quinta-feira, 21 de março de 2013

Da Bahia à Nicarágua, passando pelo Fla, a saga do fenômeno da internet


Maycon Santana, que recebeu chance na Gávea após vídeo com jogadas suas explodir na rede, tenta o recomeço no futebol da América Central

Por Janir Júnior Rio de Janeiro


A realidade mudou, mas o mundo virtual continua como principal ferramenta de Maycon Santana. Ainda garoto, aos 14 anos, ele surgiu como fenômeno da internet, com vídeos contendo lances de efeito, gols e habilidade com a bola postados por um amigo no Youtube. Depois de uma explosão de acessos, torcedores se mobilizaram e o Flamengo foi buscar o menino em Adustina, interior da Bahia, em 2007. Com dificuldades de adaptação e uma idolatria obsessiva por Cristiano Ronaldo, o jogador sucumbiu e foi dispensado do clube no início de 2011. Depois, teve passagem pelo Tigres, fez alguns treinos num time de pouca expressão na Alemanha e, desde o fim de janeiro, defende o Walter Ferreti, do quase desconhecido futebol da Nicarágua.

- Tô jogando aqui na Nicarágua. Que matéria você gostaria de fazer? Estou longe, acho que nem tenho como (rs). Tenho que ir jantar, pois a janta aqui é de 18h30 às 19h. Mas aqui tem um vídeo, vê aí (o vídeo mostra uma vitória do Ferreti e o jogador brasileiro faz um gol e dá passe para o outro) – sugeriu Maycon Santana, numa espécie de vale a pena ver de novo.

Depois do rápido contato feito, é claro, através da internet, o jogador sumiu do mundo virtual. Na vida real, ele mora em locações do clube e divide espaço com outros jogadores. Na Nicarágua, o beisebol é o esporte preferido da população.

Allan Ribeiro, amigo de infância de Maycon Santana e responsável por filmar e postar o vídeo que despertou o interesse do Flamengo, diz que o jogador amadureceu.

- Ele está bem, feliz, gostando muito. A cabeça dele mudou, agora sabe o que quer. Caiu a ficha. Pena que não foi no Flamengo - disse Allan, que, agora, posta vídeos de lances do amigo na Nicarágua.

Maycon Santana futebol (Foto: Divulgação)Novo rubro-negro: Maycon Santana (à esq.) com companheiro no Walter Ferreti (Foto: Divulgação)

A semelhança entre passado e presente ficou apenas nas cores do Walter Ferreti, iguais às do Flamengo, só que com listras verticais. Os campos de treinamento são bem modestos e os jogos têm pouco público. A Nicarágua serve como ponte para o futebol mexicano. No time de Maycon, outros brasileiros também tentam a sorte.

Na sua chegada ao clube, no fim de janeiro, Maycon Santana, apresentado à imprensa local como grande aposta de reforço, chegou a reclamar em uma rede social sobre a dificuldade de comunicação:
- Tô no deserto, aqui nem celular pega.

A saída para se comunicar com o mundo foi, novamente, a internet, ferramenta que funcionou para Maycon Santana tanto para o bem como para o mal.

Maycon Santana futebol (Foto: Reprodução)O franzino Maycon na chegada ao Flamengo(Foto: Reprodução)

O trabalho de fortalecimento muscular feito no Flamengo deu corpo a Maycon Santana; e o futebol se encarregou de modelar a figura comum a jogadores. Hoje, aos 20 anos, ele desfila com um moicano à la Cristiano Ronaldo, usa roupas da moda - e justas - e utiliza a Internet - mais uma vez - para desfilar o seu estilo.

Mas, ao ser apresentado no Walter Ferreti, Maycon Santana usava chinelo de dedos e tinha um sorriso estampado no rosto. É mais uma tentativa de engrenar na carreira, no clube que é ligado à Polícia Nacional da Nicarágua e conquistou títulos nacionais em 1998 e 2001.

