Destaque no Brasileirão 2013, jogador do Goiás visita a comunidade do Coque e diz que tem orgulho da origem humilde: 'A fama não é boa, mas quero tentar mudar isso'
Porto Alegre, Goiânia, Belo Horizonte e até Porto, em
Portugal. Aos 24 anos, o atacante Walter já morou nessas quatro cidades. Nas
duas primeiras pode dizer que foi bem. Nas outras nem tanto. Em comum nesses
períodos, apenas as saudades da terra natal, o Recife. Mas o jogador não sente
falta de toda a capital pernambucana e somente da comunidade onde nasceu e
cresceu. Trata-se do Coque, uma das áreas mais pobres e violentas da cidade,
encravada no bairro de Joana Bezerra, na área central recifense. Sempre que
está no Recife, Walter vai ao locar rever os amigos. Nas férias deste ano, após
brilhar com a camisa do Goiás no Brasileirão 2013, não foi diferente.
Os momentos vividos na rua Barra Dourada, mais precisamente na casa de número 31, são difíceis de esquecer. Da fome à primeira chuteira. Das peladas que varavam a madrugada até o dia em que, aos seis anos, precisou correr pelo bairro para ver de perto o corpo de um dos seus cinco irmãos, assassinado dentro de um ônibus. Foram altos e baixos. Mais baixos, é verdade, mas nem assim o Coque sai da memória de Walter.
A relação de carinho é tanta que no dia 7 de agosto deste ano ele viu uma grande oportunidade de homenagear o local e os amigos. Jogando pelo Goiás, o atacante iria enfrentar o Náutico. Ficou sabendo que o jogo seria transmitido com sinal aberto pelo SporTV. E não pensou duas vezes. Ao comemorar o seu primeiro gol - fez dois no jogo -, correu para as câmeras como muitos atacantes fazem para homenagear esposas, filhos e filhas. No caso dele, a homenagem era para a sua casa: “Uh, Coque aê” - gritou.
- Quando eu soube que ia ser transmitido pensei logo em homenagear o Coque. Sei que todo mundo aqui torce por mim e que dificilmente conseguem assistir a um jogo do Goiás, pois a maioria só é transmitida pelo pay-per-view.
Apesar da distância e da nova vida que leva por ter se
tornado um jogador de futebol de sucesso, Walter não abandona o Coque. Sempre
que pode reaparece para uma visita. Acaba ficando o dia todo conversando com os
amigos e revendo velhos conhecidos. É parado em cada esquina. Virou ídolo de
crianças e adultos. Pode se dizer que é o Rei do Coque. E quer muito mais.
- Muita gente pensa que todo mundo aqui no Coque é ladrão. Conheço pessoas que não conseguem emprego quando dizem que são daqui. Eu peguei um táxi uma vez e quando disse que ira para o Coque o taxista não quis me levar. O nome coloca medo, mas o lugar mudou. Não é mais aquela violência de antigamente. Tem uns problemas e outros, mas melhorou.
Uma das ideias de Walter é fazer com que o Coque seja conhecido por coisas boas. E os seus gols acabam sendo o caminho mais fácil. Sonha em realizar projetos sociais no local, mas por enquanto usa a sua fama como goleador para servir de garoto propaganda da comunidade.
A alegria de Walter hoje é poder andar pelas ruas onde foi criado sem medo e sem estar preocupado com o que pode acontecer no minuto seguinte. É ver que as crianças de hoje possuem um pouco mais de tranquilidade para brincar do que ele tinha.
- Aqui eu já vi assaltos, mortes, tiroteios. Já vi gente morrendo com o sangue escorrendo ainda. Quando tinha tiroteio a gente tinha que correr do nada. Eu entrava na casa mais próxima e algumas vezes de pessoas desconhecidas porque não dava tempo de chegar a minha. Minha mãe ficava preocupada e saía no meio do tiroteio para tentar me achar.
A mãe, Edith, é inclusive a grande responsável por tudo que Walter se tornou. Hoje ela já não vive mais no Coque. Foi uma promessa feita pelo filho antes de se tornar famoso e cumprida ainda nos primeiros anos de carreira. Comprou um apartamento para ela quando era jogador do Internacional. Foi uma retribuição por tudo que ganhou quando criança. E os presentes passaram longe de ser apenas bens materiais. Amor, ensinamentos, responsabilidades. Essas são as heranças que Edith deu ao filho.
