segunda-feira, 30 de julho de 2012

Na base da 'porrada', Marcelo Negrão deixou sua marca com ponto do ouro

Caçula da seleção em Barcelona-92, com 19 anos, jogador diz que não tinha noção da importância de marcar o último ponto da conquista brasileira

Por Danielle Rocha e Leo Velasco Rio de Janeiro

vôlei barcelona 1992 carlão marcelo negrão brasil final medalha olímpica (Foto: Fábio M. Salles / Agência Estado)Carlão e Marcelo Negrão sobem para o bloqueio na
semifinal (Foto: Fábio M. Salles / Agência Estado)
 
Quando recebeu a bola para sacar mais a vez naquele jogo contra a Holanda no dia 9 de agosto de 1992, Marcelo Negrão não atentou para o fato de que faltava apenas um ponto para o Brasil conquistar o ouro olímpico. Acostumado a defender a camisa da seleção brasileira desde os 13 anos, o jogador mais novo daquela equipe, na época com 19 anos, só pensou em fazer o que sempre se esperou dele: sacar forte. Não tinha ideia do que ia acontecer com sua vida depois que aquela bola saiu de sua mão e caiu na quadra holandesa.

- Eu desde garoto joguei naquela posição de oposto. O oposto está encarregado de dar porrada. Seja bola boa ou bola ruim, tem que botar no chão, tua obrigação é dar porrada. Naquele momento, não tinha me ligado da importância daquele ponto. Fui para o saque e simplesmente fiz o que sempre fiz. Não sei se pela ingenuidade, eu não me preocupei. Eu, talvez por ser moleque, não pensei em fechar o jogo. Fui para sacar e pronto. Entrou e eu dei muita sorte. As pessoas lembram muito de mim por aquele último ponto – afirmou o ex-jogador.

Após marcar o ponto da vitória, Negrão ainda tinha mais uma tarefa antes de receber o ouro. Precisava achar um orelhão.

- Depois do ponto, eu ajoelhei, o Paulão me abraçou, e depois fui ligar para meu pai. Ele sempre foi meu maior incentivador, meu maior apoio, e eu quis falar com ele. Liguei para ver o que ele achou, se ele gostou. Minha vontade era dividir com minha família aquilo. Não lembro o que ele falou. Mas deve ter sido alguma coisa boa.

marcelo negrão vôlei (Foto: Agência Estado)O rosto de garoto evidenciava a juventude. Marcelo Negrão ganhou o ouro aos 19 anos (Foto: Agência Estado)
 
Se a pouca idade até ajudou na hora de fazer o último ponto da competição, ela poderia ter atrapalhado em outro aspecto. Marcelo Negrão admite que é muito difícil não se deslumbrar na Vila Olímpica. Seja com restaurantes “fast food” de graça, com a conversa de duas estrelas do tênis na lavanderia ou com a presença de um astro de Hollywood.

- O Zé (Roberto Guimarães) teve um cuidado muito grande de deixar o grupo muito unido. Realmente é incrível ali. Você tem hambúrguer, pizza, máquina de refrigerante. E tudo de graça. É a Disneylândia dos atletas. Tem sessão do cinema, e na nossa época o filme que tinha era o “Exterminador do Futuro 2” (de 1991). E o Arnold Schwarzenegger estava lá na Vila. Eu lembro que estava na lavanderia e estava o Jim Courier e o Boris Becker conversando. Você fica maluco com aquilo ali. Mas o Zé foi muito inteligente. A gente ficava sempre junto. Quando um ia comer, ia todo mundo junto. Ninguém ficava separado, senão você não se perde.A gente teve uma reunião antes dos Jogos e disse “é um momento que vamos representar o Brasil. Vamos ter que esquecer as coisas maravilhosas que tem lá. Depois você aproveita, mas durante os Jogos, vamos nos concentrar”. E foi o que a gente fez – lembra Negrão.

Apesar de ter feito o ponto mais marcante daquela conquista, Marcelo acha que poderia ter aproveitado melhor aquele momento. Para ele, atualmente os atletas sabem capitalizar melhor as vitórias.

Marcelo Negrão, Vôlei (Foto: Divulgação / CBV)Marcelo Negrão acha que poderia ter aproveitado
melhor aquela fase (Foto: Divulgação / CBV)
 
- Eu aproveitei muito pouco. Muito, muito pouco essa fase. Se eu tivesse assessor de imprensa, empresário, como a gente vê hoje, acho que meu nome seria até mais forte do que é. Não fomos uma geração preparada para este tipo de coisa, para o estrelato. Eu vivia uma vida normal, não é como é hoje um atleta olímpico. Foi muito natural, sem ter muito essa preocupação. Hoje, com 40 anos é que eu sei o tamanho do feito. Na época, achava comum. Se eu ganhasse uma medalha de ouro hoje, estava feito - brincou.

No entanto, isso não o impediu de virar uma “celebridade”.
- Uma vez fui a um shopping em São Paulo. Aí parou um para tirar foto, outro para pedir autógrafo, veio mais um. Daqui a pouco começou uma muvuca, juntou gente, tinha segurança. Os caras falando que eu tinha que sair porque o shopping não estava preparado para receber uma celebridade. E eu perguntando “Celebridade?”. Mas eles falaram que eu tinha que sair e foram me escoltando até o carro. O shopping parou. Foi uma coisa impressionante - contou o ex-jogador.

O oposto foi também um dos protagonistas de uma inovação tática feita por José Roberto Guimarães. Para aproveitar as melhores características de cada um, o técnico usava Marcelo Negrão pelo meio de rede em algumas oportunidades, deslocando Carlão para as pontas.

- Eu sempre tive comigo que eu tinha que ajudar o grupo. Eu tinha uma facilidade de jogar em todas as posições, e o Zé fez um esquema que não ia desperdiçar o meu ataque. Tinha dois grandes bloqueadores, o Carlão e o Paulão, e o Tande e o Giovane que também estavam bem.

Não podia desperdiçar isso tudo. Para mim, era muito fácil jogar em qualquer posição, então ele falou “bloqueia por aqui de vez em quando, ataca uma ou outra bola pelo meio, às vezes vai para a ponta”. Foi uma surpresa nas Olimpíadas. Eu estava muito bem fisicamente, estava saltando muito, e a cada jogo eu ganhava uma confiança maior. Quando os caras acordaram, já era.

FONTE:
http://globoesporte.globo.com/olimpiadas/noticia/2012/07/na-base-da-porrada-marcelo-negrao-deixou-sua-marca-com-ponto-do-ouro.html

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