FONTE:
http://www.conversaafiada.com.br/brasil/temer-o-ramon-vai-te-depor
Ele é a prova de que uma educação progressista muda um homem e um povo!
publicado 15/06/2016
Retorno ao Brasil, Cruz das Almas, de volta aos trabalhos na área de
produção coletiva da residência universitária
produção coletiva da residência universitária
No dia 09/06/2016, eu fui lançar “O Quarto Poder – uma outra História” na Universidade Federal do Recôncavo, uma das obras monumentais do Governo Lula.
(Em dez anos, 10 mil alunos, no interior baiano!)
Depois de uma palestra, participei de uma divertida e estimulante noite de autógrafos.
Uma professora me apresentou um dos compradores na fila:
- Esse é Ramon. Chegou outro dia da França. Estava lá com o Ciência sem Fronteiras.
(“Ciência sem Fronteiras”, essa obra monumental do Governo Dilma!)
Geórgia Pinheiro, Presidenta do Conversa Afiada, procurou o Ramon.
Nós queríamos saber como é que Ramon Alves Malta tinha saído do interior da Bahia para estudar na França, e no que isso tinha dado...
Ramon, com um amigo e seu pai (agricultor familiar), no povoado de
São Benedito em Nilo Pecanha (BA)
Ele partiu da Engenharia, para a Agronomia e vai ser professor de Sociologia Rural, para entender como é que o pequeno produtor rural é um herói na França e, a aqui, criminalizado e perseguido.
É um depoimento comovente, que publicamos na íntegra, com um álbum de fotografias e legendas que o próprio Ramon redigiu.
A história de Ramon comove.
Porque é a prova de que políticas educacionais progressistas mudam um homem e um povo!
Essa política corre sério risco.
Com a “desvinculação” , com o ajuste dos açougueiros do neolibelismo e as ideias de dizimação social embutidas no receituário do professor Bacha – que deve entender muito da Bourgogne, mas não sabe por que Cruz das Almas é um patrimônio da Humanidade!
Mas, não tem problema: o Ramon vai depor o temer!
PHA
Primeiro encontro no Arco do triunfo, na praça Darcy, com os amigos
brasileiros que habitavam em Dijon
Mês de luta, 21 de maio, Dia Mundial de luta contra a Monsanto,
ato na cidade de Dijon, capital da Bourgogne
Com os colegas Franceses em Bruxelas em atividade acadêmica
Saindo dos livros e vendo de perto o Coliseu e a fortaleza do
Império Romano na Itália
Com as amigas da Grécia do programa de mobilidade internacional
da Europa, o Erasmus
Eu e os amigos brasileiros do Ciências sem Fronteiras, residentes
na Irlanda, na cidade de Cork
No norte da África no deserto do Saara, Marrocos, contato e
muito diálogo com os povos bérberes e nômades
Nos alpes marroquinos, apreciando esta bela vista e conhecendo
a historia dos diferentes povos africanos
Grupo de brasileiros do csf no Marrocos (residentes na
Itália, França e Irlanda)
2016... - Esporte e resgate das origens, comunidade africana na França, esporte com a rapaziada, uma dezena de nacionalidades da África (Burkina, Congo, Togo, Costa do Marfim, Angola, Benin, Camarões e outros)
Abaixo, a íntegra da entrevista com Ramon:
PHA: Ramon, que idade você tem?
Ramon: Tenho 24 anos.
PHA: E você nasceu onde?
Ramon: Eu nasci na cidade de Nilo Peçanha, sou originário do povoado de São Benedito, região da Alvorada, no sul da Bahia .
PHA: E como você foi parar na Universidade Federal do Recôncavo?
Ramon: Rapaz, foi uma longa trajetória, na verdade... Todo o período do meu ensino fundamental eu estudei numa escola na zona rural...
PHA: Onde?
Ramon: Lá em Nilo Peçanha, no povoado de São Benedito. Quando eu tinha 13 anos, acabei tendo que sair, porque não tinha ensino médio, e fui para Valença, que fica a cerca de 150km de Nilo Peçanha, mas a quase 200km do povoado em que eu moro.
