FONTE:
http://www.diariodocentrodomundo.com.br/o-artigo-sobre-delacao-que-moro-traduziu-prega-o-oposto-do-que-faz-a-lava-jato-por-marcos-danhoni/
por : Diario do Centro do Mundo
Sérgio Moro
O DCM recebeu este artigo de Marcos Cesar Danhoni Neves, professor Titular do Departamento de Física da Universidade Estadual de Maringá, autor da obra “Do Infinito, do Mínimo e da Inquisição em Giordano Bruno”.
O juiz Sérgio Fernando Moro vem tendo sua atuação chamada de “contundente, precisa e implacável” pela imprensa amiga desde o início da assim chamada “Operação Lava-Jato”.
Para entender este personagem do mundo jurídico contemporâneo, é necessário lembrar que Sergio Moro, filho de um professor do Departamento de Geografia da Universidade Estadual de Maringá (UEM) e de mãe professora de Ensino Fundamental e assídua nas hostes conservadoras católicas da cidade, graduou-se em Direito pela UEM (fato que não se encontra em seu currículo Lattes de uma página), fez mestrado pela Universidade Federal do Paraná (UFPR – fato que também não consta em seu C.V.) e doutorou-se ali estranhamente em dois anos, entre 2001 e 2002 (“estranhamente” porque sabemos que um doutorado leva, no mínimo, 48 meses, ou seja, 4 anos).
Sérgio Moro traduziu um ensaio de Stephen Sprangler Trott, intitulado The use of a criminal as a witness: a special problem publicado no U.S. Department of Justice’s Manual for Federal Prosecutors e no Hastings Law Journal, vol. 47, July/August 1996, no. 5/6.
A tradução de Moro, intitulada O uso de um criminoso como testemunha: um problema especial foi publicada na Revista CEJ (Brasília, Ano XI, n. 37, p. 68-93, abr./jun. 2007; disponível aqui), é de um ano depois.
O autor é juiz, filiado ao Partido Republicano, indicado por Ronald Reagan para ocupar a Corte de Apelo da 9ª Jurisdição dos EUA. Trott disserta sobre a possibilidade de se usar delatores para punir um criminoso.
É rico em detalhes neste procedimento, mas levanta inúmeras cautelas sobre a eficácia dessa estratégia, uma vez que o delator, ele também um criminoso, tenta incriminar pessoas inocentes.
Trott afirma que:
“a questão apropriada não é a de se criminosos devem realmente ser utilizados como testemunhas de acusação, mas quando e como. Entende que criminosos colaboradores(sic) são perigosos, pois quase sempre possuem uma mentalidade que não carrega os princípios que animam a lei, além de serem motivados por interesses próprios, o que pode levar à traição. Alega que um promotor desatento a essas verdades poderá transformar-se eventualmente em objeto de investigação, e por isso, disponibiliza exemplos de casos concretos relacionados ao assunto e orientações para lidar com o problema de modo efetivo.” (grifos nossos)
O artigo orbita em torno do Direito Processual Penal norte-americano, a jurisprudência nos EUA e as intricadas relações entre delação, criminoso, testemunha, defesa e acusação.
“Um promotor que não for sensível aos perigos de utilizar criminosos recompensados como testemunhas arrisca comprometer a missão de busca de verdade em nosso sistema de justiça criminal. Porque a acusação decide se e quando utilizar essas testemunhas e o quê, se alguma coisa, dar a elas pelos seus serviços, a acusação encontra-se posicionada de maneira única para proteger contra a perfídia.” (grifos nossos)
Trott prossegue, agora citando o caso notório de Charles Manson, envolvido no pavoroso homicídio múltiplo que vitimou Sharon Tate, esposa do cineasta Roman Polanski:
“Por outro lado, alguns dos maiores sucessos em nossas cortes criminais poderiam não ter sido alcançados sem a utilização experiente e habilidosa desse tipo de testemunha. Vicent Bugliosi usou destramente membros da Família Manson para derrubar seu confiante líder, o próprio Charles Manson.”
