Conquista nas duplas mistas e excelente fim de ano dá confiança, e mineiro
se mostra com condições de brigar por feitos maiores na temporada 21013
Em 2012, Bruno Soares
conquistou cinco títulos no circuito de duplas e viveu seu momento mais
brilhante ao sagrar-se campeão de duplas mistas do US Open. Ao fim de
sua melhor temporada como profissional, o mineiro de 30 anos e 1,80m
conversou com o GLOBOESPORTE.COM em São Paulo e lembrou do começo. Falou
da grave lesão que o afastou das quadras por quase dois anos, do
trabalho como administrador de academias e do dinheiro que ganhou com o
pôquer para pagar as contas enquanto afastado do circuito.
Com o tom otimista adotado em todas entrevistas - o mesmo com o qual
tenta encarar o duro dia-a-dia do circuito mundial, Soares fala da
caminhada que "recomeçou" com inesperada semifinal em Roland Garros/2008
e ressalta o que ninguém vê na TV, nem mesmo quando seus jogos são
exibidos. Diz o quanto autoavaliou seu jogo e o que vem fazendo
incessantemente para crescer e jogar no nível das melhores parcerias do
mundo. Atual número 19 no ranking mundial, o brasileiro também aborda a
dose de confiança que foi injetada quando triunfou ao lado da russa
Ekaterina Makarova em Nova York: "Não foi coincidência eu ter jogado
muito bem no fim do ano".
Prestes a começar sua primeira temporada completa ao lado do austríaco Alexander Peya, com quem levantou três troféus em 2011, Soares acredita finalmente estar no mesmo nível dos grandes e aposta que "acreditar" será o diferencial. Confira abaixo a conversa.
GLOBOESPORTE.COM: Vamos começar lembrando do começo? O que fez você escolher a dupla como meio de vida?
Bruno Soares: Eu operei a tíbia (em outubro de 2006), só que tive infecção hospitalar e voltei a operar por causa da infecção. Eu retornei ao circuito em julho de 2007 e estava sem ranking, sem nada. Nos primeiros seis meses, eu joguei vendo o que acontecia. Só que nesse ano eu ganhei três Challengers. Fiz alguns pontinhos em simples, mas nada muito animador. Já não estava muito com a mentalidade das simples. No fim do ano, quando parei, falei: "Estou bem, o físico está sentindo bem" Precisava melhorar tenisticamente, recuperar minha forma, mas deu para ver que o corpo iria aguentar. No início da pré-temporada, resolvi focar na dupla.
E o que fez em um ano e meio parado?
Quando eu fiz ressonância, eu tinha uma fratura por estresse na tíbia e um inflamação. De acordo com todo mundo que eu consultei, fratura por estresse não tem jeito. É por volta de seis meses. E essa inflamação em três, quatro meses, deveria ceder. Seis meses depois a fratura tinha passado, só que a inflamação não. Fiquei sem saber o que fazer. Eu, minha sogra, minha esposa e minha irmã, a gente trouxe para Belo Horizonte uma franquia de academias só para mulheres chamada Curves. Comecei a trabalhar com isso. Como era academia só para mulheres, eu administrava o andamento, fazia a parte burocrática porque eu não podia ficar lá dentro. Foi uma experiência nova. Eu não sabia muita coisa, aprendi bastante. Mas continuei tratando, na esperança de voltar. Cheguei a voltar e me machuquei de novo, mas sempre trabalhando, com as academias rolando. E aí, em julho de 2007, eu voltei e fui me afastando das academias até que vendemos as duas em 2010.
E o pôquer entrou como na sua vida?
Meus amigos de tênis sempre jogavam pôquer. Eu estava em Belo Horizonte e comecei a ir. Fui aprendendo, na época do boom do pôquer, em 2003 e a gente começou a se interessar, se aperfeiçoar. Como eu tinha muito tempo livre, comecei a ler livro, estudar, entrar em site de treinamento. E comecei a jogar. Na época, eu conseguia tirar uma graninha por mês. Jogava umas cinco horas por dia. Nunca tive a intenção de viver disso, mas deu para pagar umas contas por um tempo.
