Assassinado após fazer um gol contra na Copa de 1994, jogador é visto como exemplo no país, que conseguiu conter violência após o incidente
É
difícil entrevistar Santiago Escobar, especialmente no dia em que se
completaram 20 anos da morte de seu irmão famoso, Andrés. Na zona nobre
de Medellín, o ex-jogador e treinador é interrompido a cada cinco
minutos para ser cumprimentado. As mensagens são de pêsames, mas
enaltecem os feitos do zagueiro que ficou famoso em 1994, quando marcou
um gol contra pela seleção colombiana na Copa do Mundo e, dias depois,
acabou assassinado na cidade natal.
– Vamos ganhar do Brasil, e espero que os jogadores levantem os braços para o céu e dediquem a vitória a Andrés – diz um homem que passou para trocar algumas palavras com Santiago.
Homenagens não faltaram a Andrés Escobar desde que ele foi assassinado com seis tiros na saída de uma discoteca em Medellín, poucos dias depois da eliminação da Colômbia na Copa do Mundo dos Estados Unidos. Um dos jogadores mais queridos da primeira grande geração colombiana, o "Cavalheiro dos Gramados" foi vítima de um momento bastante complicado em seu país, mas, mesmo que de forma trágica, ajudou a nação a evoluir.
Santiago Escobar é testemunha disso. Nesta quarta-feira, 2 de julho, representou o irmão numa grande homenagem realizada pelo Atlético Nacional, clube pelo qual Andrés jogou, com a presença de muitos torcedores. Para Sanchi, ali estava o exemplo da influência do ex-zagueiro para as gerações mais jovens da Colômbia.
– Fiquei impressionado com a forma como uma pessoa é recordada constantemente, mesmo depois de 20 anos. Andrés deixou um legado muito grande no nosso país e no mundo, porque sua morte teve repercussão internacional. Ele deixou o exemplo, a educação. Era uma pessoa muito honesta e trabalhadora, era querido por crianças, jovens, adultos e idosos – disse Santiago.
Um dos fãs de Andrés Escobar é o taxista Mauricio Ramirez. Crescido em Medellín, ele viu de perto como a violência da cidade levou embora um dos principais jogadores do país.
– Escobar era muito educado e amável. Ajudava muito as pessoas. Por isso, todos gostavam dele. Mas Medellín, há 20 anos, era muito diferente. Tinha bastante violência, delinquência. Todos viviam com medo. Uma vez, eu estava num campo de futebol assistindo a uma partida quando chegaram pessoas distribuindo panfletos pregando morte aos maconheiros. Todas as pessoas foram embora do estádio, porque ficaram com medo de que chegassem bandidos atirando.
Narcotráfico e futebol
Andrés foi mais uma das vítimas do domínio do narcotráfico na Colômbia. Um ano antes de sua morte, outro Escobar famoso, o traficante Pablo, havia sido assassinado pela polícia em Medellín, cidade que controlava. Segundo as investigações da polícia, o zagueiro foi vítima de pessoas que haviam apostado fortemente na Copa do Mundo. Humberto Castro Muñoz, guarda-costas de um criminoso local, foi condenado a 43 anos de prisão pelo assassinato do jogador, mas deixou a cadeia após 11 anos, por bom comportamento.
Naquela
época, o clima na Colômbia era de confiança em relação à seleção. Com
nomes como Asprilla, Higuita, Rincón e Valderrama, a equipe era tida
como uma das favoritas no Mundial de 1994. Mas o que aconteceu nos EUA
foi o oposto: derrotas para Romênia e os anfitriões significaram a
eliminação ainda na fase de grupos. Contra os donos da casa, Escobar
marcou o primeiro gol do jogo, contra, ao tentar cortar um cruzamento de
Harkes (veja o gol no vídeo ao lado). Era o início de seu fim.
– Ele ficou muito triste, porque nunca havia feito um gol contra, e isso aconteceu justamente quando o Milan queria contratá-lo. Depois da partida contra os EUA, fui ao hotel e o abracei. Disse para ele não se preocupar, porque havia sido um acidente. Ele estava com medo de não ser mais contratado – relatou Santiago.
A partida contra os EUA aconteceu no dia 22 de junho. A Colômbia ainda jogou sua última partida na Copa e venceu a Suíça por 2 a 0 antes de voltar para casa. Na noite do dia 1º de julho, Escobar saiu com amigos para uma discoteca no bairro El Poblado, zona nobre de Medellín. Durante a noite, foi constantemente incomodado por pessoas que insistiam em lembrar-lhe do gol contra.
