quarta-feira, 16 de dezembro de 2015

A Situação do Botafogo no Enrolado Caso do Willian Arão


Torcedor do Botafogo

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Por Thiago Pinheiro



Foto por Vitor Silva / SSPress


Se você leu alguma notícia relacionada ao Botafogo nas últimas semanas, deparou-se com uma batalha jurídica envolvendo o clube e o volante Willian Arão.

Desde agosto, o Botafogo vem, sem sucesso, tentando renovar com o volante, um dos poucos destaques neste ano de 2015. Após várias tentativas infrutíferas, o Botafogo tentou exercer a cláusula de renovação automática, depositando os R$400 mil estabelecidos no contrato. Surpreendentemente, o jogador devolveu a quantia, por duas vezes, declarando que não retornaria ao clube. Esta semana ele foi anunciado como jogador do time da Gávea.

A polêmica toda passa pela FIFA e uma mudança de regulamentação que entrou em vigor em maio de 2015. A partir dali, estavam proibidos investidores em direitos econômicos de atletas, acabando com o que a "terceira parte" em um contrato de futebol (link em inglês). 

Resumindo: a FIFA baniu terceiros de serem donos de contratos. O nome em inglês é "Third party ownership (TPO)"

O Botafogo assinou contrato com William Arão em janeiro de 2015, mas já havia o conhecimento sobre a mudança nos direitos econômicos que entraria em vigor em maio. Em 22 de dezembro de 2014, a FIFA enviou comunicado aos seus membros sobre as novas regras. (link em inglês). 

A resolução da FIFA informava ainda que os contratos assinados entre janeiro e abril deste ano - caso do Arão - teriam uma duração máxima de um ano. Aqueles que foram assinados antes não teriam a sua validade alterada. Em ambos os casos, a FIFA considerou que, com esse tempo, os demais donos dos passes poderiam chegar a um acordo com os clubes.

A SITUAÇÃO DO BOTAFOGO


Como eu disse antes, a Fifa permite apenas que clubes sejam donos de direitos econômicos de jogadores, não permitindo mais o fracionamento de contratos. Entretanto, Arão é (ou melhor, era) dono de 50% do seu passe, só que, de acordo com as novas regras, ele é um "terceiro envolvido" na relação e, com isso, não tem direito mais a partes do seu contrato.

Em conversa com Gustavo Noronha, diretor jurídico da Vice-Presidência de Futebol, o Botafogo está questionando na Justiça "se o jogador é considerado terceira parte na relação". Se sim (e, para mim, isso está claro), o Botafogo busca esclarecer, também, o que acontece com o contrato assinado em janeiro.

Ainda segundo Noronha, se o jogador for considerado terceira parte, o que seria anulado no contrato? Se o instrumento for considerado inválido em seu inteiro teor, acabou a discussão do Botafogo e nós não podemos fazer mais nada. Agora, se for apenas a parte da renovação automática, o clube entende que os R$400 mil foram depositados a título de luvas e, assim, diante da negativa do jogador no ato, poderia se discutir o valor para o restante do percentual, com o Botafogo, assim, sendo o único dono dos seus direitos econômicos.

O OUTRO LADO


Bichara Neto, advogado do Arão, tem outro entendimento, de acordo com reportagem para o Terra Esportes.

"A gente entendia que a cláusula de um novo contrato mediante a aquisição de um nova parcela de direitos econômicos do atleta não valia mais. Devido a mudança que aconteceu em maio tanto no regulamento da CBF quanto o da Fifa essa cláusula deixou de ser válida e a gente trabalhou em cima disso, conseguindo a decisão favorável em favor do atleta."

O QUE ACONTECEU ATÉ AGORA?


Não há nada decidido, por enquanto. O que Arão conseguiu na Justiça foi o deferimento de um pedido de tutela antecipada, mas não houve julgamento do mérito. O jogador pode seguir a sua vida enquanto não há decisão definitiva.