PHA: E o que você fazia em Valença, Ramon?
Ramon: Em Valença eu fazia uma concomitância. Fazia o ensino médio numa escola estadual e, no período da manhã, fazia um curso técnico em agropecuária, o que agora a gente conhece como UIFE, mas que, na época, era Escola Média de Agropecuária Regional...
PHA: E como você se sustentava em Valença?
Ramon: Rapaz, no período em que eu morei em Valença...
PHA: Quantos anos?
Ramon: Eu tinha 13 anos. Fiquei dos treze aos dezesseis em Valença. Inauguramos a primeira residência universitária, da EMAC de Valença, que tinha parado e nós reinauguramos. Então, eu morava na residência, no curso técnico, nesse período.
PHA: E esse curso técnico era do Estado, do município, do Governo Federal ? Quem bancava você lá ?
Ramon: Era um curso técnico do Governo Federal, em parceria com a instituição federal que estudava (agricultura do cacau).
(A ligação caiu e ele retoma para contar como se virava...)
Ramon: … fruto do nosso trabalho, que a gente cultivava hortaliças - alface, coentro, de uma forma geral - e nós vendíamos isso na feira (e também tinha a ajuda da instituição federal, que ajudava a gente. Mas, no geral, a gente trabalhava no período oposto ao que estudava, ou, se a gente estudava o dia inteiro, trabalhava um pouco no fim de semana vendendo hortaliças e cultivando...
PHA: Isso foi exatamente quando ?
Ramon: Entre 2005 e 2007 eu morei em Valença. Em 2005, ingressei no Colégio Estadual de Valença, em 2006 ingressei nesse instituto federal e 2006/07 eu morei nessa residência e fiz o curso técnico.
PHA: E como você veio parar na Universidade Federal do Recôncavo ?
Ramon: Pra Universidade já foi um pouco mais fácil, porque assim que eu me formei em Valença eu tinha 16 anos. Fui trabalhar em janeiro de 2007, ainda menor de idade, um período na zona rural, e quando eu senti que tinha a perspectiva de sair do local em que eu morava, eu comecei a fazer uma escola particular, uma faculdade de Biologia. Depois eu tentei o último vestibular que teve para a UFRB, mas ainda não foi para Agronomia - entrei pelo curso de Ciências Exatas. Decidi abandonar tudo lá e vim cursar a universidade pública, que sempre foi o meu sonho. Comecei a fazer esse curso de bacharelado em Ciências Exatas (porque eu pensava em fazer Engenharia Civil). Depois de um tempo, (com) a minha paixão pela Agronomia - meu pai é agricultor, pequeno agricultor familiar - eu me transferi de curso (e pela dificuldade do curso, também, porque eu tinha que trabalhar para me sustentar)... Eu migrei do curso de Ciências Exatas e fui fazer Engenharia Agronômica aqui na UFRB.
PHA: Qual o tamanho da propriedade do seu pai e o que ele planta?
Ramon: Meu pai tem cerca de 3 mil pés de cacaleira, entre 3 e 4 hectares, e tem uma área pequena de graviola, meio hectare. Ele tem cerca de 5 hectares. Todos os meus tios são agricultores familiares. Foi através da agricultura familiar também que o meu pai me sustentou pra possibilitar que eu estudasse. E ele também trabalha como porteiro em um escola municipal.
PHA: E qual o grau de instrução do seu pai?
Ramon: Meu pai estudou até a quinta série do ensino fundamental. Não chegou a terminar. E minha mãe é professora. Ela conseguiu depois de muito terminar Pedagogia, curso a distância, mas meu pai não terminou o fundamental.
PHA: Quantos irmãos vocês são?
Ramon: Eu tenho dois irmãos: tenho uma irmã de 21 anos e um irmão mais novo, que é filho do meu pai...
PHA: E eles são também universitários?
Ramon: Minha irmã entrou recentemente também na UFRB, no curso de Psicologia, e meu irmão, como é muito novo, está estudando lá na zona rural ainda. Ele está na quarta série.
PHA: E como você resolveu entrar no Ciência sem Fronteiras?
