Depois de migrar para a quadra, atacante diz que foi boicotado no Flamengo, revela carinho pelo Botafogo e quase desistiu do futebol
Em uma faculdade de Brasília, os sons se misturam. Em um canto, alunas
se alongam e correm. No outro, quatro estudantes praticam passos de
alguma dança latina, enquanto a sala ao lado recebe aulas de dança do
ventre. Do lado de fora, sentados e conversando, estão os atletas do
time de futsal do Peixe Brasília. A maioria é jovem, mas alguns são
visivelmente mais velhos. Entre eles, um veterano de 37 anos,
ex-artilheiro do Campeonato Brasileiro e herói do Botafogo. Com um
sorriso no rosto, Dimba foi breve.
- Enquanto a aula de educação física não acaba, vamos adiantando a conversa - afirnou.
Editácio Vieira trocou os gramados pela quadra no último mês. Não que estivesse fazendo feio em campo: depois de um bicampeonato no Candangão pelo Brasiliense, em 2008 e 2009, levou o Ceilândia ao título no ano passado. Foi o último time em que atuou antes de aceitar o convite para o Peixe, completando a volta às origens: nascido em Sobradinho, cidade a 22 quilômetros de Brasília, Dimba começou no esporte defendendo o time de futsal da cidade. Mas o que leva um veterano como ele a fazer o caminho inverso?
- Dei um tempo para poder cuidar dos meus filhos, coisa que há muito tempo eu não conseguia fazer. Porque no campo você concentra, viaja, joga, é uma rotina completamente diferente do futsal. E conversando com meus filhos eu sentia essa necessidade deles de estarem mais próximos de mim, então eu resolvi dar esse tempo. Então eu troquei de profissão: deixei de ser atleta profissional e passei a ser pai.
Para o atacante, que ainda sonha em voltar aos gramados, a mudança não é nada simples, mas satisfatória.
- Foi muito difícil porque vir jogar futsal depois de um bom tempo é complicado. Lá atrás eu era pivô, mas hoje em dia, como mudou muito, eu tenho que ver primeiro, depois jogar. Mas está gostoso, já estou começando a me adaptar com a bola, o espaço, a quadra. É claro que falta alguma coisinha em termos táticos e eu estou chegando, mas a cada dia que passa estou adquirindo um tipo de conhecimento.
Apesar de admitir que o ritmo na quadra é mais pesado, Dimba negou qualquer problema com o preparo físico. A complicação agora é outra. Acostumado a sofrer com os zagueiros na marcação às vezes dura, o jogador se depara agora com o desafio de estar do outro lado.
- No campo eu era marcado, como atacante não marcava ninguém. Eu me posicionava ali para cercar, mas estava sempre pronto para um contra-ataque, para finalizar. Aqui não, aqui você tem que marcar, atacar, correr atrás.
A capacidade de improviso - chave da habilidade para um atacante no campo, segundo o jogador - não tem o mesmo efeito e relevância na quadra.
- A criatividade do jogador no campo é mais importante, porque ali é o
momento do jogador, em que ele se coloca, tem a chance de finalizar. O
salão é um conjunto, o coletivo fala muito mais alto. Se você fizer o
que foi treinado, executar com perfeição os movimentos, a chance de dar
certo é muito grande.
Do gol do título à quase desistência
Se o treino já está funcionando, ainda não se sabe. A estreia de Dimba está marcada para esta quinta, contra o Parkway, em um torneio local. Uma mudança e tanto para quem ficou famoso graças a um daqueles gols de crônica, que garante o título. Foi em 1997, na final do Campeonato Carioca. Artilheiro no Campeonato Brasiliense do ano anterior pelo Gama, Dimba estava na reserva do Botafogo até ser chamado durante a final contra o Vasco. De perto da lateral, invadiu a área, driblou dois defensores, colocou a bola no canto do gol e deu o campeonato ao alvinegro. O suficiente para marcar o jogador - e a torcida, a preferida de Dimba em toda a carreira.
- Nem eu sabia que isso ia dar essa repercussão, mas os botafoguenses
em si são um tipo de torcedor muito carismático. Não é a maior torcida
do Brasil, mas é uma torcida que sofreu muito. Era sofrida mesmo.
Criou-se aquela coisa de "tem coisas que só acontecem com o Botafogo" e,
por incrível que pareça, tem mesmo coisas que só acontecem com o
Botafogo. Então, é uma torcida assim, muito ligada ao jogador. Existe a
cobrança como existe em todos os clubes, mas eles te dão um carinho
diferente. Eles são muito gratos pelo que você faz pelo clube.