Ainda dá tempo para jogar hoje?
Ainda me interessa muito! Adoro o jogo. Acho que o pôquer é um dos jogos mais fascinantes que existem. É um jogo de cartas em que a sorte conta bem pouco no longo prazo. Acompanho, vejo, leio e jogo torneios quando posso. Agora está muito difícil. Na época que eu voltei, ainda jogava nos fins de semana, mas agora está muito complicado. Quando a gente está de férias tem muito evento. A gente ainda tem nosso grupo de amigos e jogo online quando posso. É um jogo fascinante.
Você voltou a jogar full-time em 2008 e as coisas aconteceram bastante rápido, não?
Eu tive um pouco de sorte. Foi até na época que o Thomaz (Bellucci) estava nos Challengers e a gente jogou torneios junto. Ganhamos alguns e eu estava melhorando meu ranking. Um pouco antes de Roland Garros eu era top 100 e me inscrevi com o (sérvio Dusan) Vemic. A gente estava "cinco fora" (à espera de cinco desistências para entrar no torneio). Chegamos lá, nem treinamos juntos. Era quarta-feira à noite, estava indo jantar, recebi uma mensagem dizendo que tínhamos entrado. Falei com o Vemic, treinamos na quinta-feira e jogamos na sexta. E foi um ano que choveu muito. A gente jogou sexta, sábado, domingo e segunda. Em quatro dias, fomos de fora do evento para a semifinal. E a semi foi na quinta, tivemos dois dias off que me fizeram até mal.
Por quê?
Sabe quando você está sem pensar? Você entra, aquece, joga e já está naquele ritmo? Nesses dois dias, a cabeça começou a pensar demais, meio que perdi o foco do negócio. Ainda jogamos super bem na semi (Soares e Vemic foram eliminados por Pablo Cuevas e Luís Horna). Foi uma semana muito especial. A gente ganhou do Jonas Bjorkman e do Kevin Ullyett nas quartas. Na sexta à noite, toca o meu telefone. Era o Kevin me chamando para jogar com ele em Nottingham. Nunca tinha falado com o Kevin. Eu me senti extremamente honrado pelo convite. Você vê a humildade do cara. Ele era top 10 na época. Podia dizer: "Esse moleque entrou de alternate, está tendo o torneio da vida dele e cagou pra caramba". Mas me deu uma chance e me chamou. Eu ia jogar com o Thomaz. Mandei uma mensagem, e ele falou: "Nem pensa, vai lá". Acabei entrando com o Kevin e ganhamos o torneio. Aí, de antes de Roland Garros, que eu estava 94 do mundo, depois de Nottingham eu estava 36. Fui jogando e depois daí nunca mais baixei de top 35.
De 2009 a 2011 você fez dupla com Marcelo Melo. No fim do ano
passado, você disse que queria quebrar a rotina, fazer algo diferente.
Na prática, o que significa quebrar a rotina? O que fez de diferente
nesta temporada?
Não é nem o que eu fiz de diferente. A gente teve dois anos muito bons, mas não teve o algo a mais. A gente ficou ali no top 30, com bons resultados, mas não teve um resultado grande. Nem uma final de Masters ou Grand Slam, nem ganhamos um ATP 500. Não que a gente não jogue bem junto, mas eu queria tentar com algum outro parceiro. Poderia pintar uma coisa diferente. Era simplesmente isso. Eu queria sentir como experiência.
Com o Eric Butorac deu certo no começo do ano. O que fez a dupla desandar?