Ramon: Rapaz, na verdade, eu não tinha a perspectiva de sair do país para estudar. Depois de um tempo aqui na Universidade mudei um pouquinho a forma de pensar (e pensar a sociedade). No ano passado, eu estava definindo a minha vida: se eu iria me formar logo ou se eu devia tentar entrar na Pós-Graduação. E aí eu conheci o programa Ciência sem Fronteiras. A Universidade aqui tem uma parceria que se chama “Bra-Frag” (Brasil e França), uma parceria que envolve os cursos de Ciências Agrárias (Agronomia e outros cursos). Conheci alguns professores desse programa Bra-Frag, e com a propaganda também das Universidades, do Governo Federal - que começou a investir muito nisso - eu tomei conhecimento do Ciência sem Fronteiras e decidi ir para esse enfrentamento, porque eu nunca tinha falado francês na minha vida...
PHA? Nunca?! Não sabia falar "oui" ?
Ramon: Não sabia falar nem "oui", nem "bonjour"...
PHA: E como você se virou, Ramon?
Ramon: Na verdade, eu comecei a estudar dois meses antes de ir pra lá e tinha um colega que tinha ido, pelo Ciência sem Fronteiras, para França... Ele voltou, fiz uma semana intensiva de curso com ele e depois, quando eu fui contemplado pelo Ciência sem Fronteiras, lá na França eu estudei um mês e meio, antes de começar o ensino superior.
PHA: Qual foi a Universidade que você fez lá ?
Ramon: Eu fiquei na AgroSup Dijon, instituto nacional...
PHA: Onde tem mostarda!
Ramon: Exatamente, na região da Borgonha, onde tem a famosa mostarda...
PHA: E o vinho da Borgonha, né, doutor ?
Ramon: Sim, sim... Os vinhos brancos são muito bons.
PHA: Qual foi a experiência marcante do que você estudou em Dijon?
Ramon: Pra mim, a experiência mais marcante, como eu sou apaixonado por Sociologia Rural - a França é uma referência nessa área e um país marcado por uma equidade no que envolve a distribuição de terras... eu fiquei muito encantado pela distribuição agrária da França, que é um país em que os agricultores conseguem ter qualidade de vida, eles não tem uma concentração de terras extrema como é o caso do nosso país. Os movimentos sociais do campo não são taxados de pessoas que não tem o que fazer, não são criminalizados... Na França, as pessoas tem uma visão muito diferente das pessoas que produzem alimentos e dos movimentos sociais. Isso foi uma coisa que me chamou muito a atenção.
PHA: Os pais do Ramon da França tem um padrão de vida muito melhor e uma outra posição na hierarquia social e política do país? É isso?
Ramon: Com certeza.
PHA: É um país de pequenos agricultores, não?
Ramon: Tem muitos pequenos agricultores que conseguem viver bem no campo e fazer com que os filhos estudem, com saúde, educação... Essa é uma coisa bem perceptível.
PHA: Eu encontrei você lá em Cruz das Almas, no dia do lançamento do meu livro, e fazia cinco dias que você tinha voltado da França. Você visitou bem Paris ou não?
Ramon: Visitei, visitei bastante Paris...
PHA: Que bom, não?
Ramon: Muito bom. Uma das coisas boas que fiz nesse intercâmbio foi conhecer muitos países e outros continentes.
PHA: Você nunca tinha saído do Brasil?
Ramon: Nunca tinha saído do Brasil. Conhecia todas as regiões do Brasil, costumo sair bastante por conta da militância, mas nunca tinha saído do país...
PHA: Qual a sua militância política?
Ramon: O primeiro movimento social que eu conheci foi a Federação dos Estudantes de Agronomia do Brasil, mas eu sou militante do Levante [Popular da Juventude] desde 2012, quando se nacionalizou. O Levante tem uma proximidade muito grande com o MST, um movimento com o qual a gente sempre dialoga. E, no período em que eu estive na França, militei pelos “Amigos do MST”.
PHA: Tem MST na França ?
Ramon: Tem os Amigos do MST...
PHA: Quais são os seus próximos passos?