Apesar do título, o atacante não se firmou no time. Acabou indo para Portugal, onde jogaria pelo Porto, mas acabou integrando o elenco do Leça. A experiência europeia não durou muito, e Dimba voltou ao Brasil para disputar o Campeonato Brasileiro pelo América-MG. Dali, foi chamado por Joel Santana, que o havia treinado no Botafogo e assumia o Bahia. O atacante admite um carinho especial pelo treinador.
- Eu já trabalhei com vários bons, cada um com suas particularidades. Mas o Joel é fantástico.
Em Salvador, o atacante conquistou o título baiano e chegou às semifinais da Copa do Brasil. Depois, foi para a Portuguesa e, novamente, o Botafogo de Joel Santana. Mas o time passava por problemas financeiros, que levaram Dimba a pensar em desistir do futebol.
- Eu sou uma pessoa assim: quando eu tomo uma decisão, quando falo que vou fazer, acabo fazendo. Tenho uma opinião muito forte. E o Botafogo naquele negócio de não pagar, me levou a decidir deixar o clube. Vim embora, e não queria mais jogar futebol. Eu ia parar, cuidar das minhas coisas.
De volta a Brasília, recebeu o convite do Gama, time que havia ajudado a revelá-lo em 1996. Resolveu aceitar, e da quase desistência, voltou a brilhar. Campeão e artilheiro da Copa Centro-Oeste, foi vice-artilheiro do Brasileiro de 2002, à frente de Romário, que jogava então no Fluminense. Infelizmente, não conseguiu ajudar o Gama a permanecer na série A. No ano seguinte, partia para o Goiás, onde colocaria o nome na lista de goleadores do Brasileiro.
- Na minha estreia eu fiz quatro gols, fomos campeões goianos. Depois acabei sendo maior artilheiro do Brasileiro, batendo o recorde do Edmundo, com 31 gols. Minha média estava em quase um gol por jogo. Aí eu rompi ligamentos, fiquei mais de um mês sem jogar, e assim mesmo consegui ser atilheiro do campeonato.
Boicote
O sucesso atraiu a atenção de fora, e Dimba foi para a Arábia Saudita. O escolhido foi o Al-Ittihad, que já tinha o jogador Tcheco e era treinado pelo técnico Candinho. Ali, Dimba ajudou o time a conquistar a Liga dos Campeões da Ásia - feito que o clube repetiria no ano seguinte. Pouco depois voltou ao Brasil, no que talvez seja a maior polêmica da carreira do jogador: sua passagem pelo Flamengo.
Ainda em 2004, o clube da Gávea passava por dificuldades, com uma
campanha apenas regular no Brasileirão, salários do elenco atrasados e
torcida insatisfeita. Foi neste clima que Dimba foi anunciado: uma
contratação milionária de um salvador da pátria. Para o jogador, foi
quando as coisas começaram a dar errado.
- Eu não tinha culpa se os caras estavam sem receber. Eu apenas me precavi: exigi uma quantia X para poder ir. Quem tentou me contratar na época não conseguiu, porque eu não aceitei. Veio o vice-presidente de futebol, passou por cima de quem era a pessoa indicada para contratar e me contratou. Aí houve aquela ciumeira.
Enquanto o resto do time reclamava, o atacante foi trazido a peso de ouro: R$ 3 milhões, parcelados. Para Dimba, o resultado foi uma péssima relação com parte dos companheiros, o que teria prejudicado seu desempenho em campo.
- A verdade é que houve um boicote muito grande. Fiz poucos gols? Fiz poucos gols por causa da circunstância que estava acontecendo lá. Aí foi virando aquela bola de neve, até que chegou um ponto em que eu não estava mais satisfeito.
A saída traumática foi a venda para o São Caetano, de onde partiu pouco tempo depois de volta a Brasília. Apesar de estar nas quadras, Dimba não descarta uma possível volta ao campo. E provoca.
- A verdade é uma só: o jogador não para, param o jogador. Com 50 anos,
se o cara fizer uma proposta irrecusável, ele vai tentar voltar. Eu
ainda não aposentei dos gramados, não. Enquanto estiverem me dando
oportunidade e eu estiver satisfeito, vou jogar. Eu acho que no meu
lugar, no lugar de alguns outros jogadores que estão por aí, como o
Rivaldo, os jovens é que deviam estar aproveitando essas oportunidades,
mas infelizmente a maioria dos jovens não acordou ainda para a vida.