Quando a gente terminou, não era minha ideia jogar com o Eric. Eu tinha dois caras em mente, e um deles era o Peya. E acabou que não consegui, então comecei 2012 com ele (Butorac). A gente jogou muito bem no início do ano. Não sei por que a coisa desandou. A gente passou um bom tempo jogando bem, mas sem ganhar. Foi complicando o negócio. Aí chegou a temporada de saibro, que não é boa para ele, e a coisa já não andou bem. Pintou a oportunidade de jogar com o Peya em maio. Ele terminou com o parceiro dele, e a gente começou a se falar. Eu estava no Brasil, mandei uma mensagem perguntando o que ele estava fazendo. Fomos conversando e resolvemos tentar. Aí falei com o Eric em Roland Garros, ele entendeu na boa e bola para a frente.
Por que achava que poderia dar certo junto com o Peya?
Ele é completo. Ele tem o estilo de jogo, de certa forma, parecido com o meu. A gente é sólido de uma maneira geral. Ele saca bem, devolve bem, voleia bem, se mexe bem, tem uma boa segunda bola, acho que a gente encaixa no aspecto de ser uma dupla sólida, com todos os pontos bons. A gente não tem nenhum buraco aparente. O que vem acontecendo muito nos nossos jogos é que a gente vem quebrando os saques dos adversários. A gente saca legal, mas não somos grandes sacadores, então precisamos basear nosso jogo na consistência. A gente vai perder o saque um pouco mais que grandes sacadores, como Max Mirnyi e Daniel Nestor, então é importante ter essa força quando a gente devolve. Poder ter a tranquilidade para sacar e, caso perca o saque, saber que, a qualquer momento, a gente pode quebrar os caras também.
Não é o seu melhor ranking, mas podemos concordar que é sua melhor temporada?
É minha melhor temporada. Meu melhor ranking (Soares foi 14º do mundo em maio de 2009) foi resultado de uma combinação de três ou quatro resultados muito grandes e um ano consistente.
Este ano não estou no meu melhor ranking por causa daquele espaço que tive com o Butorac, de quatro meses. De Memphis, que foi em fevereiro, até Wimbledon, em junho, não fiz praticamente nada. Mais 600 pontos e eu estaria 12, 13 do mundo. Em termos de jogo, vitórias... No fim do ano, eu e Alex ganhamos de várias duplas que estão na briga, estão entre as melhores. Ganhamos dois ATPs 500, fizemos quartas do US Open, perdemos pouquíssimos jogos. Estamos com motivação extra para a temporada 2013 ser a melhor.
E o que melhorou no seu jogo de 2009 até hoje?
O que eu quis melhorar foi meu jogo de rede. Eu sempre tive um bom voleio, sempre me mexi bem na rede, mas fazia muito de sacar e ficar no fundo, principalmente no segundo saque. Eu senti que, por mais que eu conseguisse jogar dessa forma, contra os caras top, era difícil. Eles pressionavam demais, não deixavam respirar e a coisa acabava complicando. Uma coisa que eu quis evoluir foi minha chegada na rede. Saque-e-voleio o tempo inteiro, tomar a bola no pé e fazer o primeiro voleio tirando do cara da rede. Essa transição do fundo para a rede foi o que eu mais treinei este ano, foi a grande evolução do meu jogo. Então estou procurando fazer, até nos lugares mais lentos, saque-e-voleio. Deu muito resultado. Agora eu tenho aquela confiança para dar o segundo saque, tomar a pancada no pé e tirar um bom voleio para fechar a rede. Esse foi o salto, e essa vai continuar sendo a evolução. A hora que eu ficar muito bom nesse aspecto... Eu tenho um saque bom, tenho uma boa devolução, que é meu ponto forte, tenho boa segunda bola... Acho que quando eu conseguir jogar o meu saque com uma precisão muito boa, com confiança no primeiro voleio e fechar a rede, isso vai completar. É o que eu mais tenho treinado.
E o que esperar de Bruno Soares em 2013?