– Quando meu irmão saiu da discoteca, estava no estacionamento e foi pedir respeito a estas pessoas. Mas os assassinos estavam metidos com o narcotráfico, andavam armados e supostamente haviam apostado um dinheiro importante na Copa. Eles não gostaram do pedido de Andrés e lhe deram seis tiros – contou Santiago.
Entretanto, há outras interpretações para o crime. Técnico da seleção colombiana em 1994, Francisco Maturana acredita que o gol contra não foi a causa da morte de Escobar, mas sim o clima de violência no país na época.
– Aquela era uma época de alta criminalidade, de intolerância. Não creio que o gol contra causou a morte de Escobar. Mas é preciso lembrar as coisas boas dele. Sua maneira de levar a vida, sua lealdade. Minha relação com ele era muito boa, e o tenho no meu coração, com recordações bonitas – defendeu o treinador.
Medellín, um novo lugar
Hoje, o consenso é de que a Colômbia evoluiu. O lugar onde Escobar foi assassinado virou um canteiro abandonado, mas no restante de Medellín o progresso é exaltado por todos. Andrés é lembrado constantemente: dá nome a um centro esportivo no bairro de Belén, onde também há uma estátua sua. Na quarta-feira, torcedores iam ao local para tirar fotos e deixar flores.
– Sem dúvida, o país está muito melhor hoje, com mais progresso e desenvolvimento. Ainda há violência, ainda acontecem coisas difíceis de compreender, mas está muito melhor. Há 20 anos as cidades conviviam com ameaças de bombas, milhares de pessoas morriam. Era um país muito inseguro – analisou Santiago Escobar.
O taxista Ramirez assina embaixo.
– Medellín mudou muito nos últimos anos. Melhorou uns 90%.
Um exemplo do novo momento da Colômbia é justamente a seleção nacional. A geração atual é tida como a melhor desde a de 1994, que tinha Andrés Escobar. Contra o Brasil, na próxima sexta-feira, estes novos jogadores entrarão em campo numa situação completamente diferente daquela de duas décadas atrás.
– A morte de Andrés foi atípica, espero que não volte a acontecer algo desta natureza. De uma maneira ou de outra, acho que o incidente com meu irmão serviu para que os jovens o usem como exemplo em muitos aspectos da vida – completou Sanchi.
FONTE:
http://globoesporte.globo.com/futebol/selecoes/colombia/noticia/2014/07/o-legado-e-o-novo-momento-20-anos-apos-morte-de-escobar-na-colombia.html
– Vamos ganhar do Brasil, e espero que os jogadores levantem os braços para o céu e dediquem a vitória a Andrés – diz um homem que passou para trocar algumas palavras com Santiago.
Estátua em homenagem a Andrés Escobar no
bairro de Belén (Foto: Felipe Schmidt)
Homenagens não faltaram a Andrés Escobar desde que ele foi assassinado com seis tiros na saída de uma discoteca em Medellín, poucos dias depois da eliminação da Colômbia na Copa do Mundo dos Estados Unidos. Um dos jogadores mais queridos da primeira grande geração colombiana, o "Cavalheiro dos Gramados" foi vítima de um momento bastante complicado em seu país, mas, mesmo que de forma trágica, ajudou a nação a evoluir.
Santiago Escobar é testemunha disso. Nesta quarta-feira, 2 de julho, representou o irmão numa grande homenagem realizada pelo Atlético Nacional, clube pelo qual Andrés jogou, com a presença de muitos torcedores. Para Sanchi, ali estava o exemplo da influência do ex-zagueiro para as gerações mais jovens da Colômbia.
– Fiquei impressionado com a forma como uma pessoa é recordada constantemente, mesmo depois de 20 anos. Andrés deixou um legado muito grande no nosso país e no mundo, porque sua morte teve repercussão internacional. Ele deixou o exemplo, a educação. Era uma pessoa muito honesta e trabalhadora, era querido por crianças, jovens, adultos e idosos – disse Santiago.
Um dos fãs de Andrés Escobar é o taxista Mauricio Ramirez. Crescido em Medellín, ele viu de perto como a violência da cidade levou embora um dos principais jogadores do país.
– Escobar era muito educado e amável. Ajudava muito as pessoas. Por isso, todos gostavam dele. Mas Medellín, há 20 anos, era muito diferente. Tinha bastante violência, delinquência. Todos viviam com medo. Uma vez, eu estava num campo de futebol assistindo a uma partida quando chegaram pessoas distribuindo panfletos pregando morte aos maconheiros. Todas as pessoas foram embora do estádio, porque ficaram com medo de que chegassem bandidos atirando.