“Um conjunto sem fim de promotores habilitados utilizou mafiosos para derrubar seus líderes e destruir seus impérios. Até mesmo o Presidente Nixon foi retirado do mais elevado posto da nação com a ajuda do depoimento de seus mais próximos confidentes. A lista de sucessos é comprida e impressionante. Como a Suprema Corte disse em Kastigar v. United States, nossas leis de imunidade a testemunhas refletem a importância da prova testemunhal e o fato de que muitoscrimes são do tipo de que as únicas pessoas aptas a dar depoimentos úteis são aquelas neles implicadas.” (grifos nossos)
Um promotor norte-americano pergunta-se como um profissional da Lei torna-se adequadamente treinado e habilitado nessa área peculiar de sua arte. E ele próprio responde:
“O currículo requerido não pode comumente ser encontrado na sala de aula de nossas escolas de Direito, mas apenas nas ruas, nas cadeias e nos fóruns de nossas cidades. Aqui, o conhecimento vem das trincheiras, dos veteranos, das escolas dos nocautes duros, e espera-se que venha antes que erros problemáticos sejam cometidos.” (grifos nossos)
Nota-se que o promotor deve ter muita experiência no campo da delinquência, no trabalho de rua, o que destoa do perfil de Sergio Moro e de seus colegas de desventuras jurídicas, especialmente Deltan Dallagnol e Carlos Fernando dos Santos Lima.
Sobre testemunhas passíveis de se tornarem traidores de seus colegas de crime, Trott afirma:
“Cedo ou tarde, no entanto, outro tipo não tão confiável de testemunhacomeçará a aparecer ocasionalmente na lista de intimações, e o promotor começará a aventurar-se em um mar totalmente diferente e no qual ele está freqüentemente mal preparado para navegar: as águas e o domínio traiçoeiro do cúmplice, do co-conspirador, do delator e do informante. Após o depoimento do Sr. Jones como vítima de uma fraude, um dos estelionatários é chamado a depor em uma tentativa de condenar o mentor que planejou o esquema e que escondeu todo o seu saque em contas em bancos estrangeiros. (grifos nossos)
“Criminosos estão dispostos a dizer e a fazer qualquer coisa para obterem o que querem, especialmente quando o que eles desejam é livrar-se de seu problema com a lei. Este desejo de fazer qualquer coisa inclui não-somente espalhar os segredos dos amigos e parentes, mas também mentir, cometer perjúrio, fabricar provas, solicitar a outros que corroborem suas mentiras com mais mentiras e trair qualquer um que tiver contato com eles, incluindo o promotor.” (grifos nossos)
Incrível que Moro, traduzindo este importante artigo, não tenha se valido das precauções de seu autor. A prisão indevida de uma cunhada de um tesoureiro de um partido, as escutas ilegais contrabandeadas para a imprensa e a aceitação da “des-delação” do presidente da Andrade Gutierrez que emitiu um cheque nominal de um milhão de reais para o Golpista Michel Temer como propina de campanha, indicam que Moro não entendeu o livro.
O promotor prossegue:
“(…) a história de Marion Albert Pruett é apavorante mas obrigatória. Mantido em prisão federal, ele negociou seu caminho para a liberdade concordando em testemunhar contra um prisioneiro acusado de matar o seu colega de cela (que também estava arrolado como testemunha pela Acusação). Em troca, o governo norte-americano colocou-o no seu programa secreto de segurança para testemunhas, dando-lhe nova identidade e um novo começo de vida.