Estou muito motivado. Espero coisas grandes. Quero focar nos torneios grandes. Nos 500, 1.000 e Grand Slams. Acho que eu e Alex terminamos o ano conscientes de que a gente pode ganhar um torneio grande, e isso é muito importante. Muitas vezes você está no torneio, olha a chave e pensa: "É, este lado aqui é difícil para mim. Só ganho este torneio se a chave abrir". Hoje, não. A gente olha a chave e pode ganhar de todo mundo. Esta postura, o lance de acreditar, é muito importante para você ganhar um Masters 1.000, um Grand Slam. A gente conversou muito em Paris, no fim do ano. Ele disse assim: "We belong there". Em português, é como dizer que a gente pertence, a gente faz parte das duplas tops. Eu concordo. Isto serve de motivação ainda mais nesta pré-temporada.
O que mudou na relação com os fãs depois do título do US Open?
Não sei se há uma procura muito maior. O que eu vejo é que quando me apresentam, dizem: "Ah, o Bruno, campeão do US Open". Você vê que a pessoa lembra. Isso marca muito as pessoas. Já tem esse lance de conhecer a pessoa. Antes era: "Tem um tenista que joga bem, um tal de Bruno". Agora é: "O Bruno joga bem, é o cara que ganhou o US Open".
Já sente a responsabilidade de ser um dos grandes nomes do tênis no país?
Por enquanto, não. O que eu senti de impressionante foi uma mudança na postura, na minha confiança. Eu fiquei até surpreso porque não achei que seria um negócio tão rápido. A minha autoconfiança mudou demais. Na hora H, saber que posso fazer o negócio acontecer naquele momento, e que vai dar tudo certo... Isso melhorou demais. Não foi coincidência eu ter jogado muito bem no fim do ano. Com certeza, isso vem de tudo que eu passei no US Open. De todos jogos que eu fiz, de todos momentos delicados, de todos momentos sob pressão e, no fim, sair com o título em um torneio com tanta importância. Isso muda a sua postura.
Marcelo Melo costuma dizer que há pouca gente mostrando dupla. Concorda?
Em parte. Poderia ter mais, mas acho que no Brasil a maioria das pessoas reconhece a gente e sabe o valor das nossas conquistas. Eu converso com os austríacos e com o Alex e, tirando a mídia de tênis, ninguém sabe. Nesse aspecto, aqui no Brasil a gente tem uma visibilidade bacana. Eu acho que a gente tem que mudar o conceito da TV. O brasileiro gosta de torcer. Se mostrar mais jogos meus e do Marcelo na TV, vai dar ibope legal. Muitas vezes está passando um jogo e, de repente, Tursunov contra Baghdatis é um belo jogo, mas o cara olha e fala: "Não conheço esses caras. Não é o Federer nem o Nadal, vou mudar". De repente, se é o Bruno ou o Marcelo, ele diz: "Esse é brasileiro? Vou torcer". E vai assistir ao jogo. No Brasil, como o pessoal gosta de torcer, pode ser feito mais pela dupla. Pode mostrar mais e o pessoal vai gostar.
E mundialmente, como a modalidade pode crescer?
As pessoas têm que conhecer para querer assistir. Se você coloca na TV os Bryans contra Daniel Nestor e Nenad Zimonjic, e o cara não sabe quem é, não adianta. Mas se você tem divulgação e está sempre falando deles, coloca os caras na mídia, mostrando, o pessoal vai assistir. Aí o cara liga a TV e fala: "Os Bryans são os melhores do mundo, vou assistir". Ele tem razão para assistir. Acontece comigo em outros esportes. Eu ligo a TV e está passando basquete universitário. Não vou ver, cara. Porque nem gosto muito de basquete é não é a minha praia. Mas se está passando Miami Heat contra Boston Celtics, eu assisto ao jogo porque sei que o LeBron está lá, sei que o Leandrinho agora está no Boston. Eu tenho uma razão para assistir. É a mesma coisa no tênis. Se a pessoa só vê Nadal, Federer e Djokovic, não adianta. Só vão querer ver os caras. Falando mais, mostrando mais, as pessoas vão conhecer e querer ver. Hoje, nas simples, o estilo de jogo de todos é muito parecido. Está todo mundo muito forte, ficando no fundo e batendo na bola. Na dupla, temos de tudo. Tem os espanhóis que ficam no fundo, tem caras que jogam agressivo, tem o Leander Paes que joga com uma habilidade monstruosa, então você tem diversos estilos em um jogo extremamente dinâmico. A dupla está passando por um momento muito legal. É hora de aproveitar.
