se formam. Uma para homens, outra para as mulheres. A primeira anda mais rápido, porque a quantidade de senhoras visitando parentes e amigos chega ser quase o triplo. De minuto em minuto, o portão de ferro se abre e um oficial pede para que os próximos a entrar apresentem seus documentos.
A partir daí começa a saga de quem pretende ver um dos detentos da
Penitenciária San Pedro. Esse primeiro policial, de cara, carimba seu
braço para identificá-lo como visitante. À esquerda, em um cubículo de
alumínio, um senhor pede para que os visitantes deixem seus celulares. É
preciso pagar dois bolivianos (R$ 0,50).
Já dentro do presídio, novamente homens e mulheres se dividem. Elas do lado esquerdo. Eles do lado direito. O próximo passo é ser registrado no livro de visitas. Dois oficiais controlam a vistoria aos documentos, anotam os dados da pessoa, escrevem o número no braço, tal como está registrado nas anotações, e carimbam.
Com dois carimbos na pele mais os números de identificação escritos à caneta, o visitante tem de ser revistado. Primeiro o corpo, depois a mochila. Na mala, eles procuram celulares, remédios (que só podem entrar mediante receita médica, salvo os mais genéricos). Tirar fotos dentro da penitenciária é proibido. A revista parece bem superficial.
Enquanto o visitante aguarda para ser revistado, alguns presos acenam
do pátio e gritam perguntando por quem estão procurando e ficam ali, à
espera. Antes de entrar definitivamente no mesmo ambiente dos detentos,
outro policial dá o terceiro carimbo e faz um número zero: “É para saber
que você entrou”, diz.
Ao dar o primeiro passo no pátio é possível entender quem são aqueles presos que ficam perguntando a todos quem são os visitados. Essas pessoas são chamadas de “táxis”. Elas conhecem a prisão de ponta a ponta e têm na cabeça quem são os detentos e onde eles costumam ficar alojados. É o ganha pão deles.
Assim que você diz quem quer ver, eles fazem a correria e o levam até lá. Desde que em troca recebam algumas moedas, algumas vezes até notas maiores. Ao perceberem, então, que se trata de brasileiros, os “táxis” logo começam a gritar “los 12 brasileños?”, “la gente de Corinthians?”.
Depois de 45 dias na prisão de Oruro, os brasileiros alvinegros já
sabem como funcionam as leis internas. E sabendo da pressão que os
visitantes sofrem para dar um trocado, prontamente saem de suas celas
para acompanhar e amenizar a pressão dos outros detentos bolivianos.
Como ainda estão sob investigação e não foram condenados, os 12 torcedores do Corinthians, suspeitos da morte do garoto Kevin (no Brasil, o menor H.A.M., de 17 anos, confessou o disparo do sinalizador, mas a Justiça da Bolívia não aceitou), estão divididos em duas celas mais privativas, num setor fechado. Apesar de livros serem proibidos, os brasileiros estão lendo um exemplar de "Memórias do Velho Vamp", do ex-jogador Vampeta.
Os demais presos, aqueles já condenados, ficam em barracões, que chegam a ter até 100 pessoas dentro – a Penitenciária San Pedro conta atualmente com 600 detentos. Recentemente, os policiais bolivianos quiseram tirar os corintianos dessa área mais reservada, mas, após intervenção da embaixada, desistiram.
Está certo que as condições dos brasileiros na penitenciária não são das melhores, mas seguir nessas duas celas mais reservadas é algo que dá mais segurança a todos eles. Ambas são muito pequenas. Os colchões ficam colados uns nos outros. Em volta, as mochilas penduradas e os objetos de higiene pessoal.
Por falar em higiene pessoal, a chegada da reportagem o
GLOBOESPORTE.COM coincidiu com o retorno da água. O presídio estava
havia três dias sem abastecimento. Consequentemente, todos os detentos
estavam sem banho pelo mesmo período. Muitos carregavam baldes cheios
para suas celas.