- Minha mãe é tudo para mim. Ela sempre correu atrás para
que eu me tornasse o que sou hoje. Lutou para que eu entrasse na escolinha do
Sport e acabou conseguindo uma cortesia. Quando fui para o Santa Cruz ela
corria atrás para conseguir a minha passagem e às vezes deixava de comprar o
pão ou o café para que eu pudesse ir treinar. Sem ela eu não iria vencer.
Além da mãe, Walter tem outras duas mulheres pelas quais ele seria capaz de dar tudo. Mulheres que entraram na vida do jogador quando ele estava melhores condições financeiras, mas que lutaram junto com ele em uma das suas maiores dificuldades até hoje. Vanessa, a esposa e Catarina Vitória, a filha.
Vanessa e Walter se casaram em 2010 e no mesmo ano ela acabou perdendo o primeiro filho do casal. Em 2011, ela deu à luz uma menina de apenas seis meses. Catarina, que ganhou o sobrenome de Vitória pela briga para se manter viva. Luta parecida com a do pai, que conseguiu vencer na vida depois de uma infância dura e perigosa.
- O nascimento da minha filha foi um momento muito difícil. Ela nasceu de seis meses e ninguém acreditava que sobreviveria. Muitos médicos falaram que ela não tinha chances, mas conseguimos. Agradeço muito ao Hulk, que na época jogava no Porto comigo. Ele me ajudou muito durante o tempo todo.
Apesar de ter apenas 24 anos, Walter pode dizer que já tem um filho apenas quatro anos mais novo. Natural também do Coque, o atacante Anderson Lopes segue os passos do amigo. Deixou o Recife para jogar no São José-RS, assim como Walter e depois se transferiu para o Internacional. Hoje é jogador do Avaí e foi utilizado pela equipe catarinense na Série B do Campeonato Brasileiro deste ano.
- Fico muito orgulhoso de ver o Walter vencendo na carreira e
sonho um dia conseguir isso também. Ele é um pedaço da minha vida. Eu não
estava sendo valorizado no Sport e ele disse que iria me levar para o Sul.
Acabei tendo uma chance no São José e hoje dou os meus primeiros passos como
profissional no Avaí.
Anderson Lopes passou três anos nas categorias de base do Internacional. Chegou lá quando aos 17 anos quando o padrinho já tinha estourado e estava prestes a ser vendido para o Porto, de Portugal. Walter já tinha moral no Beira-Rio e isso ajudou o garoto Anderson.
- Todo mundo lá me chamava de "filho de Walter". Passei a ser conhecido assim e reconhecido por todo mundo. Essa sombra nunca me incomodou. Ser conhecido como filho dele é uma honra para mim. Somos amigos, irmãos e estamos sempre juntos quando temos condições.
FONTE:
http://globoesporte.globo.com/pe/noticia/2013/12/walter-sonha-com-dias-melhores-para-localidade-onde-nasceu-no-recife.html
Os momentos vividos na rua Barra Dourada, mais precisamente na casa de número 31, são difíceis de esquecer. Da fome à primeira chuteira. Das peladas que varavam a madrugada até o dia em que, aos seis anos, precisou correr pelo bairro para ver de perto o corpo de um dos seus cinco irmãos, assassinado dentro de um ônibus. Foram altos e baixos. Mais baixos, é verdade, mas nem assim o Coque sai da memória de Walter.
No
Coque, Walter se sente à vontade perto dos
amigos e dos locais onde
brincava na infância no
Recife (Foto: Aldo Carneiro/Pernambuco Press)
A relação de carinho é tanta que no dia 7 de agosto deste ano ele viu uma grande oportunidade de homenagear o local e os amigos. Jogando pelo Goiás, o atacante iria enfrentar o Náutico. Ficou sabendo que o jogo seria transmitido com sinal aberto pelo SporTV. E não pensou duas vezes. Ao comemorar o seu primeiro gol - fez dois no jogo -, correu para as câmeras como muitos atacantes fazem para homenagear esposas, filhos e filhas. No caso dele, a homenagem era para a sua casa: “Uh, Coque aê” - gritou.
- Quando eu soube que ia ser transmitido pensei logo em homenagear o Coque. Sei que todo mundo aqui torce por mim e que dificilmente conseguem assistir a um jogo do Goiás, pois a maioria só é transmitida pelo pay-per-view.
Ex-morador do Coque, Walter hoje é ídolo na comunidade (Foto: Aldo Carneiro/PE Press)
- Muita gente pensa que todo mundo aqui no Coque é ladrão. Conheço pessoas que não conseguem emprego quando dizem que são daqui. Eu peguei um táxi uma vez e quando disse que ira para o Coque o taxista não quis me levar. O nome coloca medo, mas o lugar mudou. Não é mais aquela violência de antigamente. Tem uns problemas e outros, mas melhorou.
