terça-feira, 12 de janeiro de 2016

Ex-pedreiro e herói de oito irmãos, Maicon Andrade sonha com Rio 2016


TAEKWONDO


Lutador, que disputa 1ª seletiva olímpica do taekwondo no fim de semana, lembra dos poucos treinos, supera câncer da mãe e recorda rotina em obras: "Chegava exausto"




Por
Rio de Janeiro


Maicon Andrade derrotou Braian Edward por 5 a 2 em Open de taekwondo (Foto: Marcelo Barone)
Maicon desfere chute na direção do rosto de 
um oponente: brasileiro já trabalhou como 
garçom antes de lutar (Foto: Marcelo Barone)

A dificuldade financeira é a tônica de muitos atletas em início de carreira no Brasil. Na vida de Maicon Andrade, integrante da seleção brasileira de taekwondo na categoria +87kg e em busca da vaga olímpica, os obstáculos eram os mesmos enfrentados por outros esportistas, exceto por um detalhe: dona Vitória, a matriarca, precisava sustentar nove filhos. Ele e mais oito.

Caçula da família, Maicon, aos 18 anos, trabalhava como assistente de pedreiro de segunda à sexta-feira, em Justinópolis, distrito de Ribeirão das Neves, em Minas Gerais, onde nasceu. No sábado, fazia "bico" como garçom e, naturalmente, sobrava apenas um dia da semana para se dedicar à sua paixão, o taekwondo.

- A rotina era intensa. Carregava saco de cimento, virava massa, levava tijolo, descarregava caminhão, brita... Era um trabalho pesado, chegava em casa exausto. Mas era o único jeito de permanecer lutando, por isso, não podia largar o serviço. Eu levava um dinheiro para casa e outra parte comprava o que precisava do taekwondo. Era pouco, mas dava para pagar uma inscrição no campeonato, ajudou muito - declarou o atleta, de 22 anos.

+ Confira como está a corrida olímpica do taekwondo para 2016

Maicon Andrade Taekwondo (Foto: Arquivo Pessoal)Lutador posa com a mãe, Vitória, que foi diagnosticada com câncer (Foto: Arquivo Pessoa)


Trabalhar e treinar consumiam toda a rotina, forçando Maicon a abrir mão dos estudos. O talento do jovem - apesar da pouca constância de treinos - despertou a atenção de um treinador que, ao vê-lo competir, o convidou para integrar a academia 2 Brothers, em São Caetano do Sul, São Paulo. Havia chegado a hora de dar um passo maior - Justinópolis havia ficado pequena para a promessa brasileira.

- Mudar de cidade foi complicado. A minha mãe me apoiou, assim como os meus irmãos. Larguei o conforto de casa, o carinho da família, para buscar meu sonho em um lugar onde não conhecia ninguém. Os três primeiros meses foram os mais difíceis da minha vida, era período de adaptação. A saudade apertava, doía muito, só conversava com a minha mãe pelo telefone. Em nenhum momento pensei em desistir. Se eu deixei o conforto de casa para ir atrás do meu sonho, eu nunca vou desistir.
Vou até o fim. O Reinaldo e o Clayton, técnicos da equipe, me falaram que seria difícil, mas que daria certo. Eu acreditei e, no sétimo mês, estava na seletiva para a seleção.

Dificuldades financeiras, cotidiano desgastante, mudanças de cidade e distância da família. Maicon Andrade precisou de muito suporte e equilíbrio emocional para não perder o foco. Foi superando os percalços até que, no início deste ano, um adversário forte e silencioso atacou sua mãe. Dona Vitória foi diagnosticada com câncer de mama.

- Foi o momento mais difícil da minha vida. Eu estava em competições muito importantes, tive que fazer um trabalho forte de psicologia. Foi a única coisa que mexeu muito comigo e, mesmo assim, mantive o foco e não desisti, provando que tudo que aconteceu com ela serviu de inspiração. O que faço é por ela, luto por ela.

Maicon Andrade Taekwondo (Foto: Arquivo Pessoal)
Maicon ficou em terceiro lugar na 
Universíade (Foto: Arquivo Pessoal)


Maicon afirma que a mãe passou pelos devidos tratamentos e está curada. Ele celebra a chance de poder realizar um dos sonhos dela, que, aos 65 anos, nunca viajou para o exterior.

- Paguei todos os remédios, tudo o que ela precisava. Ela é a minha força, minha inspiração. Todas as minhas lutas são por ela. Antes de lutar, sempre mando mensagem, ligo para ela. É amor mesmo. Meu sonho é dar uma viagem para ela poder viajar, ficar meses fazendo o que ela quiser, conhecer o mundo inteiro, levá-la para fora do país. Ela nunca foi ao exterior e sempre sonhou em ir para Dubai. Se Deus quiser, vou dar esse presente a ela. E não vai demorar muito - destacou o lutador, medalha de bronze na Universíade deste ano.

Único integrante da família a seguir o esporte como profissão, Maicon se tornou o "herói" dos oito irmãos - sete homens e uma mulher. O mineiro disputou competições mundo afora, mas ainda tem suas raízes na cidade onde nasceu.

- Meus irmãos moram todos em Justinópolis, só um que vive no Rio. Eles ficam mais nervosos do que eu quando tem competição. A relação com todos é a melhor possível, eles têm muito orgulho de mim. O meu irmão Marcelo falou para mim várias vezes: "Cara, tenho orgulho de ser seu irmão. Tive filhos, precisei fazer um caminho diferente, mas fico feliz por você seguir essa carreira no esporte".

Maicon Andrade Taekwondo (Foto: Arquivo Pessoal)Mineiro vem desbravando o mundo através das competições de taekwondo (Foto: Arquivo Pessoal)


Depois de ingressar na seleção brasileira menos de um ano após se mudar para a 2 Brothers, Maicon Andrade tem chances de disputar os Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro, em 2016. Ele disputa a vaga com outros quatro taekwondistas na primeira seletiva olímpica fechada, neste fim de semana, em Santos, São Paulo: Guilherme Félix, André Bilia, John Lee e Icaro Soares. O faixa-preta, que via filmes de artes marciais na televisão, poderá ser um dos protagonistas do maior evento poliesportivo do mundo, ainda por cima com o apoio dos torcedores brasileiros.

- Estar na seleção era meu sonho, e venho sendo titular por dois anos consecutivos. Ao entrar, você vira o alvo. Muitos acabam se acomodando. E quando isso acontece, alguém vai querer tomar o seu lugar. Tem que estar evoluindo, competindo, tem que buscar uma coisa maior. Você precisa saber onde quer chegar. Espero representar o país nas Olimpíadas e realizar meu sonho de ser campeão olímpico.

Maicon precisa terminar a primeira seletiva olímpica fechada entre os três melhores da categoria +80kg para, aí sim, se classificar para a segunda e decisiva seletiva fechada, que acontece no dia 14 de fevereiro, no Rio de Janeiro. Apenas o campeão de cada peso (-57kg feminino; -58kg e +80kg masculino) garante a vaga de titular. A categoria -49kg feminino já tem representante e a seletiva decidirá a reserva. A titular será Iris Sing, que se classificou de forma direta por terminar entre as seis melhores do mundo no ranking da Federação Internacional.


FONTE:
http://globoesporte.globo.com/taekwondo/noticia/2016/01/ex-pedreiro-e-heroi-de-oito-irmaos-maicon-andrade-sonha-com-rio-2016.html

Nenhum comentário: