FONTE:
http://jornalggn.com.br/luisnassif
Coletânea narra os últimos acontecimentos políticos que determinaram o rumo do golpe de Estado no Brasil
Jornal GGN - Grupo de acadêmicos articulados por Wilson Ramos Filho e o Instituto Declatra, lançam a coletânea A Resistência ao Golpe de 2016, pela Editora Praxis. O livro escrito por 105 autores, dentre eles juristas, economistas e artistas, faz uma narrativa dos últimos acontecimentos políticos no país e que determinaram o rumo do golpe de Estado.
Release
Livro “Resistência Internacional ao Golpe de 2016”
Por Carol Proner
« Por que foi que cegamos, Não sei, talvez um dia se chegue a conhecer a razão, Queres que te diga o que penso, Diz, Penso que não cegamos, penso que estamos cegos, Cegos que veem, Cegos que, vendo, não veem. » José Saramago, em Ensaio sobre a cegueira.
O Brasil de 2016 tateia no escuro uma etapa dramática de sua história. Está a ponto de ser consolidado um crime meticulosamente tramado por parte de suas elites e que produzirá uma ruptura irreversível na jovem democracia sob aparência de constitucionalidade.
Todos sabem que foi Golpe. A palavra, incômoda, o é porque expõe os responsáveis e os cúmplices. Assim como é constrangedor para os criminosos o lugar de vítima encarnado por Dilma Rousseff que até o último momento não aceitou fazer qualquer tipo de acordo para indultar o golpismo, nem mesmo quando aconselhada por assessores “realistas”.
Os usurpadores tomam o poder e nosso papel, dos intelectuais, da academia, é não deixar naturalizar as narrativas justificadoras para o cometimento do mais explícito atentado contra a soberania popular já produzido no país. O Golpe de 2016 produzirá consequências incalculáveis para a sociedade brasileira, para o projeto de estado autônomo e soberano, para os recursos naturais e o futuro da nação brasileira. E mais uma vez estaremos do lado certo da história, contestando os abusos e resistindo aos retrocessos.
Com a presente coletânea completamos a série de três obras dedicadas a denunciar e resistir ao Golpe de 2016, um projeto idealizado por Wilson Ramos Filho, pelo Instituto Declatra, realizado com outros colaboradores entre os quais o Instituto de Direitos Humanos Joaquín Herrera Flores e publicados pela Editora Praxis.
A primeira da série, lançada em junho e organizada no calor dos acontecimentos processuais do impeachment, teve como título A Resistência ao Golpe de 2016, livro inaugural de denúncia, escrito por 105 autores entre juristas, economistas, artistas e que cumpriu um importante papel interpretativo e difusor da narrativa segundo a qual Sim, vivemos um Golpe, inédito, novidadeiro, branco, parlamentar, possibilitado por uma articulação corrupta midiatizada e com o beneplácito da elite empresarial, de setores do Poder Judiciário e do Ministério Público para assaltar o poder sem disputar eleições.
A segunda coletânea, lançado no mês seguinte, A Classe Trabalhadora e a Resistência Internacional ao Golpe de 2016, reuniu igualmente mais de 100 autores, especialmente juristas ligados ao mundo do trabalho, que traduziram o Golpe na faceta social de retrocessos iminentes, de liquidação do projeto de estado social inclusivo e o desmonte das conquistas dos últimos 30 anos, bem como relembrou a histórica capacidade de mobilização da classe trabalhadora para resistir e lutar.
A presente coletânea, Resistência Internacional ao Golpe de 2016, teve como objetivo principal recolher as impressões sobre o processo vivido no Brasil a partir do olhar estrangeiro, da mirada distanciada dos intelectuais, juristas, jornalistas, escritores, parlamentares de outros países que, irmanados por uma preocupação comum – a preservação da democracia como valor estrutural de uma sociedade – e com a devida distância geográfica foram capazes de denunciar “aquilo que não se quis ver”.
Em organização colegiada de cinco mulheres, reunimos textos que registram as iniciativas da sociedade civil e de parlamentares para resistir ao Golpe fazendo uso de instrumentos de denúncia interna e internacional, como a sentença do Tribunal Internacional pela Democracia no Brasil (realizado em julho/2016, na cidade do Rio de Janeiro), cópia da Representação Perante a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), cópia do documento Defesa Jurídica e Política Contra o Golpe no Brasil, assinado pelo advogado da Presidenta Dilma, José Eduardo Cardozo, bem como a Mensagem da Presidenta da República Dilma Rousseff ao Senado Federal e ao Povo Brasileiro, divulgada antes do julgamento do impeachment.
Também compilamos textos militantes (alguns já publicados em blogs), entrevistas, manifestos, opiniões e artigos de uma centena de autores e personalidades dedicados a revelar e refletir sobre uma espécie inédita de “golpe branco” praticada no Brasil, que se destaca acintosamente pela inidoneidade de um Congresso engolfado em processos de corrupção. Se no golpe paraguaio o destaque escandaloso foi o processo relâmpago de 24 horas que expurgou Lugo do mandato constitucional e se no caso hondurenho o destaque foi a expulsão a fórceps do mandatário em pijamas, no caso brasileiro o “Fator Cunha”, o “Fator Temer” e “um Congresso corrupto” causaram perplexidade da comunidade internacional que reagiu fortemente em Manifestos e escritos de apoio ao mandato e à democracia. O aspecto ético foi definitivo para motivar internacionalmente a enxurrada de denúncias pela injustiça cometida contra Dilma Rousseff, reconhecida como mulher honesta e íntegra.
Mesmo a imprensa conservadora, como é o caso da revista inglesa The Economist, apontou o vexame internacional do impeachment aprovado na fase da Câmara dos Deputados no pesaroso 17 de abril, entendendo que os delitos fiscais atribuídos a Dilma eram muito menores que os de seus algozes e que, como tal, não constituíam “crime de responsabilidade”.
A complexidade do “golpe branco” no Brasil é imensa e demanda coragem aos que o denunciamos, pois que já se revelam diversos “golpes dentro do golpe” numa espécie de caça às bruxas de tipo constitucional e regulamentar promovidos pelas mesmas instituições que asseguram o processo maior. Há o poder judiciário atuando com um ativismo jamais visto, há o Supremo Tribunal Federal que, se eximindo de responsabilidade quanto ao momento político, limita-se ao exame legalista das matérias que lhe são atribuídas, há também a pronúncia de alguns ministros da suprema corte que, enfáticos, afirmam a constitucionalidade do processo de impeachment, há o ministério público com setores persecutórios enraivecidos ideologicamente, há a polícia federal mais autônoma que em qualquer outro momento da história (mérito do Governo Dilma) e que serve de engrenagem persecutória, há a grotesca manifestação do legislativo oportunista que vive o momento como se fossem novas eleições e há, por fim, o mais importante, o processo brasileiro também contém um ingrediente indispensável: a mídia golpista trabalhando diuturnamente para que chegue a bom termo da forma como seja a investidura de candidato ligado aos interesses do grande capital.
Fazemos parte de uma academia que não se eximiu do dever histórico de tomar posição diante das injustiças. Em tempos de cegueira voluntária dos que detêm o poder, o resultado do golpismo só foi e seguirá sendo possível porque mantém o povo e as ruas verdadeiramente cegos, controlados ou distantes. Esperemos que esta coletânea e os diversos livros que surgem simultaneamente para denunciar o Golpe possam servir para o contrário, para fazer ver, revelar e armar as lutas que virão adiante.
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