Andrés Escobar em ação contra os Estados
Unidos, anfitriões da Copa do Mundo de 1994
(Foto: Getty Images)
Narcotráfico e futebol
Andrés foi mais uma das vítimas do domínio do narcotráfico na Colômbia. Um ano antes de sua morte, outro Escobar famoso, o traficante Pablo, havia sido assassinado pela polícia em Medellín, cidade que controlava. Segundo as investigações da polícia, o zagueiro foi vítima de pessoas que haviam apostado fortemente na Copa do Mundo. Humberto Castro Muñoz, guarda-costas de um criminoso local, foi condenado a 43 anos de prisão pelo assassinato do jogador, mas deixou a cadeia após 11 anos, por bom comportamento.
– Ele ficou muito triste, porque nunca havia feito um gol contra, e isso aconteceu justamente quando o Milan queria contratá-lo. Depois da partida contra os EUA, fui ao hotel e o abracei. Disse para ele não se preocupar, porque havia sido um acidente. Ele estava com medo de não ser mais contratado – relatou Santiago.
A partida contra os EUA aconteceu no dia 22 de junho. A Colômbia ainda jogou sua última partida na Copa e venceu a Suíça por 2 a 0 antes de voltar para casa. Na noite do dia 1º de julho, Escobar saiu com amigos para uma discoteca no bairro El Poblado, zona nobre de Medellín. Durante a noite, foi constantemente incomodado por pessoas que insistiam em lembrar-lhe do gol contra.
– Quando meu irmão saiu da discoteca, estava no estacionamento e foi pedir respeito a estas pessoas. Mas os assassinos estavam metidos com o narcotráfico, andavam armados e supostamente haviam apostado um dinheiro importante na Copa. Eles não gostaram do pedido de Andrés e lhe deram seis tiros – contou Santiago.
Santiago Escobar celebra o legado deixado pelo
irmão Andrés (Foto: Felipe Schmidt)
Entretanto, há outras interpretações para o crime. Técnico da seleção colombiana em 1994, Francisco Maturana acredita que o gol contra não foi a causa da morte de Escobar, mas sim o clima de violência no país na época.
– Aquela era uma época de alta criminalidade, de intolerância. Não creio que o gol contra causou a morte de Escobar. Mas é preciso lembrar as coisas boas dele. Sua maneira de levar a vida, sua lealdade. Minha relação com ele era muito boa, e o tenho no meu coração, com recordações bonitas – defendeu o treinador.
Medellín, um novo lugar
Hoje, o consenso é de que a Colômbia evoluiu. O lugar onde Escobar foi assassinado virou um canteiro abandonado, mas no restante de Medellín o progresso é exaltado por todos. Andrés é lembrado constantemente: dá nome a um centro esportivo no bairro de Belén, onde também há uma estátua sua. Na quarta-feira, torcedores iam ao local para tirar fotos e deixar flores.
– Sem dúvida, o país está muito melhor hoje, com mais progresso e desenvolvimento. Ainda há violência, ainda acontecem coisas difíceis de compreender, mas está muito melhor. Há 20 anos as cidades conviviam com ameaças de bombas, milhares de pessoas morriam. Era um país muito inseguro – analisou Santiago Escobar.
Andrés Escobar dá nome a um centro esportivo
no bairro de Belén, em Medellín
(Foto: Felipe Schmidt)
O taxista Ramirez assina embaixo.
– Medellín mudou muito nos últimos anos. Melhorou uns 90%.
Um exemplo do novo momento da Colômbia é justamente a seleção nacional. A geração atual é tida como a melhor desde a de 1994, que tinha Andrés Escobar. Contra o Brasil, na próxima sexta-feira, estes novos jogadores entrarão em campo numa situação completamente diferente daquela de duas décadas atrás.
– A morte de Andrés foi atípica, espero que não volte a acontecer algo desta natureza. De uma maneira ou de outra, acho que o incidente com meu irmão serviu para que os jovens o usem como exemplo em muitos aspectos da vida – completou Sanchi.
FONTE:
http://globoesporte.globo.com/futebol/selecoes/colombia/noticia/2014/07/o-legado-e-o-novo-momento-20-anos-apos-morte-de-escobar-na-colombia.html
Nenhum comentário:
Postar um comentário