A CRÔNICA
por
Lucas Rizzatti
A faixa estendida nas cadeiras da Arena Corinthians era para ser de
pura provocação aos ingleses. Virou doce premonição aos uruguaios. Numa
paródia do hino da Inglaterra, dizia “Deus salve… o Rei”. No caso, Luis
Suárez. O herói, o salvador, o santo. Na tarde desta quinta-feira, o
camisa 9 simbolizava tudo isso e um pouco mais para uma nação de 3
milhões de apaixonados. Ele não desapontou. Renasceu sobre o joelho
esquerdo operado há 29 dias. Colocou nele toda a força para, em dois
golpes certeiros, destronar o time da Rainha. Inclusive ofuscou Rooney,
que marcou seu primeiro gol em Mundiais. O 2 a 1 foi suficiente para
também resgatar o Uruguai de uma eliminação quase certa a uma possível
classificação no Grupo D da Copa do Mundo. Bendita faixa… Deus salvou
Suárez, que salvou o Uruguai. O fantasma de 1950 despertou outra vez.
Suárez marcou duas vezes no mesmo minuto. Nos 39 de cada tempo. Um enredo divino, como fora o passe de Cavani para o primeiro tento. No segundo, Luisito fez quase tudo sozinho após balão do milagreiro Muslera. Pobre Rooney, não conseguiu o brilho que a quebra do jejum pessoal merecia
.
A tabela volta a sorrir aos uruguaios. Após perder para a Costa Rica, coleciona três pontos. A Inglaterra segue zerada. Na sexta, o Grupo D complementa a segunda rodada com o confronto entre Costa Rica e Itália. Nenhuma das equipes está eliminada. Mas os ingleses precisam torcer pelos italianos e golear a Costa Rica na rodada final, que será na terça.
Nem parecia que Uruguai e Inglaterra haviam perdido na estreia e
diminuído suas chances de classificação. A festa dos torcedores nos
arredores de Itaquera e no interior da Arena Corinthians foi digna de
final de Copa. Os charruas, como de costume, foram mais balhurentos,
pareciam multiplicar as vozes já roucas de tanto gritar “Soy Celeste”.
Mais do que isso, deliraram com a escalação nos telões, que estamparam o
rosto dele, de Luis Suárez. Além dele, entraram Giménez, na vaga do
lesionado Lugano, Álvaro Pereira, em substituição ao suspenso Maxi
Pereira, e as alterações de ordem técnica, com os ingressos de Álvaro
González e Lodeiro no meio-campo.
A Inglaterra não mudou em relação à derrota para a Itália. Só recuou Rooney. Mas o alvo da torcida inglesa não era o seu astro. Todos queriam apupar Suárez. Vaias se avolumaram a cada toque na bola do atacante do Liverpool, companheiro de clube de cinco titulares do time de Roy Hodgson. Haja garganta. Porque Suárez tocou muito na bola. Ele cobrava escanteios, faltas, puxava contragolpes…
Em dois desses escanteios, Suárez quase aprontou. Primeiro, aos três
minutos, em que a cobrança na primeira trave quase se transformou em gol
olímpico. Mais tarde, aos 26, mudou a tática e bateu o escanteio
rasteiro para a marca penal. Cavani emendou de primeira, sobre o poste.
Suárez é assim. Imprevisível como todo craque. Mas ele tinha algo a
mais. Uma fome a mais. Não aquela fome que o fez morder um adversário do
Chelsea na Premier League. Fome de gol. Afinal, quase perdera a Copa
pela lesão no joelho.
O único que parecia capaz de desvirtuar o destino redentor de Suárez era Rooney. Entrou em seu nono jogo de Mundial em busca de seu primeiro gol. Em cobrança de falta, deixou Muslera estático e arrancou “uuhhhh” sem fim da torcida. Em outra bola parada, aparou de cabeça um escanteio, na pequena área. A finalização explodiu no travessão.