O Ferreti tem 25 anos de existência. Inicialmente, surgiu como Mint, mas, devido a um acidente fatal no qual o presidente da época e também fundador, Walter Ferretti Fonseca, morreu, em 1991, os dirigentes resolveram fazer uma homenagem, e a equipe passou a ter o nome atual.
O time ocupa a quarta colocação na competição local. A negociação para o acerto de Maycon Santana aconteceu através de um advogado escolhido pela família para representar o jogador.

Obsessão por Cristiano Ronaldo e 'travado' para sair do carro


Paulo Henrique, que trabalhava nas categorias de base do Flamengo na época de Maycon Santana, lembra da maneira inusitada como o menino de Adustina chegou ao clube, da falta de evolução e da confusão mental entre a realidade e o universo virtual e paralelo no qual o jogador sonhava ser Cristiano Ronaldo.

- O Maycon chegou ao Flamengo ainda garoto, através da Internet, numa situação que não é convencional. Ele mostrou certa qualidade, técnica, mas se deslumbrou com o Rio e ficou prejudicado. Outro problema foi que ele queria imitar o Cristiano Ronaldo, achava que ia fazer através dos vídeos o que o Cristiano fazia. Perdeu o foco e não evoluiu. Outros atletas como Nixon e Lucas (que hoje estão no profissional) passaram à frente, enquanto ele estagnou. A última vez que tive contato foi quando ele estava no Tigres, nunca mais tive notícia – afirmou Paulo Henrique.

O amigo Allan Ribeiro garante que Maycon conseguiu controlar o fanatismo por Cristiano Ronaldo:

- Ele é fã, mas aquela história de fanatismo acabou.
Info_MAYCON-SANTANA-2 (Foto: Infoesporte)

A chegada de Maycon Santana ao Flamengo trouxe o choque de realidade que assustou o menino. A transição de Adustina para o Rio. A mudança dos campos de terra batida para o gramado da Gávea. A substituição de uma câmera amadora que registrava seus lances pelas entrevistas com emissoras de todo o país interessadas no curioso caso do fenômeno da internet. Tudo isso fez com que o menino travasse, literalmente.

- Demorou uma semana para ele conseguir entrar no CT. Chegávamos na porta, ele travava e não conseguia sair do carro. Fizemos algumas sessões juntos, ele tentou se adaptar às mudanças e, depois, seguiu o trabalho com os profissionais da base - recordou o psicólogo Paulo Ribeiro, que na época trabalhava com o time principal e foi convocado para ajudar na adaptação de Maycon Santana.

Paulo Ribeiro acredita que, com a mudança para a Nicarágua, o jogador passa por novo choque de realidade, mas, agora, em menores proporções:
- Está se repetindo, mas não tem a mesma dimensão de como foi no Flamengo.

Maycon Santana futebol (Foto: Reprodução)Estilo jogador: Maycon com roupa de grife e brincos (Foto: Reprodução)

Além de "travar" para conseguir sair do carro, na chegada ao Flamengo, Maycon Santana teve outros problemas detectados, entre eles anemia e verminose. A socialização com os demais aspirantes a profissionais também foi complicada. Houve um treino em que responsáveis pelas categorias de base tiveram que buscá-lo embaixo da cama, já que estava escondido, pois não queria sair do quarto. Antes de chegar à Gávea, o garoto nunca tinha saído de Adustina, nem mesmo para Salvador. Um assistente social contratado pelo Flamengo chegou a viajar à cidade do jogador para saber como era a vida dele.

Dos tempos de Flamengo, ficou a amizade com Nixon. Ambos são evangélicos e mantêm contato até os dias atuais.
Pela internet, é claro.

FONTE:
http://globoesporte.globo.com/futebol/noticia/2013/03/da-bahia-nicaragua-passando-pelo-fla-saga-do-fenomeno-da-internet.html

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