Ramon: Como eu estou no meu último semestre na Universidade, eu pretendo terminar a minha graduação aqui e (penso na) perspectiva de ingressar na pós-graduação, na área de Engenharia Rural, no Rio de Janeiro ou no Rio Grande do Sul, porque sempre foi um sonho estudar (Sociologia Rural), e esse período na França contribuiu para (estimular) essa experiência. Meu projeto profissional é trabalhar com docência universitária.
PHA: Você quer ser professor?
Ramon: Isso, isso, quero ser professor universitário.
PHA: E como militante do Levante quais são as suas próximas ambições?
Ramon: As atividades já começaram. Tivemos reunião ontem (14/06/2016), já tem várias atividades programadas de formação, de ato na rua, pautando o "Fora, Temer". E também lutando por uma reforma do sistema político brasileiro. No geral, a gente tem medido forças no cenário nacional para pautar o debate e para que a gente viva no mínimo uma mudança do Governo ou uma reforma política. A gente vai ter o Acampamento Nacional do Levante neste ano, em setembro, e a gente está se mobilizando nas universidades, nas periferias.
PHA: O que você acha da ideia de convocar plebiscito já, para convocar eleições?
Ramon: O plebiscito, antes do golpe e até um pouco depois do golpe era uma coisa que muita gente não reivindicava, porque dizia que convocar o plebiscito seria dar um tiro nos próprios pés. Mas, no cenário em que a gente está vivendo agora, eu acho que uma das possibilidades seria a gente convocar esse plebiscito para novas eleições... Acho que é a última carta na manga que a gente tem. Mas, além disso a gente precisaria de um plebiscito mesmo para reformar esse sistema político e pautar uma Constituinte exclusiva...
PHA: Uma última pergunta: por que quando nós nos encontramos lá na UFRB, você estava com uma camiseta do Bob Marley?
Ramon: Ah, sim... Bob Marley, pra mim, é uma grande referência, assim como Che Guevara. Foi um grande pacifista, que sempre pregava o bem, independentemente das circunstâncias. E era uma pessoa que sonhava no horizonte com dias melhores. Ele foi um revolucionário, porque falava de amor, falava de igualdade, de viver bem. Pra mim, foi um dos grandes revolucionários. Um homem negro, lutador, que teve um histórico de pobreza e se superou.
PHA: Você acompanha o Conversa Afiada?
Ramon: Acompanho.
(Em dez anos, 10 mil alunos, no interior baiano!)
Depois de uma palestra, participei de uma divertida e estimulante noite de autógrafos.
Uma professora me apresentou um dos compradores na fila:
- Esse é Ramon. Chegou outro dia da França. Estava lá com o Ciência sem Fronteiras.
(“Ciência sem Fronteiras”, essa obra monumental do Governo Dilma!)
Geórgia Pinheiro, Presidenta do Conversa Afiada, procurou o Ramon.
Nós queríamos saber como é que Ramon Alves Malta tinha saído do interior da Bahia para estudar na França, e no que isso tinha dado...
Ramon, com um amigo e seu pai (agricultor familiar), no povoado de
São Benedito em Nilo Pecanha (BA)
Ele partiu da Engenharia, para a Agronomia e vai ser professor de Sociologia Rural, para entender como é que o pequeno produtor rural é um herói na França e, a aqui, criminalizado e perseguido.
É um depoimento comovente, que publicamos na íntegra, com um álbum de fotografias e legendas que o próprio Ramon redigiu.
A história de Ramon comove.
Porque é a prova de que políticas educacionais progressistas mudam um homem e um povo!
Essa política corre sério risco.
Com a “desvinculação” , com o ajuste dos açougueiros do neolibelismo e as ideias de dizimação social embutidas no receituário do professor Bacha – que deve entender muito da Bourgogne, mas não sabe por que Cruz das Almas é um patrimônio da Humanidade!
Mas, não tem problema: o Ramon vai depor o temer!
PHA
Primeiro encontro no Arco do triunfo, na praça Darcy, com os amigos
brasileiros que habitavam em Dijon
Mês de luta, 21 de maio, Dia Mundial de luta contra a Monsanto,
ato na cidade de Dijon, capital da Bourgogne
Com os colegas Franceses em Bruxelas em atividade acadêmica
Saindo dos livros e vendo de perto o Coliseu e a fortaleza do
Império Romano na Itália
Com as amigas da Grécia do programa de mobilidade internacional
da Europa, o Erasmus
Eu e os amigos brasileiros do Ciências sem Fronteiras, residentes
na Irlanda, na cidade de Cork
No norte da África no deserto do Saara, Marrocos, contato e
muito diálogo com os povos bérberes e nômades
Nos alpes marroquinos, apreciando esta bela vista e conhecendo
a historia dos diferentes povos africanos
Grupo de brasileiros do csf no Marrocos (residentes na
Itália, França e Irlanda)
2016... - Esporte e resgate das origens, comunidade africana na França, esporte com a rapaziada, uma dezena de nacionalidades da África (Burkina, Congo, Togo, Costa do Marfim, Angola, Benin, Camarões e outros)
Abaixo, a íntegra da entrevista com Ramon:
PHA: Ramon, que idade você tem?
Ramon: Tenho 24 anos.
PHA: E você nasceu onde?
Ramon: Eu nasci na cidade de Nilo Peçanha, sou originário do povoado de São Benedito, região da Alvorada, no sul da Bahia .
PHA: E como você foi parar na Universidade Federal do Recôncavo?
Ramon: Rapaz, foi uma longa trajetória, na verdade... Todo o período do meu ensino fundamental eu estudei numa escola na zona rural...
PHA: Onde?
Ramon: Lá em Nilo Peçanha, no povoado de São Benedito. Quando eu tinha 13 anos, acabei tendo que sair, porque não tinha ensino médio, e fui para Valença, que fica a cerca de 150km de Nilo Peçanha, mas a quase 200km do povoado em que eu moro.
PHA: E o que você fazia em Valença, Ramon?
Ramon: Em Valença eu fazia uma concomitância. Fazia o ensino médio numa escola estadual e, no período da manhã, fazia um curso técnico em agropecuária, o que agora a gente conhece como UIFE, mas que, na época, era Escola Média de Agropecuária Regional...
PHA: E como você se sustentava em Valença?
Ramon: Rapaz, no período em que eu morei em Valença...
PHA: Quantos anos?
Ramon: Eu tinha 13 anos. Fiquei dos treze aos dezesseis em Valença. Inauguramos a primeira residência universitária, da EMAC de Valença, que tinha parado e nós reinauguramos. Então, eu morava na residência, no curso técnico, nesse período.
PHA: E esse curso técnico era do Estado, do município, do Governo Federal ? Quem bancava você lá ?
Ramon: Era um curso técnico do Governo Federal, em parceria com a instituição federal que estudava (agricultura do cacau).
(A ligação caiu e ele retoma para contar como se virava...)
Ramon: … fruto do nosso trabalho, que a gente cultivava hortaliças - alface, coentro, de uma forma geral - e nós vendíamos isso na feira (e também tinha a ajuda da instituição federal, que ajudava a gente. Mas, no geral, a gente trabalhava no período oposto ao que estudava, ou, se a gente estudava o dia inteiro, trabalhava um pouco no fim de semana vendendo hortaliças e cultivando...
PHA: Isso foi exatamente quando ?
Ramon: Entre 2005 e 2007 eu morei em Valença. Em 2005, ingressei no Colégio Estadual de Valença, em 2006 ingressei nesse instituto federal e 2006/07 eu morei nessa residência e fiz o curso técnico.
PHA: E como você veio parar na Universidade Federal do Recôncavo ?
Ramon: Pra Universidade já foi um pouco mais fácil, porque assim que eu me formei em Valença eu tinha 16 anos. Fui trabalhar em janeiro de 2007, ainda menor de idade, um período na zona rural, e quando eu senti que tinha a perspectiva de sair do local em que eu morava, eu comecei a fazer uma escola particular, uma faculdade de Biologia. Depois eu tentei o último vestibular que teve para a UFRB, mas ainda não foi para Agronomia - entrei pelo curso de Ciências Exatas. Decidi abandonar tudo lá e vim cursar a universidade pública, que sempre foi o meu sonho. Comecei a fazer esse curso de bacharelado em Ciências Exatas (porque eu pensava em fazer Engenharia Civil). Depois de um tempo, (com) a minha paixão pela Agronomia - meu pai é agricultor, pequeno agricultor familiar - eu me transferi de curso (e pela dificuldade do curso, também, porque eu tinha que trabalhar para me sustentar)... Eu migrei do curso de Ciências Exatas e fui fazer Engenharia Agronômica aqui na UFRB.
