Lucas Nascimento, 17 anos, diz ter sido dispensado após recusar contrato de agenciamento. Dirigente do Palmeiras nega e dá sua versão
Lucas Nascimento em jogo pelo Audax
(Foto: Arquivo Pessoal)
(Foto: Arquivo Pessoal)
- Falaram que os jogadores que não assinassem o contrato de agenciamento seriam mandados embora. Diziam: “sabe o que pode acontecer contigo, né?". Me pressionavam para assinar o contrato. Alguns dias depois de não ter assinado o contrato de agenciamento, cheguei para treinar e disseram que eu estava dispensado – revelou o jogador.
A empresa tem como um dos seus sócios José Carlos Brunoro, que exerceu a função de diretor executivo do Audax até o fim de janeiro, antes de acertar com o Palmeiras. O dirigente assegura que não agencia atletas, mas confirma que o uso da empresa era um artifício do clube. Thiago Roberto Scuro, gerente geral do Audax, admite que assinar o contrato de formação é uma condição para o atleta permanecer no clube, mas não especificou o motivo do vínculo de agenciamento com a Brunoro Assessoria.
O GLOBOESPORTE.COM teve acesso aos dois contratos oferecidos a Lucas: o de formação, que foi assinado pelo jogador, e o de gerenciamento, que deixaria o jovem ligado à Brunoro Assessoria. Uma das cláusulas exige "10% sobre toda remuneração recebida pelo contratante, entre salários, bichos, prêmios, luvas e direitos de arena".
Contrato
de agenciamento oferecido a Lucas ligaria jogador à empresa de Brunoro.
De acordo com documento, jogador teria que repassar percentuais sobre
alguns vencimentos (Foto: Reprodução)
- Chamaram o pai dele para assinar o contrato de formação. Quando chegamos lá, tinham dois contratos. Assinamos o de formação, que é um direito do clube, mas não o de agenciamento, que é de uma empresa que não conhecemos. Os percentuais cobrados são normais de mercado, não há problema, mas a forma como foi feito não é correta. O clube impor de assinar com uma empresa, com empresário que você desconhece? Se ele assinasse, poderia ficar preso a uma pessoa que não conhece. Orientei e eles decidiram não assinar. Expliquei ao Lucas e ao pai que ele poderia ser mandado embora, mas pensei que fosse apenas pressão, nunca tinha passado por isso pessoalmente. Achava que não iam mandar embora, mas cumpriram a ameaça. É totalmente imoral – criticou o advogado Diogo Souza.
A recusa aconteceu em 7 de fevereiro. Dias depois, Lucas Nascimento foi dispensado do clube. Outros dois jogadores - Marcos e Jordan - também não assinaram e foram desligados. Procurado pela reportagem, José Carlos Brunoro garantiu não existir pressão para assinatura do contrato ligado a sua empresa.
- Não tem nenhuma pressão. Às vezes, o jogador é dispensado por questões técnicas e começa a achar desculpas. Não sou mais do Audax, não tenho mais nada a ver, nem a minha empresa. Os garotos podem até escolher o procurador que eles querem. O João Filipe, que joga no São Paulo, é do (Eduardo) Uram, o Leonardo, do Cruzeiro, é do Claudio (Guadagno). Jogadores de origem do Audax têm outros procuradores. Isso não é impeditivo. Ninguém é obrigado a assinar isso – disse Brunoro.
Na despedida do clube, Brunoro foi homenageado pelo Audax. (Foto: Reprodução)
- A gente fazia a gestão de carreira dos meninos do Audax com pró-forma (feito por formalidade), para não ter envolvimento de muitos empresários. Os atletas optavam pelo clube fazer a gestão de carreira. Como o Audax não pode fazer, eles assinavam conosco para ter a gestão do clube, mas através da gente. Mas todos os atletas que foram negociados pelo Audax nunca passaram pela minha empresa, é mais pró-forma para eles ficarem vinculados a gente. Muitos queriam que o clube cuidasse de suas carreiras, mas eu não cuido de jogadores. Nunca quis fazer isso de cuidar de carreira de atleta, mas como minha empresa era ligada ao Audax...- disse o dirigente do Palmeiras.
Brunoro garantiu que a relação da sua empresa com Audax terminou há cerca de um mês. Pouco depois, o dirigente do Palmeiras fez contato com a reportagem. Dessa vez, não mais citou o contrato de agenciamento, se referiu apenas ao documento de formação - que foi assinado por Lucas Nascimento:
- Levantei essa história, não gosto de coisa mal parada. Vou pedir para o Thiago (gerente geral do Audax) explicar. Não foi nenhuma situação de assinar com a Brunoro, foi o contrato de formação. Os garotos não quiseram assinar o contrato de formação. O Audax é obrigado a fazer isso, pois senão não tem direito a nada. Mas é com o clube. Com a Brunoro é só atleta profissional, se ele quiser de fato gerenciamento de carreira ele assina com a gente. Se ele quiser.