Uma coisa é certa: Arão não joga mais com a camisa do Botafogo. Quanto ao que vai acontecer, é difícil dizer, mas é certo que a batalha se arraste por um tempo nos tribunais e o jogador não tenha a tranquilidade necessária para atuar.

E O TRIBUNAL DO TRABALHO?


Conversei também com Theotonio Chermont, advogado trabalhista que tem obtido importante vitórias contra o Botafogo. Ele representa jogadores como Túlio (o volante da 2ª divisão), Daniel, Gabriel, entre outros.

O ponto principal do advogado é a legislação brasileira, sem considerar muito a mudança da FIFA, o que, talvez, indique o caminho a ser seguido no TRT.

Chermont, inicialmente, fala sobre as dificuldades da discussão, por tratar de legislação específica nacional e internacional, mas garante que o direito do atleta é o cerne do debate, ainda mais que "a nossa Justiça privilegia muito o direito constitucional do livre exercício da profissão que, no meu entender, está sendo cerceado por conta da cláusula que prevê a obrigatoriedade do atleta celebrar um novo contrato de trabalho. Não existe em nosso direito tal obrigação condicionada a compra de percentual de direitos econômicos."

"Entendo que a questão não versa sobre renovação automática de contrato por prazo determinado (regra no caso dos atletas de futebol), mas sim de celebração de um novo contrato. São questões distintas. Os contrato de emprego por prazo determinado de atletas profissionais de futebol não se comunicam por lei. São desvinculados um do outro. Assim sendo, não podem ser renovados após o seu término. E, pela expressa previsão da Lei Pelé, não se transformam em contrato por prazo determinado.

Caso as partes desejem estender a relação podem celebrar durante o contrato em vigor termo aditivo ou, após o seu término, um novo contrato que será registrado na CBF com numeração distinta.

Assim sendo, não há que se falar em renovação automática de contrato por prazo determinado."

Chermont lembra ainda do artigo 27 da Lei Pelé, dizendo que, nele, "são nulas de pleno direito as cláusulas de contratos firmados entre as entidades de prática desportiva e terceiros, ou entre estes e atletas, que possam intervir ou influenciar nas transferências de atletas"

Finalizando, ele entende que a cláusula de renovação automática é nula, "pois impede que o atleta possa contratar com a agremiação que bem entender após o fim do pacto laboral em vigor, razão pela qual, de boa fé, devolveu o valor de R$ 400.000,00."

Ao final, faz uma consideração sobre a renovação automática:

"É muito cômodo para os clubes, inclusive, esse tipo de cláusula com obrigação futura e condicionada. Se o atleta não despontar ou mesmo ficar inutilizado, basta o clube não pagar o valor acordado para que a relação seja automaticamente renovada e aguardar o contrato de origem se encerrar. Caso contrário, se o atleta explodir e se tornar uma revelação, o clube pagará o montante a fim de obriga-lo a celebrar um novo contrato. É, a meu ver, desproporcional, e colide com o fim social do contrato e com a boa fé.
(...).

Na verdade, a questão posta sob tutela jurisdicional da Justiça do Trabalho é se a “aquisição” de parte dos direitos econômicos do Arão o obriga à formalização de um contrato de trabalho desportivo, tornando efetivas as obrigações contratuais livremente estipuladas pelas partes. Entendo que não.
Entendo que a anuência do atleta com termos futuros quando da celebração do contrato de origem não pode sobrepor sua vontade no ato de contratar, haja vista que a CF/88 art. 5º XIII  garante a todos os cidadãos o livre exercício de sua profissão, incluindo a de atleta profissional de futebol.
Por óbvio que a inobservância das obrigações contratuais assumidas pelas partes pode acarretar outras consequências na esfera jurídica, principalmente de natureza civil, cabendo aos interessados buscar a tutela jurisdicional do Estado perante o Juízo competente."

Senhoras e senhores, preparem-se. Vai demorar.

Foto por Vitor Silva / SSPress


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