FONTE:
http://globoesporte.globo.com/tenis/noticia/2012/12/do-poquer-ao-titulo-em-ny-soares-evolui-em-busca-de-grandes-feitos.html
O dia que marcou 2012: Soares é campeão de duplas mistas do US Open junto com Makarova (Foto: Reuters)
Prestes a começar sua primeira temporada completa ao lado do austríaco Alexander Peya, com quem levantou três troféus em 2011, Soares acredita finalmente estar no mesmo nível dos grandes e aposta que "acreditar" será o diferencial. Confira abaixo a conversa.
GLOBOESPORTE.COM: Vamos começar lembrando do começo? O que fez você escolher a dupla como meio de vida?
Bruno Soares: Eu operei a tíbia (em outubro de 2006), só que tive infecção hospitalar e voltei a operar por causa da infecção. Eu retornei ao circuito em julho de 2007 e estava sem ranking, sem nada. Nos primeiros seis meses, eu joguei vendo o que acontecia. Só que nesse ano eu ganhei três Challengers. Fiz alguns pontinhos em simples, mas nada muito animador. Já não estava muito com a mentalidade das simples. No fim do ano, quando parei, falei: "Estou bem, o físico está sentindo bem" Precisava melhorar tenisticamente, recuperar minha forma, mas deu para ver que o corpo iria aguentar. No início da pré-temporada, resolvi focar na dupla.
Estou muito motivado. Espero coisas grandes. O Alex e eu, a gente olha
a chave e pode ganhar de todo mundo. O lance de acreditar, é importante
para você ganhar um Masters 1.000, um Grand Slam."
Bruno Soares
Quando eu fiz ressonância, eu tinha uma fratura por estresse na tíbia e um inflamação. De acordo com todo mundo que eu consultei, fratura por estresse não tem jeito. É por volta de seis meses. E essa inflamação em três, quatro meses, deveria ceder. Seis meses depois a fratura tinha passado, só que a inflamação não. Fiquei sem saber o que fazer. Eu, minha sogra, minha esposa e minha irmã, a gente trouxe para Belo Horizonte uma franquia de academias só para mulheres chamada Curves. Comecei a trabalhar com isso. Como era academia só para mulheres, eu administrava o andamento, fazia a parte burocrática porque eu não podia ficar lá dentro. Foi uma experiência nova. Eu não sabia muita coisa, aprendi bastante. Mas continuei tratando, na esperança de voltar. Cheguei a voltar e me machuquei de novo, mas sempre trabalhando, com as academias rolando. E aí, em julho de 2007, eu voltei e fui me afastando das academias até que vendemos as duas em 2010.
E o pôquer entrou como na sua vida?
Meus amigos de tênis sempre jogavam pôquer. Eu estava em Belo Horizonte e comecei a ir. Fui aprendendo, na época do boom do pôquer, em 2003 e a gente começou a se interessar, se aperfeiçoar. Como eu tinha muito tempo livre, comecei a ler livro, estudar, entrar em site de treinamento. E comecei a jogar. Na época, eu conseguia tirar uma graninha por mês. Jogava umas cinco horas por dia. Nunca tive a intenção de viver disso, mas deu para pagar umas contas por um tempo.
Ainda dá tempo para jogar hoje?
Ainda me interessa muito! Adoro o jogo. Acho que o pôquer é um dos jogos mais fascinantes que existem. É um jogo de cartas em que a sorte conta bem pouco no longo prazo. Acompanho, vejo, leio e jogo torneios quando posso. Agora está muito difícil. Na época que eu voltei, ainda jogava nos fins de semana, mas agora está muito complicado. Quando a gente está de férias tem muito evento. A gente ainda tem nosso grupo de amigos e jogo online quando posso. É um jogo fascinante.
