domingo, 29 de junho de 2014

Efeito Beckham e chefe indiano levam "soccer" ao auge e a recordes na Cop

Com índices de popularidade surpreendentes durante a Copa de 2014, futebol nos EUA vê mudanças de hábitos atraírem fãs pela televisão e nos estádios brasileiros


Por Salvador

Ao redor do mundo, seja qual for o idioma, o evento é chamado de “Copa do Mundo de Futebol”. Mesmo tendo no dicionário as exatas palavras para fazer a tradução literal, os americanos seguem chamando o esporte de “soccer”. Mas, se o vocabulário se mantém intacto, as percepções e hábitos destes torcedores se transformaram de forma drástica para que a competição alcançasse índices de popularidade surpreendentes nos Estados Unidos durante o Mundial de 2014 – e para que outras dezenas de milhares de fãs viajassem para torcer in loco nos estádios brasileiros.
Classificada em segundo lugar no Grupo G, com quatro pontos, a seleção comandada por Jürgen Klinsmann volta a campo nesta terça-feira, às 17h (horário de Brasília), pelas oitavas de final. A equipe encara a Bélgica na Arena Fonte Nova, em Salvador.

Torcida Estados Unidos Copa do Mundo (Foto: Getty Images )
Americanos invadem estádios brasileiros 
durante a Copa do Mundo (Foto: Getty Images )

Os Estados Unidos só perdem para o Brasil em ingressos comprados para a Copa do Mundo: foram 198.208 bilhetes, mais do que o triplo da Argentina, terceira colocada com 61.477. Mesmo considerando que este número inclui estrangeiros que moram no país, o Consulado Geral dos EUA no Brasil afirma que mais de 90 mil americanos desembarcaram na terra da Copa nas últimas semanas.

Presidente Barack Obama assiste ao jogo entre Alemanha e EUA (Foto: Agência AP)Presidente Barack Obama assiste ao jogo entre Alemanha e EUA (Foto: Agência AP)

Se os estádios têm ficado cheios de torcedores vestindo as tradicionais listras e estrelas da bandeira, os números mais impressionantes vêm de empresas especializadas em audiência de televisão. De acordo com a Nielsen, a partida entre Estados Unidos e Portugal foi o jogo de futebol mais visto na história da TV americana, com média de 18,22 milhões de espectadores e pico de quase 23 milhões. A título de comparação, esta medição é superior aos confrontos dos playoffs da NBA e das decisões de beisebol no ano passado.

- Esta impressionante alta no interesse nos EUA é um verdadeiro divisor de águas para a Copa do Mundo e para o futebol. Estamos entusiasmados por ver a maneira com que os torcedores americanos estão recebendo a Copa do Mundo, como nunca antes - disse o diretor da TV da Fifa, Niclas Ericson.

o efeito beckham
Maior artilheiro da história da seleção americana com 57 gols, Landon Donovan não foi relacionado pelo técnico Jürgen Klinsmann na lista final de 23 atletas que viriam ao Brasil. Com três Mundiais disputados pelos EUA, o meia-atacante foi o principal nome do país no esporte na última década. Mas, mesmo todos os seus esforços nos gramados, não se compararam ao efeito causado pelo marketing em torno de um colega de time na Major Soccer Leage (MSL) nascido na Inglaterra.

David Beckham los angeles galaxy comemora com os filhos Brooklyn Beckham, Romeo Beckham and Cruz Bekham (Foto: Agência Getty Images)
David Beckham comemora com os filhos título 
conquistado pelo Los Angeles Galaxy 
(Foto: Agência Getty Images)

Membro do time de galáticos do Real Madrid por quatro anos, David Beckham transferiu-se para o Los Angeles Galaxy no início de 2007, e a transferência explorou o slogan “Beckham comes to América” (Beckham vem para a América, na tradução literal do inglês) . Casado com a ex-Spice Girl Victoria Beckham, o astro britânico atraiu a imprensa e um volume de publicidade inédito para a Major League. Segundo dados do clube, o número de jovens aspirantes a uma vaga na equipe dobrou, em relação à peneira anterior à chegada do astro.

- Acho que Beckham foi o primeiro grande nome a aparecer o tempo todo nas notícias. E então começaram a aparecer mais outros grandes nomes. Atualmente ouvimos muito sobre Messi. As crianças já crescem ouvindo os nomes, sabendo as regras e jogando na escola, o que não acontecia em outras gerações. A geração de nossos pais até teve esse contato na escola, mas, como não havia essa exposição de mídia, não tinha como se equiparar ao basquete, ao futebol (americano) ou ao beisebol. E ficava com fama de ser um esporte feminino – disse Janell Fuller, que foi à Copa de 2006 e está com o marido, Alex, e os filhos Carlos e Maggie em Salvador para o confronto com a Bélgica.

