segunda-feira, 7 de novembro de 2016

A estudante que tentou fraudar o Enem enquanto batia panela é o retrato do Brasil de Temer. Por Donato



FONTE:
http://www.diariodocentrodomundo.com.br/a-estudante-que-tentou-fraudar-o-enem-enquanto-batia-panela-e-o-retrato-do-brasil-de-temer-por-donato/

por : 

Sofia Macedo
Sofia Macedo

Colar na prova, quem nunca? Aquela olhadinha rápida, uma cutucada no colega CDF da frente: “Sabe a oitava?” Inocente e inofensivo.
Mas quando se está na vida adulta, em um processo seletivo, a coisa muda de figura. Na vida adulta, em processo seletivo e praticando suborno, a situação muda de patamar. Na vida adulta, em processo seletivo e praticando suborno depois de ter batido panela de forma desequilibrada pelo ‘fim da corrupção’ e gritando Fora Dilma, é de uma hipocrisia espetacular.
Em mais um episódio de máscara que cai (já foram centenas de manifestantes adoradores de Sergio Moro flagrados em casos de corrupção e a explosão de denúncias de malas de dinheiro nos movimentos que tramaram o golpe é sintomática), uma estudante que apoia a república de Curitiba foi pega no pulo.
Sofia Azevedo Macedo estava com um ponto eletrônico no ouvido. Uma central que ficava em um hotel em Montes Claros (MG) enviava o gabarito e a estudante tossia uma vez para sinalizar que havia compreendido.
Tossir duas vezes significava que o interlocutor deveria repetir. Pela ajudinha na trapaça, o custo girava entre R$ 150 mil a R$ 180 mil, segundo a Polícia Federal.
A operação Embuste foi realizada em Minas Gerais, Bahia e Ceará com o propósito de desmantelar uma quadrilha especializada em fraudes no Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM). A Justiça emitiu vinte e oito mandados, quatro de prisão temporária.
No cumprimento dos mandados foram apreendidos os equipamentos usados pela turma criminosa e os áudios captados em escutas autorizadas pela Justiça revelam que antes do exame era feito um teste para verificar se a geringonça toda estava funcionando, se o candidato conseguia escutar a voz de quem iria repassar as respostas para ele. Em um desses áudios, a estudante
Sofia estava em contato com um homem identificado como Jonathan, que a polícia diz ser Jonathan Galdino dos Santos.
Jonathan: Sofia, tá me escutando? Dá duas tosses aí, por favor.
Sofia: tosse duas vezes, sinalizando que estava tudo ok.
Jonathan: Correto. Eu vou falar cinco palavras: casa, carro, tatu, prédio e cachorro. Entendeu? Dá uma tossida.
Sofia: tosse uma vez novamente.
Jonathan: Pronto, ok.
“Pela primeira vez constatamos o retorno de áudio por parte do candidato. A maneira que ele usava para demonstrar ao interlocutor que compreendia ou não o gabarito era por intermédio da tosse”, disse o delegado Marcelo Freitas.
Quem tem entre R$ 150 e R$ 180 mil para ‘investir’ assim? Estudantes oriundos das classes menos favorecidas? Por óbvio que não. O que vale um investimento desse montante? Cursos de mensalidades altas, historicamente frequentados pela elite. O target da quadrilha eram os candidatos que almejam principalmente os cursos de medicina.
Sofia tem 19 anos, nasceu em Carbonita (MG) e hoje vive em Belo Horizonte. Seus posts em redes sociais nem são majoritariamente engajados. Em 2014 publicou algumas vezes em apoio a Aécio Neves e compartilhou memes que ridicularizavam Dilma Rousseff.
Lamentou a vitória da petista e depois comemorou o impeachment. Em dezembro de 2013 viajou para Montes Claros, cidade que serviu agora como sede da quadrilha. Só coincidência? Talvez, mas vale a investigação.
De resto, seus posts são relacionados a maquiagem (que faz em si mesma). Muito bonita, agora tem a página recheada de comentários como ‘bonitinha mas ordinária’, ‘vai ser bonita assim lá na cadeia’, ‘olha a corrupta’. Enfim, Sofia se assemelha ao despolitizado clássico que apenas repete o que seu meio social propaga sem refletir.
Isso não a isenta de nada, claro. Sempre que possível, suas postagens mais ‘cabeças’ revelam o conservadorismo. Em uma delas enalteceu a Indonésia por possuir pena de morte enquanto o Brasil não. Em outra, pediu ‘punição rígida e prisão’ para infratores de leis de trânsito. Como se vê, seu lema é o bom e velho ‘leis para os outros’.
Em resumo: (mais) uma daquelas figuras que estiveram exigindo a expulsão de corruptos faz parte da parcela da população que tem R$ 150 mil para sacanear estudantes de escola pública que mal têm grana para o busão que os levará ao local de exame. Mais uma representante do ‘papai pagou, passou’.
Satisfeito, coxinha? Entendeu? Então tosse uma vez aí.
sofia - posts
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Sobre o Autor
Jornalista, escritor e fotógrafo nascido em São Paulo.

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