domingo, 22 de janeiro de 2012

Oswaldo: 'É preciso 30 anos para jogar como o Barça'


Técnico do Botafogo conta o que espera de sua volta ao Brasi

  • Galeria - Oswaldo de Oliveira - Botafogo/2012(Foto: Cleber Mendes) Oswaldo de Oliveira sentiu que era o momento de voltar para casa(Foto: Cleber Mendes)

Marcelo Benevides
Publicada em 22/01/2012 às 11:03
Saquarema (RJ)

O magnetismo atrai, orienta ideias, objetivos na mesma direção. Esta força influente interferiu na caminhada de Oswaldo de Oliveira. Cinco anos obtendo e repassando experiência aos japoneses do Kashima Antlers. Aos olhos do futebol, tempo suficiente para aprendizado, conquistas. Ao coração do carioca de 61 anos, uma eternidade. A saudade de casa tocou fundo na alma. Era hora de voltar às raízes.

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No retorno, Oswaldo tem como porta de entrada o Botafogo, único grande carioca pelo qual não havia trabalhado. No dia de sua reestreia em solo nacional, nada melhor que um campeonato vivo na memória do ex-morador de Realengo (Zona Oeste do Rio), mas apenas como torcedor, já que nunca disputou a competição.

Como inspiração, o Barcelona, time da moda. Mas não será de um dia para o outro, como sonham alguns torcedores. Para Oswaldo, seria um trabalho de gerações:

- É preciso fazer um trabalho de 30 anos, como eles fazem.

Marcelo Benevides: Quando recebeu o convite do Botafogo, estava certo de que este era o momento de retornar ao Brasil?
Foi muito bom lá, mas era a hora de me reencontrar aqui, de reviver todas as emoções na minha terra. Essa coisa da raiz é muito magnética, ela te atrai. Não adianta. Você sofre por estar longe, por estar sozinho. Então, chega uma hora que você diz: chegou a hora de voltar.

M.B.: Mais do que se adaptar a um lugar distante, é preciso conquistas. Lá também há pressão?
Não tive muito problema de adapta ção, pois já havia vivido muitos anos no Qatar. Dificuldade por dificuldade, no Qatar, as coisas são muito piores. O japonês tem algo bem particular: ele só confia em você depois de um tempo. Fui muito questionado, cobrado. Depois, as coisas fluíram. O que muda, na verdade, é o nível de cobranças.

M. B.: E como é o nível de cobranças no Brasil? Todos sofrem e você, possivelmente, sofrerá...
Apesar de ter sofrido uma pressão mais silenciosa no Japão, já passei por isso várias vezes. Estou preparado. Com ou sem cobrança, tem de procurar fazer o trabalho.

M.B: Não há outro caminho no país justamente num campeonato da sua cidade e que você jamais disputou. Isto mexe?
O Carioca é uma lembrança mais antiga do futebol que eu tenho. Me lembro dos anos 50 de assistir pela TV alguns jogos do campeonato. Via aqueles timaços do Botafogo, Flamengo, Fluminense, Botafogo e América. A lembrança mais remota que eu tenho é a do Carioca. Depois, as repetidas vezes que ia ao Maracanã quando criança, adolescente. Estou realmente vivendo um
momento muito especial.

M. B.: Quais são os jogos que marcaram sua vida na competição?
Acompanhei pelo rádio o bicampeonato de 62 do Botafogo, no jogo em que o Flávio Costa colocou o Gerson na ponta esquerda. No Fla-Flu de 63, fui à porta do Maracanã e não pude entrar porque tinha 12 anos. Meu pai não deixou entrar porque o Maracanã estava superlotado. Em 65, o jogo da água no chope do Botafogo no Flamengo, no gol de Gerson. Enfim, grandes momentos
que eu jamais esquecerei.

M.B.: Muitos jogadores brasileiros vieram dos "terrões", dos campos de pelada. De alguma forma, esta base não interfere na disciplina? O jogador não chega ao profissional viciado devido à esta formação?
Hoje em dia não mais. Nos idos dos anos 70, talvez isso fosse mais acentuado. O processo de formação de jogadores evoluiu muito. Existe um trabalho em todos os clubes nas categorias de base, observando sempre a correção tática.

M. B.: Muito se fala do Barcelona como modelo de jogo, de clube. O que eles têm para nos ensinar?
É uma situação que precisa sair do campo para trazer para dentro. É preciso permanecer com os jogadores. É preciso permanecer com o Daniel Alves, por exemplo. É preciso fazer um trabalho de 30 anos, como eles fazem, que têm um ex-jogador
que conhece o clube como ninguém. Enfim, o exemplo bem-sucedido está aí. Serve de inspiração.

M. B.: O Barcelona tem como grande característica fazer muitos gols com raras bolas alçadas à área. Aqui, é comum treinamentos explorando exatamente este tipo de jogada. Não seria a hora de rever estes procedimentos nos treinos?
É uma questão de trabalhar o tempo, mas não só ter o tempo. Há a necessidade de se qualificar. Não há nenhum lugar do mundo com material humano mais qualificado que o Brasil. Basta trabalhar.

M. B.: O Botafogo tem fama de amarelar em jogos decisivos. Como mudar este mito?
Não acredito nisso. Todos que não ganharam são quase. Por isso, não vejo por este lado. Vi o Botafogo muito bem e que, no final, não conseguiu dar prosseguimento. Oscilar, o próprio campeão oscilou. Portanto, todos passaram por isso. Não estou preocupado em desfazer um clima de falta de segurança, porque não há este clima aqui.

M.B.: Como está o panorama atual dos clubes brasileiros, comparado ao período que você trabalhou? Ainda há muito amadorismo?
Vejo a maioria deles buscando gestores capacitados. Há o exemplo do Vasco, bem-sucedido, com o Rodrigo Caetano. A figura destes profissionais está contribuindo para o crescimento e fortalecimento dos clubes.

M. B.: E como está o Botafogo?
Tenho dado novas ideias. O Engenhão tem um espaço que pode ser melhor utilizado. Não que o Botafogo não queira, mas há que
se criar condições para ser feito. Mas, hoje, o Botafogo está bem.

M. B.: O que já deu para perceber de Loco Abreu?
É um cara diferenciado, que tem uma visão muito interessante do jogo. Sabe como poucos se posicionar dentro da área. A gente vai ter uma interação muito maior ainda.

M.B.: Você é um apreciador de literatura. O que você gosta de ler?
Gosto de Rui Castro, Zuenir Ventura, do 1968 (A ano que não terminou, célebre livro do autor) e de poesia. Gosto também de música brasileira, como Luiz Melodia e Emílio Santiago.

M. B.: Qual a poesia que poderia reger a sua vida?
Soneto de Fidelidade. Houve época em que eu sabia de cor e salteado.

M. B.: O torcedor do Botafogo é conhecido pela superstição. Vai adotar alguma?
Não tenho nada consciente. Mas se eu notar que pode interferir no ânimo do jogador, eu até poderei fazer. Entrar com o pé direito, pode ser uma opção (risos).

M. B.: Os seus dois antecessores no Botafogo tinham personalidades peculiares. Um era estudioso, enquanto o outro tinha um estilo paizão. E você, como se define?
Estou muito para Oswaldo de Oliveira. Sou a mesma pessoa que você conheceu antes, só que agora mais velho, mais tranquilo.

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