Com a quadra da faculdade livre, Dimba é chamado para o treino - que continua depois que o resto do time é liberado. Longe de desistir, e antes de ir embora, ele ainda revelou um sonho.
- Eu vou fazer essa jornada, se der certo eu vou continuar, e tenho um objetivo ainda dentro do campo: preciso e quero ser campeão mais uma vez no gramado, independentemente de onde seja. Se é no Norte, no Nordeste, em um time do Acre, não interessa. Quero ser campeão no salão,ter esse prazer e ser mais uma vez campeão no campo para, aí sim, poder parar. Enquanto eu tiver condição, vou em busca desse sonho, objetivo, é a única coisa que quero ainda. Aí eu acho que meu ciclo vai chegar ao fim.
FONTE:
http://globoesporte.globo.com/bau-do-esporte/noticia/2011/10/agora-no-futsal-dimba-diz-que-ainda-nao-se-aposentou-dos-gramados.html
- Enquanto a aula de educação física não acaba, vamos adiantando a conversa - afirnou.
Editácio Vieira trocou os gramados pela quadra no último mês. Não que estivesse fazendo feio em campo: depois de um bicampeonato no Candangão pelo Brasiliense, em 2008 e 2009, levou o Ceilândia ao título no ano passado. Foi o último time em que atuou antes de aceitar o convite para o Peixe, completando a volta às origens: nascido em Sobradinho, cidade a 22 quilômetros de Brasília, Dimba começou no esporte defendendo o time de futsal da cidade. Mas o que leva um veterano como ele a fazer o caminho inverso?
- Dei um tempo para poder cuidar dos meus filhos, coisa que há muito tempo eu não conseguia fazer. Porque no campo você concentra, viaja, joga, é uma rotina completamente diferente do futsal. E conversando com meus filhos eu sentia essa necessidade deles de estarem mais próximos de mim, então eu resolvi dar esse tempo. Então eu troquei de profissão: deixei de ser atleta profissional e passei a ser pai.
Dimba se prepara para a estreia no Peixe Brasilia, nesta quinta (Foto: Divulgação/Rafael Moura)
- Foi muito difícil porque vir jogar futsal depois de um bom tempo é complicado. Lá atrás eu era pivô, mas hoje em dia, como mudou muito, eu tenho que ver primeiro, depois jogar. Mas está gostoso, já estou começando a me adaptar com a bola, o espaço, a quadra. É claro que falta alguma coisinha em termos táticos e eu estou chegando, mas a cada dia que passa estou adquirindo um tipo de conhecimento.
Apesar de admitir que o ritmo na quadra é mais pesado, Dimba negou qualquer problema com o preparo físico. A complicação agora é outra. Acostumado a sofrer com os zagueiros na marcação às vezes dura, o jogador se depara agora com o desafio de estar do outro lado.
- No campo eu era marcado, como atacante não marcava ninguém. Eu me posicionava ali para cercar, mas estava sempre pronto para um contra-ataque, para finalizar. Aqui não, aqui você tem que marcar, atacar, correr atrás.
A capacidade de improviso - chave da habilidade para um atacante no campo, segundo o jogador - não tem o mesmo efeito e relevância na quadra.
Dimba teve que se readaptar: 'No campo eu era marcado, no fusal eu tenho que marcar (Foto: Divulgação)
Do gol do título à quase desistência
Se o treino já está funcionando, ainda não se sabe. A estreia de Dimba está marcada para esta quinta, contra o Parkway, em um torneio local. Uma mudança e tanto para quem ficou famoso graças a um daqueles gols de crônica, que garante o título. Foi em 1997, na final do Campeonato Carioca. Artilheiro no Campeonato Brasiliense do ano anterior pelo Gama, Dimba estava na reserva do Botafogo até ser chamado durante a final contra o Vasco. De perto da lateral, invadiu a área, driblou dois defensores, colocou a bola no canto do gol e deu o campeonato ao alvinegro. O suficiente para marcar o jogador - e a torcida, a preferida de Dimba em toda a carreira.
Botafoguenses são gratos e carismáticos"
Dimba
Apesar do título, o atacante não se firmou no time. Acabou indo para Portugal, onde jogaria pelo Porto, mas acabou integrando o elenco do Leça. A experiência europeia não durou muito, e Dimba voltou ao Brasil para disputar o Campeonato Brasileiro pelo América-MG. Dali, foi chamado por Joel Santana, que o havia treinado no Botafogo e assumia o Bahia. O atacante admite um carinho especial pelo treinador.