Você voltou a jogar full-time em 2008 e as coisas aconteceram bastante rápido, não?
Eu tive um pouco de sorte. Foi até na época que o Thomaz (Bellucci) estava nos Challengers e a gente jogou torneios junto. Ganhamos alguns e eu estava melhorando meu ranking. Um pouco antes de Roland Garros eu era top 100 e me inscrevi com o (sérvio Dusan) Vemic. A gente estava "cinco fora" (à espera de cinco desistências para entrar no torneio). Chegamos lá, nem treinamos juntos. Era quarta-feira à noite, estava indo jantar, recebi uma mensagem dizendo que tínhamos entrado. Falei com o Vemic, treinamos na quinta-feira e jogamos na sexta. E foi um ano que choveu muito. A gente jogou sexta, sábado, domingo e segunda. Em quatro dias, fomos de fora do evento para a semifinal. E a semi foi na quinta, tivemos dois dias off que me fizeram até mal.
Por quê?
Sabe quando você está sem pensar? Você entra, aquece, joga e já está naquele ritmo? Nesses dois dias, a cabeça começou a pensar demais, meio que perdi o foco do negócio. Ainda jogamos super bem na semi (Soares e Vemic foram eliminados por Pablo Cuevas e Luís Horna). Foi uma semana muito especial. A gente ganhou do Jonas Bjorkman e do Kevin Ullyett nas quartas. Na sexta à noite, toca o meu telefone. Era o Kevin me chamando para jogar com ele em Nottingham. Nunca tinha falado com o Kevin. Eu me senti extremamente honrado pelo convite. Você vê a humildade do cara. Ele era top 10 na época. Podia dizer: "Esse moleque entrou de alternate, está tendo o torneio da vida dele e cagou pra caramba". Mas me deu uma chance e me chamou. Eu ia jogar com o Thomaz. Mandei uma mensagem, e ele falou: "Nem pensa, vai lá". Acabei entrando com o Kevin e ganhamos o torneio. Aí, de antes de Roland Garros, que eu estava 94 do mundo, depois de Nottingham eu estava 36. Fui jogando e depois daí nunca mais baixei de top 35.
Ao lado de Alexander Peya (à dir.), Soares conquista o ATP 500 de Tóquio (Foto: Getty Images)
Não é nem o que eu fiz de diferente. A gente teve dois anos muito bons, mas não teve o algo a mais. A gente ficou ali no top 30, com bons resultados, mas não teve um resultado grande. Nem uma final de Masters ou Grand Slam, nem ganhamos um ATP 500. Não que a gente não jogue bem junto, mas eu queria tentar com algum outro parceiro. Poderia pintar uma coisa diferente. Era simplesmente isso. Eu queria sentir como experiência.
Com o Eric Butorac deu certo no começo do ano. O que fez a dupla desandar?
Quando a gente terminou, não era minha ideia jogar com o Eric. Eu tinha dois caras em mente, e um deles era o Peya. E acabou que não consegui, então comecei 2012 com ele (Butorac). A gente jogou muito bem no início do ano. Não sei por que a coisa desandou. A gente passou um bom tempo jogando bem, mas sem ganhar. Foi complicando o negócio. Aí chegou a temporada de saibro, que não é boa para ele, e a coisa já não andou bem. Pintou a oportunidade de jogar com o Peya em maio. Ele terminou com o parceiro dele, e a gente começou a se falar. Eu estava no Brasil, mandei uma mensagem perguntando o que ele estava fazendo. Fomos conversando e resolvemos tentar. Aí falei com o Eric em Roland Garros, ele entendeu na boa e bola para a frente.
