Países, que participaram da guerra que culminou no fim da Iugoslávia nos anos 90, buscam acabar de vez com tensão em jogo pelas eliminatórias
Maksimir Stadium, na Croácia, será o palco da partida contra a Sérvia (Foto: Divulgação)
Após tanto tempo, as cicatrizes da guerra, que durou de 1991 a 1995 e resultou na independência da Croácia em relação à Iugoslávia, ainda não se fecharam completamente. Tanto que a partida, considerada de prioridade máxima pela Uefa, será de apenas uma torcida, sob forte esquema de segurança: três mil policiais foram destacados para acompanhar os cerca de 35 mil croatas que devem lotar o Maksimir Stadium. Um duelo sem incidentes pode significar mais um passo na reconciliação entre as nações. Algo que, para o sérvio mais famoso do Brasil, Dejan Petkovic, já está bem avançado.
- Não tem mais problema. O passado é passado, já está superado. Tem muito jogador que se conhece nas duas seleções. Tenho certeza que o jogo não terá incidente algum. A rivalidade passou para o campo, que é onde ela deve estar – disse o ex-meia, em entrevista ao GLOBOESPORTE.COM.
Pet recebe homenagem na Sérvia: ele acha que não há mais tensão com a Croácia (Foto: Divulgação)
- Se alguém deixar a entender isso, é louco. Ele não é nada nacionalista. Mora na Itália, foi um jogador de grande sucesso, atuou na seleção. Quando se trata da seleção tem que ser patriota, fazer de tudo para vencer.
Embora este seja o primeiro jogo da Sérvia em seu atual formato contra os rivais, dois duelos parecidos aconteceram em 1999, pelas eliminatórias para a Eurocopa de 2000. Na época, a então Iugoslávia, composta por sérvios e por Montenegro (esta região se separou em 2006, de forma pacífica), encarou os croatas em um ambiente longe de ser tranquilo. Segundo jornalistas da região, a política é o grande motivo para que ainda haja tensão entre as nações.
- A tensão entre os dois países diminuiu nos últimos anos, mas ainda existe muito rancor dos dois lados. Porém, cada vez mais sérvios e croatas viajam entre os dois países. A tendência é que as relações melhorem com o tempo, embora sempre haja uma rivalidade política. Nos jogos das Eliminatórias para a Euro de 2000, os dois duelos foram muito tensos – disse o jornalista sérvio Igor Mladenovic, cujas palavras foram endossadas pelo croata Ivo Scepanovic.
- A guerra já acabou. Eu diria que os políticos em ambos os países alimentam esta tensão para esconder sua própria fraqueza para enfrentar os problemas financeiros. Mas, no esporte, ainda há rivalidade no momento – afirmou Scepanovic.
Boban agride policial durante confusão em campo (Foto: Divulgação / site oficial do Dínamo de Zagreb)
Brasileiro no meio do clássico
Em uma partida entre países com uma história tão ligada, um jogador pode se sentir deslocado em meio a tudo isso. Trata-se do meia Sammir, brasileiro que se naturalizou croata e foi convocado para o jogo. Atleta do Dínamo de Zagreb, ele está há sete anos na Croácia.
- Eu me sinto metade croata. Vou ficar no banco, mas talvez eu entre. Aprendi muita coisa sobre a guerra, sei de tudo o que aconteceu, mas neste jogo não vai ter nada além de futebol – garantiu o jogador.
Sammir em ação pela Croácia: meia deve ficar no banco de reservas (Foto: Getty Images)
- A guerra ainda é meio recente, né? No dia-a-dia ainda tem alguma tensão, os croatas ainda são incomodados com isso. Mas esta parte fica mais com a imprensa. Nós, jogadores, estamos mais tranqüilos. A maioria já atuou com jogadores da Sérvia – contou Sammir.
Croatas em vantagem
Um fator que vai apimentar ainda mais o clássico é a distância entre Croácia e Sérvia na tabela. Os donos da casa têm 10 pontos e dividem a liderança do Grupo A com a Bélgica. Os sérvios, por sua vez, estão na terceira posição, com quatro pontos. Um triunfo croata complica demais as chances dos rivais de chegar à Copa do Mundo no Brasil.
- É uma motivação a mais, até pela torcida. Vai ser um orgulho a mais para os jogadores. Vamos fazer de tudo para já eliminar a Sérvia e carimbar o passaporte para o Brasil – disse Sammir.
Modric, do Real Madrid, é a grande estrela da Croácia (Foto: Agência Getty Images)
- Tivemos algumas falhas nos dois últimos jogos. Vamos ter uma missão difícil, mas não é impossível. A Croácia tem um bom time, está na frente, joga em casa. Mas temos de aproveitar isso. Os favoritos são eles, não temos nada a perder. Você vai com menos pressão, pode fazer um jogo mais solto, mais arriscado. Mas, se perdemos, nosso sonho fica mais difícil – analisou Pet.
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A superioridade da Croácia no futebol não se restringe às atuais
Eliminatórias. Desde que alcançou a independência, o país vem
conseguindo resultados melhores do que os obtidos pela Sérvia, como o
terceiro lugar na Copa do Mundo de 1998. Novamente, a explicação para
isso tem suas raízes no conflito do início dos anos 90.- A Croácia teve um período de pós-guerra mais estável. A Sérvia teve de lidar com outros conflitos depois (com Bósnia e Kosovo), o que tornou a situação econômica dramática no país, impedindo que as estruturas esportivas fossem melhoradas. Além disso, a Croácia teve uma geração extremamente talentosa nos anos 90, com Suker, Boban e Prosinecki – analisou o jornalista sérvio Mladenovic.
Kolarov (no centro) atua no Manchester City e é uma das estrelas da Sérvia (Foto: Agência Reuters)
- A Croácia teve mais dinheiro para investir, se adaptou muito mais rápido, foi mais aceita pela comunidade europeia. A Sérvia sofreu com embargos, ficou atrás nos investimentos. A mudança na Sérvia demorou um pouco. Tivemos problemas.
Para Pet, porém, a maior decepção é o fato de a grande geração da Iugoslávia do início dos anos 90 não ter alcançado todo seu potencial. O time, que foi campeão mundial sub-20 em 1987, teve a melhor campanha nas Eliminatórias para a Eurocopa de 1992, mas foi banido por conta da guerra. A Dinamarca entrou em seu lugar e foi campeã. Em 1994, nova decepção: os iugoslavos foram impedidos até de tentar a classificação.
- Nosso maior problema é que temos um time cheio de talento, mas que, como coletivo, nunca conseguiu alcançar um bom resultado, devido à falta de organização. Faltou um líder que tivesse moral com os jogadores e pudesse colocar este talento em prol do coletivo. Em 92 a Iugoslávia chegou invicta à Eurocopa, mas infelizmente a política entrou e não nos deixou jogar. Era uma geração que poderia ser campeã mundial. Mas estamos nos recuperando.
Técnico da Sérvia, Mihajlovic fez parte da geração de ouro da Iugoslávia (Foto: Getty Images)
FONTE;
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