PHA: Qual o tamanho da propriedade do seu pai e o que ele planta?
Ramon: Meu pai tem cerca de 3 mil pés de cacaleira, entre 3 e 4 hectares, e tem uma área pequena de graviola, meio hectare. Ele tem cerca de 5 hectares. Todos os meus tios são agricultores familiares. Foi através da agricultura familiar também que o meu pai me sustentou pra possibilitar que eu estudasse. E ele também trabalha como porteiro em um escola municipal.
PHA: E qual o grau de instrução do seu pai?
Ramon: Meu pai estudou até a quinta série do ensino fundamental. Não chegou a terminar. E minha mãe é professora. Ela conseguiu depois de muito terminar Pedagogia, curso a distância, mas meu pai não terminou o fundamental.
PHA: Quantos irmãos vocês são?
Ramon: Eu tenho dois irmãos: tenho uma irmã de 21 anos e um irmão mais novo, que é filho do meu pai...
PHA: E eles são também universitários?
Ramon: Minha irmã entrou recentemente também na UFRB, no curso de Psicologia, e meu irmão, como é muito novo, está estudando lá na zona rural ainda. Ele está na quarta série.
PHA: E como você resolveu entrar no Ciência sem Fronteiras?
Ramon: Rapaz, na verdade, eu não tinha a perspectiva de sair do país para estudar. Depois de um tempo aqui na Universidade mudei um pouquinho a forma de pensar (e pensar a sociedade). No ano passado, eu estava definindo a minha vida: se eu iria me formar logo ou se eu devia tentar entrar na Pós-Graduação. E aí eu conheci o programa Ciência sem Fronteiras. A Universidade aqui tem uma parceria que se chama “Bra-Frag” (Brasil e França), uma parceria que envolve os cursos de Ciências Agrárias (Agronomia e outros cursos). Conheci alguns professores desse programa Bra-Frag, e com a propaganda também das Universidades, do Governo Federal - que começou a investir muito nisso - eu tomei conhecimento do Ciência sem Fronteiras e decidi ir para esse enfrentamento, porque eu nunca tinha falado francês na minha vida...
PHA? Nunca?! Não sabia falar "oui" ?
Ramon: Não sabia falar nem "oui", nem "bonjour"...
PHA: E como você se virou, Ramon?
Ramon: Na verdade, eu comecei a estudar dois meses antes de ir pra lá e tinha um colega que tinha ido, pelo Ciência sem Fronteiras, para França... Ele voltou, fiz uma semana intensiva de curso com ele e depois, quando eu fui contemplado pelo Ciência sem Fronteiras, lá na França eu estudei um mês e meio, antes de começar o ensino superior.
PHA: Qual foi a Universidade que você fez lá ?
Ramon: Eu fiquei na AgroSup Dijon, instituto nacional...
PHA: Onde tem mostarda!
Ramon: Exatamente, na região da Borgonha, onde tem a famosa mostarda...
PHA: E o vinho da Borgonha, né, doutor ?
Ramon: Sim, sim... Os vinhos brancos são muito bons.
PHA: Qual foi a experiência marcante do que você estudou em Dijon?
Ramon: Pra mim, a experiência mais marcante, como eu sou apaixonado por Sociologia Rural - a França é uma referência nessa área e um país marcado por uma equidade no que envolve a distribuição de terras... eu fiquei muito encantado pela distribuição agrária da França, que é um país em que os agricultores conseguem ter qualidade de vida, eles não tem uma concentração de terras extrema como é o caso do nosso país. Os movimentos sociais do campo não são taxados de pessoas que não tem o que fazer, não são criminalizados... Na França, as pessoas tem uma visão muito diferente das pessoas que produzem alimentos e dos movimentos sociais. Isso foi uma coisa que me chamou muito a atenção.