Mas o destino já tinha seu roteiro para a tarde cinza e fria desta quinta, na Arena Corinthians. Porque, desta vez, Deus está salvando Suárez. E, por tabela, o Uruguai. Em contragolpe perfeito, Lodeiro oferece a bola a Cavani. O atacante do Paris Saint-Germain fez menção de chutar. Como que por força divina, desistiu. Ergueu os olhos sob a cabeleira e alçou com maestria para Suárez. Aos 39 minutos, Luisito voltava a sorrir como não fazia há 29 dias.
Estava tão ansioso em marcar que, após golpear de cabeça e vencer Hart, nem esperou a bola roçar a rede. Misturou todas as comemorações numa só. Emendou com os dedos alguns tiros de revólver por seu apelido “Pistoleiro”, depois beijou a aliança de casado, levou as mãos ao rosto, deitou-se no chão, apontou para o fisioterapeuta Walter Ferreira. Fez de tudo. Chorou. Nada que qualquer outro uruguaio não estivesse fazendo naquele momento. Ao mesmo tempo, Suárez era o cara, mas também era mais um.
O início do segundo tempo foi avassalador. Parecia que todos os
jogadores do Uruguai eram um pouco Suárez. Foram quatro chances claras
em seis minutos. Uma delas, com o próprio camisa 9, que se precipitou em
chutou para longe. Cavani, no entanto, foi quem errou mais. Após belo
passe de González, ficou cara a cara com Hart e colocou com defeito.
A Inglaterra deu o troco logo depois. Em cruzamento rasteiro para a área, a bola se ofereceu a Rooney, sozinho. Melhor que um pênalti. Não melhor que Muslera. Milagre na Arena Corinthians, que chegou a ouvir em certos momentos o grito do dono do estádio: “Timão, êô, Timão êô”...
Que foi cortado pelos urros ingleses, pedindo pênalti - que não houve -
em Sterling. A trupe da terra da Rainha também reclamou do tempo de
atendimento a Muslera. Mas em nada poderia se enervar com a parada para
atender Álvaro Pereira, que levou uma joelhada no rosto, aos 15 minutos.
Ao saber que seria substituído, levantou o dedo, em sinal negativo em
direção ao cuidadoso médico Alberto Pan. E não saiu. Em questão de
minutos, já estava cabeceando a bola na aplicada defesa charrua.
O esforço de Pereira só não foi maior que a insistência de Rooney. Após três tentativas fracassadas, enfim o camisa 10 conseguiu marcar seu primeiro gol em Copas. Justamente no décimo jogo. Com o gol vazio, completou passe de carrinho de Johnson: 1 a 1. Assim como Suárez, Rooney estava com aquele momento mágico entalado. Faltava tempo para o tanto que queria extravasar. Agradeceu aos céus, sorriu, acabou soterrado de abraços. A massa de branco atrás da meta de Muslera daria tudo para fazer o mesmo. Abraçar Rooney.
Mas quem abraça por último… o faz bem melhor. Suárez não deixaria o protagonismo sair de seu colo. Aninhou no pé direito um balão de Muslera. Porque Suárez não está só comungado com forças divinas. Também é Rei. Tocou, virou ouro. E, mansa, a bola saiu como um foguete para balançar a rede de Hart. Golaço, choro e redenção. Tudo que um uruguaio gosta.
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Suárez marcou duas vezes no mesmo minuto. Nos 39 de cada tempo. Um enredo divino, como fora o passe de Cavani para o primeiro tento. No segundo, Luisito fez quase tudo sozinho após balão do milagreiro Muslera. Pobre Rooney, não conseguiu o brilho que a quebra do jejum pessoal merecia
.
A tabela volta a sorrir aos uruguaios. Após perder para a Costa Rica, coleciona três pontos. A Inglaterra segue zerada. Na sexta, o Grupo D complementa a segunda rodada com o confronto entre Costa Rica e Itália. Nenhuma das equipes está eliminada. Mas os ingleses precisam torcer pelos italianos e golear a Costa Rica na rodada final, que será na terça.