A autoconfiança mudou demais. Na hora H, sei que posso fazer o negócio
acontecer e que vai dar tudo certo... Não foi coincidência eu ter
jogado muito bem no fim do ano. Com certeza, isso vem de tudo que eu
passei no US Open
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Bruno Soares
Ele é completo. Ele tem o estilo de jogo, de certa forma, parecido com o meu. A gente é sólido de uma maneira geral. Ele saca bem, devolve bem, voleia bem, se mexe bem, tem uma boa segunda bola, acho que a gente encaixa no aspecto de ser uma dupla sólida, com todos os pontos bons. A gente não tem nenhum buraco aparente. O que vem acontecendo muito nos nossos jogos é que a gente vem quebrando os saques dos adversários. A gente saca legal, mas não somos grandes sacadores, então precisamos basear nosso jogo na consistência. A gente vai perder o saque um pouco mais que grandes sacadores, como Max Mirnyi e Daniel Nestor, então é importante ter essa força quando a gente devolve. Poder ter a tranquilidade para sacar e, caso perca o saque, saber que, a qualquer momento, a gente pode quebrar os caras também.
Não é o seu melhor ranking, mas podemos concordar que é sua melhor temporada?
É minha melhor temporada. Meu melhor ranking (Soares foi 14º do mundo em maio de 2009) foi resultado de uma combinação de três ou quatro resultados muito grandes e um ano consistente.
Este ano não estou no meu melhor ranking por causa daquele espaço que tive com o Butorac, de quatro meses. De Memphis, que foi em fevereiro, até Wimbledon, em junho, não fiz praticamente nada. Mais 600 pontos e eu estaria 12, 13 do mundo. Em termos de jogo, vitórias... No fim do ano, eu e Alex ganhamos de várias duplas que estão na briga, estão entre as melhores. Ganhamos dois ATPs 500, fizemos quartas do US Open, perdemos pouquíssimos jogos. Estamos com motivação extra para a temporada 2013 ser a melhor.
E o que melhorou no seu jogo de 2009 até hoje?
O que eu quis melhorar foi meu jogo de rede. Eu sempre tive um bom voleio, sempre me mexi bem na rede, mas fazia muito de sacar e ficar no fundo, principalmente no segundo saque. Eu senti que, por mais que eu conseguisse jogar dessa forma, contra os caras top, era difícil. Eles pressionavam demais, não deixavam respirar e a coisa acabava complicando. Uma coisa que eu quis evoluir foi minha chegada na rede. Saque-e-voleio o tempo inteiro, tomar a bola no pé e fazer o primeiro voleio tirando do cara da rede. Essa transição do fundo para a rede foi o que eu mais treinei este ano, foi a grande evolução do meu jogo. Então estou procurando fazer, até nos lugares mais lentos, saque-e-voleio. Deu muito resultado. Agora eu tenho aquela confiança para dar o segundo saque, tomar a pancada no pé e tirar um bom voleio para fechar a rede. Esse foi o salto, e essa vai continuar sendo a evolução. A hora que eu ficar muito bom nesse aspecto... Eu tenho um saque bom, tenho uma boa devolução, que é meu ponto forte, tenho boa segunda bola... Acho que quando eu conseguir jogar o meu saque com uma precisão muito boa, com confiança no primeiro voleio e fechar a rede, isso vai completar. É o que eu mais tenho treinado.
E o que esperar de Bruno Soares em 2013?
Estou muito motivado. Espero coisas grandes. Quero focar nos torneios grandes. Nos 500, 1.000 e Grand Slams. Acho que eu e Alex terminamos o ano conscientes de que a gente pode ganhar um torneio grande, e isso é muito importante. Muitas vezes você está no torneio, olha a chave e pensa: "É, este lado aqui é difícil para mim. Só ganho este torneio se a chave abrir". Hoje, não. A gente olha a chave e pode ganhar de todo mundo. Esta postura, o lance de acreditar, é muito importante para você ganhar um Masters 1.000, um Grand Slam. A gente conversou muito em Paris, no fim do ano. Ele disse assim: "We belong there". Em português, é como dizer que a gente pertence, a gente faz parte das duplas tops. Eu concordo. Isto serve de motivação ainda mais nesta pré-temporada.
