quarta-feira, 1 de agosto de 2012

Giovane, sobre seleção de 92: 'Éramos comparados a uma banda de rock'


Ex-jogador fala do clima de histeria que envolvia time antes e após Barcelona, da emoção do bi em 2004 e do sonho de ser campeão como técnico

Por Danielle Rocha e Leo Velasco Rio de Janeiro

giovane gávio vôlei (Foto: mpc comunicação / divulgação)Giovane com as medalhas de Barcelona e Atenas
(Foto: Tria Sports / Divulgação)

O tempo se encarregou de puir, mas não conseguiu tirar a aura mágica que aquela camisa tem até hoje para Giovane. Mesmo 20 anos depois, ele a deixa ao alcance das mãos. E sempre que precisa resgatar boas coisas, a tira do armário. Num piscar de olhos está de novo em Barcelona, com 21 anos, jogando e cantando com os amigos, com uma medalha de ouro olímpica no peito. As histórias foram contadas e recontadas aos filhos, que demoraram a entender que aquele homem que chamam de pai tinha feito parte de uma geração inesquecível e que ainda era apontado como o galã daquela equipe.


- Aquele time se mantém vivo na cabeça das pessoas. Só não sei se meus filhos têm muita noção do que foi realmente porque não existe isso agora. Por mais que a seleção continue ganhando, não tinha a febre da nossa época. Ao ponto de sermos comparados a uma banda de rock, devido à histeria. Mas meus filhos sabem que foi um grande momento. O ensinamento que deixamos para as gerações futuras foi como se comportar fora da quadra e não deixar que nada de fora interfira dentro dela. O assédio antes e, principalmente depois do ouro, era ótimo e dava muito trabalho. Eu me casei antes das Olimpíadas de 92, imagina, e me fiz de bobo muitas vezes. Era cantado todo dia pelo menos três vezes. Muita gente se hospedava no mesmo hotel, pulava muro de vestiário. Era uma histeria que não existe hoje porque tem mais ídolos e acesso - disse.


Giovane, Vôlei, Brasil, 1992 (Foto: Agência Getty Images)Giovane festeja a vitória do Brasil sobre a Holanda na final de Barcelona 92 (Foto: Agência Getty Images)

Apesar dela, o time não se deslumbrou. Encarou os Jogos com seriedade, fez da harmonia o seu grande trunfo para bater adversários que em tudo pareciam mais fortes e melhores.


- A gente rompeu uma barreira, o fato de achar que a gente é pequeno e não pode. A gente imaginava chegar em quarto lugar porque a geração anterior a nossa tinha ficado em segundo em Los Angeles-84 e no também no Mundial de 82. E tinha essa barreira de achar que a gente não treinava igual, não tinha o uniforme igual. Ali mostramos que é possivel vencer sim. E não foi sorte.


Foi sonho. Quando as vitórias começaram a se acumular, Tande tratou logo de arrumar uma trilha sonora. Precisou entoar apenas dois versos de "Sonhar não custa nada", samba da Mocidade, para receber o aval dos companheiros. No dia 9 de agosto, a cantoria se repetiu. E terminou na Vila, com todos comemorando aquela façanha comendo sanduíches.


Giovane com os filhos Giulia, Tiago (no colo) e Gianmarco  (Foto: Danielle Rocha / Globoesporte.com)Após título da Superliga, Giovane recebe abraço dos
filhos (Foto: Danielle Rocha / Globoesporte.com)

- Voltamos para a Vila quase meia-noite, com medalha no peito, todo mundo cantando abraçado. A comemoração foi assim. Fomos comer  na lanchonete, todos juntos, como foi a nossa marca durante toda aquela campanha. A alegria era enorme. Aquele era um grupo jovem, sem problema nenhum. Tínhamos menos condição e preparo do que a seleção tem hoje. Mas era a primeira Olimpíada da maioria, e foi motivamente. Lembro da euforia, da alegria da equipe de estar ali. Quando as vitórias começaram acontecer, essa alegria ficava contagiante e a gente cantava muito aquele samba, porque nosso sonho era tão real... A gente se divertiu muito mais do que qualquer outro grupo porque, embora não fôssemos amadores, tínhamos menos peso do que os jogadores têm hoje, pelo movimento que o vôlei atingiu.


Depois dali, a vida mudou. Os compromissos aumentaram, a fama, o assédio e a conta bancária também. O problema é que eles ainda não estavam preparados para passar por tudo aquilo. O preço seria cobrado em Atlanta-96.

- Houve uma carga excessiva. Eu pelo menos sofri, no bom sentido. A vida mudou muito. Nos amistosos ninguém queria ver o time reserva jogar. Os titulares ficaram expostos e eram obrigados a jogar porque a empresa estava pagando. Existia pressão sobre o Zé Roberto para que todos jogassem. E, em alguns momentos, não estavamos bem. E tinha aquela coisa da fama, da propaganda, do ganhar dinheiro... Gerou inveja, ciúmes e sentimento ruim. De 2001 para cá o Brasil ganhou muitos títulos e não sofreu.


comemoração Brasil vôlei Olimpíadas 2004 (Foto: Getty Images)Giovane (à esquerda) comemora o bi nas Olimpíadas de Atenas-2004 (Foto: Getty Images)

Giovane fala com conhecimento de causa. Viveu os dois momentos e teve a sorte de novamente sentir a emoção de subir ao pódio olímpico, em Atenas-2004. Desta vez, mais experiente, sob a batuta de Bernardinho e ao lado de jogadores que tiveram sua geração como inspiração. Se eles ainda continuam dentro de quadra, Giovane preferiu trocar o uniforme. Virou técnico, conquistou o título da Superliga 2010/2011 com o Sesi e trabalha com um desafio em mente: ganhar uma medalha nos Jogos como treinador.  


- Para fazer bem feito, tem que ter objetivo e sonho. Fiquei 20 anos longe da família e, para ficar mais 20, tem que ser por um motivo muito grande. O dia a dia se torna convidativo a passar por tudo de novo. Continuo pensando dessa forma e trabalho para isso. Não vou negar que é um sonho.


Giulia, filha de Giovane vôlei (Foto: Alexandre Arruda/CBV)Giulia durante treino da seleção infantil no CT de Saquarema (Foto: Alexandre Arruda/CBV)

Giulia e Gianmarco, os mais velhos dos quatro herdeiros de Giovane que se arriscam no vôlei, parecem querer o mesmo. Na temporada passada, com 15 anos, ela já chegou à seleção brasileira infantil. 


- Gosto de dizer que não fico botando muita pilha não, porque já carregam um peso grande. Se conseguirem vestir a camisa seleção e chegaram às Olimpíadas, será muito bacana. E eu já sei o que vão passar. Se forem médicos o orgulho de pai será o mesmo. A família ia gostar de ter um sucessor na quadra, mas estamos bem resolvidos com relação a isso.

FONTE:
http://globoesporte.globo.com/olimpiadas/noticia/2012/08/giovane-sobre-selecao-de-92-eramos-comparados-uma-banda-de-rock.html

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