Uma das ideias de Walter é fazer com que o Coque seja conhecido por coisas boas. E os seus gols acabam sendo o caminho mais fácil. Sonha em realizar projetos sociais no local, mas por enquanto usa a sua fama como goleador para servir de garoto propaganda da comunidade.
saiba mais
- Espero que o Coque seja de todo mundo. Quando vejo uma
notícia sobre mim e falam que eu sou do Coque fico muito feliz. Estou sendo
reconhecido pelo meu trabalho e colocando o nome do meu bairro. Sei que estou
dando uma alegria a eles também. A fama daqui não é boa, mas eu quero tentar
mudar isso.A alegria de Walter hoje é poder andar pelas ruas onde foi criado sem medo e sem estar preocupado com o que pode acontecer no minuto seguinte. É ver que as crianças de hoje possuem um pouco mais de tranquilidade para brincar do que ele tinha.
- Aqui eu já vi assaltos, mortes, tiroteios. Já vi gente morrendo com o sangue escorrendo ainda. Quando tinha tiroteio a gente tinha que correr do nada. Eu entrava na casa mais próxima e algumas vezes de pessoas desconhecidas porque não dava tempo de chegar a minha. Minha mãe ficava preocupada e saía no meio do tiroteio para tentar me achar.
01
as mulheres de walter
A mãe, Edith, é inclusive a grande responsável por tudo que Walter se tornou. Hoje ela já não vive mais no Coque. Foi uma promessa feita pelo filho antes de se tornar famoso e cumprida ainda nos primeiros anos de carreira. Comprou um apartamento para ela quando era jogador do Internacional. Foi uma retribuição por tudo que ganhou quando criança. E os presentes passaram longe de ser apenas bens materiais. Amor, ensinamentos, responsabilidades. Essas são as heranças que Edith deu ao filho.
Vanessa é uma das mulheres da vida de Walter (Foto: Reprodução / Instagram)
Além da mãe, Walter tem outras duas mulheres pelas quais ele seria capaz de dar tudo. Mulheres que entraram na vida do jogador quando ele estava melhores condições financeiras, mas que lutaram junto com ele em uma das suas maiores dificuldades até hoje. Vanessa, a esposa e Catarina Vitória, a filha.
Vanessa e Walter se casaram em 2010 e no mesmo ano ela acabou perdendo o primeiro filho do casal. Em 2011, ela deu à luz uma menina de apenas seis meses. Catarina, que ganhou o sobrenome de Vitória pela briga para se manter viva. Luta parecida com a do pai, que conseguiu vencer na vida depois de uma infância dura e perigosa.
- O nascimento da minha filha foi um momento muito difícil. Ela nasceu de seis meses e ninguém acreditava que sobreviveria. Muitos médicos falaram que ela não tinha chances, mas conseguimos. Agradeço muito ao Hulk, que na época jogava no Porto comigo. Ele me ajudou muito durante o tempo todo.
02
um filho de 20 anos
Apesar de ter apenas 24 anos, Walter pode dizer que já tem um filho apenas quatro anos mais novo. Natural também do Coque, o atacante Anderson Lopes segue os passos do amigo. Deixou o Recife para jogar no São José-RS, assim como Walter e depois se transferiu para o Internacional. Hoje é jogador do Avaí e foi utilizado pela equipe catarinense na Série B do Campeonato Brasileiro deste ano.
Anderson é o 'filho adotivo' de Walter (Foto: Aldo Carneiro/Pernambuco Press)
Anderson Lopes passou três anos nas categorias de base do Internacional. Chegou lá quando aos 17 anos quando o padrinho já tinha estourado e estava prestes a ser vendido para o Porto, de Portugal. Walter já tinha moral no Beira-Rio e isso ajudou o garoto Anderson.
- Todo mundo lá me chamava de "filho de Walter". Passei a ser conhecido assim e reconhecido por todo mundo. Essa sombra nunca me incomodou. Ser conhecido como filho dele é uma honra para mim. Somos amigos, irmãos e estamos sempre juntos quando temos condições.
Walter visita a comunidade do Coque sempre
que passa pelo Recife (Foto: Aldo
Carneiro/Pernambuco Press)
FONTE:
http://globoesporte.globo.com/pe/noticia/2013/12/walter-sonha-com-dias-melhores-para-localidade-onde-nasceu-no-recife.html
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