A CRÔNICA
por
Cahê Mota
Independência, Chiquito! Independência! A Argentina está na final da
Copa do Mundo graças a um herói improvável. Um herói que chegou ao
Brasil criticado, contestado, e repetiu Goycochea 24 anos depois. No dia
em que completam 198 anos de independência, os hermanos bateram a
Holanda nos pênaltis graças a Sergio Romero e estão na decisão de
domingo, contra a Alemanha, no Maracanã. Chamado de Chiquito por ser o
mais baixo de quatro irmãos na infância, o goleiro foi gigante e parou
as cobranças de Vlaar e Sneidjer. Brasileiros, não teve jeito, eles
estão na final - nos 120 minutos, ninguém fez gol na Arena Corinthians
nesta quarta-feira.
Desta vez, Louis van Gaal não aprontou, não guardou a última substituição para colocar Krull nas cobranças de pênaltis e se deu mal. O máximo que Cillessen conseguiu foi tocar na bola após chute de Maxi Rodriguez, o derradeiro, que garantiu a Argentina na grande decisão. Em 1990, na Itália, foi outro Sergio, o Goycochea, que parou os donos da casa em outra decisão por penalidades máximas e garantiu os hermanos em outra final contra a Alemanha. A história se repete.
Será a terceira final de Copa entre alemães e argentinos. Em 1986, Maradona garantiu o bi para os hermanos. Quatro anos depois, o futebol coletivo do time germânico comandado por Beckenbauer no banco e Matthäus no campo foi responsável pelo tri. Agora, o tira-teima. Messi ou Müller? Romero ou Neuer? Os europeus chegam embalados pelo 7 a 1 no Brasil, jogam melhor, mas a Argentina tem se mostrado o time do improvável, um time de vitórias no fim.
Aos holandeses resta um encontro com o Brasil, sábado, às 17h (de Brasília), no Estádio Mané Garrincha, em Brasília, para decidir o terceiro lugar. Um jogo com cara de melancolia para os donos da casa e também para a Laranja, que chegou perto mais uma vez e novamente refugou. Dificilmente a geração comandada por Robben, Van Persie e Sneidjer terá outra chance.
Precaução e pouca emoção
Muita marcação, muito toque para o lado e pouco futebol. Holanda e Argentina entraram em campo tão preocupados com o que o outro ia fazer, que esqueceram de jogar. O 7 a 1 da Alemanha sobre o Brasil e o risco de um novo vexame parecem ter deixado as duas equipes mais precavidas. Mas não precisavam ser tão precavidos. Ao término dos 45 minutos iniciais, foram apenas quatro finalizações - três para os hermanos e uma dos holandeses. Romero e Cillessen, no entanto, desceram para o vestiário sem muito trabalho.
Na ausência de Di María, Alejandro Sabella optou por escalar Enzo Pérez e uma formação mais defensiva. Era como se dissesse: "Vamos nos defender aqui, e Messi e Higuaín que se virem lá na frente". No lado esquerdo da defesa, Rojo sempre tinha a ajuda de um companheiro na marcação a Robben.
Como o treinador já tinha alertado na véspera, não podia deixar o atacante pegar velocidade. E assim foi. Quando o carequinha flutuava pelo campo, Mascherano o acompanhava, e a atuação apagada de Van Persie facilitava o trabalho dos argentinos.
Com o rival controlado, a Argentina tentou sair e propor o jogo. Enzo Pérez e Lavezzi trocaram de posição, e o segundo impôs correria no lado direito do campo. As melhores jogadas do primeiro tempo saíram de seus pés, com avanços até a linha de fundo. Nada, porém, que empolgasse muito. Messi, na mesma banda do campo, mas um pouco mais recuado, aparecia mais para tabelas do que em jogadas individuais. De Jong o perseguia, e o craque não conseguia fazer a diferença. O jogo era monótono. Chato, na verdade.
Higuaín e Robben assustam, e só
O medo de perder continuou ditando o ritmo do jogo no segundo tempo. A diferença é que foi a Holanda que passou a ter mais a bola e tentar criar alguma coisa. Tentar, e só, porque nada acontecia. Era bola para esquerda, bola para direita, e desarme argentino. Van Persie sequer aparecia para fazer graça, enquanto Robben e Sneidjer erravam quase tudo, até lances de bola parada. Van Gaal até tentou dar um gás, trocando Martins Indi por Janmaat e colocando Kuyt na esquerda. E tudo seguia da mesma maneira.
