Thauane de Medeiros, de 18 anos, deixou o Sul e se mudou para São Paulo em busca de dias melhores. Agora, gremista vende dicas na Av. Paulista
No vão livre do Museu de Arte de São Paulo, o Masp, Thauane Medeiros
precisou se acostumar a uma certa dose de ignorância. Com as palavras
ensaiadas na cabeça, a jovem de 18 anos sabe, mesmo antes da abordagem,
quem dificilmente dará importância ao seu discurso. O descaso, porém,
não se restringe àquela altura da Avenida Paulista. Campeã brasileira
sub-18 e sub-20 de xadrez, a gaúcha de Santa Maria, mas criada em
Palhoça, Santa Catarina, tenta se virar como pode para seguir no esporte
sem apoio ou patrocínio. Depois de deixar o Sul para buscar dias
melhores em São Paulo, escreveu um livro com lições de tabuleiro e agora
usa o dinheiro arrecadado com a venda para pagar inscrições e viagens
para as competições.
Thauane vende o livro de 57 páginas, recheado de jogadas e ilustrações e impresso por conta própria, a R$ 20. Quem passa pelo Masp às quartas, sextas, sábados e domingos, entre 9h e 12h, a encontra com vários exemplares em mãos e um sorriso no rosto. Simpática, usa alguns poucos minutos – às vezes segundos – de papo para tentar ganhar o apoio do pedestre. Nem sempre consegue. Em meio ao caos de um dos principais centros de negócios da capital paulista, muitas vezes é ignorada. Uma vez, chegou a ter sua mochila, cheia de livros, furtada. A enxadrista, no entanto, persiste.
- Quando eu coloco algo na minha cabeça, quando eu tenho uma meta, foco
nisso. Isso tem um lado ruim porque às vezes tem de mudar o foco. Às
vezes, eu não penso. Não olho para o lado. Não foi à toa que aos 8 anos
eu me decidi pelo xadrez, larguei tudo lá no sul por causa do xadrez. Eu
vendo os livros a R$ 20. As inscrições variam entre R$ 50 e R$ 80. Eu
me programo bem antes para juntar uma grana. São várias despesas, né?
Sempre me virei bem, sempre dei meus pulos.
A jovem começou no xadrez incentivada pelo cunhado, quando tinha apenas 8 anos. Pegou gosto pelo esporte e, em pouco tempo, conquistou bons resultados em torneios escolares em Santa Catarina. Com 9 anos, foi vice-campeã estadual na categoria sub-10. Depois, acumulou títulos e representou o país em competições na Grécia, Paraguai e Colômbia.Tudo contando apenas com o apoio dos pais e parcerias pontuais, nenhum patrocínio fixo.
Ainda com 16 anos, Thauane deixou a casa dos pais em Palhoça e foi
morar com dois amigos em Mogi das Cruzes, no interior de São Paulo.
Trabalhou em lojas de calçados, mas, incentivada pelo poeta Ivan
Petrovitch, que também vende suas obras no vão do Masp, resolveu
investir no que gosta. Primeiro, gravou aulas em um CD. Depois,
transferiu as jogadas para o livro. Nos dias que parte para a capital,
enfrenta até duas horas de ônibus, mas se diz satisfeita com o
resultado. Em pouco mais de um ano, a jovem acredita já ter vendido
cerca de dois mil exemplares.
- Eu estudava xadrez sem livros, apenas jogando. Mas eu sempre tive uma memória boa. Via as jogadas diferentes que os outros faziam e as repetia. Hoje, é ruim isso porque sou preguiçosa com a leitura. Eu não leio livro de nada. Mas deveria ler. Estaria bem melhor hoje – disse a gaúcha, que largou o colégio no segundo ano do ensino médio, mas que pretende completar os estudos com a ajuda de um supletivo.
Além dos livros, Thauane também dá aulas, até mesmo pelo computador. Mesmo tão jovem, tem se esforçado para não abandonar o xadrez. Apenas com o apoio dos pais e de amigos, ainda acredita em dias melhores.
- É uma coisa que ou você investe ou você desiste. Lá (em Santa
Catarina), não tinha torneio, não tinha nada. Precisava gastar uma grana
para vir para São Paulo. Minha mãe é servente, meu pai já foi auxiliar
de marceneiro, já foi garçom. Hoje, ele é dono de uma lanchonete. Então,
não tem a menor possibilidade de bancar isso. Com a venda dos livros,
eu pago meu aluguel. Sobra pouco para a inscrição dos torneios. Meus
pais são meus maiores incentivadores. Meu pai incentivou ainda mais
porque ele era muito bom no futebol quando criança, muito mesmo. Mas, na
época, Santa Maria era roça. Meu avô não deixou. Isso foi um pouco de
trauma para o meu pai. Ele diz: “Eu fui trancado quando criança, por que
iria trancar minha filha?”.
De tanto bater à porta das empresas, Thauane acabou entrando em um projeto do Sesi-SP, onde passou a dar aulas para crianças por um tempo. Teve a sorte de estar lá durante a passagem do russo Garry Kasparov, uma das maiores lendas do esporte. Mais do que isso. Por quase duas horas, manteve a calma e enfrentou o Grão-Mestre (nível máximo de excelência no xadrez). Só não conseguiu vencer o ídolo.