Gerente geral do Audax, Thiago Roberto Scuro confirma que a assinatura do contrato de formação é uma condição do clube.
- Esse contrato de formação prevê que o clube tem que disponibilizar uma série de condições para o atleta, como alimentação, treinamento, assistência médica... Por outro lado, o clube passa a ter o direito de formação, de indenização futura conforme previsão legal. Eles assinam esse contrato a partir dos 14 anos. Depois, esse contrato dá o direito ao Audax de fazer um contrato profissional com o atleta, dos 16 aos 20 anos. Realmente, assinar o contrato de formação é uma condição para o atleta fazer parte do clube, esse é o documento que dá uma série de direitos, e de deveres, que documenta a relação atleta-clube - explicou.
Depois, o gerente comentou a relação entre Audax e a empresa de Brunoro, admitiu que existia uma ligação entre as partes e disse que uma nova estrutura está sendo estudada depois da saída do ex-diretor executivo:
- O Audax jamais tira nenhum centavo do atleta, de salário, nenhum tipo de comissão, isso é uma prática comum entre os agentes e os clubes. O que acontece é que a atividade do clube não contempla essa atividade de gestão de carreira do atleta. Então, na ocasião, existia esse ajuste para utilizar essa empresa da qual o Brunoro era sócio para fazer esse vínculo contratual, mas tudo sendo administrado pelo Audax. Com a saída do Brunoro, tudo isso é interrompido, muda a estrutura, que está sendo estudada. Mas o compromisso segue sendo com o Audax, e não com o Brunoro. O Brunoro nunca foi agente de ninguém, nunca representou. O contrato, com direitos e deveres, tem cláusulas padronizadas, mas o clube nunca utilizou isso para retirar recursos de atletas. O que a gente faz é prestar toda assessoria ao atleta, sem custo adicional, com objetivo de preservar e proteger a gestão do jogador que pertence ao Audax.
Thiago Scuro garantiu que a dispensa – logo depois da recusa da assinatura do vínculo de agenciamento – foi por questões técnicas. E falou um pouco mais sobre a relação contratual com a Brunoro Assessoria:
- A avaliação do nosso corpo técnico é de que ele (Lucas) não teria perspectiva de evolução para o profissional. Então, foi liberado. O procedimento do Audax é claro, transparente, trabalhamos há oito anos assim no Rio, sem desgaste, sem problema. Na verdade, como o Brunoro estava como diretor, teve a empresa envolvida, mas não é uma coisa da pessoa física. O Brunoro estava como executivo do clube, era a entidade jurídica utilizada para fazer a relação deles (jogadores) com o clube. A partir do momento em que o Brunoro se desligou do Audax e foi para o Palmeiras, tudo isso foi desligado junto. O clube já resolveu esse problema junto ao Brunoro, junto a todas as partes, isso é uma situação do Audax com os atletas. O Brunoro não leva isso junto com ele, estava atrelado ao contrato de trabalho entre ele e o Audax.
Advogado rebate explicações
O advogado Diogo Souza disse que alegação de "dispensa técnica" foi uma desculpa:
- Eles podem dizer que Lucas não estava treinando tão bem. Podem arrumar isso como desculpa. Mas esse não é o motivo... ou não teria porque assinar. Por que ao não assinar contrato de agenciamento ele foi mandado embora uma semana depois?
Lucas
Nascimento, hoje no Olaria, ao lado do pai Abraão, que procurou um
advogado ao estranhar o fato de o filho ter que assinar dois contratos
com Audax (Foto: Janir Júnior)
- É um sonho do garoto, meu também, lógico que fico decepcionado. Mas tenho que saber o que estou assinando. Não sei se os pais têm a mesma iniciativa que eu tive. Se vou sozinho eu assino. Não conheço ninguém, como deixar meu filho na mão de pessoas que não conheço?!
Depois da dispensa, Lucas Nascimento treina no Olaria. E, apesar do abatimento com toda situação, ainda sonha em ser jogador de futebol, dar uma vida melhor para a família e ao pai, cadeirante:
- Não penso em parar. Vou tentar a sorte.
FONTE:
http://globoesporte.globo.com/futebol/noticia/2013/03/dispensado-jogador-acusa-audax-rj-de-coacao-para-favorecer-empresa-de-brunoro.html
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