Casada com a jogadora Larissa, medalhista de bronze no Pan visita bairro gay de Toronto e fala sobre homossexualidade: "Quando você se omite, se sente preso"
A medalha de bronze nos Jogos Pan-Americanos
ao lado de Carol Horta veio
para iluminar ainda mais o momento de Liliane Maestrini. É certo que a
dourada era a que ela mais queria, mas o terceiro lugar pôs o time,
formado há
três meses, em um seleto grupo medalhista do Pan, onde o vôlei de praia é
disputado desde Winnipeg 1999. Felicidade que vai além da quadra. Pelo
relacionamento com a jogadora Larissa, dupla de Talita, Lili se sente
“leve”.
Leve para relembrar de quando contou aos pais sobre sua orientação sexual, para falar sobre intolerância e para revelar que, desde que o público ficou sabendo, além de mensagens de carinho, virou “conselheira”. Pela internet, alguns fãs a procuram com dúvidas, outros a elogiam por se assumir e há até quem a convide para ser madrinha de casamento.
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Confira a entrevista completa de Lili abaixo:
GloboEsporte.com: Como contou à família sobre sua orientação?
- Desde o início, nunca escondi nada de ninguém. Sempre fui muito verdadeira. É verdade acima de tudo para mim. As primeiras pessoas que ficaram sabendo foram meus pais, meu irmão, minha família. Sempre me deram total apoio em tudo e disseram que se eu era feliz assim, me apoiariam. Só queriam ver minha felicidade. Sempre fui tranquila em relação à minha orientação. Com meus pais e minha família do lado, não tenho que ter medo do mundo ou de ninguém mais. Não fiquei tensa porque sempre fui muito aberta com eles. Sou uma pessoa de sorte, porque muitas têm problemas com isso e se escondem da sociedade. Sempre me senti bem comigo. Falando e sendo sincero com as pessoas, principalmente quem te ama e está do seu lado, você se sente leve. Sempre quis ter minha vida como um livro aberto. Quando você omite, se sente preso. Me sinto leve e isso me traz alegria.
GloboEsporte.com: Como os fãs lidaram com isso? Acha que ajudou alguém?
Conheça mais da história de Larissa e Lili
Lili em passeio ao bairro gay de Toronto no
Pan (Foto: Gabriel Fricke)
Leve para relembrar de quando contou aos pais sobre sua orientação sexual, para falar sobre intolerância e para revelar que, desde que o público ficou sabendo, além de mensagens de carinho, virou “conselheira”. Pela internet, alguns fãs a procuram com dúvidas, outros a elogiam por se assumir e há até quem a convide para ser madrinha de casamento.
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- Muitas e muitas pessoas sempre falam que acham lindo nosso amor, nosso
carinho, nosso respeito. Muita gente fala muita coisa boa em relação a isso. Já
fui convidada para ser madrinha de uns 10 casamentos (risos), o problema é que
a gente viaja muito. Fica difícil, mas é uma honra. As pessoas, por a gente
estar na mídia, olham e veem que é uma relação bonita, com amor, e com aquela
leveza, e respeitam isso. Por respeitarem, vêm falar, pedir conselhos, tem
muitas mensagens, perdi as contas, de pessoas dizendo que acham lindo e queriam
agir da mesma maneira, mas têm medo e insegurança – contou Lili.
Lili - vôlei de praia - passeio por Toronto - Jogos Pan-Americanos (Foto: Gabriel Fricke/GloboEsporte.com)
O GloboEsporte.com levou Lili para um passeio no quadrilátero gay de
Toronto. Possui
bares, restaurantes, comércio e até caixas eletrônicos enfeitados com arco-íris,
símbolo do movimento LGBT. Até as faixas de pedestre são coloridas. As ruas
Church e Wellesley são as principais. Por lá, há uma praça com um memorial para as
vítimas fatais do vírus HIV no país, com os nomes de cada pessoa nos anos 80 a
90, época em que a Aids era muito associada à comunidade gay.
Os direitos LGBT do Canadá estão entre os mais avançados do mundo. O
país é considerado um dos mais liberais. Mas já houve
prisão perpétua e até pena de morte. Homossexuais eram tidos como agressores
sexuais, e a descriminalização aconteceu em 1969. Aos poucos, a união
civil foi legalizada em alguns lugares no país.