Por volta do último outubro e por sua própria conta, no entanto, Pruett havia cometido uma seqüência de roubos a banco e havia matado dois balconistas de lojas de conveniência, um perto de Denver, outro em Fort Smith, Arkansas.”(grifos nossos)
E cita outros casos:
“o que dizer da história de Willie Kemp, que, em troca de dinheiro, inventou casos criminais contra trinta e duas pessoas inocentes? O National Law Journal contou a história em 27/02/1995, sob esta manchete: Agentes postais marcados pelo escândalo: Por quinze meses, Willie Kemp e outros se infiltraram no correio de Cleveland, ostensivamente procurando provas contra usuários e vendedores de drogas. Providos de dinheiro do governo, eles alcançaram o topo, alugando carros de luxo … Os dezenove trabalhadores do correio despedidos após serem presos em setembro de 1992 foram readmitidos em seus empregos.” (grifos nossos)
“New York Times – A Califórnia abalada por um informante. No mundo desagradável dos informantes da cadeia, traição tem sido há tempos o seu credo e favores dos carcereiros sua recompensa. Agora advogados e promotores devem ponderar se a ficção era o seu método. Essa é a implicação infeliz atrás da crise na aplicação da lei que foi revelada no Sul da Califórnia desde que um prisioneiro, Leslie Vernon White, que testemunhou vários casos de grande publicidade, demonstrou em outubro (1988) como ele podia fabricar as confissões de outros presos sem sequer ter falado com eles. Ele disse posteriormente ter mentido em um número significativo de casos criminais. Advogados de defesa compilaram uma lista de 225 pessoas condenadas por homicídio ou outros crimes graves, alguns dos quais sentenciados a morte, em casos nos quais o Sr. White e outros informantes prisioneiros testemunharam nos últimos dez anos no Condado de Los Angeles.” (grifos nossos)
Em todos os casos citados por Trott, demonstra-se a extrema complexidade em se confiar num delator premiado pelo poder que um criminoso possui, inclusive, em ludibriar o Promotor que o interroga e todo o sistema judiciário e também a mídia de massa.
Por essa razão, Trott fala na regra de precaução:
“A regra de precaução contra a sujeira por parte de uma confissão na prisão oferecida por outro prisioneiro é a de que ela é falsa até que o contrário seja provado acima de qualquer dúvida razoável. Se você não sabe como Leslie Vernon White foi capaz de forjar confissões com credibilidade sem sequer falar com o alegado confesso sobre o crime, deve descobrir. Usando o telefone e fingindo ser outra pessoa, ele era capaz de coletar de fontes oficiais informação privilegiada suficiente acerca de um crime, a fim de convencer investigadores de que ele teria ouvido isso diretamente do suspeito. Uma leitura clara e instrutiva, que você deve experimentar, é Key Witness, de J. F. Freedman. É um romance, mas um que irá abrir-lhe os olhos. Poderia um delator em potencial, procurando informação sobre um acusado para trocar com a polícia, a fim de obter benefícios, invadir os arquivos de computador de um advogado de defesa? Pense a esse respeito. (grifos nossos)
Trott finaliza:
“Finalmente, e eu repito, nunca, em tempo algum, perca o controle sobre a testemunha. Ela vai tentar manipulá-lo se ela quiser, pensando que você precisa dela e não vice-versa. Esteja preparado para dizer “não” a pedidos bizarros e deixe-a saber, todo o tempo, que você está no controle. Isso pode ser feito educadamente, mas deve ser feito com firmeza, e, acredite ou não, ela usualmente vai respeitá-lo por isso. Ela deve confiar em você até certo grau, mas não irá machucá-la ter um elemento de medo fundado em confiança e respeito. Você não quer deixá-la pensar que pode passar por cima de você e abandoná-lo com isso. Se ela cometer perjúrio, processe-a por isso. É o seu dever. A verdade é a sua mercadoria de troca! (grifos nossos)
Sergio Moro nunca trabalhou com “a verdade como mercadoria”. Criou uma similaridade com a operação Mani Pulite (“Mãos Limpas”) do promotor Antonio di Pietro, que destruiu a classe política italiana de uma forma que permitiu a sucessão de um governo estável pelos 10 anos posteriores com um mafioso como Berlusconi no poder.
Dez longos e doloridos anos que mergulharam a Itália numa crise da qual ela ainda não saiu: política, econômica, social e judiciária. O próprio Antonio di Pietro, cego pela ambição política e por ter-se tornado um promotor pop-star, adentrou na política e nela se enterrou com posteriores acusações contra si por subtração de fundos destinados ao seu partido e por enriquecimento ilícito (ver Illeciti nei rimborsi elettorali, Di Pietro indagato per truffa – Corriere della Sera https://goo.gl/BiccCd).
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