A partir dos 20 minutos, a Argentina deixou de ser passiva e adiantou a marcação. Pegando forte no meio-campo, obrigava a Holanda a trocar passes no campo defensivo, e o jogo ficou mais monótono ainda. Sem pressa, os zagueiros tocavam de um lado para o outro em busca de espaços. Mas o primeiro bom espaço da partida quem encontrou foram os argentinos.
Aos 30 minutos, Enzo Pérez aproveitou dividida de Messi com dois holandeses, ficou com a sobra, avançou pela direita e cruzou na medida.
Higuaín se esticou e tocou com a pontinha da chuteira. Grito de gol no Itaquerão, mas a bola ficou na rede pelo lado de fora. Com o time desgastado pela forte marcação imposta o tempo todo, Sabella mudou e tornou a Argentina mais ofensiva: saíram Enzo e Higuaín para as entradas de Palacio e Agüero.
A prorrogação desde o minuto inicial parecia inevitável. Ninguém se expunha, ninguém arriscava. A posse de bola era quase idêntica: 51% x 49% para Holanda. Mas no lance final por muito pouco a genialidade de Sneidjer não decidiu a favor da Holanda. O camisa 10 deixou de calcanhar, Robben invadiu a área com espaço, demorou para chutar e foi travado por Mascherano quase na pequena áera. Não tinha jeito, seriam necessários mais 30 minutos.
Gás de Robben e boas chances da Argentina não impedem pênaltis
Na prorrogação, Arjen Robben, enfim, apareceu. Mostrou aquele fôlego extra que só ele parece ter e passou a correr. Arrancava pela esquerda, pela direita, tentava. Tentava evitar os pênaltis. Mascherano, do outro lado, impedia que o rival conseguisse. Em lindo lance, o holandês se livrou de três, com direito a caneta em Demichelis, mas foi travado pelo volante. Quando teve espaço, arriscou de longe e parou em Romero.
Apesar da proximidade das penalidades, Van Gaal abriu mão de sua arma que não é mais secreta. Huntelaar entrou na vaga de Van Persie: era a terceira substituição. Krull não poderia ser herói dessa vez. Na Argentina, Messi até tinha a bola. Timidamente, mas tinha. Arrancava e sempre era desarmado facilmente. O craque tinha sua pior atuação no Mundial, talvez abalado pela morte do amigo jornalista Jorge "Topo" Lopez, em acidente de trânsito na madrugada desta quarta.
Nos 15 minutos finais, a Holanda cansou. Nem Robben tinha mais pernas para atacar, e a Argentina ganhou duas boas oportunidades. As finalizações, no entanto, foram pífias. E não tinha jeito: os pênaltis eram inevitáveis.
Primeiro, Palacio recuou de cabeça na frente de Cillessen. Em seguida, Messi fez sua melhor jogada na partida, deixou três para trás e cruzou no segundo pau. Maxi Rodriguez, livre, pegou mal na bola. Era hora das penalidades.
Chiquito gigante: Romero coloca Argentina na final
Nas penalidades, a teoria de que a pressão está nos jogadores de linha já tinha ido por água abaixo. Depois de toda a polêmica nas quartas de final, contra a Costa Rica, Krull permaneceu no banco, e era a hora de Cillessen provar que merecia, sim, ser mantido. Antes mesmo de poder fazer sua parte, a responsabilidade já tinha dobrado. Na primeira cobrança, Vlaar chutou para defesa de Romero. O Itaquerão explodiu em sotaque castelhano.
Na penalidade de abertura da Argentina, Lionel Messi. Bola de um lado, Cillessen para o outro, e gol. Em seguida, Robben e Garay fizeram, até que Romero novamente se agigantou. Chute de Sneidjer, defesa do goleiro. Daí em diante, a festa dos hermanos foi quase que uma contagem regressiva.
Agüero fez, Kuyt também, e Maxi Rodriguez garantiu a vaga na final.