Nas paredes das duas celas dos corintianos, pedidos de justiça ("Força aos 12 inocentes", diz um dos cartazes, feito pelo filho de um detento boliviano). Pôsteres do Corinthians mostram o amor deles pelo clube, mas os rostos carregam o abatimento e o estresse de 45 dias de prisão.
Pelo telefone público, o contato dos 12 com as famílias é diário. De manhã, de tarde e de noite. Os assuntos? Sempre os mesmos: notícias sobre a liberação deles e sobre os familiares e amigos. Ao vivo, um grupo de senhoras que vive em Oruro se reveza na visita aos brasileiros. Elas levam comida, lavam as roupas deles...
Orientados pelo advogado Miguel Blancourt a não dar entrevistas pelo menos até esta sexta-feira, quando uma comitiva de deputados brasileiros vai visitá-los, os 12 corintianos iniciam a conversa arredios, mas aos poucos se soltam e
relatam alguns sentimentos. Na prisão, o humor se altera muito rapidamente.
Dia-a-dia.
- É muito difícil você acordar todos os dias e ver uma grade.
- É horrível você participar de uma contagem de presos.
- Estou cansado de ter paciência e calma.
- Se a gente fosse culpado, ainda estaríamos conformados. Mas como somos inocentes, é difícil ficar aqui e passar por isso.
Essas são apenas algumas das frases ouvidas durante os pouco mais de 30 minutos que o GLOBOESPORTE.COM ficou em contato com os brasileiros detidos em Oruro. Ao final, duas senhoras passaram nas duas celas chamando os corintianos para uma oração. Eles rezaram o Pai Nosso e a Ave Maria e se despediram.
Antes, três deles acompanharam todos aqueles que estavam lá para vê-los para evitar o assédio dos “táxis”. Inevitável. Antes de ir embora, ainda foi possível escutar: “Monedas, monedas, solamente unas monedas” (moedas, moedas, somente umas moedas). Eles são insistentes.
Por fim, a retirada dos documentos e dos celulares de volta é tranquila. Mas o bater forte do portão de ferro na saída dá uma sensação de que, do lado de dentro, a tensão continua.
FONTE:
http://globoesporte.globo.com/futebol/times/corinthians/noticia/2013/04/dia-de-visita-na-penitenciaria-san-pedro-tensao-desanimo-e-oracao.html
Do lado de fora, duas filas se formam. Uma para homens, outra para as mulheres. A primeira anda mais rápido, porque a quantidade de senhoras visitando parentes e amigos chega ser quase o triplo. De minuto em minuto, o portão de ferro se abre e um oficial pede para que os próximos a entrar apresentem seus documentos.
Entrada da Penitenciária San Pedro, em Oruro, onde estão os 12 corintianos (Foto: Leandro Canônico)
Já dentro do presídio, novamente homens e mulheres se dividem. Elas do lado esquerdo. Eles do lado direito. O próximo passo é ser registrado no livro de visitas. Dois oficiais controlam a vistoria aos documentos, anotam os dados da pessoa, escrevem o número no braço, tal como está registrado nas anotações, e carimbam.
Com dois carimbos na pele mais os números de identificação escritos à caneta, o visitante tem de ser revistado. Primeiro o corpo, depois a mochila. Na mala, eles procuram celulares, remédios (que só podem entrar mediante receita médica, salvo os mais genéricos). Tirar fotos dentro da penitenciária é proibido. A revista parece bem superficial.
Visitante tem braço carimbado para controle da polícia boliviana (Foto: Leandro Canônico)
Ao dar o primeiro passo no pátio é possível entender quem são aqueles presos que ficam perguntando a todos quem são os visitados. Essas pessoas são chamadas de “táxis”. Elas conhecem a prisão de ponta a ponta e têm na cabeça quem são os detentos e onde eles costumam ficar alojados. É o ganha pão deles.