No dia 20 de julho de 2005, o Canadá se tornou o quarto país do mundo e primeiro
fora da Europa a legalizar o casamento entre pessoas do mesmo sexo. Adoção
também é permitida, mas com algumas variações por província e território.
Transexuais têm o direito de trocar seu gênero legalmente.
Além de Toronto, há bairros gays em Montreal, Vancouver e Ottawa. De
acordo com o instituto de pesquisa de mercado canadense "Ipsos", em
um levantamento feito em 2013, a maioria dos canadenses (63%) apoia o casamento
entre pessoas do mesmo sexo; 13% não apoiam a união civil legal, mas afirmam que
eles devem ter alguns direitos reconhecidos.
Lili passeia orgulhosa por Toronto após bronze
nos Jogos Pan-Americanos
(Foto: Gabriel Fricke/GloboEsporte.com)
Lili além do arco-íris (Foto: Gabriel Fricke/GloboEsporte.com)
- Desde o início, nunca escondi nada de ninguém. Sempre fui muito verdadeira. É verdade acima de tudo para mim. As primeiras pessoas que ficaram sabendo foram meus pais, meu irmão, minha família. Sempre me deram total apoio em tudo e disseram que se eu era feliz assim, me apoiariam. Só queriam ver minha felicidade. Sempre fui tranquila em relação à minha orientação. Com meus pais e minha família do lado, não tenho que ter medo do mundo ou de ninguém mais. Não fiquei tensa porque sempre fui muito aberta com eles. Sou uma pessoa de sorte, porque muitas têm problemas com isso e se escondem da sociedade. Sempre me senti bem comigo. Falando e sendo sincero com as pessoas, principalmente quem te ama e está do seu lado, você se sente leve. Sempre quis ter minha vida como um livro aberto. Quando você omite, se sente preso. Me sinto leve e isso me traz alegria.
GloboEsporte.com: Como os fãs lidaram com isso? Acha que ajudou alguém?
- Recebo várias mensagens no Facebook de pessoas que nem conheço
pessoalmente e que me pedem ajuda, uma opinião, tipo "como você falou com
seus pais?", "como você se sente?", e eu tento ajudar da maneira
como posso. Perdi as contas, as pessoas dizem que acham lindo e queriam ser da
mesma forma, mas têm medo. Sou contra qualquer tipo de preconceito. Acho que
existe muito, mas tenho fé que as pessoas vão ser melhores e se ajudar. Já
melhorou muito de alguns anos para cá.
Lili: sorriso estampado no rosto com o bronze
em Toronto (Foto: Gabriel
Fricke/GloboEsporte.com)
GloboEsporte.com: Já foi vítima de preconceito?
- Nunca sofri nenhum tipo de desrespeito, nunca chegou alguém para falar
de mim em relação a isso ou me julgar. Como trato com tanta naturalidade, as
pessoas veem isso com naturalidade em mim. Mas acho que tem muita intolerância.
De todo tipo.
Lili em passeio por Toronto (Foto: Gabriel Fricke/GloboEsporte.com)
GloboEsporte.com: Mas nunca teve medo?
- Se eu te falar que tive 100% de tranquilidade, é mentira. A gente
sempre tem um receio de como as pessoas vão olhar. Mas eu vou te dizer que não
são nem 5% das pessoas, então é algo que vem e passa. É como eu falei:
"Para que ficar com medo do mundo se sou tão feliz?". É simples
assim. A gente veio ao mundo para ser feliz, amar, receber amor, respeitar as
pessoas. Se eu respeito as pessoas, dou amor e sou feliz, preciso mais de quê
nessa vida? Sou muito abençoada porque Deus me deu uma família maravilhosa, uma
vida maravilhosa, uma esposa maravilhosa, que está comigo há cinco anos e, todos os
dias, agradeço a Ele nas minhas orações.
GloboEsporte.com: O que achou do Canadá em relação a isso?
- Vários casais aqui andam de mãos dadas. No Brasil, muita gente fica
olhando quando andam de mãos dadas. No Pan, apenas o pessoal das delegações
ficou olhando, mas os canadenses estão acostumados com isso. É natural para
eles. Mas acho que, aos poucos, as pessoas vão entendendo e abrindo a cabeça. É
cada um vivendo sua vida, se respeitando e levando como achar melhor.