PHA: Os pais do Ramon da França tem um padrão de vida muito melhor e uma outra posição na hierarquia social e política do país? É isso?
Ramon: Com certeza.
PHA: É um país de pequenos agricultores, não?
Ramon: Tem muitos pequenos agricultores que conseguem viver bem no campo e fazer com que os filhos estudem, com saúde, educação... Essa é uma coisa bem perceptível.
PHA: Eu encontrei você lá em Cruz das Almas, no dia do lançamento do meu livro, e fazia cinco dias que você tinha voltado da França. Você visitou bem Paris ou não?
Ramon: Visitei, visitei bastante Paris...
PHA: Que bom, não?
Ramon: Muito bom. Uma das coisas boas que fiz nesse intercâmbio foi conhecer muitos países e outros continentes.
PHA: Você nunca tinha saído do Brasil?
Ramon: Nunca tinha saído do Brasil. Conhecia todas as regiões do Brasil, costumo sair bastante por conta da militância, mas nunca tinha saído do país...
PHA: Qual a sua militância política?
Ramon: O primeiro movimento social que eu conheci foi a Federação dos Estudantes de Agronomia do Brasil, mas eu sou militante do Levante [Popular da Juventude] desde 2012, quando se nacionalizou. O Levante tem uma proximidade muito grande com o MST, um movimento com o qual a gente sempre dialoga. E, no período em que eu estive na França, militei pelos “Amigos do MST”.
PHA: Tem MST na França ?
Ramon: Tem os Amigos do MST...
PHA: Quais são os seus próximos passos?
Ramon: Como eu estou no meu último semestre na Universidade, eu pretendo terminar a minha graduação aqui e (penso na) perspectiva de ingressar na pós-graduação, na área de Engenharia Rural, no Rio de Janeiro ou no Rio Grande do Sul, porque sempre foi um sonho estudar (Sociologia Rural), e esse período na França contribuiu para (estimular) essa experiência. Meu projeto profissional é trabalhar com docência universitária.
PHA: Você quer ser professor?
Ramon: Isso, isso, quero ser professor universitário.
PHA: E como militante do Levante quais são as suas próximas ambições?
Ramon: As atividades já começaram. Tivemos reunião ontem (14/06/2016), já tem várias atividades programadas de formação, de ato na rua, pautando o "Fora, Temer". E também lutando por uma reforma do sistema político brasileiro. No geral, a gente tem medido forças no cenário nacional para pautar o debate e para que a gente viva no mínimo uma mudança do Governo ou uma reforma política. A gente vai ter o Acampamento Nacional do Levante neste ano, em setembro, e a gente está se mobilizando nas universidades, nas periferias.
PHA: O que você acha da ideia de convocar plebiscito já, para convocar eleições?
Ramon: O plebiscito, antes do golpe e até um pouco depois do golpe era uma coisa que muita gente não reivindicava, porque dizia que convocar o plebiscito seria dar um tiro nos próprios pés. Mas, no cenário em que a gente está vivendo agora, eu acho que uma das possibilidades seria a gente convocar esse plebiscito para novas eleições... Acho que é a última carta na manga que a gente tem. Mas, além disso a gente precisaria de um plebiscito mesmo para reformar esse sistema político e pautar uma Constituinte exclusiva...
PHA: Uma última pergunta: por que quando nós nos encontramos lá na UFRB, você estava com uma camiseta do Bob Marley?
Ramon: Ah, sim... Bob Marley, pra mim, é uma grande referência, assim como Che Guevara. Foi um grande pacifista, que sempre pregava o bem, independentemente das circunstâncias. E era uma pessoa que sonhava no horizonte com dias melhores. Ele foi um revolucionário, porque falava de amor, falava de igualdade, de viver bem. Pra mim, foi um dos grandes revolucionários. Um homem negro, lutador, que teve um histórico de pobreza e se superou.
PHA: Você acompanha o Conversa Afiada?
Ramon: Acompanho.
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