FONTE:
http://jornalggn.com.br/noticia/xadrez-do-bale-da-danca-dos-lobos-de-janot-e-gilmar-para-livrar-serra
Luis Nassif
Peça 1 - sobre a mentira e os vazamentos horizontais
Conforme apontamos em artigos anteriores, o grande problema dos vazamentos horizontais - como no caso da Lava Jato - é que a única maneira de uniformizar o discurso é através da verdade, que comporta menos versões que a mentira.
Quando se foge do script, há um curto-circuito total no discurso.
Foi o que ocorreu nos dois últimos factoides: o “factoide informacional” (apud Rodrigo Janot) da capa da Veja, com a não-denúncia sobre Dias Toffoli; e o “factoide processual”, de suspender a delação por causa do vazamento.
Versão 1 – o PGR acusou advogados da OAS de terem vazado parte do pré-documento de delação de Léo Pinheiro, com o intuito de pressionar para que a delação fosse aceita. Atribuiu o suposto vazamento aos advogados da OAS devido ao fato de que a informação vazada supostamente não constaria dos documentos encaminhados ao MPF, logo o suposto vazamento não poderia ter partido de lá. A versão não se sustenta porque, além de ser ilógica – é evidente que o vazamento comprometeria a delação - fica-se sabendo que o caso Toffoli foi mencionado na conversa entre Pinheiro e os procuradores. Logo, o vazamento poderia ter partido de qualquer um.
Versão 2 – imediatamente Janot suspendeu as negociações para a aceitação da delação do presidente da OAS, Léo Pinheiro. Para justificar a não tomada de decisão ante as 17 delações anteriores vazadas, alegou que a de Toffoli era diferente, porque a informação não existia. Ou seja, tratou drasticamente um vazamento irrelevante (porque, segundo ele, de fatos que não existiam) e com condescendência vazamentos graves.
Na atual edição de Veja, tenta-se emplacar uma nova versão: a de que o anexo (com o suposto vazamento) existia, mas não constava da pré-delação formalizada. Como fica, então, o argumento invocado para livrar os procuradores da suspeita de vazamento?
Fica um conjunto de indagações no ar:
1. O que explicaria a reação instantânea, de bate-pronto de Janot e de Gilmar a um factoide jornalístico, uma não-denúncia sem nenhuma relevância?
2. Por que se tentaria anular a delação de Léo Pinheiro.
A hipótese mais aceita é que Janot se surpreendeu com o vazamento e saiu atabalhoadamente em defesa dos seus e suspendendo a delação, visando arrefecer qualquer arremetida mais dura do STF.
Será? Há outras suposições bastante verossímeis.
Peça 2 - o jogo de cena entre Janot e Gilmar Mendes
Advogado que assistiu a sessão do CNMP (Conselho Nacional do Ministério Público) que analisou a pinimba com Gilmar Mendes surpreendeu-se com o depoimento absolutamente tranquilo de Rodrigo Janot, que, embora rebatesse as críticas contra a Lava Jato e o MPF, em nenhum momento aparentou indignação com o episódio. Pode ser sangue frio. Mas pode ser outra coisa.
Janot sempre atuou como radar dos humores do STF em relação à Lava Jato. É ele que orienta sobre quando avançar, quando recuar, permitindo aos procuradores atuar sempre no limite da irresponsabilidade.
E ele endossa o viés totalmente partidário das investigações. Esse acerto ficou nítido no vazamento dos grampos ilegais de Dilma e Lula, decisivo para a votação da admissibilidade do impeachment. Janot estava na Europa. O STF reagiu, Sérgio Moro e a Lava Jato se deram conta de que haviam cruzado a faixa de segurança. Naquele breve momento de estupefação, espremidos por repórteres investigadores de Curitiba defenderam-se alegando que, antes do vazamento, haviam consultado Janot e recebido sua autorização. Alguns amigos ensaiaram uma defesa tênue, sustentando que Janot não tinha conhecimento sobre as últimas gravações - gravadas após o prazo de encerramento.
Na Lava Jato, o chamado “macho alfa” (do dicionário: em biologia, o líder que conduz a manada) é o procurador Carlos Fernando dos Santos Lima. Seu ego o tornou imprudente. O questionamento de uma decisão de Toffoli, em artigo na Folha, mostrou uma autonomia de voo temerária e o expôs a uma estratégia sutilíssima.
Certamente houve choques internos como resultado do seu atrevimento. E justo no momento em que a Lava Jato ingressa na fase mais delicada: quando deixa de lado o “inimigo comum” e se depara com delações que atingem os atuais políticos alçados ao poder graças à atuação destemida da PGR.
Como enquadrar a tropa?
O “factoide informacional” caiu como uma luva. Cria-se o barulho, Gilmar tenta incendiar o Supremo contra a Lava Jato e, no meio da bruma, surge a figura resoluta de Janot defendendo os seus e apontando os culpados – a OAS. Como castigo, suspende a delação.