Não teve Messi, não teve Di María, muito menos Higuaín ou Agüero. O herói foi o improvável, o criticado Romero. Assim como um outro Sergio 24 anos atrás. Desta vez, como um grito de independência. Independência, Chiquito! No dia em que a Argentina se libertou, Romero fez o mesmo.
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Desta vez, Louis van Gaal não aprontou, não guardou a última substituição para colocar Krull nas cobranças de pênaltis e se deu mal. O máximo que Cillessen conseguiu foi tocar na bola após chute de Maxi Rodriguez, o derradeiro, que garantiu a Argentina na grande decisão. Em 1990, na Itália, foi outro Sergio, o Goycochea, que parou os donos da casa em outra decisão por penalidades máximas e garantiu os hermanos em outra final contra a Alemanha. A história se repete.
Será a terceira final de Copa entre alemães e argentinos. Em 1986, Maradona garantiu o bi para os hermanos. Quatro anos depois, o futebol coletivo do time germânico comandado por Beckenbauer no banco e Matthäus no campo foi responsável pelo tri. Agora, o tira-teima. Messi ou Müller? Romero ou Neuer? Os europeus chegam embalados pelo 7 a 1 no Brasil, jogam melhor, mas a Argentina tem se mostrado o time do improvável, um time de vitórias no fim.
Aos holandeses resta um encontro com o Brasil, sábado, às 17h (de Brasília), no Estádio Mané Garrincha, em Brasília, para decidir o terceiro lugar. Um jogo com cara de melancolia para os donos da casa e também para a Laranja, que chegou perto mais uma vez e novamente refugou. Dificilmente a geração comandada por Robben, Van Persie e Sneidjer terá outra chance.
Sergio Romero vibra com defesa de
pênalti na Arena Corinthians
(Foto: Getty Images)
Muita marcação, muito toque para o lado e pouco futebol. Holanda e Argentina entraram em campo tão preocupados com o que o outro ia fazer, que esqueceram de jogar. O 7 a 1 da Alemanha sobre o Brasil e o risco de um novo vexame parecem ter deixado as duas equipes mais precavidas. Mas não precisavam ser tão precavidos. Ao término dos 45 minutos iniciais, foram apenas quatro finalizações - três para os hermanos e uma dos holandeses. Romero e Cillessen, no entanto, desceram para o vestiário sem muito trabalho.
Na ausência de Di María, Alejandro Sabella optou por escalar Enzo Pérez e uma formação mais defensiva. Era como se dissesse: "Vamos nos defender aqui, e Messi e Higuaín que se virem lá na frente". No lado esquerdo da defesa, Rojo sempre tinha a ajuda de um companheiro na marcação a Robben.
Como o treinador já tinha alertado na véspera, não podia deixar o atacante pegar velocidade. E assim foi. Quando o carequinha flutuava pelo campo, Mascherano o acompanhava, e a atuação apagada de Van Persie facilitava o trabalho dos argentinos.
Com o rival controlado, a Argentina tentou sair e propor o jogo. Enzo Pérez e Lavezzi trocaram de posição, e o segundo impôs correria no lado direito do campo. As melhores jogadas do primeiro tempo saíram de seus pés, com avanços até a linha de fundo. Nada, porém, que empolgasse muito. Messi, na mesma banda do campo, mas um pouco mais recuado, aparecia mais para tabelas do que em jogadas individuais. De Jong o perseguia, e o craque não conseguia fazer a diferença. O jogo era monótono. Chato, na verdade.
Robben lamenta: craque holandês
perdeu grande chance no fim da partida
(Foto: Reuters)
O medo de perder continuou ditando o ritmo do jogo no segundo tempo. A diferença é que foi a Holanda que passou a ter mais a bola e tentar criar alguma coisa. Tentar, e só, porque nada acontecia. Era bola para esquerda, bola para direita, e desarme argentino. Van Persie sequer aparecia para fazer graça, enquanto Robben e Sneidjer erravam quase tudo, até lances de bola parada. Van Gaal até tentou dar um gás, trocando Martins Indi por Janmaat e colocando Kuyt na esquerda. E tudo seguia da mesma maneira.