- Foi inusitado, não esperava. Mas fiquei tranquila. Lógico, ele é um
ícone do xadrez. Mas o psicológico é muito importante. Se você entra
para o jogo com 50% perdido, você perde. Precisa entrar com muita
atenção.
Além do xadrez, Thauane também se mostra fanática por futebol. Do pai, herdou a paixão pelo Grêmio. Tatuou aos 14 anos o escudo do clube no ombro direito e chega a usar camisas do time em competições e para vender seus livros.
- Uma vez Grêmio, sempre Grêmio. Quando tinha 14 anos, tatuei o escudo no ombro. Minha mãe me enrolou, queria que eu fizesse só aos 18. Mas um amigo tinha uma máquina caseira, e eu tatuei. Eu coloco uma coisa na cabeça e preciso fazer. Já até procurei apoio deles, mas só investem em futebol.
Nos planos para o futuro, Thauane ensaia uma mudança para a capital e se prepara para disputar o Sul-Americano sub-20 no Paraguai, em abril. Enquanto isso, continua vendendo seus livros e desviando de alguns “nãos” e até mesmo de cantadas de pedestres e da ira de namoradas mais ciumentas.
- Ah, já recebi algumas, né? Chamam para almoçar, para jantar, para conversar mais sobre o livro (risos). Já me acostumei. As mulheres são as piores, grudam no namorado para mostrar que estão juntos e fecham a cara. Acontece...
Thauane vende o livro de 57 páginas, recheado de jogadas e ilustrações e impresso por conta própria, a R$ 20. Quem passa pelo Masp às quartas, sextas, sábados e domingos, entre 9h e 12h, a encontra com vários exemplares em mãos e um sorriso no rosto. Simpática, usa alguns poucos minutos – às vezes segundos – de papo para tentar ganhar o apoio do pedestre. Nem sempre consegue. Em meio ao caos de um dos principais centros de negócios da capital paulista, muitas vezes é ignorada. Uma vez, chegou a ter sua mochila, cheia de livros, furtada. A enxadrista, no entanto, persiste.
Thauane de Medeiros vende livros para poder pagar inscrições de torneios (Foto: João Gabriel Rodrigues)
A jovem começou no xadrez incentivada pelo cunhado, quando tinha apenas 8 anos. Pegou gosto pelo esporte e, em pouco tempo, conquistou bons resultados em torneios escolares em Santa Catarina. Com 9 anos, foi vice-campeã estadual na categoria sub-10. Depois, acumulou títulos e representou o país em competições na Grécia, Paraguai e Colômbia.Tudo contando apenas com o apoio dos pais e parcerias pontuais, nenhum patrocínio fixo.
Thauane de Medeiros se acostumou a ouviralguns 'nãos' (João Gabriel Rodrigues)
- Eu estudava xadrez sem livros, apenas jogando. Mas eu sempre tive uma memória boa. Via as jogadas diferentes que os outros faziam e as repetia. Hoje, é ruim isso porque sou preguiçosa com a leitura. Eu não leio livro de nada. Mas deveria ler. Estaria bem melhor hoje – disse a gaúcha, que largou o colégio no segundo ano do ensino médio, mas que pretende completar os estudos com a ajuda de um supletivo.
Além dos livros, Thauane também dá aulas, até mesmo pelo computador. Mesmo tão jovem, tem se esforçado para não abandonar o xadrez. Apenas com o apoio dos pais e de amigos, ainda acredita em dias melhores.
Thauane de Medeiros autografa os livros que vende (Foto: João Gabriel Rodrigues)
De tanto bater à porta das empresas, Thauane acabou entrando em um projeto do Sesi-SP, onde passou a dar aulas para crianças por um tempo. Teve a sorte de estar lá durante a passagem do russo Garry Kasparov, uma das maiores lendas do esporte. Mais do que isso. Por quase duas horas, manteve a calma e enfrentou o Grão-Mestre (nível máximo de excelência no xadrez). Só não conseguiu vencer o ídolo.
Thauane de Medeiros chegou a enfrentar o mito Kasparov (Foto: Ivan Petrovitch / Divulgação)
Além do xadrez, Thauane também se mostra fanática por futebol. Do pai, herdou a paixão pelo Grêmio. Tatuou aos 14 anos o escudo do clube no ombro direito e chega a usar camisas do time em competições e para vender seus livros.
- Uma vez Grêmio, sempre Grêmio. Quando tinha 14 anos, tatuei o escudo no ombro. Minha mãe me enrolou, queria que eu fizesse só aos 18. Mas um amigo tinha uma máquina caseira, e eu tatuei. Eu coloco uma coisa na cabeça e preciso fazer. Já até procurei apoio deles, mas só investem em futebol.
Nos planos para o futuro, Thauane ensaia uma mudança para a capital e se prepara para disputar o Sul-Americano sub-20 no Paraguai, em abril. Enquanto isso, continua vendendo seus livros e desviando de alguns “nãos” e até mesmo de cantadas de pedestres e da ira de namoradas mais ciumentas.
- Ah, já recebi algumas, né? Chamam para almoçar, para jantar, para conversar mais sobre o livro (risos). Já me acostumei. As mulheres são as piores, grudam no namorado para mostrar que estão juntos e fecham a cara. Acontece...
Gremista fanática, Thauane tentou o apoio do clube (Foto: João Gabriel Rodrigues)
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