Depois, simulam-se guerras verbais que permitem a Gilmar se consolidar junto aos neo-garantistas e a Janot junto à sua tropa. E, no final dos embates, ambos celebram a paz, alcançando o mesmo objetivo: a suspensão de uma delação que colocaria aliados no caldeirão da Lava Jato.
Faz sentido?
A hipótese alternativa é de alguém ligado ao PSDB ter vazado a notícia e Janot aproveitado o embalo para atingir seu objetivo.
Pelo resultado final do jogo, tendo a apostar na hipótese da combinação do resultado. Graças a essa dupla manobra, Janot enquadra a tropa e coloca a faca no peito de Léo Pinheiro: ou muda a estratégia (modo de dizer: muda a narrativa) ou não tem delação premiada. E os soldados na ponta acatam as ordens do chefe que os está defendendo do único poder ao qual se curvam: o Supremo.
Peça 3 – a relevância do depoimento da OAS
Como vocês se recordam, o GGN antecipou a tentativa final de encerrar a Lava Jato: a votação de uma lei pelo Congresso separando o financiamento de campanha do enriquecimento pessoal. Haveria anistia a quem apenas recorreu ao financiamento de campanha. No segundo caso, seria prática de corrupção, expondo os autores à cadeira por formação de quadrilha.
No dia 11 de agosto passado, a sempre atilada Mônica Bérgamo deu pistas importantes para entender os últimos episódios (http://migre.me/uMCbH)”
“A revelação feita pela Odebrecht sobre dinheiro de caixa dois para o PMDB, a pedido de Michel Temer, e para o tucano José Serra (PSDB-SP) tem impacto noticioso, mas foi recebida com alívio por aliados de ambos. Como estão, os relatos poupam os personagens de serem enquadrados em acusações mais graves, como corrupção e formação de quadrilha.
EM CASA
Contribuição não contabilizada pode ser enquadrada como crime eleitoral, de punição branda e chance mínima de resultar em prisão.
CONTA MAIS
Há, porém, uma pedra no caminho: a força-tarefa da Operação Lava Jato, que não aceita a versão de contribuições desinteressadas para campanhas eleitorais via caixa dois. Os procuradores insistem na revelação de contrapartidas, o que enquadraria a doação dos recursos em propina pura e simples.
PROCESSO DINÂMICO
Por isso, a delação que envolve Temer e Serra pode ainda sofrer alterações.
Caso Serra e Aécio
É aqui o busílis da questão. Como o GGN já informou, a delação da Odebrecht se fixaria no financiamento de campanha e caixa 2. Se a Lava Jato quiser correr atrás, que avance sobre Paulo Preto.
No caso da OAS, sabia-se desde o início que apresentaria dados mais pesados. No material divulgado pela Veja fala-se em pagamento a Serra em dinheiro vivo.
Neste final de semana, Veja traz o conteúdo total da pré-delação de Léo Pinheiro.
Há informações seguras de pelo menos um depósito na conta de Verônica Serra. Esse depósito não aparece na pré-delação da OAS divulgada pela Veja. Talvez apareça mais à frente, quando se avançar sobre os sistemas de offshore.
Caso Lula
Que a OAS pretendeu fazer mimo para Lula, não se discute. Ocorre que não existem as duas pré-condições para caracterizar crime:
a. A contrapartida de contratos escusos para os mimos recebidos. A Lava Jato pretende que a cada graça corresponda uma operação de contrapartida. Ou seja, reformou o tríplex em troca de um contrato xis com a Petrobras.
b. Não existe o enriquecimento ilícito – isto é, o crescimento do patrimônio da família Lula com esses mimos. O usufruto do sítio, por si, não caracteriza enriquecimento pessoal. Insiste-se nas bobagens de procurar corrupção em palestras remuneradas ou na influência notória de Lula sobre governantes estrangeiros. Trata-se de prática usual para qualquer ex-dirigente nacional, ao sul e ao norte da linha do Equador. E o preço estava de acordo com o status de Lula, de mais popular dirigente político do mundo naquele momento.
A única coisa que dá para acusar Lula é de estupidez política e deslumbramento pessoal.
A semana terminou com Gilmar cobrindo a Lava Jato de elogios, sendo acompanhado por Luís Roberto Barroso e esquecendo-se o comentário do Ministro Marco Aurélio, que pediu investigações sobre o supostos vazamento da não-notícia.
No fim de semana, o Valor Econômico traçou um perfil da atuação política de Janot. Não chegou a avançar o tanto que poderia, tendo consultado fontes bastante próximas e críticas a ele. Mas seu perfil encaixou-se como uma luva à definição do mineiro, segundo Guimarães Rosa:
”O mineiro espia, escuta, indaga, protela, se sopita, tolera, remancheia, perrengueia, sorri, escapole, se retarda, faz véspera, tempera, cala a boca, matura, engambela, pauteia, se prepara”.
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