Assim que você diz quem quer ver, eles fazem a correria e o levam até lá. Desde que em troca recebam algumas moedas, algumas vezes até notas maiores. Ao perceberem, então, que se trata de brasileiros, os “táxis” logo começam a gritar “los 12 brasileños?”, “la gente de Corinthians?”.
É muito difícil você acordar todos os dias e ver uma grade"
Corintiano preso
Como ainda estão sob investigação e não foram condenados, os 12 torcedores do Corinthians, suspeitos da morte do garoto Kevin (no Brasil, o menor H.A.M., de 17 anos, confessou o disparo do sinalizador, mas a Justiça da Bolívia não aceitou), estão divididos em duas celas mais privativas, num setor fechado. Apesar de livros serem proibidos, os brasileiros estão lendo um exemplar de "Memórias do Velho Vamp", do ex-jogador Vampeta.
Os demais presos, aqueles já condenados, ficam em barracões, que chegam a ter até 100 pessoas dentro – a Penitenciária San Pedro conta atualmente com 600 detentos. Recentemente, os policiais bolivianos quiseram tirar os corintianos dessa área mais reservada, mas, após intervenção da embaixada, desistiram.
Está certo que as condições dos brasileiros na penitenciária não são das melhores, mas seguir nessas duas celas mais reservadas é algo que dá mais segurança a todos eles. Ambas são muito pequenas. Os colchões ficam colados uns nos outros. Em volta, as mochilas penduradas e os objetos de higiene pessoal.
Estou cansado de ter paciência e calma"
Detento corintiano
Nas paredes das duas celas dos corintianos, pedidos de justiça ("Força aos 12 inocentes", diz um dos cartazes, feito pelo filho de um detento boliviano). Pôsteres do Corinthians mostram o amor deles pelo clube, mas os rostos carregam o abatimento e o estresse de 45 dias de prisão.
Pelo telefone público, o contato dos 12 com as famílias é diário. De manhã, de tarde e de noite. Os assuntos? Sempre os mesmos: notícias sobre a liberação deles e sobre os familiares e amigos. Ao vivo, um grupo de senhoras que vive em Oruro se reveza na visita aos brasileiros. Elas levam comida, lavam as roupas deles...
Orientados pelo advogado Miguel Blancourt a não dar entrevistas pelo menos até esta sexta-feira, quando uma comitiva de deputados brasileiros vai visitá-los, os 12 corintianos iniciam a conversa arredios, mas aos poucos se soltam e
relatam alguns sentimentos. Na prisão, o humor se altera muito rapidamente.
Dia-a-dia.
- É muito difícil você acordar todos os dias e ver uma grade.
- É horrível você participar de uma contagem de presos.
- Estou cansado de ter paciência e calma.
- Se a gente fosse culpado, ainda estaríamos conformados. Mas como somos inocentes, é difícil ficar aqui e passar por isso.
Essas são apenas algumas das frases ouvidas durante os pouco mais de 30 minutos que o GLOBOESPORTE.COM ficou em contato com os brasileiros detidos em Oruro. Ao final, duas senhoras passaram nas duas celas chamando os corintianos para uma oração. Eles rezaram o Pai Nosso e a Ave Maria e se despediram.
Antes, três deles acompanharam todos aqueles que estavam lá para vê-los para evitar o assédio dos “táxis”. Inevitável. Antes de ir embora, ainda foi possível escutar: “Monedas, monedas, solamente unas monedas” (moedas, moedas, somente umas moedas). Eles são insistentes.
Por fim, a retirada dos documentos e dos celulares de volta é tranquila. Mas o bater forte do portão de ferro na saída dá uma sensação de que, do lado de dentro, a tensão continua.
FONTE:
http://globoesporte.globo.com/futebol/times/corinthians/noticia/2013/04/dia-de-visita-na-penitenciaria-san-pedro-tensao-desanimo-e-oracao.html
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