Suárez é só alegria ao marcar um dos gols que deu
nova vida ao Uruguai na Copa do Mundo (Foto: AP)
A Inglaterra não mudou em relação à derrota para a Itália. Só recuou Rooney. Mas o alvo da torcida inglesa não era o seu astro. Todos queriam apupar Suárez. Vaias se avolumaram a cada toque na bola do atacante do Liverpool, companheiro de clube de cinco titulares do time de Roy Hodgson. Haja garganta. Porque Suárez tocou muito na bola. Ele cobrava escanteios, faltas, puxava contragolpes…
Faixa em homenagem a Suáraz com provocação
ao hino da Inglaterra (Foto: Lucas Rizzatti)
ao hino da Inglaterra (Foto: Lucas Rizzatti)
O único que parecia capaz de desvirtuar o destino redentor de Suárez era Rooney. Entrou em seu nono jogo de Mundial em busca de seu primeiro gol. Em cobrança de falta, deixou Muslera estático e arrancou “uuhhhh” sem fim da torcida. Em outra bola parada, aparou de cabeça um escanteio, na pequena área. A finalização explodiu no travessão.
Mas o destino já tinha seu roteiro para a tarde cinza e fria desta quinta, na Arena Corinthians. Porque, desta vez, Deus está salvando Suárez. E, por tabela, o Uruguai. Em contragolpe perfeito, Lodeiro oferece a bola a Cavani. O atacante do Paris Saint-Germain fez menção de chutar. Como que por força divina, desistiu. Ergueu os olhos sob a cabeleira e alçou com maestria para Suárez. Aos 39 minutos, Luisito voltava a sorrir como não fazia há 29 dias.
Estava tão ansioso em marcar que, após golpear de cabeça e vencer Hart, nem esperou a bola roçar a rede. Misturou todas as comemorações numa só. Emendou com os dedos alguns tiros de revólver por seu apelido “Pistoleiro”, depois beijou a aliança de casado, levou as mãos ao rosto, deitou-se no chão, apontou para o fisioterapeuta Walter Ferreira. Fez de tudo. Chorou. Nada que qualquer outro uruguaio não estivesse fazendo naquele momento. Ao mesmo tempo, Suárez era o cara, mas também era mais um.
Suárez e a cabeçada certeira para abrir o placar na
Arena Corinthians, em São Paulo (Foto: Reuters)
A Inglaterra deu o troco logo depois. Em cruzamento rasteiro para a área, a bola se ofereceu a Rooney, sozinho. Melhor que um pênalti. Não melhor que Muslera. Milagre na Arena Corinthians, que chegou a ouvir em certos momentos o grito do dono do estádio: “Timão, êô, Timão êô”...
Rooney faz primeiro gol em Copas (Foto: Reuters)
O esforço de Pereira só não foi maior que a insistência de Rooney. Após três tentativas fracassadas, enfim o camisa 10 conseguiu marcar seu primeiro gol em Copas. Justamente no décimo jogo. Com o gol vazio, completou passe de carrinho de Johnson: 1 a 1. Assim como Suárez, Rooney estava com aquele momento mágico entalado. Faltava tempo para o tanto que queria extravasar. Agradeceu aos céus, sorriu, acabou soterrado de abraços. A massa de branco atrás da meta de Muslera daria tudo para fazer o mesmo. Abraçar Rooney.
Mas quem abraça por último… o faz bem melhor. Suárez não deixaria o protagonismo sair de seu colo. Aninhou no pé direito um balão de Muslera. Porque Suárez não está só comungado com forças divinas. Também é Rei. Tocou, virou ouro. E, mansa, a bola saiu como um foguete para balançar a rede de Hart. Golaço, choro e redenção. Tudo que um uruguaio gosta.
Êxtase geral da equipe uruguaia com o gol de Suárez
que decidiu a vitória celeste (Foto: Reuters)
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