GloboEsporte.com: Acha que seria possível ter um lugar como esse no
Brasil?
- Não acho que necessariamente tivesse que ter um bairro assim no Brasil,
mas as pessoas precisam se sentir à vontade para fazer coisas que desejam. Eu
ando de mãos dadas na rua. Eu abraço, trato com carinho e respeito, da mesma
maneira como outros casais. Não acho que tenhamos que enfeitar uma rua para
mostrar isso. Se você quer acabar com o preconceito, tem que ser normal em todo
lugar. Claro que as pessoas, como querem quebrar tabus, acabam tendo que fazer
isso, mas as pessoas se respeitarem, as demonstrações de afeto e carinho podem
acontecer em qualquer lugar.
Na região, até os caixas eletrônicos são coloridos
(Foto: Gabriel Fricke/GloboEsporte.com)
GloboEsporte.com: Deixou sua foto colorida no Facebook quando a Suprema
Corte dos Estados Unidos aprovou o casamento entre pessoas do mesmo sexo em
todo país?
- Eu achei legal porque é um apoio contra o preconceito. E toda forma
disso é válida. Eu também aderi, coloquei minha foto lá colorida. Toda minha
linha do tempo ficou colorida. É muito válido.
GloboEsporte.com: Consideraria ser ativista?
- Não gosto da palavra ativista. Acho que as pessoas têm de ir sentindo
as coisas de forma natural, ninguém tem de impor nada a ninguém, e ninguém tem
de agredir ninguém. As pessoas, aos poucos, vão abrindo seus olhos. Você vai
expondo seu ponto de vista, conversando, mas não precisa agredir ninguém para
colocar seu ponto de vista. Se você respeitar o seu próximo, pode pensar o que
quiser. Se você quer respeito, tem de respeitar.
Orgulho da escolha e orgulho pela medalha
(Foto: Gabriel Fricke/GloboEsporte.com)
Em 2013, o relacionamento Lili e Larissa ganhou repercussão na mídia.
Quando as jogadoras se casaram em uma cerimônia na praia do Porto das Dunas, em
Fortaleza, o assunto tomou conta do noticiário. Mas elas já formam um casal
desde a metade de 2010. Em dezembro daquele ano, se "casaram" em uma
viagem de férias.
volei larissa e lili mosaico (Foto: Editoria de Arte)
Larissa, inclusive, se aposentou no fim de 2012 para tentar ser mãe. No
ano seguinte, veio a mais dura derrota das duas na vida: perderam o bebê que
Larissa esperava, com oito semanas na barriga. Em 2014, mais uma tentativa, e
uma nova perda. Um verdadeiro soco no estômago das jogadoras. Juntas, seguiram
em frente. Hoje, estão focadas nos objetivos dentro de quadra no momento, mas
sabem que a hora de uma nova tentativa vai chegar. Elas querem, inclusive, uma
casa cheia de crianças.
O casal mora em Fortaleza. Estão sempre juntas durante as etapas do
Circuito Brasileiro e também no Circuito Mundial. Quando as competições não
coincidem, como agora, quando Lili esteve em Toronto para a disputa do Pan, e
Larissa está em Yokohama para o Grand Slam japonês, elas usam as redes sociais
e se falam diariamente. Apesar das agendas muitas vezes não coincidirem, Lili e
a esposa preferem não formar uma parceria nas areias pois daria "muita
briga".
Larissa joga com Talita e forma uma vitoriosa parceria que já rendeu,
além de um título do Circuito Brasileiro (2014/2015), quatro ouros no Circuito
Mundial (2014). Elas também bateram o recorde de vitórias consecutivas do
torneio nacional, com 61 triunfos seguidos. Nesta temporada, em torneios
válidos para a corrida olímpica, já levaram o Grand Slam de Moscou, e os Majors
de Porec e Gstaad. Estão em segundo na busca pela vaga, atrás de Ágatha/Bárbara
Seixas. Enquanto isso, Lili tem uma dupla de pouco mais de três meses com
Carol, e já conquistou a prata no Pan.
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