A partir dos 20 minutos, a Argentina deixou de ser passiva e adiantou a marcação. Pegando forte no meio-campo, obrigava a Holanda a trocar passes no campo defensivo, e o jogo ficou mais monótono ainda. Sem pressa, os zagueiros tocavam de um lado para o outro em busca de espaços. Mas o primeiro bom espaço da partida quem encontrou foram os argentinos.
Aos 30 minutos, Enzo Pérez aproveitou dividida de Messi com dois holandeses, ficou com a sobra, avançou pela direita e cruzou na medida.
Higuaín se esticou e tocou com a pontinha da chuteira. Grito de gol no Itaquerão, mas a bola ficou na rede pelo lado de fora. Com o time desgastado pela forte marcação imposta o tempo todo, Sabella mudou e tornou a Argentina mais ofensiva: saíram Enzo e Higuaín para as entradas de Palacio e Agüero.
A prorrogação desde o minuto inicial parecia inevitável. Ninguém se expunha, ninguém arriscava. A posse de bola era quase idêntica: 51% x 49% para Holanda. Mas no lance final por muito pouco a genialidade de Sneidjer não decidiu a favor da Holanda. O camisa 10 deixou de calcanhar, Robben invadiu a área com espaço, demorou para chutar e foi travado por Mascherano quase na pequena áera. Não tinha jeito, seriam necessários mais 30 minutos.
Messi e Sneijder disputam
lance: argentino teve sua pior
atuação nesta Copa (Foto: Reuters)
Na prorrogação, Arjen Robben, enfim, apareceu. Mostrou aquele fôlego extra que só ele parece ter e passou a correr. Arrancava pela esquerda, pela direita, tentava. Tentava evitar os pênaltis. Mascherano, do outro lado, impedia que o rival conseguisse. Em lindo lance, o holandês se livrou de três, com direito a caneta em Demichelis, mas foi travado pelo volante. Quando teve espaço, arriscou de longe e parou em Romero.
Apesar da proximidade das penalidades, Van Gaal abriu mão de sua arma que não é mais secreta. Huntelaar entrou na vaga de Van Persie: era a terceira substituição. Krull não poderia ser herói dessa vez. Na Argentina, Messi até tinha a bola. Timidamente, mas tinha. Arrancava e sempre era desarmado facilmente. O craque tinha sua pior atuação no Mundial, talvez abalado pela morte do amigo jornalista Jorge "Topo" Lopez, em acidente de trânsito na madrugada desta quarta.
Nos 15 minutos finais, a Holanda cansou. Nem Robben tinha mais pernas para atacar, e a Argentina ganhou duas boas oportunidades. As finalizações, no entanto, foram pífias. E não tinha jeito: os pênaltis eram inevitáveis.
Primeiro, Palacio recuou de cabeça na frente de Cillessen. Em seguida, Messi fez sua melhor jogada na partida, deixou três para trás e cruzou no segundo pau. Maxi Rodriguez, livre, pegou mal na bola. Era hora das penalidades.
Jogadores da Argentina correm para
vibrar com Romero após disputa
por pênaltis (Foto: Marcos Ribolli)
Nas penalidades, a teoria de que a pressão está nos jogadores de linha já tinha ido por água abaixo. Depois de toda a polêmica nas quartas de final, contra a Costa Rica, Krull permaneceu no banco, e era a hora de Cillessen provar que merecia, sim, ser mantido. Antes mesmo de poder fazer sua parte, a responsabilidade já tinha dobrado. Na primeira cobrança, Vlaar chutou para defesa de Romero. O Itaquerão explodiu em sotaque castelhano.
Na penalidade de abertura da Argentina, Lionel Messi. Bola de um lado, Cillessen para o outro, e gol. Em seguida, Robben e Garay fizeram, até que Romero novamente se agigantou. Chute de Sneidjer, defesa do goleiro. Daí em diante, a festa dos hermanos foi quase que uma contagem regressiva.
Agüero fez, Kuyt também, e Maxi Rodriguez garantiu a vaga na final.
Não teve Messi, não teve Di María, muito menos Higuaín ou Agüero. O herói foi o improvável, o criticado Romero. Assim como um outro Sergio 24 anos atrás. Desta vez, como um grito de independência. Independência, Chiquito! No dia em que a Argentina se libertou, Romero fez o mesmo.
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