Torcida Estados Unidos em Salvador (Foto: Helena Rebello)Janell e a família na Praça da Cruz Caída, em Salvador: 2ª Copa da família (Foto: Helena Rebello)

Nem os dois períodos de empréstimo para o Milan ou a presença constante nas páginas de celebridades diminuíram os efeitos da semente plantada involuntariamente por Beckham. Pelo contrário. Os holofotes atraídos pelo britânico abriram portas para que outros astros do futebol mundial também vissem os Estados Unidos como um possível mercado. O francês Thierry Henry acertou com o New York, e os brasileiros Ronaldinho Gaúcho e Kaká foram cotados para atuar na Liga. Com tantos nomes famosos em jogo, a mídia do país deu espaço ao “soccer”, e o público foi se familiarizando cada vez mais.

Para o jornalista Andrew Das, do jornal "The New York Times", a negociação de Beckham foi um marco para o estabelecimento de um novo patamar salarial na liga americana e também para uma mudança de perfil da competição.

- Quando ele foi para a liga talvez não estivesse mais no auge, mas ainda era um jogador valioso na Europa e um enorme impulso de credibilidade. Fez com que jogadores em outros países soubessem que a MLS não era apenas um porto para se passar um ou dois anos antes da aposentadoria, mas um campeonato para se jogar no auge. Beckham mostrou um comportamento profissional trabalhando, treinando e jogando duro, o que foi um exemplo para os jovens atletas. 
Ele ainda aumentou o patamar salarial e persuadiu nomes como Henry, Tim Cahill e Robbie Keane a virem também. Isso aumentou o nível competitivo no campo. Aqui no Brasil podemos ver vários jogadores da liga, não só pelos EUA, mas por Costa Rica, Honduras e até o herói do Brasil nas oitavas, Julio César.

Um indiano por trás dos panos e campanhas marcantes
Nascido em Allahabad, na Índia, e radicado nos Estados Unidos desde criança, Sunil Gulati é professor de economia da Universidade de Columbia. É das aulas que ministra que tira o sustento de sua família – é casado e tem duas filhas. Seu cargo como presidente da Federação Americana de Futebol não possui remuneração, é voluntário. Em março deste ano, já às vésperas da preparação para a Copa do Brasil, ele conquistou a reeleição para seu terceiro mandato.

Jurgen Klinsmann e Sunil Gulati Estados Unidos (Foto: AFP)Jurgen Klinsmann e Sunil Gulati na apresentação do treinador, em 2011 (Foto: AFP)

Muito antes de assumir o cargo, Gulati esteve envolvido no desenvolvimento do futebol no país. Jogador e árbitro universitário na juventude, o indiano conheceu Warner Fricker, então presidente da federação nacional. Ali começou seu envolvimento na entidade. Participou do Comitê Organizador da Copa de 1994 e, depois, teve papel fundamental na profissionalização da MSL.

Paralelamente à ascensão de Gulati, os EUA deram passos significativos no campo. Em 2002, chegaram às quartas de final da Copa do Mundo. Após a eliminação na primeira fase em 2006, Gulati começou as investidas para contratar Jürgen Klinsmann. Em 2010, os americanos se classificaram de forma dramática na fase de grupos - o gol de Donovan diante da Argélia virou um marco -, mas caíram nas oitavas, diante de Gana. No ano seguinte, o técnico alemão finalmente cedeu às propostas do dirigente e assumiu o comando da seleção.

A combinação parece ter rendido frutos, e os EUA se classificaram em primeiro lugar nas eliminatórias da Concacaf. No Grupo G, estreou com vitória sobre Gana, empatou com Portugal e foi superada pela Alemanha. Campanha suficiente para avançar às oitavas e deixar torcedores esperançosos.

Torcida Estados Unidos em Salvador (Foto: Helena Rebello)À direita, John Smith posa com os amigos no Pelourinho (Foto: Helena Rebello)

- Eu gosto do estilo da equipe com o Klinsmann, acho que valeu a pena insistir na contratação dele. O time está bem defensivamente e conta com Dempsey em boa fase. A torcida tem razões para estar confiante, apesar de eu achar que ainda são poucos os torcedores que acompanham de fato o dia a dia da equipe. Acho que a maioria só está empolgada por conta da cobertura da mídia, das reuniões para ver jogos. Hoje em dia vemos nossos amigos se reunindo em bares para ver jogos. Isso não havia há alguns anos – disse John Smith, que veio ao Brasil com outros três amigos.

Em busca da vaga nas quartas de final, os Estados Unidos desembarcam em Salvador neste domingo. A equipe deve realizar um treino no final da tarde, mas nem o local nem o horário foram divulgados ainda. Na segunda-feira, o grupo faz o reconhecimento do gramado na Fonte Nova, e na terça entra em campo em busca de mais motivos para que os americanos se interessem pelo futebol.


FONTE:
http://globoesporte.globo.com/futebol/selecoes/estados-unidos/noticia/2014/06/efeito-beckham-e-chefe-indiano-levam-soccer-ao-auge-e-recordes-no-brasil.html

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