- Eu já trabalhei com vários bons, cada um com suas particularidades. Mas o Joel é fantástico.
Em Salvador, o atacante conquistou o título baiano e chegou às semifinais da Copa do Brasil. Depois, foi para a Portuguesa e, novamente, o Botafogo de Joel Santana. Mas o time passava por problemas financeiros, que levaram Dimba a pensar em desistir do futebol.
- Eu sou uma pessoa assim: quando eu tomo uma decisão, quando falo que vou fazer, acabo fazendo. Tenho uma opinião muito forte. E o Botafogo naquele negócio de não pagar, me levou a decidir deixar o clube. Vim embora, e não queria mais jogar futebol. Eu ia parar, cuidar das minhas coisas.
De volta a Brasília, recebeu o convite do Gama, time que havia ajudado a revelá-lo em 1996. Resolveu aceitar, e da quase desistência, voltou a brilhar. Campeão e artilheiro da Copa Centro-Oeste, foi vice-artilheiro do Brasileiro de 2002, à frente de Romário, que jogava então no Fluminense. Infelizmente, não conseguiu ajudar o Gama a permanecer na série A. No ano seguinte, partia para o Goiás, onde colocaria o nome na lista de goleadores do Brasileiro.
- Na minha estreia eu fiz quatro gols, fomos campeões goianos. Depois acabei sendo maior artilheiro do Brasileiro, batendo o recorde do Edmundo, com 31 gols. Minha média estava em quase um gol por jogo. Aí eu rompi ligamentos, fiquei mais de um mês sem jogar, e assim mesmo consegui ser atilheiro do campeonato.
Boicote
O sucesso atraiu a atenção de fora, e Dimba foi para a Arábia Saudita. O escolhido foi o Al-Ittihad, que já tinha o jogador Tcheco e era treinado pelo técnico Candinho. Ali, Dimba ajudou o time a conquistar a Liga dos Campeões da Ásia - feito que o clube repetiria no ano seguinte. Pouco depois voltou ao Brasil, no que talvez seja a maior polêmica da carreira do jogador: sua passagem pelo Flamengo.
Dimba comemora um dos poucos gols pelo Fla:
passagem com problemas (Foto: Agência O Globo)
passagem com problemas (Foto: Agência O Globo)
- Eu não tinha culpa se os caras estavam sem receber. Eu apenas me precavi: exigi uma quantia X para poder ir. Quem tentou me contratar na época não conseguiu, porque eu não aceitei. Veio o vice-presidente de futebol, passou por cima de quem era a pessoa indicada para contratar e me contratou. Aí houve aquela ciumeira.
Enquanto o resto do time reclamava, o atacante foi trazido a peso de ouro: R$ 3 milhões, parcelados. Para Dimba, o resultado foi uma péssima relação com parte dos companheiros, o que teria prejudicado seu desempenho em campo.
- A verdade é que houve um boicote muito grande. Fiz poucos gols? Fiz poucos gols por causa da circunstância que estava acontecendo lá. Aí foi virando aquela bola de neve, até que chegou um ponto em que eu não estava mais satisfeito.
A saída traumática foi a venda para o São Caetano, de onde partiu pouco tempo depois de volta a Brasília. Apesar de estar nas quadras, Dimba não descarta uma possível volta ao campo. E provoca.
Dimba trocou Fla pelo Azulão (Foto: Agência Lance)
Com a quadra da faculdade livre, Dimba é chamado para o treino - que continua depois que o resto do time é liberado. Longe de desistir, e antes de ir embora, ele ainda revelou um sonho.
- Eu vou fazer essa jornada, se der certo eu vou continuar, e tenho um objetivo ainda dentro do campo: preciso e quero ser campeão mais uma vez no gramado, independentemente de onde seja. Se é no Norte, no Nordeste, em um time do Acre, não interessa. Quero ser campeão no salão,ter esse prazer e ser mais uma vez campeão no campo para, aí sim, poder parar. Enquanto eu tiver condição, vou em busca desse sonho, objetivo, é a única coisa que quero ainda. Aí eu acho que meu ciclo vai chegar ao fim.
FONTE:
http://globoesporte.globo.com/bau-do-esporte/noticia/2011/10/agora-no-futsal-dimba-diz-que-ainda-nao-se-aposentou-dos-gramados.html
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