Soares acredita que o jogo de duplas vive ótimo
momento no circuito (Foto: Luiz Pires/FOTOJUMP)
momento no circuito (Foto: Luiz Pires/FOTOJUMP)
Não sei se há uma procura muito maior. O que eu vejo é que quando me apresentam, dizem: "Ah, o Bruno, campeão do US Open". Você vê que a pessoa lembra. Isso marca muito as pessoas. Já tem esse lance de conhecer a pessoa. Antes era: "Tem um tenista que joga bem, um tal de Bruno". Agora é: "O Bruno joga bem, é o cara que ganhou o US Open".
Já sente a responsabilidade de ser um dos grandes nomes do tênis no país?
Por enquanto, não. O que eu senti de impressionante foi uma mudança na postura, na minha confiança. Eu fiquei até surpreso porque não achei que seria um negócio tão rápido. A minha autoconfiança mudou demais. Na hora H, saber que posso fazer o negócio acontecer naquele momento, e que vai dar tudo certo... Isso melhorou demais. Não foi coincidência eu ter jogado muito bem no fim do ano. Com certeza, isso vem de tudo que eu passei no US Open. De todos jogos que eu fiz, de todos momentos delicados, de todos momentos sob pressão e, no fim, sair com o título em um torneio com tanta importância. Isso muda a sua postura.
Marcelo Melo costuma dizer que há pouca gente mostrando dupla. Concorda?
Em parte. Poderia ter mais, mas acho que no Brasil a maioria das pessoas reconhece a gente e sabe o valor das nossas conquistas. Eu converso com os austríacos e com o Alex e, tirando a mídia de tênis, ninguém sabe. Nesse aspecto, aqui no Brasil a gente tem uma visibilidade bacana. Eu acho que a gente tem que mudar o conceito da TV. O brasileiro gosta de torcer. Se mostrar mais jogos meus e do Marcelo na TV, vai dar ibope legal. Muitas vezes está passando um jogo e, de repente, Tursunov contra Baghdatis é um belo jogo, mas o cara olha e fala: "Não conheço esses caras. Não é o Federer nem o Nadal, vou mudar". De repente, se é o Bruno ou o Marcelo, ele diz: "Esse é brasileiro? Vou torcer". E vai assistir ao jogo. No Brasil, como o pessoal gosta de torcer, pode ser feito mais pela dupla. Pode mostrar mais e o pessoal vai gostar.
E mundialmente, como a modalidade pode crescer?
As pessoas têm que conhecer para querer assistir. Se você coloca na TV os Bryans contra Daniel Nestor e Nenad Zimonjic, e o cara não sabe quem é, não adianta. Mas se você tem divulgação e está sempre falando deles, coloca os caras na mídia, mostrando, o pessoal vai assistir. Aí o cara liga a TV e fala: "Os Bryans são os melhores do mundo, vou assistir". Ele tem razão para assistir. Acontece comigo em outros esportes. Eu ligo a TV e está passando basquete universitário. Não vou ver, cara. Porque nem gosto muito de basquete é não é a minha praia. Mas se está passando Miami Heat contra Boston Celtics, eu assisto ao jogo porque sei que o LeBron está lá, sei que o Leandrinho agora está no Boston. Eu tenho uma razão para assistir. É a mesma coisa no tênis. Se a pessoa só vê Nadal, Federer e Djokovic, não adianta. Só vão querer ver os caras. Falando mais, mostrando mais, as pessoas vão conhecer e querer ver. Hoje, nas simples, o estilo de jogo de todos é muito parecido. Está todo mundo muito forte, ficando no fundo e batendo na bola. Na dupla, temos de tudo. Tem os espanhóis que ficam no fundo, tem caras que jogam agressivo, tem o Leander Paes que joga com uma habilidade monstruosa, então você tem diversos estilos em um jogo extremamente dinâmico. A dupla está passando por um momento muito legal. É hora de aproveitar.
FONTE:
http://globoesporte.globo.com/tenis/noticia/2012/12/do-poquer-ao-titulo-em-ny-soares-evolui-em-busca-de-grandes-feitos.html
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